TRF2 0490423-49.2012.4.02.5101 04904234920124025101
PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. NEUROSSÍFILIS
E DEPRESSÃO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS E ACOMPANHAMENTO MÉDICO
ESPECIALIZADO. DIREITO À SAÚDE. ARTIGO 196 DA CRFB/88. DEVER DO
ESTADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA DA UNIÃO, DO ESTADO E DO
MUNICÍPIO, OS QUAIS COMPÕEM O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - SUS. PREVALÊNCIA
DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. HONORÁRIOS MANTIDOS. SEGUNDA APELAÇÃO D A UNIÃO
FEDERAL. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. SENTENÇA MANTIDA. -Cinge-se a controvérsia ao
fornecimento de acompanhamento médico contínuo do autor em seu domicílio por
fisioterapeuta e enfermeiro, fornecimento de fraldas descartáveis continuamente
(120 unidades ao mês), reavaliações médicas por ortopedista e neurologista,
bem como o fornecimento dos medicamentos AMITRIPTILINA 50mg (1 comprimido
ao dia), FLUOXETINA 20mg (1 comprimido ao dia), DIGESAN 10mg (3 comprimidos
ao dia), CIPROFLOXACIN 500mg (2 comprimidos ao dia) e AMOXICILINA/CLAVULANATO
(500/125 - 3 comprimidos ao dia), por ser portador de Neurossífilis (CID A52.3)
e D epressão (F32.4). -Ausência de reiteração do agravo retido interposto
pela União, nas razões ou contrarrazões de apelação, nos termos do art. 523,
§1º, do CPC, vigente à época da sua interposição, i mpondo-se, assim, o não
conhecimento. -O segundo recurso de apelação interposto pela União Federal
não merece ser conhecido, tendo em vista o princípio da unirrecorribilidade
recursal e a preclusão consumativa. -A jurisprudência pátria, diante do
comando constitucional previsto no artigo 196 - segundo o qual "a saúde é
direito de 1 todos e dever do Estado" -, é assente em reconhecer o direito
dos cidadãos à obtenção de tratamento médico eficaz e gratuito, o qual
deve abranger, quando necessário à cura dos pacientes hipossuficientes,
o fornecimento gratuito da medicação essencial ao combate às doenças ou à
manutenção da saúde, de modo a preservar uma condição de existência, ao menos,
minimamente condigna, em absoluto respeito ao princípio da dignidade da pessoa
humana, fundamento de nosso E stado Democrático de Direito (art. 1º, III,
CRFB/88). -Há que se reconhecer a legitimidade de todos os entes públicos à
realização deste importante mister, tendo em vista que a obrigação em testilha
é imposta genericamente ao Estado e, sobretudo, que entendimento diverso é
capaz de pôr em risco a efetividade do comando constitucional, o que não se
p ode admitir, diante da magnitude dos interesses envolvidos. -A obrigação
do Estado de assegurar o direito à saúde, nos termos do artigo 196 da Carta
Magna, deve ser efetivada em toda a extensão necessária à garantia do direito
à vida. Assim, sendo certa a disponibilidade do medicamento no mercado interno
e externo e havendo real necessidade de tratamento reconhecida por um médico
da rede pública de saúde, nenhum óbice se pode opor ao fornecimento do m
edicamento necessário ao tratamento do demandante. -O posicionamento recente
do Eg. Supremo Tribunal Federal que, em sua composição plena, no julgamento
da Suspensão de Segurança 3.355-AgR/RN, fixou entendimento no sentido de
que a "obrigação dos entes da federação no que tange ao dever fundamental
de prestação de saúde é solidária" (AI 808059 AgR, Relator: Min. RICARDO
LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 02/12/2010, DJe-020 DIVULG 31-01-2011
PUBLIC 01- 0 2-2011 EMENT VOL-02454-13 PP-03289). -A alegação da União de
que o fornecimento do medicamento em questão, por destinar a tratamento de
doença grave, não é procedimento padronizado do SUS, não é capaz de afastar a
sua i legitimidade para fornecê-lo. -A ausência de inclusão de medicamentos
em listagem não pode, por si só, obstaculizar o fornecimento gratuito de
medicação a portador de moléstia grave, desde que receitado e 2 comprovada
a sua necessidade, o que ocorreu, in casu . Precedente desta Oitava Turma
Especializada citado. -Ademais, o médico do Hospital Federal de Bonsucesso,
em seu laudo médico (fl. 24/25), atesta que "apresentou melhora clínica, bem
como melhora importante das úlceras de pressão, porém mantém-se com sequelas
motoras em virtude da neurossifilis e das complicações da osteomielite crônica
coxa femural direita, sendo incapaz de exercer atividades laborais. Persiste
com depressão (F 32.4). O paciente requer cuidados contínuos de fisioterapia
e de enfermagem em domicílio, assim como acompanhamento frequente (a ser
avaliado por casa especialidade) por fonoaudiólogo, dentista, psicólogo e
médico (Clínico Geral). Necessita também de reavaliação médica de Ortopedista
e Neurologista. O paciente necessita ainda de fornecimento contínuo de fraldas
(cerca de 120 unidades/mês) e transporte com ambulância para reavaliações
ambulatoriais e realização de exames em unidade h ospitalar". -Não merece
prosperar a alegação da existência de outras alternativas terapêuticas
oferecidas pelo SUS para o tratamento da doença acometica pelo autor,
na medida em que não consta do laudo, qualquer menção a alternativas
terapêuticas fornecidas gratuitamente pelo SUS, capazes de t razer maior
eficácia à moléstia do demandante. -Dessa forma, comprovada nos autos a
necessidade dos remédios/insumos postulados, bem como do acompanhamento médico
contínuo do autor em domicílio por especialistas (fisioterapeuta e enfermeiro)
e reavaliações médicas por ortopedista e neurologista, através de transporte
adequado para tal, como condição essencial à preservação da sua saúde, elemento
integrante do mínimo existencial, em observância do Princípio da Dignidade da
Pessoa Humana, impõe-se a m anutenção da sentença. -Em relação à violação ao
princípio da Separação dos Poderes, verifica-se que, em que pese a atuação do
Poder Judiciário no controle das políticas públicas não poder se dar de forma
indiscriminada, a Administração Pública, ao violar direitos fundamentais por
meio da execução ou falta injustificada de 3 programas de governo, torna sua
interferência perfeitamente legítima, servindo, portanto, como instrumento para
r estabelecer a integridade da ordem jurídica violada. -Manutenção do quantum
fixado a título de honorários advocatícios, ante a ausência de complexidade da
causa e atendido o critério de equidade previsto nas alíneas "a", "b" e "c",
do § 3º, do artigo 20, do CPC. - Remessa necessária e recursos desprovidos.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. NEUROSSÍFILIS
E DEPRESSÃO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS E ACOMPANHAMENTO MÉDICO
ESPECIALIZADO. DIREITO À SAÚDE. ARTIGO 196 DA CRFB/88. DEVER DO
ESTADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA DA UNIÃO, DO ESTADO E DO
MUNICÍPIO, OS QUAIS COMPÕEM O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - SUS. PREVALÊNCIA
DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. HONORÁRIOS MANTIDOS. SEGUNDA APELAÇÃO D A UNIÃO
FEDERAL. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. SENTENÇA MANTIDA. -Cinge-se a controvérsia ao
fornecimento de acompanhamento médico contínuo do autor em seu domicílio por
fisioterapeuta e enfermeiro, fornecimento de fraldas descartáveis continuamente
(120 unidades ao mês), reavaliações médicas por ortopedista e neurologista,
bem como o fornecimento dos medicamentos AMITRIPTILINA 50mg (1 comprimido
ao dia), FLUOXETINA 20mg (1 comprimido ao dia), DIGESAN 10mg (3 comprimidos
ao dia), CIPROFLOXACIN 500mg (2 comprimidos ao dia) e AMOXICILINA/CLAVULANATO
(500/125 - 3 comprimidos ao dia), por ser portador de Neurossífilis (CID A52.3)
e D epressão (F32.4). -Ausência de reiteração do agravo retido interposto
pela União, nas razões ou contrarrazões de apelação, nos termos do art. 523,
§1º, do CPC, vigente à época da sua interposição, i mpondo-se, assim, o não
conhecimento. -O segundo recurso de apelação interposto pela União Federal
não merece ser conhecido, tendo em vista o princípio da unirrecorribilidade
recursal e a preclusão consumativa. -A jurisprudência pátria, diante do
comando constitucional previsto no artigo 196 - segundo o qual "a saúde é
direito de 1 todos e dever do Estado" -, é assente em reconhecer o direito
dos cidadãos à obtenção de tratamento médico eficaz e gratuito, o qual
deve abranger, quando necessário à cura dos pacientes hipossuficientes,
o fornecimento gratuito da medicação essencial ao combate às doenças ou à
manutenção da saúde, de modo a preservar uma condição de existência, ao menos,
minimamente condigna, em absoluto respeito ao princípio da dignidade da pessoa
humana, fundamento de nosso E stado Democrático de Direito (art. 1º, III,
CRFB/88). -Há que se reconhecer a legitimidade de todos os entes públicos à
realização deste importante mister, tendo em vista que a obrigação em testilha
é imposta genericamente ao Estado e, sobretudo, que entendimento diverso é
capaz de pôr em risco a efetividade do comando constitucional, o que não se
p ode admitir, diante da magnitude dos interesses envolvidos. -A obrigação
do Estado de assegurar o direito à saúde, nos termos do artigo 196 da Carta
Magna, deve ser efetivada em toda a extensão necessária à garantia do direito
à vida. Assim, sendo certa a disponibilidade do medicamento no mercado interno
e externo e havendo real necessidade de tratamento reconhecida por um médico
da rede pública de saúde, nenhum óbice se pode opor ao fornecimento do m
edicamento necessário ao tratamento do demandante. -O posicionamento recente
do Eg. Supremo Tribunal Federal que, em sua composição plena, no julgamento
da Suspensão de Segurança 3.355-AgR/RN, fixou entendimento no sentido de
que a "obrigação dos entes da federação no que tange ao dever fundamental
de prestação de saúde é solidária" (AI 808059 AgR, Relator: Min. RICARDO
LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 02/12/2010, DJe-020 DIVULG 31-01-2011
PUBLIC 01- 0 2-2011 EMENT VOL-02454-13 PP-03289). -A alegação da União de
que o fornecimento do medicamento em questão, por destinar a tratamento de
doença grave, não é procedimento padronizado do SUS, não é capaz de afastar a
sua i legitimidade para fornecê-lo. -A ausência de inclusão de medicamentos
em listagem não pode, por si só, obstaculizar o fornecimento gratuito de
medicação a portador de moléstia grave, desde que receitado e 2 comprovada
a sua necessidade, o que ocorreu, in casu . Precedente desta Oitava Turma
Especializada citado. -Ademais, o médico do Hospital Federal de Bonsucesso,
em seu laudo médico (fl. 24/25), atesta que "apresentou melhora clínica, bem
como melhora importante das úlceras de pressão, porém mantém-se com sequelas
motoras em virtude da neurossifilis e das complicações da osteomielite crônica
coxa femural direita, sendo incapaz de exercer atividades laborais. Persiste
com depressão (F 32.4). O paciente requer cuidados contínuos de fisioterapia
e de enfermagem em domicílio, assim como acompanhamento frequente (a ser
avaliado por casa especialidade) por fonoaudiólogo, dentista, psicólogo e
médico (Clínico Geral). Necessita também de reavaliação médica de Ortopedista
e Neurologista. O paciente necessita ainda de fornecimento contínuo de fraldas
(cerca de 120 unidades/mês) e transporte com ambulância para reavaliações
ambulatoriais e realização de exames em unidade h ospitalar". -Não merece
prosperar a alegação da existência de outras alternativas terapêuticas
oferecidas pelo SUS para o tratamento da doença acometica pelo autor,
na medida em que não consta do laudo, qualquer menção a alternativas
terapêuticas fornecidas gratuitamente pelo SUS, capazes de t razer maior
eficácia à moléstia do demandante. -Dessa forma, comprovada nos autos a
necessidade dos remédios/insumos postulados, bem como do acompanhamento médico
contínuo do autor em domicílio por especialistas (fisioterapeuta e enfermeiro)
e reavaliações médicas por ortopedista e neurologista, através de transporte
adequado para tal, como condição essencial à preservação da sua saúde, elemento
integrante do mínimo existencial, em observância do Princípio da Dignidade da
Pessoa Humana, impõe-se a m anutenção da sentença. -Em relação à violação ao
princípio da Separação dos Poderes, verifica-se que, em que pese a atuação do
Poder Judiciário no controle das políticas públicas não poder se dar de forma
indiscriminada, a Administração Pública, ao violar direitos fundamentais por
meio da execução ou falta injustificada de 3 programas de governo, torna sua
interferência perfeitamente legítima, servindo, portanto, como instrumento para
r estabelecer a integridade da ordem jurídica violada. -Manutenção do quantum
fixado a título de honorários advocatícios, ante a ausência de complexidade da
causa e atendido o critério de equidade previsto nas alíneas "a", "b" e "c",
do § 3º, do artigo 20, do CPC. - Remessa necessária e recursos desprovidos.
Data do Julgamento
:
23/08/2016
Data da Publicação
:
29/08/2016
Classe/Assunto
:
APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - Recursos - Processo Cível e
do Trabalho
Órgão Julgador
:
8ª TURMA ESPECIALIZADA
Relator(a)
:
VERA LÚCIA LIMA
Comarca
:
TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
VERA LÚCIA LIMA
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