TRF2 0131885-55.2015.4.02.5001 01318855520154025001
CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITO. EMPRESA MATRIZ POSSUI DÉBITOS
JUNTO AO FISCO. EMPRESA AUTORA, NA CONDIÇÃO DE FILIAL, NÃO POSSUI
DÉBITOS. IMPOSSIBILIDADE DE OBTENÇÃO DA CND PELA FILIAL. 1- É sabido que a
jurisprudência tem se posicionado no sentido de que, em linha de princípio,
cada estabelecimento tem seu domicílio tributário, onde as obrigações
tributárias são geradas, de modo que os respectivos encargos são exigidos
conforme a situação específica e peculiar de cada filial. A partir disso,
o STJ tem proferido entendimento no sentido de que cada estabelecimento de
empresa que tenha CNPJ individual tem direito a certidão positiva com efeito
de negativa em seu nome, ainda que restem pendências tributárias de outros
estabelecimentos do mesmo grupo econômico, quer seja matriz ou filial. 2-
A matriz e filial são a mesma pessoa jurídica, com o mesmo CNPJ, que muda
apenas a terminação, para fins de identificação. Segundo a doutrina de
Leandro Paulsen, nesse contexto, o tratamento unitário pode inviabilizar as
providências necessárias à obtenção de certidões, "implicando em complexidade
invencível, reveladora de ônus demasiado ao contribuinte". 3- A sociedade
empresária é identificada como contribuinte pelo número de sua inscrição no
Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, sendo que a Secretaria da Receita
Federal, através da Instrução Normativa SRF nº 1634/2016, que regulamenta
atualmente a matéria, considera a matriz e filiais sujeitos à inscrição
individualizada no CNPJ. 4- A jurisprudência passou a interpretar o artigo 127,
II, do Código Tributário Nacional, cada estabelecimento tem seu domicílio
tributário, não sendo possível a recusa de emissão de certidão negativa a
determinado estabelecimento sob a alegação de que outros estabelecimentos
da recorrida têm débitos junto à Administração Fiscal. 5- Pelas normas de
Direito Civil, a matriz e filial constituem estabelecimentos da mesma pessoa
jurídica de direito privado. Com efeito, a empresa é considerada uma só,
quer haja um, quer haja vários estabelecimentos, sendo esta (exegese do
art. 127, II, do CTN) uma questão de domicílio da pessoa jurídica, seara na
qual se admite a pluralidade. 6- A esse respeito, o próprio § 1º do art. 75
do Código Civil dispõe que "tendo a pessoa jurídica diversos estabelecimentos
em lugares diferentes, cada um deles será considerado domicílio para os atos
nele praticados". Nisso, portanto, constitui a autonomia administrativa
dos estabelecimentos. 7- Da mesma forma que o dispositivo da legislação
civil acima mencionado, o Código Tributário Nacional, em seu art. 127, II,
estabelece a possibilidade de pluralidade de domicílios, para fins fiscais. 8-
É importante destacar que a interpretação dada pelo Superior Tribunal de
Justiça ao art. 127, II, do CTN, bem como pela adoção da idéia de autonomia
jurídico-funcional dos estabelecimento 1 que possuam CNPJ próprio foi o de
prestigiar a descentralização da administração empresarial, otimizando-a,
portanto. 9- A distinção deve ser feita aqui para que esses precedentes
não sejam considerados como fundamento para a realização de planejamento
tributário fraudulento. Com efeito, as empresas poderão realizar planejamento
tributário ilegal, transferindo débitos para as suas filiais ou destas
para a matriz, liberando a matriz ou filiais, conforme o caso, para obter
certidão, e participar de licitações, conseguir financiamentos com o BNDES,
parcelamentos etc. A sociedade anônima, que é una, estaria repleta de débitos
(matriz ou filais), mas apesar disso, realizaria licitações e estaria apta a
obter financiamentos através da matriz ou da filial (aquela que não tivesse
débitos). Vislumbrar-se-ia mais um caminho para a fraude e lesão ao erário. 10-
A apelante afirma que não existem débitos previdenciários em nome da autora
filial, mas existem diversos débitos fazendários em nome da matriz (extratos
juntados aos autos). Ressalte-se que, à evidência, a expedição de certidão
negativa em favor da filial poderá beneficiar toda a pessoa jurídica, que,
diga-se novamente, é una. 11- Não se pretende afastar, aqui, prima facie,
o entendimento que vem trilhando o Egrégio Superior Tribunal de Justiça,
embora os precedentes citados não tenham sido julgados como representativos
de controvérsia. Na verdade, o que se vislumbra é a necessidade da distinção
sugerida. Perceba-se que nada impediria que a autora, como pessoa jurídica,
valer-se do gozo de certidão negativa para a formalização de convênios e
contratos que beneficiem toda a sociedade, em nome da filial, ainda que a
matriz possua débitos fiscais exigíveis em seu CNPJ. 12- A própria Portaria
Conjunta RFB / PGFN Nº 1751, de 02 de outubro de 2014, que trata da emissão de
Certidões, dispõe que "a certidão emitida para pessoa jurídica é válida para
o estabelecimento matriz e suas filiais" (art. 3º). 13- O próprio Superior
Tribunal de Justiça, ao tratar da responsabilidade patrimonial das filiais
em relação à dívida tributária da pessoa jurídica, tratou como irrelevante o
fato de a filial possuir CNPJ próprio, por considerar a unidade patrimonial da
pessoa jurídica frente ao fisco, ressaltando, inclusive, que a inscrição da
filial no CNPJ é derivada do CNPJ da matriz. Esse entendimento foi proferido
pela Primeira Seção da Corte Superior em julgamento de recurso representativo
de controvérsia, e divulgado no informativo nº 0524, de 28 de agosto de 2013
( REsp 1355812/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO,
julgado em 22/05/2013, DJe 31/05/2013). 14- Dessa forma, a existência de
distinção entre o CNPJ da matriz com o da filial se dá em benefício da
própria atividade da Administração Fiscal, e não pode servir como elemento
apto a alterar a realidade que deve ser retratada na certidão de débitos,
qual seja, a existência ou não de débitos em nome da pessoa jurídica. 15- O
fato de o número de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica - CNPJ
de cada estabelecimento ser diferente ocorre porque as normas relativas a esse
cadastro são de natureza tributária e possuem como objetivo central facilitar
a atividade fiscalizatória do Estado, sem o efeito, nota-se, de cindir as
pessoas jurídicas que se estabelecem em mais de um lugar. Acrescente-se que
o STJ tem orientação em sua jurisprudência, com base em doutrina, no sentido
de que a filial é uma espécie de estabelecimento empresarial, fazendo parte
do acervo patrimonial de uma única pessoa jurídica, partilhando os mesmos
sócios, contrato social e firma ou denominação da matriz, de modo que,
conforme doutrina majoritária, consiste em uma universalidade de fato,
não ostentando personalidade jurídica própria, nem é sujeito de direitos,
tampouco uma pessoa distinta da sociedade empresária. 2 16- O STJ também já
decidiu que o princípio tributário da autonomia dos estabelecimentos, cujo
conteúdo normativo preceitua que estes devem ser considerados, na forma da
legislação específica de cada tributo, unidades autônomas e independentes
nas relações jurídico- tributárias travadas com a Administração Fiscal,
é um instituto de direito material, ligado à questão do nascimento da
obrigação tributária de cada imposto especificamente considerado e não tem
relação com a responsabilidade patrimonial dos devedores prevista em um
regramento de direito processual, ou com os limites da responsabilidade
dos bens da empresa e dos sócios definidos no direito empresarial. 17-
Portanto, a mencionada autonomia patrimonial das filiais é um instituto de
direito material cujo efeito serve para indicar o nascimento da obrigação
tributária, na forma do art. 127, II, do CTN e art. 75, §1º do Código Civil
(tanto que a jurisprudência do Superior de Justiça é no sentido de que a
matriz não tem legitimidade para representar processualmente as filiais
nos casos em que o fato gerador do tributo se dá de maneira individualizada
em cada estabelecimento comercial/industrial), e não se presta para cindir
a pessoa jurídica ou desconfigurar sua unidade patrimonial com relação ao
fisco. Caso contrário, seria contraditório conceber que cada filial/matriz
possua plena independência, apto a garanti-la o direito à certidão negativa,
independentemente dos débitos dos demais estabelecimentos, e ao mesmo tempo
entender que a diversidade de CNPJ não afasta a unidade patrimonial da pessoa
jurídica em relação ao fisco, para fins de responsabilidade patrimonial,
conforme decidido no REsp 1355812. 18- Remessa necessária e apelação providas.
Ementa
CERTIDÃO NEGATIVA DE DÉBITO. EMPRESA MATRIZ POSSUI DÉBITOS
JUNTO AO FISCO. EMPRESA AUTORA, NA CONDIÇÃO DE FILIAL, NÃO POSSUI
DÉBITOS. IMPOSSIBILIDADE DE OBTENÇÃO DA CND PELA FILIAL. 1- É sabido que a
jurisprudência tem se posicionado no sentido de que, em linha de princípio,
cada estabelecimento tem seu domicílio tributário, onde as obrigações
tributárias são geradas, de modo que os respectivos encargos são exigidos
conforme a situação específica e peculiar de cada filial. A partir disso,
o STJ tem proferido entendimento no sentido de que cada estabelecimento de
empresa que tenha CNPJ individual tem direito a certidão positiva com efeito
de negativa em seu nome, ainda que restem pendências tributárias de outros
estabelecimentos do mesmo grupo econômico, quer seja matriz ou filial. 2-
A matriz e filial são a mesma pessoa jurídica, com o mesmo CNPJ, que muda
apenas a terminação, para fins de identificação. Segundo a doutrina de
Leandro Paulsen, nesse contexto, o tratamento unitário pode inviabilizar as
providências necessárias à obtenção de certidões, "implicando em complexidade
invencível, reveladora de ônus demasiado ao contribuinte". 3- A sociedade
empresária é identificada como contribuinte pelo número de sua inscrição no
Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, sendo que a Secretaria da Receita
Federal, através da Instrução Normativa SRF nº 1634/2016, que regulamenta
atualmente a matéria, considera a matriz e filiais sujeitos à inscrição
individualizada no CNPJ. 4- A jurisprudência passou a interpretar o artigo 127,
II, do Código Tributário Nacional, cada estabelecimento tem seu domicílio
tributário, não sendo possível a recusa de emissão de certidão negativa a
determinado estabelecimento sob a alegação de que outros estabelecimentos
da recorrida têm débitos junto à Administração Fiscal. 5- Pelas normas de
Direito Civil, a matriz e filial constituem estabelecimentos da mesma pessoa
jurídica de direito privado. Com efeito, a empresa é considerada uma só,
quer haja um, quer haja vários estabelecimentos, sendo esta (exegese do
art. 127, II, do CTN) uma questão de domicílio da pessoa jurídica, seara na
qual se admite a pluralidade. 6- A esse respeito, o próprio § 1º do art. 75
do Código Civil dispõe que "tendo a pessoa jurídica diversos estabelecimentos
em lugares diferentes, cada um deles será considerado domicílio para os atos
nele praticados". Nisso, portanto, constitui a autonomia administrativa
dos estabelecimentos. 7- Da mesma forma que o dispositivo da legislação
civil acima mencionado, o Código Tributário Nacional, em seu art. 127, II,
estabelece a possibilidade de pluralidade de domicílios, para fins fiscais. 8-
É importante destacar que a interpretação dada pelo Superior Tribunal de
Justiça ao art. 127, II, do CTN, bem como pela adoção da idéia de autonomia
jurídico-funcional dos estabelecimento 1 que possuam CNPJ próprio foi o de
prestigiar a descentralização da administração empresarial, otimizando-a,
portanto. 9- A distinção deve ser feita aqui para que esses precedentes
não sejam considerados como fundamento para a realização de planejamento
tributário fraudulento. Com efeito, as empresas poderão realizar planejamento
tributário ilegal, transferindo débitos para as suas filiais ou destas
para a matriz, liberando a matriz ou filiais, conforme o caso, para obter
certidão, e participar de licitações, conseguir financiamentos com o BNDES,
parcelamentos etc. A sociedade anônima, que é una, estaria repleta de débitos
(matriz ou filais), mas apesar disso, realizaria licitações e estaria apta a
obter financiamentos através da matriz ou da filial (aquela que não tivesse
débitos). Vislumbrar-se-ia mais um caminho para a fraude e lesão ao erário. 10-
A apelante afirma que não existem débitos previdenciários em nome da autora
filial, mas existem diversos débitos fazendários em nome da matriz (extratos
juntados aos autos). Ressalte-se que, à evidência, a expedição de certidão
negativa em favor da filial poderá beneficiar toda a pessoa jurídica, que,
diga-se novamente, é una. 11- Não se pretende afastar, aqui, prima facie,
o entendimento que vem trilhando o Egrégio Superior Tribunal de Justiça,
embora os precedentes citados não tenham sido julgados como representativos
de controvérsia. Na verdade, o que se vislumbra é a necessidade da distinção
sugerida. Perceba-se que nada impediria que a autora, como pessoa jurídica,
valer-se do gozo de certidão negativa para a formalização de convênios e
contratos que beneficiem toda a sociedade, em nome da filial, ainda que a
matriz possua débitos fiscais exigíveis em seu CNPJ. 12- A própria Portaria
Conjunta RFB / PGFN Nº 1751, de 02 de outubro de 2014, que trata da emissão de
Certidões, dispõe que "a certidão emitida para pessoa jurídica é válida para
o estabelecimento matriz e suas filiais" (art. 3º). 13- O próprio Superior
Tribunal de Justiça, ao tratar da responsabilidade patrimonial das filiais
em relação à dívida tributária da pessoa jurídica, tratou como irrelevante o
fato de a filial possuir CNPJ próprio, por considerar a unidade patrimonial da
pessoa jurídica frente ao fisco, ressaltando, inclusive, que a inscrição da
filial no CNPJ é derivada do CNPJ da matriz. Esse entendimento foi proferido
pela Primeira Seção da Corte Superior em julgamento de recurso representativo
de controvérsia, e divulgado no informativo nº 0524, de 28 de agosto de 2013
( REsp 1355812/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO,
julgado em 22/05/2013, DJe 31/05/2013). 14- Dessa forma, a existência de
distinção entre o CNPJ da matriz com o da filial se dá em benefício da
própria atividade da Administração Fiscal, e não pode servir como elemento
apto a alterar a realidade que deve ser retratada na certidão de débitos,
qual seja, a existência ou não de débitos em nome da pessoa jurídica. 15- O
fato de o número de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica - CNPJ
de cada estabelecimento ser diferente ocorre porque as normas relativas a esse
cadastro são de natureza tributária e possuem como objetivo central facilitar
a atividade fiscalizatória do Estado, sem o efeito, nota-se, de cindir as
pessoas jurídicas que se estabelecem em mais de um lugar. Acrescente-se que
o STJ tem orientação em sua jurisprudência, com base em doutrina, no sentido
de que a filial é uma espécie de estabelecimento empresarial, fazendo parte
do acervo patrimonial de uma única pessoa jurídica, partilhando os mesmos
sócios, contrato social e firma ou denominação da matriz, de modo que,
conforme doutrina majoritária, consiste em uma universalidade de fato,
não ostentando personalidade jurídica própria, nem é sujeito de direitos,
tampouco uma pessoa distinta da sociedade empresária. 2 16- O STJ também já
decidiu que o princípio tributário da autonomia dos estabelecimentos, cujo
conteúdo normativo preceitua que estes devem ser considerados, na forma da
legislação específica de cada tributo, unidades autônomas e independentes
nas relações jurídico- tributárias travadas com a Administração Fiscal,
é um instituto de direito material, ligado à questão do nascimento da
obrigação tributária de cada imposto especificamente considerado e não tem
relação com a responsabilidade patrimonial dos devedores prevista em um
regramento de direito processual, ou com os limites da responsabilidade
dos bens da empresa e dos sócios definidos no direito empresarial. 17-
Portanto, a mencionada autonomia patrimonial das filiais é um instituto de
direito material cujo efeito serve para indicar o nascimento da obrigação
tributária, na forma do art. 127, II, do CTN e art. 75, §1º do Código Civil
(tanto que a jurisprudência do Superior de Justiça é no sentido de que a
matriz não tem legitimidade para representar processualmente as filiais
nos casos em que o fato gerador do tributo se dá de maneira individualizada
em cada estabelecimento comercial/industrial), e não se presta para cindir
a pessoa jurídica ou desconfigurar sua unidade patrimonial com relação ao
fisco. Caso contrário, seria contraditório conceber que cada filial/matriz
possua plena independência, apto a garanti-la o direito à certidão negativa,
independentemente dos débitos dos demais estabelecimentos, e ao mesmo tempo
entender que a diversidade de CNPJ não afasta a unidade patrimonial da pessoa
jurídica em relação ao fisco, para fins de responsabilidade patrimonial,
conforme decidido no REsp 1355812. 18- Remessa necessária e apelação providas.
Data do Julgamento
:
22/08/2017
Data da Publicação
:
25/08/2017
Classe/Assunto
:
AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
4ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
LUIZ ANTONIO SOARES
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
LUIZ ANTONIO SOARES
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