TRF2 0145566-64.2017.4.02.5117 01455666420174025117
PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. REALIZAÇÃO DE CIRURGIA DE
NEFROLITOTIPSIA PERCUTÂNEA PELO PODER PÚBLICO. PRECEDENTES. SUS. PESSOA
DESPROVIDA DE RECURSOS FINANCEIROS. ART. 196 DA CF/88 E LEI Nº
8.080/90. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. DEFERIMENTO. LEGITIMIDADE PASSIVA. ALTO CUSTO
DO TRATAMENTO. RECURSO ADESIVO DA PARTE AUTORA. IMPOSIÇÃO DE MULTA DIÁRIA NA
HIPÓTESE DE DESCUMPRIMENTO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. CIRURGIA COMPROVADAMENTE
REALIZADA. INEXIGIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. CRITÉRIOS A SEREM APLICADOS QUANDO A FAZENDA PÚBLICA FOR
VENCIDA. RECURSOS DESPROVIDOS. 1 - Trata-se de remessa necessária, que tenho
por interposta, e de recursos de apelação interpostos pelo ESTADO DO RIO DE
JANEIRO, MUNICÍPIO DE SÃO GONÇALO, e de forma adesiva pela parte autora,
nos autos da ação ordinária ajuizada por ELISABETE CRISTINA MONTEIRO DE
SOUZA MOLINA, onde requer sejam as Rés condenadas à realização de cirurgia
de NEFROLITOTRIPSIA PERCUTÂNEA esquerda a laser, além de indenização por
danos morais. 2 - O cumprimento do dever político-constitucional de proteção
à saúde, consagrado no art. 196 do Texto Básico, obriga o Estado (gênero)
em regime de responsabilidade solidária entre as pessoas políticas que o
compõem, dada a unicidade do Sistema (art. 198, CF/88), a par de restar
incluso, nas atividades voltadas a assegurar tal direito fundamental, o
fornecimento gratuito de medicamentos e congêneres, bem como de atendimento
médico, a pessoas desprovidas de recursos financeiros para a cura, controle
ou atenuação de enfermidades. 3 - A interpretação da norma programática não
pode ser transformada em promessa constitucional inconseqüente. Precedente
do STF. 4 - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios são
partes legítimas para figurar no pólo passivo nas demandas cuja pretensão é
o fornecimento de medicamentos/tratamento médico imprescindível à saúde de
pessoa carente. 5 - No presente caso, a Autora apresenta o diagnóstico de
cálculo coraliforme em rim esquerdo e foi encaminhada ao posto de saúde,
unidade do SUS, à urologia cirúrgica para realização de nefrolitotripsia
percutânea esquerda a laser, em caráter de urgência, conforme documentos
médicos de fls. 21 e 27. A indicação do medicamento foi confirmada pelo Núcleo
de Assessoria Técnica em Ações de Saúde às fls. 44/47: "... Além disso, a
mesma está coberta pelo SUS, conforme Tabela de Procedimentos, Medicamentos,
Orteses/Próteses e Materiais Especiais do Sistema Único de Saúde - SUS
(SIGTAP), na qual consta nefrolitomia percutânea (04.09.01.023-5). Destaca-se
que a Autora está sendo acompanhada pelo Pólo 1 Sanitário Washington Luiz
Lopes, unidade de saúde pertencente ao SUS. Dessa forma, cabe esclarecer que
tal unidade de saúde é responsável pelo seu encaminhamento à instituição de
referência do seu município, a saber, o Hospital Universitário Antonio Pedro,
que integra os serviços especializados de Atenção em Urologia, conforme o
Cadastro Nacional de Estabelecimentos em Saúde (ANEXO), a fim de que seja
viabilizado o atendimento da demanda. Elucida-se que de acordo com o documento
médico acostado à folha 27 o médico assistente solicita "caráter de urgência,
pois a demora pode evoluir com perda da função e do parênquima renal esquerdo
e até a retirada do rim". Assim, salienta-se que a demora na realização da
cirurgia pleiteada pode acarretar em danos à saúde da Autora. Acrescenta-se
que ainda não existe Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas do
Ministério da Saúde, que verse sobre litíase renal." (grifos nossos) 6 -
O alto custo do tratamento não se configura, por si só, motivo suficiente
para caracterizar a ocorrência de grave lesão às finanças públicas, já que
o preceito do artigo 196 da Constituição Federal assegura aos necessitados
o fornecimento, pelo Estado, dos medicamentos e tratamentos indispensáveis
ao restabelecimento da saúde, sendo confirmado ser a Apelada pessoa carente,
bem como a necessidade premente da cirurgia, conforme consta dos documentos
médicos de fls. 21 e 27. Neste sentido, impõe-se a incidência do princípio
da cedência recíproca, pelo que, conflitando a oneração financeira do ente
político e pronto atendimento do paciente, há que se resolver em favor da
manutenção da saúde — e, consequentemente, da vida — deste. 7 -
Inexigível a aplicação de multa por descumprimento da decisão que antecipou
a tutela, haja vista a realização da cirurgia pleiteada. 8 - Com relação ao
pedido autoral de dano moral, o art.5º, X, da Constituição Federal de 1988,
consagra expressamente o direito em indenização por danos morais decorrente de
violação da intimidade, da vida privada, da honra e imagem das pessoas. Dessa
forma, sabe-se que o dano moral é aquele resultante de grave lesão aos
direitos da personalidade, que emanam da própria dignidade humana. A esse
respeito, confira-se recente julgado do Superior Tribunal de Justiça: STJ -
REsp 1717177/SE - 3ª Turma - Rel. Min. NANCY ANDRIGHI - Data da decisão:
13/03/2018 - Data de publicação: DJe 20/03/2018. Atualmente, se entende que
não está atrelada a aspectos anímicos do titular do direito, como sofrimento,
dor, humilhação ou desgosto, mas a caracterização da lesão extrapatrimonial
como um genuíno dano moral não prescinde da demonstração da gravidade da
ofensa, sob pena de banalização do instituto. É dizer, então, que, no plano
processual, incumbe ao demandante demonstrar a ocorrência do próprio dano,
mormente por ser excepcional o chamado "dano moral in re ipsa". E neste caso,
não ficou suficientemente comprovado a ocorrência de grave dano à esfera de
dignidade da autora, a autorizar a imposição de condenação do ente público
por dano moral, sendo inviável fazê-lo sem o mínimo sustento probatório. 9 -
Por fim, quanto à condenação em honorários, o Código de Processo Civil em
vigor expressamente dispõe sobre os critérios para a fixação dos honorários
nas causa em que a Fazenda Pública for parte - §3º, do artigo 85. A apreciação
equitativa terá lugar somente quando for inestimável ou irrisório o proveito
econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo; não se aplicando
em todas as causas nas quais for vencida a Fazenda Pública, tal como ocorria
sob a égide do CPC/1973. 10 - Remessa necessária e recursos do Estado do
Rio de Janeiro e do Município de São Gonçalo, e recurso adesivo da parte
autora desprovidos. Recurso do Município de São Gonçalo 2 de fls. 221/227
não conhecido, tendo em vista a preclusão consumativa.
Ementa
PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. REALIZAÇÃO DE CIRURGIA DE
NEFROLITOTIPSIA PERCUTÂNEA PELO PODER PÚBLICO. PRECEDENTES. SUS. PESSOA
DESPROVIDA DE RECURSOS FINANCEIROS. ART. 196 DA CF/88 E LEI Nº
8.080/90. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. DEFERIMENTO. LEGITIMIDADE PASSIVA. ALTO CUSTO
DO TRATAMENTO. RECURSO ADESIVO DA PARTE AUTORA. IMPOSIÇÃO DE MULTA DIÁRIA NA
HIPÓTESE DE DESCUMPRIMENTO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. CIRURGIA COMPROVADAMENTE
REALIZADA. INEXIGIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE DANO MORAL. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. CRITÉRIOS A SEREM APLICADOS QUANDO A FAZENDA PÚBLICA FOR
VENCIDA. RECURSOS DESPROVIDOS. 1 - Trata-se de remessa necessária, que tenho
por interposta, e de recursos de apelação interpostos pelo ESTADO DO RIO DE
JANEIRO, MUNICÍPIO DE SÃO GONÇALO, e de forma adesiva pela parte autora,
nos autos da ação ordinária ajuizada por ELISABETE CRISTINA MONTEIRO DE
SOUZA MOLINA, onde requer sejam as Rés condenadas à realização de cirurgia
de NEFROLITOTRIPSIA PERCUTÂNEA esquerda a laser, além de indenização por
danos morais. 2 - O cumprimento do dever político-constitucional de proteção
à saúde, consagrado no art. 196 do Texto Básico, obriga o Estado (gênero)
em regime de responsabilidade solidária entre as pessoas políticas que o
compõem, dada a unicidade do Sistema (art. 198, CF/88), a par de restar
incluso, nas atividades voltadas a assegurar tal direito fundamental, o
fornecimento gratuito de medicamentos e congêneres, bem como de atendimento
médico, a pessoas desprovidas de recursos financeiros para a cura, controle
ou atenuação de enfermidades. 3 - A interpretação da norma programática não
pode ser transformada em promessa constitucional inconseqüente. Precedente
do STF. 4 - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios são
partes legítimas para figurar no pólo passivo nas demandas cuja pretensão é
o fornecimento de medicamentos/tratamento médico imprescindível à saúde de
pessoa carente. 5 - No presente caso, a Autora apresenta o diagnóstico de
cálculo coraliforme em rim esquerdo e foi encaminhada ao posto de saúde,
unidade do SUS, à urologia cirúrgica para realização de nefrolitotripsia
percutânea esquerda a laser, em caráter de urgência, conforme documentos
médicos de fls. 21 e 27. A indicação do medicamento foi confirmada pelo Núcleo
de Assessoria Técnica em Ações de Saúde às fls. 44/47: "... Além disso, a
mesma está coberta pelo SUS, conforme Tabela de Procedimentos, Medicamentos,
Orteses/Próteses e Materiais Especiais do Sistema Único de Saúde - SUS
(SIGTAP), na qual consta nefrolitomia percutânea (04.09.01.023-5). Destaca-se
que a Autora está sendo acompanhada pelo Pólo 1 Sanitário Washington Luiz
Lopes, unidade de saúde pertencente ao SUS. Dessa forma, cabe esclarecer que
tal unidade de saúde é responsável pelo seu encaminhamento à instituição de
referência do seu município, a saber, o Hospital Universitário Antonio Pedro,
que integra os serviços especializados de Atenção em Urologia, conforme o
Cadastro Nacional de Estabelecimentos em Saúde (ANEXO), a fim de que seja
viabilizado o atendimento da demanda. Elucida-se que de acordo com o documento
médico acostado à folha 27 o médico assistente solicita "caráter de urgência,
pois a demora pode evoluir com perda da função e do parênquima renal esquerdo
e até a retirada do rim". Assim, salienta-se que a demora na realização da
cirurgia pleiteada pode acarretar em danos à saúde da Autora. Acrescenta-se
que ainda não existe Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas do
Ministério da Saúde, que verse sobre litíase renal." (grifos nossos) 6 -
O alto custo do tratamento não se configura, por si só, motivo suficiente
para caracterizar a ocorrência de grave lesão às finanças públicas, já que
o preceito do artigo 196 da Constituição Federal assegura aos necessitados
o fornecimento, pelo Estado, dos medicamentos e tratamentos indispensáveis
ao restabelecimento da saúde, sendo confirmado ser a Apelada pessoa carente,
bem como a necessidade premente da cirurgia, conforme consta dos documentos
médicos de fls. 21 e 27. Neste sentido, impõe-se a incidência do princípio
da cedência recíproca, pelo que, conflitando a oneração financeira do ente
político e pronto atendimento do paciente, há que se resolver em favor da
manutenção da saúde — e, consequentemente, da vida — deste. 7 -
Inexigível a aplicação de multa por descumprimento da decisão que antecipou
a tutela, haja vista a realização da cirurgia pleiteada. 8 - Com relação ao
pedido autoral de dano moral, o art.5º, X, da Constituição Federal de 1988,
consagra expressamente o direito em indenização por danos morais decorrente de
violação da intimidade, da vida privada, da honra e imagem das pessoas. Dessa
forma, sabe-se que o dano moral é aquele resultante de grave lesão aos
direitos da personalidade, que emanam da própria dignidade humana. A esse
respeito, confira-se recente julgado do Superior Tribunal de Justiça: STJ -
REsp 1717177/SE - 3ª Turma - Rel. Min. NANCY ANDRIGHI - Data da decisão:
13/03/2018 - Data de publicação: DJe 20/03/2018. Atualmente, se entende que
não está atrelada a aspectos anímicos do titular do direito, como sofrimento,
dor, humilhação ou desgosto, mas a caracterização da lesão extrapatrimonial
como um genuíno dano moral não prescinde da demonstração da gravidade da
ofensa, sob pena de banalização do instituto. É dizer, então, que, no plano
processual, incumbe ao demandante demonstrar a ocorrência do próprio dano,
mormente por ser excepcional o chamado "dano moral in re ipsa". E neste caso,
não ficou suficientemente comprovado a ocorrência de grave dano à esfera de
dignidade da autora, a autorizar a imposição de condenação do ente público
por dano moral, sendo inviável fazê-lo sem o mínimo sustento probatório. 9 -
Por fim, quanto à condenação em honorários, o Código de Processo Civil em
vigor expressamente dispõe sobre os critérios para a fixação dos honorários
nas causa em que a Fazenda Pública for parte - §3º, do artigo 85. A apreciação
equitativa terá lugar somente quando for inestimável ou irrisório o proveito
econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo; não se aplicando
em todas as causas nas quais for vencida a Fazenda Pública, tal como ocorria
sob a égide do CPC/1973. 10 - Remessa necessária e recursos do Estado do
Rio de Janeiro e do Município de São Gonçalo, e recurso adesivo da parte
autora desprovidos. Recurso do Município de São Gonçalo 2 de fls. 221/227
não conhecido, tendo em vista a preclusão consumativa.
Data do Julgamento
:
15/10/2018
Data da Publicação
:
18/10/2018
Classe/Assunto
:
AC - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho
Órgão Julgador
:
6ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
ALFREDO JARA MOURA
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
ALFREDO JARA MOURA
Mostrar discussão