TRF2 0136628-70.2013.4.02.5101 01366287020134025101
ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE. ATUAÇÃO DO
PODER JUDICIÁRIO. TRATAMENTO MÉDICO. TESTEMUNHA D E JEOVÁ. RESSARCIMENTO
DE DESPESAS MÉDICAS. DESCABIMENTO. 1. A devolução cinge-se ao cabimento
da condenação dos réus a fornecer tratamento oncológico à autora na rede
privada, ante sua negativa na assinatura do termo de transfusão de componentes
sanguíneos exigido pelo INCA no qual resta assinalado que os médicos, em caso
de necessidade, podem se socorrer de transfusão sanguínea durante a realização
de procedimento cirúrgico. 2. O art. 196 da Constituição da República assevera
que a saúde é direito de todos e dever do Estado, competindo, na forma do
art. 197, primordialmente ao Poder Público, a execução das ações e serviços
que garantam ao cidadão, em última análise, o seu direito à vida. 3. A União,
os Estados, o Distrito Federal e os Municípios são responsáveis solidários
pela saúde, tanto do indivíduo quanto da coletividade e, dessa forma,
são legitimados passivos nas demandas cuja causa de pedir é a negativa,
pelo SUS (seja pelo gestor municipal, estadual ou federal), de prestações
na área de saúde. 4. O fato de o Sistema Único de Saúde ter descentralizado
os serviços e conjugado os recursos financeiros dos entes da federação,
com o objetivo de aumentar a qualidade e o acesso aos serviços de saúde,
apenas reforça a obrigação solidária e subsidiária entre esses ((RE 855178
RG, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 05/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO
REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-050 DIVULG 13- 03-2015 PUBLIC 16-03-2015
). 5. Embora o Poder Judiciário não possa editar leis ou adentrar na esfera
das políticas públicas, deve buscar a efetividade da norma constitucional
e a fiscalização do seu cumprimento, ainda que para assegurar o seu mínimo
existencial, qual seja, as condições b ásicas da existência humana. 6. Em se
tratando de paciente com neoplasia maligna, a Lei nº 12.732/2012 prevê que
paciente tem direito de se submeter ao primeiro tratamento de quimioterapia
e 1 r adioterapia no SUS no prazo de até 60 dias. 7. Na hipótese vertente,
a autora comprovou o diagnóstico de neoplasia do reto e que, matriculada
no inca em 11 de julho de 2013 (fls. 23/30), ainda aguardava por mais de 3
(três) meses a realização de procedimento cirúrgico para retirada do tumor,
em violação à s disposições da Lei nº 12.732/12. 8. Diante de tais fatos,
na linha da exegese adotada pela jurisprudência pátria, o Juízo a quo deferiu
o pedido de tutela antecipada para determinar que os réus providenciassem a
imediata avaliação e início de tratamento da autora no INCA ou em qualquer
hospital da r ede privada apto a realização do procedimento, sob custeio do
SUS (fls. 33/34). 9. De acordo com os documentos acostados às fls. 236/239,
o procedimento não foi realizado ante a recusa da autora, Testemunha de
Jeová, em assinar o termo de c onsentimento de transfusão de componentes
sanguíneos. 10. À fl. 282, a demandante informou que realizou a cirurgia em
hospital particular, requerendo a conversão da obrigação de fazer em perdas
e danos, com o reembolso do v alor de R$ 10.000,00 pago pela realização da
operação. 11. Verifica-se, portanto, que o atendimento na rede pública foi
inicialmente garantido e que a questão que se coloca a deslinde cinge-se
à análise do cabimento do custeio pelo Poder Público da cirurgia realizada
na rede privada, ante a recusa na assinatura do termo de consentimento de
transfusão de sangue e hemoderivados pela parte, por motivo de crença r
eligiosa. 12. O art. 22 do Código de Ética Médica estabelece que em situação
de risco iminente de morte, o consentimento do paciente e/ou familiares é
prescindível, sobrelevando-se o v alor-matriz vida. 13. Ainda que a liberdade
de religião seja expressão da dignidade da pessoa humana, não cabendo ao Estado
avaliar o mérito de qualquer crença, não é razoável impor ao Poder Público,
que ao possibilitar a cirurgia no INCA estava possibilitando a concretização
do direito social à saúde dentro de um quadro de escassez de recursos, a
responsabilidade pela relativização do direito à vida e pelas despesas da
cirurgia realizada pela autora na r ede privada. 14. Apelação improvida.
Ementa
ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE. ATUAÇÃO DO
PODER JUDICIÁRIO. TRATAMENTO MÉDICO. TESTEMUNHA D E JEOVÁ. RESSARCIMENTO
DE DESPESAS MÉDICAS. DESCABIMENTO. 1. A devolução cinge-se ao cabimento
da condenação dos réus a fornecer tratamento oncológico à autora na rede
privada, ante sua negativa na assinatura do termo de transfusão de componentes
sanguíneos exigido pelo INCA no qual resta assinalado que os médicos, em caso
de necessidade, podem se socorrer de transfusão sanguínea durante a realização
de procedimento cirúrgico. 2. O art. 196 da Constituição da República assevera
que a saúde é direito de todos e dever do Estado, competindo, na forma do
art. 197, primordialmente ao Poder Público, a execução das ações e serviços
que garantam ao cidadão, em última análise, o seu direito à vida. 3. A União,
os Estados, o Distrito Federal e os Municípios são responsáveis solidários
pela saúde, tanto do indivíduo quanto da coletividade e, dessa forma,
são legitimados passivos nas demandas cuja causa de pedir é a negativa,
pelo SUS (seja pelo gestor municipal, estadual ou federal), de prestações
na área de saúde. 4. O fato de o Sistema Único de Saúde ter descentralizado
os serviços e conjugado os recursos financeiros dos entes da federação,
com o objetivo de aumentar a qualidade e o acesso aos serviços de saúde,
apenas reforça a obrigação solidária e subsidiária entre esses ((RE 855178
RG, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 05/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO
REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-050 DIVULG 13- 03-2015 PUBLIC 16-03-2015
). 5. Embora o Poder Judiciário não possa editar leis ou adentrar na esfera
das políticas públicas, deve buscar a efetividade da norma constitucional
e a fiscalização do seu cumprimento, ainda que para assegurar o seu mínimo
existencial, qual seja, as condições b ásicas da existência humana. 6. Em se
tratando de paciente com neoplasia maligna, a Lei nº 12.732/2012 prevê que
paciente tem direito de se submeter ao primeiro tratamento de quimioterapia
e 1 r adioterapia no SUS no prazo de até 60 dias. 7. Na hipótese vertente,
a autora comprovou o diagnóstico de neoplasia do reto e que, matriculada
no inca em 11 de julho de 2013 (fls. 23/30), ainda aguardava por mais de 3
(três) meses a realização de procedimento cirúrgico para retirada do tumor,
em violação à s disposições da Lei nº 12.732/12. 8. Diante de tais fatos,
na linha da exegese adotada pela jurisprudência pátria, o Juízo a quo deferiu
o pedido de tutela antecipada para determinar que os réus providenciassem a
imediata avaliação e início de tratamento da autora no INCA ou em qualquer
hospital da r ede privada apto a realização do procedimento, sob custeio do
SUS (fls. 33/34). 9. De acordo com os documentos acostados às fls. 236/239,
o procedimento não foi realizado ante a recusa da autora, Testemunha de
Jeová, em assinar o termo de c onsentimento de transfusão de componentes
sanguíneos. 10. À fl. 282, a demandante informou que realizou a cirurgia em
hospital particular, requerendo a conversão da obrigação de fazer em perdas
e danos, com o reembolso do v alor de R$ 10.000,00 pago pela realização da
operação. 11. Verifica-se, portanto, que o atendimento na rede pública foi
inicialmente garantido e que a questão que se coloca a deslinde cinge-se
à análise do cabimento do custeio pelo Poder Público da cirurgia realizada
na rede privada, ante a recusa na assinatura do termo de consentimento de
transfusão de sangue e hemoderivados pela parte, por motivo de crença r
eligiosa. 12. O art. 22 do Código de Ética Médica estabelece que em situação
de risco iminente de morte, o consentimento do paciente e/ou familiares é
prescindível, sobrelevando-se o v alor-matriz vida. 13. Ainda que a liberdade
de religião seja expressão da dignidade da pessoa humana, não cabendo ao Estado
avaliar o mérito de qualquer crença, não é razoável impor ao Poder Público,
que ao possibilitar a cirurgia no INCA estava possibilitando a concretização
do direito social à saúde dentro de um quadro de escassez de recursos, a
responsabilidade pela relativização do direito à vida e pelas despesas da
cirurgia realizada pela autora na r ede privada. 14. Apelação improvida.
Data do Julgamento
:
21/07/2017
Data da Publicação
:
28/07/2017
Classe/Assunto
:
AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
5ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
ALCIDES MARTINS
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
ALCIDES MARTINS
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