TRF2 0139659-98.2013.4.02.5101 01396599820134025101
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. EMBARGOS INFRINGENTES. TRATAMENTO
MÉDICO. CIRURGIA. INTO. ISONOMIA. RESPEITO À FILA
ADMINISTRATIVAMENTE ORGANIZADA. TRATAMENTO EM HOSPITAL PARTICULAR. LEI
8.080/90. EXCEPCIONALIDADE. 1. O voto vencedor no julgamento da apelação foi
expresso ao determinar a realização do tratamento cirúrgico "em qualquer
hospital público com condições para realização do procedimento", não se
referindo à hipótese de tratamento em hospital particular. Dessa forma,
a possibilidade de tratamento em hospital particular iria além do conteúdo
do voto vencedor, não estando dentro do efeito devolutivo dos embargos
infringentes. 2. Por outro lado, o tratamento em rede privada de saúde,
a teor do que dispõe o art. 24 da Lei 8.080/90, somente deve ocorrer em
situações excepcionalíssimas. Obrigar a Administração Pública a custear toda e
qualquer ação e prestação de saúde feriria frontalmente o princípio da reserva
do possível, ante as evidentes limitações fático- econômicas existentes. O
próprio texto constitucional é cristalino ao definir que o serviço público
de saúde deve ser prestado diretamente pelo Poder Público. Não obstante
esse fato, o artigo 199 da Constituição Federal trata da participação da
iniciativa privada na área da saúde. Isto porque o constituinte reconheceu
que as estruturas públicas poderiam ser insuficientes para acolher toda
a demanda do SUS. Por essa razão, admitiu que o Poder Público pudesse
complementar o serviço público de saúde com serviços privados contratados ou
conveniados. Repise-se: a participação da iniciativa privada será em caráter
complementar, pois a prestação do serviço público de saúde é responsabilidade
direta do Estado. Torna-se evidente, portanto, que o papel da iniciativa
privada na prestação de serviços do SUS é acessório, coadjuvante. Conclui-se,
assim, que toda e qualquer tentativa ou medida de investir a iniciativa privada
no papel de protagonista ou gestora, no sistema único de saúde brasileiro,
confronta com o texto constitucional e com a legislação ordinária. Fosse pouco,
o INTO esclareceu que não se tratava de um caso de urgência/emergência e que
a autora poderia ser tratada eletivamente, não havendo justificativa para
tratamento diferenciado em relação aos demais pacientes na fila de espera. 1
3. Destaca-se, ainda, que é inviável, em um quadro insatisfatório, socializar
o custeio de internação em rede hospitalar privada. O deferimento do pedido,
nesta hipótese, também representaria verdadeira preterição aos pacientes
que aguardam na fila de espera, caracterizando privilégio indevido, à vista
da necessidade dos outros pacientes que aguardam atendimento gratuito pelo
SUS. 4. O direito à saúde implica para o Poder Público o dever inescusável
de adotar providências necessárias e indispensáveis para a sua promoção,
estabelecidas de forma universal e igualitária. Nesse contexto jurídico,
se o Poder Público negligencia no atendimento de seu dever, cumpre ao Poder
Judiciário intervir, num verdadeiro controle judicial de política pública, para
conferir efetividade ao correspondente preceito constitucional. 5. Todavia,
o acesso ao referido direito deve ser compatibilizado com o princípio
da isonomia, de forma a não garantir privilégios àqueles que procuram o
Judiciário em detrimento dos que aguardam por tratamentos e cirurgias de
acordo com a fila administrativamente estabelecida. Assim, não cabe ao
Judiciário administrar hospitais, estabelecendo prioridades de natureza
médica. Precedentes. 6. Dessa forma, cabe à Administração Pública, mediante
exame com base em critérios técnicos, aferir a possibilidade de internação
no INTO ou em qualquer outro hospital da rede pública, respeitando a fila
administrativamente estabelecida. 7. Embargos Infringentes conhecidos e
parcialmente providos.
Ementa
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. EMBARGOS INFRINGENTES. TRATAMENTO
MÉDICO. CIRURGIA. INTO. ISONOMIA. RESPEITO À FILA
ADMINISTRATIVAMENTE ORGANIZADA. TRATAMENTO EM HOSPITAL PARTICULAR. LEI
8.080/90. EXCEPCIONALIDADE. 1. O voto vencedor no julgamento da apelação foi
expresso ao determinar a realização do tratamento cirúrgico "em qualquer
hospital público com condições para realização do procedimento", não se
referindo à hipótese de tratamento em hospital particular. Dessa forma,
a possibilidade de tratamento em hospital particular iria além do conteúdo
do voto vencedor, não estando dentro do efeito devolutivo dos embargos
infringentes. 2. Por outro lado, o tratamento em rede privada de saúde,
a teor do que dispõe o art. 24 da Lei 8.080/90, somente deve ocorrer em
situações excepcionalíssimas. Obrigar a Administração Pública a custear toda e
qualquer ação e prestação de saúde feriria frontalmente o princípio da reserva
do possível, ante as evidentes limitações fático- econômicas existentes. O
próprio texto constitucional é cristalino ao definir que o serviço público
de saúde deve ser prestado diretamente pelo Poder Público. Não obstante
esse fato, o artigo 199 da Constituição Federal trata da participação da
iniciativa privada na área da saúde. Isto porque o constituinte reconheceu
que as estruturas públicas poderiam ser insuficientes para acolher toda
a demanda do SUS. Por essa razão, admitiu que o Poder Público pudesse
complementar o serviço público de saúde com serviços privados contratados ou
conveniados. Repise-se: a participação da iniciativa privada será em caráter
complementar, pois a prestação do serviço público de saúde é responsabilidade
direta do Estado. Torna-se evidente, portanto, que o papel da iniciativa
privada na prestação de serviços do SUS é acessório, coadjuvante. Conclui-se,
assim, que toda e qualquer tentativa ou medida de investir a iniciativa privada
no papel de protagonista ou gestora, no sistema único de saúde brasileiro,
confronta com o texto constitucional e com a legislação ordinária. Fosse pouco,
o INTO esclareceu que não se tratava de um caso de urgência/emergência e que
a autora poderia ser tratada eletivamente, não havendo justificativa para
tratamento diferenciado em relação aos demais pacientes na fila de espera. 1
3. Destaca-se, ainda, que é inviável, em um quadro insatisfatório, socializar
o custeio de internação em rede hospitalar privada. O deferimento do pedido,
nesta hipótese, também representaria verdadeira preterição aos pacientes
que aguardam na fila de espera, caracterizando privilégio indevido, à vista
da necessidade dos outros pacientes que aguardam atendimento gratuito pelo
SUS. 4. O direito à saúde implica para o Poder Público o dever inescusável
de adotar providências necessárias e indispensáveis para a sua promoção,
estabelecidas de forma universal e igualitária. Nesse contexto jurídico,
se o Poder Público negligencia no atendimento de seu dever, cumpre ao Poder
Judiciário intervir, num verdadeiro controle judicial de política pública, para
conferir efetividade ao correspondente preceito constitucional. 5. Todavia,
o acesso ao referido direito deve ser compatibilizado com o princípio
da isonomia, de forma a não garantir privilégios àqueles que procuram o
Judiciário em detrimento dos que aguardam por tratamentos e cirurgias de
acordo com a fila administrativamente estabelecida. Assim, não cabe ao
Judiciário administrar hospitais, estabelecendo prioridades de natureza
médica. Precedentes. 6. Dessa forma, cabe à Administração Pública, mediante
exame com base em critérios técnicos, aferir a possibilidade de internação
no INTO ou em qualquer outro hospital da rede pública, respeitando a fila
administrativamente estabelecida. 7. Embargos Infringentes conhecidos e
parcialmente providos.
Data do Julgamento
:
19/12/2016
Data da Publicação
:
26/01/2017
Classe/Assunto
:
EI - Embargos Infringentes - Embargos - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
3ª SEÇÃO ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
RICARDO PERLINGEIRO
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
JOSÉ ANTONIO NEIVA
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