TRF2 0162841-74.2017.4.02.5101 01628417420174025101
APELAÇÕES CÍVEIS. REMESSA NECESSÁRIA. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL
CIVIL. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. EX-FERROVIÁRIO. LEI N.º
8.186/1991. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. ARTS. 98 A 102 DO CÓDIGO DE PROCESSO
CIVIL DE 2015 (CPC/2015). AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO PREENCHIMENTO DOS
PRESSUPOSTOS AO GOZO DO BENEFÍCIO. REVOGAÇÃO. CABIMENTO. PRELIMINAR
DE ILLEGITIMIDADE PASSIVA RECHAÇADA. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO
REJEITADA. RELAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO. SUCESSÃO TRABALHISTA. MANUTENÇÃO
DA CONDIÇÃO DE FERROVIÁRIO. PARÂMETRO PARA A COMPLEMENTAÇÃO DA
APOSENTADORIA. REMUNERAÇÃO DO CARGO CORRESPONDENTE AO DO PESSOAL EM
ATIVIDADE NA RFFSA. CORREÇÃO MONETÁRIA. IPCA-e. ADIs 4357 E 4425 E RE
870.947. DANOS MORAIS. DESCABIMENTO. AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. ART. 85, § 11, DO CPC/15. RECURSOS DO AUTOR E DO
INSS CONHECIDOS E IMPROVIDOS. RECURSO DA UNIÃO E REEXAME OFICIAL CONHECIDOS E
PARCIALMENTE PROVIDOS. 1. O cerne da controvérsia ora posta a deslinde cinge-se
em saber se, ao fundamento de tratamento isonômico, o demandante tem direito
a obter complemento de aposentadoria de que é titular, calculado a partir da
tabela salarial aplicada à VALEC, bem como o pagamento de prestações pretéritas
com juros e correção monetária e reparação por danos morais. 2. O direito
à gratuidade judiciária, em concretização ao direito constitucionalmente
garantido de acesso à Justiça, está encartado e disciplinado nos arts. 98 a
102 do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015). Para gozar dos benefícios
da gratuidade judiciária, a interessada poderá postulá-los na petição inicial,
mediante declaração de hipossuficiência, que, segundo a legislação processual,
no caso das pessoas naturais, tem presunção de veracidade. Todavia, essa
presunção não é absoluta, de modo que, diante de elementos que evidenciem
a falta dos pressupostos legais para a concessão da gratuidade da Justiça, o
Juízo poderá indeferí-la, não sem antes instar a parte a comprovar que preenche
as condições ao gozo do benefício. 3. O C. Superior Tribunal de Justiça (STJ)
já se posicionou a respeito ao afirmar que "não é ilegal condicionar o juiz
a concessão da gratuidade à comprovação da miserabilidade jurídica, se a
atividade ou o cargo exercido pelo interessado fazem em princípio presumir
não se tratar de pessoa pobre" (STJ-RT 686/185). 4. Perlustrando o caderno
processual, extrai-se, especialmente da análise do comprovante de rendimentos
encartado, que o demandante percebia, em junho de 2017, remuneração bruta
no valor de R$ 3.073,84 (três mil e setenta e três reais e oitenta e quatro
centavos), o que importa em renda mensal superior ao limite de isenção - R$
1.903,98 (hum mil, novecentos e três reais e noventa e oito centavos) em
abril de 2015 - para o imposto de renda e também superior a três salários
mínimos, o que, na ausência de outros elementos de prova que demonstrem
a hipossuficiência do autor, não dá ensejo à concessão do 1 benefício de
gratuidade de justiça requerido, mormente diante da renda média auferida pelo
trabalhador brasileiro. Demais disso, quando da impugnação da concessão do
benefício pela União, em sede de contestação, o autor, por ocasião de sua
réplica, deixou de adunar documentos referentes às suas despesas mensais que
permitissem a conclusão do comprometimento de sua renda salarial e da sua
impossibilidade de suportar as despesas do processo. Por fim, veja-se que
o demandante sequer aventou a possibilidade de postular o parcelamento das
despesas processuais, segundo o estatuído no § 6.º, do art. 98, do vigente
Estatuto Processual Civil. 5. Tem sido orientação desta E. Corte adotar,
como critério objetivo da presunção do estado de miserabilidade jurídica,
o percebimento de renda mensal inferior a 03 (três) salários mínimos,
valor esse também utilizado, via de regra, pela Defensoria Pública para o
atendimento dos seus assistidos, e igualmente próximo ao valor do limite de
isenção do imposto de renda. 6. Rechaçada a tese de ilegitimidade passiva do
INSS, haja vista que, nas ações em que se postula revisão ou complementação
de aposentadoria ou pensão de ex-ferroviário, devem figurar conjuntamente
no polo passivo apenas o INSS e a União. O INSS é responsável diretamente
pelo pagamento das aposentadorias, bem como por dar cumprimento à eventual
concessão judicial, enquando a União cuida da verba referente à complementação
para repasse à autarquia arevidenciária. 7. Não há se falar em prescrição da
pretensão autoral, eis que, em se tratando de relação de trato sucessivo,
não se cogita de decadência ou prescrição do fundo de direito, mas apenas
da quinquenal anterior à propositura da ação, nos termos do Enunciado n.º
85 da Súmula do STJ, estando prescritas apenas as parcelas eventualmente
devidas anteriormente a 14.08.2012, já que a presente demanda foi ajuizada
em 14.08.2017, na forma do art. 1.º do Decreto n.º 20.910/32. 8. A teor do
estatuído no Decreto-Lei n.º 956/1969, a complementação de aposentadoria era
devida aos ferroviários servidores públicos, autárquicos ou em regime especial,
aposentados até a data de vigência daquele diploma legal. Com a superveniência
da Lei n.º 8.186/1991, os ferroviários admitidos, sob qualquer regime, até
1969, assim como aqueles que se aposentaram até a edição do Decreto-Lei
n.º 956/1969, têm direito à complementação da aposentadoria prevista no
mencionado decreto, que se estende aos pensionistas do ex-ferroviário. Sucede
que o art. 1.º da Lei n.º 10.478/2002 estendeu aos ferroviários admitidos
até 21/05/1991 o direito à complementação de aposentadoria, de acordo com
o estabelecido na Lei n.º 8.186/91. 9. Na espécie, constata-se, a partir do
exame dos documentos colacionados no caderno processual, em especial a Carteira
de Trabalho e Previdência Social - CTPS do autor, que este foi admitido na
Rede Ferroviária Federal S/A (RFFSA) em 22.03.1976, tendo sido posteriormente
absorvido no quadro de pessoal da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU)
por sucessão trabalhista em 03.10.1987 e transferido para o quadro de pessoal
da FLUMITRENS, por força da cisão parcial da CBTU, até que, em 14.04.1998,
aposentou-se, pelo Regime Geral da Previdência Social - RGPS. Conforme bem
comprovado na CTPS do demandante, sua mudança de quadro de pessoal se deu
em razão de sucessão trabalhista guiada pela política de descentralização
do sistema de transporte ferroviário. Do mais, a aludida lei somente exige
o ingresso na RFFSA, ou em suas subsidiárias, sem a necessidade de que o
trabalhador se aposente laborando na mesma empresa, desde que mantenha a
qualidade de ferroviário. 10. São ferroviários os trabalhadores de empresas
ferroviárias. Sob esta ótica, é indiscutível que o demandante laborou não só
na RFFSA, como também na CBTU e na FLUMITRENS, empresas públicas sucessoras
daquele órgão. Logo, deve o autor ser enquadrado na categoria de ferroviário,
salientando que nunca teve seu contrato de trabalho interrompido ou mesmo
alterado, continuando sempre a exercer exatamente as mesmas atividades,
que podem ser incluídas, sem titubeio, na definição legal de serviço
ferroviário. 2 11. O parâmetro para a complementação é a remuneração do
cargo correspondente ao do pessoal em atividade na RFFSA, e apenas as
parcelas permanentes diretamente relacionadas com o cargo (e não com a
situação pessoal de cada ex-ferroviário quando ainda estava em atividade)
compreendem a respectiva remuneração, acrescida somente da gratificação
adicional por tempo de serviço (art. 2.º, caput, da Lei n.º 8.186/91. c/c
o art. 41 da Lei n.º 8.112/90). 12. O fato de determinado empregado ter
incorporado gratificações ou qualquer outra vantagem remuneratória - inclusive
as decorrentes do exercício de cargos ou funções de confiança - de forma
alguma tem o condão de influenciar no cálculo do valor da complementação a
que este empregado fará jus após a aposentadoria. Afinal, tal incorporação -
de caráter estritamente individual - em nada altera o paradigma remuneratório
utilizado no cálculo da complementação, a ser aplicado, nos termos da lei,
indistintamente a todos os beneficiários que, por ocasião da aposentadoria,
encontrarem-se no mesmo nível de referência. 13. Os ditames da Lei n.º
8.186/1991 são claros ao estabelecer um paradigma remuneratório único para
todos os ferroviários admitidos na Rede Ferroviária Federal S.A. até 21 de
maio de 1993, independentemente de desdobramentos funcionais posteriores. Por
conseguinte, o valor da complementação deve ser igual para aposentados da
própria RFFSA e de suas subsidiárias (CBTU, Trensurb, etc.) que se encontrem
em situação idêntica (mesmo nível funcional), sob pena de afronta à isonomia
pretendida pelo legislador ordinário ao instituir o benefício previdenciário
em tela. Aliás, tal isonomia é explicitamente garantida pelo § 1.º do art. 118
da Lei n.º 10.233/2001 (redação dada pela Lei n.º 11.483/2007), ao determinar
que a paridade remuneratória relacionada à complementação de aposentadoria
instituída pelas Leis n.ºs 8.186/1991 e 10.478/2002 terá como referência os
valores previstos no plano de cargos e salários da extinta RFFSA, aplicados
aos empregados cujos contratos de trabalho foram transferidos para quadro
de pessoal especial da Valec, com o acréscimo da gratificação adicional por
tempo de serviço. Dessarte, não assiste razão ao autor em sua pretensão
de que seja aplicada outra tabela - que não a da RFFSA - no cálculo do
valor de sua complementação de aposentadoria. 14. As parcelas pretéritas
devidas a título de complementação de aposentadoria deverão ser corrigidas
monetariamente, desde a data em que devidas, e acrescidas de juros de mora,
a partir da data da citação. 15. Nas condenações impostas à Fazenda Pública,
em relação à correção monetária, deverá ser observado o Índice de Preços
ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E mensal, do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística, o qual persistirá até o efetivo pagamento pela
Fazenda Nacional, corrigindo-se as diferenças da data de cada parcela devida
(ADIs 4357 e 4425 e RE n.º 870.947). A utilização da TR, nesse contexto,
revela-se inconstitucional e deve ser afastada. 16. Por ora, o IPCA-E
foi fixado como índice de correção monetária por ser o que, atualmente,
apresenta melhor capacidade de captar o fenômeno inflacionário. Contudo,
em relação às situações futuras, deve-se observar o índice constante do
Manual de Cálculos da Justiça Feeral, caso o IPCA-E deixe de representar
o índice qualificado a capturar a variação de preços da economia, sendo
inidôneo a promover os fins a que se destina. 17. Ressalvada a possibilidade
de compensação de valores eventualmente já recebidos na via administrativa
sob o mesmo título. 18. Pedido de indenização por danos morais julgado
improcedente, haja vista a inexistência de qualquer ato ilícito praticado
pela Administração. Isto porque o autor não comprovou nos autos a apresentação
de requerimento, na seara administartiva, da complementação de aposentadoria
ora postulada, a acarretar eventual responsabilização da Administração pela
demora na apreciação ou pelo indeferimento do pleito. De mais a mais, ainda
que houvesse sido juntado prévio requerimento administrativo, o fato de a
Administração, ao interpretar a legislação em face da situação fática, reputar
3 que o autor não preenchia os requisitos para a concessão da complementação
de pensão por morte de ex- ferroviário e, assim, indeferir o benefício, por
si só, não constiui ato ilícito, não ensejando, por isso mesmo, o direito ao
pagamento de indenização por danos morais. 19. O egrégio Superior Tribunal de
Justiça editou o Enunciado Administrativo n.º 07, no qual restou definido que
"Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18
de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais
recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC.". Considerando que a
sentença ora combatida foi publicada em 14 de novembro de 2017 e levando em
conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, ficam os honorários
advocatícios devidos pelos demandados majorados, pro rata, no percentual de 1%
(um por cento) sobre o valor da condenação obtido na fase de liquidação, e os
devidos pelo demandante também majorados em 1% (um por cento) sobre o valor a
que foi condenado na sentença, com espeque no art. 85, § 11, do CPC/15, gizando
que, em relação ao autor, não mais está suspensa a exigibilidade de tal verba,
por força da revogação do benefício da gratuidade de justiça. 20. Apelações
do autor e do INSS conhecidas e improvidas. Apelação da União e remessa
necessária conhecidas e parcialmente providas.
Ementa
APELAÇÕES CÍVEIS. REMESSA NECESSÁRIA. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL
CIVIL. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. EX-FERROVIÁRIO. LEI N.º
8.186/1991. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. ARTS. 98 A 102 DO CÓDIGO DE PROCESSO
CIVIL DE 2015 (CPC/2015). AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO PREENCHIMENTO DOS
PRESSUPOSTOS AO GOZO DO BENEFÍCIO. REVOGAÇÃO. CABIMENTO. PRELIMINAR
DE ILLEGITIMIDADE PASSIVA RECHAÇADA. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO
REJEITADA. RELAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO. SUCESSÃO TRABALHISTA. MANUTENÇÃO
DA CONDIÇÃO DE FERROVIÁRIO. PARÂMETRO PARA A COMPLEMENTAÇÃO DA
APOSENTADORIA. REMUNERAÇÃO DO CARGO CORRESPONDENTE AO DO PESSOAL EM
ATIVIDADE NA RFFSA. CORREÇÃO MONETÁRIA. IPCA-e. ADIs 4357 E 4425 E RE
870.947. DANOS MORAIS. DESCABIMENTO. AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. ART. 85, § 11, DO CPC/15. RECURSOS DO AUTOR E DO
INSS CONHECIDOS E IMPROVIDOS. RECURSO DA UNIÃO E REEXAME OFICIAL CONHECIDOS E
PARCIALMENTE PROVIDOS. 1. O cerne da controvérsia ora posta a deslinde cinge-se
em saber se, ao fundamento de tratamento isonômico, o demandante tem direito
a obter complemento de aposentadoria de que é titular, calculado a partir da
tabela salarial aplicada à VALEC, bem como o pagamento de prestações pretéritas
com juros e correção monetária e reparação por danos morais. 2. O direito
à gratuidade judiciária, em concretização ao direito constitucionalmente
garantido de acesso à Justiça, está encartado e disciplinado nos arts. 98 a
102 do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015). Para gozar dos benefícios
da gratuidade judiciária, a interessada poderá postulá-los na petição inicial,
mediante declaração de hipossuficiência, que, segundo a legislação processual,
no caso das pessoas naturais, tem presunção de veracidade. Todavia, essa
presunção não é absoluta, de modo que, diante de elementos que evidenciem
a falta dos pressupostos legais para a concessão da gratuidade da Justiça, o
Juízo poderá indeferí-la, não sem antes instar a parte a comprovar que preenche
as condições ao gozo do benefício. 3. O C. Superior Tribunal de Justiça (STJ)
já se posicionou a respeito ao afirmar que "não é ilegal condicionar o juiz
a concessão da gratuidade à comprovação da miserabilidade jurídica, se a
atividade ou o cargo exercido pelo interessado fazem em princípio presumir
não se tratar de pessoa pobre" (STJ-RT 686/185). 4. Perlustrando o caderno
processual, extrai-se, especialmente da análise do comprovante de rendimentos
encartado, que o demandante percebia, em junho de 2017, remuneração bruta
no valor de R$ 3.073,84 (três mil e setenta e três reais e oitenta e quatro
centavos), o que importa em renda mensal superior ao limite de isenção - R$
1.903,98 (hum mil, novecentos e três reais e noventa e oito centavos) em
abril de 2015 - para o imposto de renda e também superior a três salários
mínimos, o que, na ausência de outros elementos de prova que demonstrem
a hipossuficiência do autor, não dá ensejo à concessão do 1 benefício de
gratuidade de justiça requerido, mormente diante da renda média auferida pelo
trabalhador brasileiro. Demais disso, quando da impugnação da concessão do
benefício pela União, em sede de contestação, o autor, por ocasião de sua
réplica, deixou de adunar documentos referentes às suas despesas mensais que
permitissem a conclusão do comprometimento de sua renda salarial e da sua
impossibilidade de suportar as despesas do processo. Por fim, veja-se que
o demandante sequer aventou a possibilidade de postular o parcelamento das
despesas processuais, segundo o estatuído no § 6.º, do art. 98, do vigente
Estatuto Processual Civil. 5. Tem sido orientação desta E. Corte adotar,
como critério objetivo da presunção do estado de miserabilidade jurídica,
o percebimento de renda mensal inferior a 03 (três) salários mínimos,
valor esse também utilizado, via de regra, pela Defensoria Pública para o
atendimento dos seus assistidos, e igualmente próximo ao valor do limite de
isenção do imposto de renda. 6. Rechaçada a tese de ilegitimidade passiva do
INSS, haja vista que, nas ações em que se postula revisão ou complementação
de aposentadoria ou pensão de ex-ferroviário, devem figurar conjuntamente
no polo passivo apenas o INSS e a União. O INSS é responsável diretamente
pelo pagamento das aposentadorias, bem como por dar cumprimento à eventual
concessão judicial, enquando a União cuida da verba referente à complementação
para repasse à autarquia arevidenciária. 7. Não há se falar em prescrição da
pretensão autoral, eis que, em se tratando de relação de trato sucessivo,
não se cogita de decadência ou prescrição do fundo de direito, mas apenas
da quinquenal anterior à propositura da ação, nos termos do Enunciado n.º
85 da Súmula do STJ, estando prescritas apenas as parcelas eventualmente
devidas anteriormente a 14.08.2012, já que a presente demanda foi ajuizada
em 14.08.2017, na forma do art. 1.º do Decreto n.º 20.910/32. 8. A teor do
estatuído no Decreto-Lei n.º 956/1969, a complementação de aposentadoria era
devida aos ferroviários servidores públicos, autárquicos ou em regime especial,
aposentados até a data de vigência daquele diploma legal. Com a superveniência
da Lei n.º 8.186/1991, os ferroviários admitidos, sob qualquer regime, até
1969, assim como aqueles que se aposentaram até a edição do Decreto-Lei
n.º 956/1969, têm direito à complementação da aposentadoria prevista no
mencionado decreto, que se estende aos pensionistas do ex-ferroviário. Sucede
que o art. 1.º da Lei n.º 10.478/2002 estendeu aos ferroviários admitidos
até 21/05/1991 o direito à complementação de aposentadoria, de acordo com
o estabelecido na Lei n.º 8.186/91. 9. Na espécie, constata-se, a partir do
exame dos documentos colacionados no caderno processual, em especial a Carteira
de Trabalho e Previdência Social - CTPS do autor, que este foi admitido na
Rede Ferroviária Federal S/A (RFFSA) em 22.03.1976, tendo sido posteriormente
absorvido no quadro de pessoal da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU)
por sucessão trabalhista em 03.10.1987 e transferido para o quadro de pessoal
da FLUMITRENS, por força da cisão parcial da CBTU, até que, em 14.04.1998,
aposentou-se, pelo Regime Geral da Previdência Social - RGPS. Conforme bem
comprovado na CTPS do demandante, sua mudança de quadro de pessoal se deu
em razão de sucessão trabalhista guiada pela política de descentralização
do sistema de transporte ferroviário. Do mais, a aludida lei somente exige
o ingresso na RFFSA, ou em suas subsidiárias, sem a necessidade de que o
trabalhador se aposente laborando na mesma empresa, desde que mantenha a
qualidade de ferroviário. 10. São ferroviários os trabalhadores de empresas
ferroviárias. Sob esta ótica, é indiscutível que o demandante laborou não só
na RFFSA, como também na CBTU e na FLUMITRENS, empresas públicas sucessoras
daquele órgão. Logo, deve o autor ser enquadrado na categoria de ferroviário,
salientando que nunca teve seu contrato de trabalho interrompido ou mesmo
alterado, continuando sempre a exercer exatamente as mesmas atividades,
que podem ser incluídas, sem titubeio, na definição legal de serviço
ferroviário. 2 11. O parâmetro para a complementação é a remuneração do
cargo correspondente ao do pessoal em atividade na RFFSA, e apenas as
parcelas permanentes diretamente relacionadas com o cargo (e não com a
situação pessoal de cada ex-ferroviário quando ainda estava em atividade)
compreendem a respectiva remuneração, acrescida somente da gratificação
adicional por tempo de serviço (art. 2.º, caput, da Lei n.º 8.186/91. c/c
o art. 41 da Lei n.º 8.112/90). 12. O fato de determinado empregado ter
incorporado gratificações ou qualquer outra vantagem remuneratória - inclusive
as decorrentes do exercício de cargos ou funções de confiança - de forma
alguma tem o condão de influenciar no cálculo do valor da complementação a
que este empregado fará jus após a aposentadoria. Afinal, tal incorporação -
de caráter estritamente individual - em nada altera o paradigma remuneratório
utilizado no cálculo da complementação, a ser aplicado, nos termos da lei,
indistintamente a todos os beneficiários que, por ocasião da aposentadoria,
encontrarem-se no mesmo nível de referência. 13. Os ditames da Lei n.º
8.186/1991 são claros ao estabelecer um paradigma remuneratório único para
todos os ferroviários admitidos na Rede Ferroviária Federal S.A. até 21 de
maio de 1993, independentemente de desdobramentos funcionais posteriores. Por
conseguinte, o valor da complementação deve ser igual para aposentados da
própria RFFSA e de suas subsidiárias (CBTU, Trensurb, etc.) que se encontrem
em situação idêntica (mesmo nível funcional), sob pena de afronta à isonomia
pretendida pelo legislador ordinário ao instituir o benefício previdenciário
em tela. Aliás, tal isonomia é explicitamente garantida pelo § 1.º do art. 118
da Lei n.º 10.233/2001 (redação dada pela Lei n.º 11.483/2007), ao determinar
que a paridade remuneratória relacionada à complementação de aposentadoria
instituída pelas Leis n.ºs 8.186/1991 e 10.478/2002 terá como referência os
valores previstos no plano de cargos e salários da extinta RFFSA, aplicados
aos empregados cujos contratos de trabalho foram transferidos para quadro
de pessoal especial da Valec, com o acréscimo da gratificação adicional por
tempo de serviço. Dessarte, não assiste razão ao autor em sua pretensão
de que seja aplicada outra tabela - que não a da RFFSA - no cálculo do
valor de sua complementação de aposentadoria. 14. As parcelas pretéritas
devidas a título de complementação de aposentadoria deverão ser corrigidas
monetariamente, desde a data em que devidas, e acrescidas de juros de mora,
a partir da data da citação. 15. Nas condenações impostas à Fazenda Pública,
em relação à correção monetária, deverá ser observado o Índice de Preços
ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E mensal, do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística, o qual persistirá até o efetivo pagamento pela
Fazenda Nacional, corrigindo-se as diferenças da data de cada parcela devida
(ADIs 4357 e 4425 e RE n.º 870.947). A utilização da TR, nesse contexto,
revela-se inconstitucional e deve ser afastada. 16. Por ora, o IPCA-E
foi fixado como índice de correção monetária por ser o que, atualmente,
apresenta melhor capacidade de captar o fenômeno inflacionário. Contudo,
em relação às situações futuras, deve-se observar o índice constante do
Manual de Cálculos da Justiça Feeral, caso o IPCA-E deixe de representar
o índice qualificado a capturar a variação de preços da economia, sendo
inidôneo a promover os fins a que se destina. 17. Ressalvada a possibilidade
de compensação de valores eventualmente já recebidos na via administrativa
sob o mesmo título. 18. Pedido de indenização por danos morais julgado
improcedente, haja vista a inexistência de qualquer ato ilícito praticado
pela Administração. Isto porque o autor não comprovou nos autos a apresentação
de requerimento, na seara administartiva, da complementação de aposentadoria
ora postulada, a acarretar eventual responsabilização da Administração pela
demora na apreciação ou pelo indeferimento do pleito. De mais a mais, ainda
que houvesse sido juntado prévio requerimento administrativo, o fato de a
Administração, ao interpretar a legislação em face da situação fática, reputar
3 que o autor não preenchia os requisitos para a concessão da complementação
de pensão por morte de ex- ferroviário e, assim, indeferir o benefício, por
si só, não constiui ato ilícito, não ensejando, por isso mesmo, o direito ao
pagamento de indenização por danos morais. 19. O egrégio Superior Tribunal de
Justiça editou o Enunciado Administrativo n.º 07, no qual restou definido que
"Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18
de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais
recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC.". Considerando que a
sentença ora combatida foi publicada em 14 de novembro de 2017 e levando em
conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, ficam os honorários
advocatícios devidos pelos demandados majorados, pro rata, no percentual de 1%
(um por cento) sobre o valor da condenação obtido na fase de liquidação, e os
devidos pelo demandante também majorados em 1% (um por cento) sobre o valor a
que foi condenado na sentença, com espeque no art. 85, § 11, do CPC/15, gizando
que, em relação ao autor, não mais está suspensa a exigibilidade de tal verba,
por força da revogação do benefício da gratuidade de justiça. 20. Apelações
do autor e do INSS conhecidas e improvidas. Apelação da União e remessa
necessária conhecidas e parcialmente providas.
Data do Julgamento
:
22/06/2018
Data da Publicação
:
27/06/2018
Classe/Assunto
:
APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - Recursos - Processo Cível e
do Trabalho
Órgão Julgador
:
6ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA
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