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Jurisprudência


TRF2 0133182-02.2013.4.02.5120 01331820220134025120

Ementa
APELAÇÃO. RECURSO ADESIVO. ADMINISTRATIVO. MILITAR. ERRO MÉDICO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. APLICAÇÃO DA TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. FALHA NO TRATAMENTO DA DOENÇA (GLAUCOMA) QUE OCASIONOU A PERDA DA VISÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CABIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. INEXISTÊNCIA. 1. De início, não deve ser conhecida a apelação interposta pela União Federal na parte em que alega a consumação da prescrição do fundo de direito, tendo em vista que tal questão não foi ventilada na contestação, o que levou a não apreciação da matéria pela parte autora em réplica e tampouco pelo juízo a quo no momento da prolação da sentença de mérito, caracterizando, à toda evidência, a inovação recursal. 2. O autor ingressou no Serviço Ativo da Marinha em 20/01/1986 e, por intermédio da Portaria nº 1735/2007, foi reformado por invalidez, ou seja, por incapacidade definitiva para o serviço militar, com diagnóstico de Glaucoma, conforme Termo de Inspeção de Saúde nº 0707479 de 02/04/2007, da Junta Regular de Saúde do Hospital Naval de Belém. 3. No presente caso, o autor fundamenta sua pretensão em eventual falha da Administração Naval quanto ao diagnóstico da doença (glaucoma), que só foi corretamente aferido no ano de 2007, sendo que os primeiros sintomas já teriam se manifestado em julho de 2005, bem como quanto ao tratamento médico a que foi submetido (uso de colírios) e o consequente agravamento da doença até sua fase final, culminando com a perda de sua visão. 4. Sobre a aplicação da teoria da perda de uma chance na atividade médica, confira-se os ensinamentos de SÉRGIO CAVALIERI FILHO: "a perda de uma chance, aplicada à atividade médica, ficou conhecida como teoria da perda de uma chance de cura ou sobrevivência. Entende-se por chance a probabilidade de se obter uma vantagem ou um ganho. Essas são típicas hipóteses da chamada perda da chance clássica, nas quais a conduta do agente faz a vítima perder a chance" (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Editora Atlas, 2014, p. 441/443). 5. Da detida análise dos autos, é possível concluir que, caso o autor tivesse recebido o tratamento médico adequado, qual seja, fosse submetido, ainda no período em que se encontrava no Serviço Ativo da Marinha, a um procedimento cirúrgico para evitar a progressão do glaucoma, tal providência, por si só, não garantiria que ele viesse a perder a visão, como aconteceu, mas certamente teria ele uma chance, razão pela qual deve ser aplicada a teoria da perda de uma chance, a impor a condenação pelo pagamento de indenização por danos morais. 6. Nas palavras do Desembargador Federal Dr. GUILHERME CALMON: "A reparação civil do dano moral, diversamente do que se verifica em relação ao dano patrimonial, não visa a recompor a situação jurídico-patrimonial do lesado, mas sim à definição de valor adequado, em razão de alguma das violações às dimensões da dignidade da pessoa humana, como a liberdade, a integridade físico-psíquica, a solidariedade, a isonomia e o crédito, pois o fim da teoria em análise não é apagar os efeitos da lesão, mas reparar os danos." (TRF2 - REO 5377278. Relator: Desembargador Federal Guilherme Calmon. Órgão julgador: 6ª Turma. E-DJF2R 11/05/2012). 7. No caso em apreço, revela-se razoável a fixação do valor indenizatório por danos morais em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), tal como fixado pela juíza sentenciante, já que compatibiliza o postulado jurídico da vedação do enriquecimento sem causa e o caráter punitivo-pedagógico do ressarcimento, para além de ser somente admissível a revisão do montante 1 fixado pela instância de origem em situações excepcionais, no caso em que o quantum indenizatório seja induvidosamente irrisório ou exorbitante. 8. A União Federal também deve ser condenada ao pagamento de indenização à titulo de danos materiais ao autor pelas despesas por ele custeadas na rede de saúde privada para a realização do procedimento cirúrgico com vistas a estabilização do quadro de glaucoma, tais como consultas, serviços médicos (cirurgião, anestesista), custos hospitalares e etc, todos descritos nos documentos acostados aos autos às fls. 43/49 e fls. 52, no valor de R$ 14.569,92 (catorze mil e quinhentos e sessenta e nove reais e noventa e dois centavos). 9. Não houve sucumbência recíproca, ao revés, a parte autora obteve provimento jurisdicional positivo em relação aos seus dois pedidos: (i) danos morais e (ii) danos materiais, em valores inferiores aos pleiteados na petição inicial, é verdade, mas o que é capaz apenas de configurar sua sucumbência mínima e a aplicação do disposto no artigo 86, parágrafo único, do NCPC/2015. 10. Apelação da União Federal conhecida em parte, e, na parte conhecida, desprovida. Recurso adesivo do autor desprovido.

Data do Julgamento : 23/06/2017
Data da Publicação : 28/06/2017
Classe/Assunto : AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador : 5ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a) : JULIO EMILIO ABRANCHES MANSUR
Comarca : TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Relator para acórdão : JULIO EMILIO ABRANCHES MANSUR
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