TRF3 0000024-63.2015.4.03.6117 00000246320154036117
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. OPERAÇÃO "PAIVA
LUZ". ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. ART. 2º, CAPUT E §§ 2º E
4º, V, DA LEI Nº 12.850/13. PRESENÇA DO RÉU EM AUDIÊNCIAS
DE INSTRUÇÃO. COMPETÊNCIA. JUÍZO APARENTE. INTERCEPTAÇÃO
TELEFÔNICA E TELEMÁTICA. PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIAS
AGRAVANTES. DOSIMETRIA. MAUS ANTECEDENTES. TRANSNACIONALIDADE. BIS IN IDEM.
1. Constitui direito do acusado a faculdade de estar presente em audiências
de instrução realizadas para a oitiva de testemunhas ou corréus, consoante
o princípio constitucional da ampla defesa (art. 5º, LV) e as previsões do
art. 14, n. 3, d, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos
(Decreto nº 592/92) e do art. 8º, § 2º, d e f, da Convenção Americana
de Direitos Humanos (Decreto nº 678/92).
2. A necessidade de assegurar-se a higidez de bens jurídicos e princípios
constitucionais, como a segurança pública, a incolumidade física do
indivíduo (dignidade da pessoa humana) e a celeridade processual (razoável
duração do processo), justificam restrição ao direito de presença do
réu em audiências de instrução.
3. A justificada restrição ao direito de presença do réu em audiências
de instrução não atinge a garantia irrevocável conferida ao réu de que
sua defesa técnica seja previamente notificada da realização dos atos
processuais.
4. A eventual infração ao direito de presença do réu em audiências
de instrução acarreta nulidade de natureza relativa, cabendo à parte
interessada a demonstração do efetivo prejuízo sofrido (arts. 156 e 563,
CPP). Precedentes.
5. Inexiste previsão legal que determine intimação de advogados de defesa
ou de coacusados para que participem em audiências de instrução realizadas
em processos desmembrados. A separação do processo originário em diversos
outros processos leva à fragmentação do polo passivo então existente,
remanescendo como vínculo processual entre os coacusados somente a conexão
pelos crimes denunciados (art. 76, CPP).
6. Cabe à polícia judiciária dirigir representação por medida cautelar
preventiva de interceptação telemática e telefônica ao juízo aparentemente
competente, segundo as regras ordinárias de competência (ratione loci e
ratione materiae), sem que o posterior reconhecimento de incompetência pelo
juízo acarrete nulidade da decisão de deferimento da medida.
7. Ainda que genérica, basta que a decisão de deferimento de interceptação
telefônica e/ou telemática esteja suficientemente fundamentada para que
seja válida. Medida cautelar invasiva que se mostrava necessária e adequada
para dar continuidade às investigações e minimizar as chances de serem
frustradas.
8. Não há óbice na reiteração dos fundamentos da decisão originária de
autorização de interceptação telefônica e/ou telemática (motivação
per relationem), se o contexto fático que evidenciava a necessidade e
adequação da medida manteve-se inalterado no decorrer da investigação.
9. A norma prevista no art. 41 do CPP, que exige que a denúncia descreva todas
as circunstâncias do fato criminoso imputado, é mitigada pelo preceito do
art. 385 do CPP, que prevê exceção quanto às circunstâncias agravantes.
10. Materialidade, autoria e dolo, referentes a crime de constituir, promover
e integrar organização criminosa, comprovados. Farto acervo probatório
apresentado pela acusação que revela que o réu mantinha posição de
comando em uma associação de mais de 4 (quatro) pessoas, estruturalmente
ordenada por divisão informal de tarefas, que tinha por objetivo de obter,
direta e indiretamente, vantagem econômica, mediante a prática de crimes
de tráfico de drogas e, em menor proporção, de armas de fogo, de caráter
nacional e transnacional.
11. Condenação anterior transitada em julgado, alcançada pelo prazo de 5
(cinco) anos referido no artigo 64, I, do CP e que já não gera efeitos
negativos da reincidência, não enseja o agravamento da pena-base, de
acordo com a vedação de pena de caráter perpétuo (artigo 5º, XLVII,
"b", da CF) e com os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade,
da proporcionalidade e da razoabilidade.
12. O aspecto negativo da personalidade do agente que guarde nexo causal
com o fato criminoso permite a exasperação da pena-base. Caso em que a
agressividade revelada pelo réu é por ele utilizada para intimidar e coagir
outros integrantes da organização criminosa a agirem conforme sua vontade,
fator que influenciava o modo por qual a organização criminosa operava-se.
13. Os elementos objetivos de transnacionalidade previstos no art. 1º,
§ 1º, e no art. 2º, § 4º, V, da Lei nº 12.850/13 não se confundem,
porquanto o primeiro refere-se às infrações penais cometidas por
uma organização criminosa enquanto o segundo à própria estrutura da
organização. Inocorrência de bis in idem.
14. Apelação de defesa não provida. Apelação ministerial parcialmente
provida.
Ementa
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. OPERAÇÃO "PAIVA
LUZ". ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. ART. 2º, CAPUT E §§ 2º E
4º, V, DA LEI Nº 12.850/13. PRESENÇA DO RÉU EM AUDIÊNCIAS
DE INSTRUÇÃO. COMPETÊNCIA. JUÍZO APARENTE. INTERCEPTAÇÃO
TELEFÔNICA E TELEMÁTICA. PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIAS
AGRAVANTES. DOSIMETRIA. MAUS ANTECEDENTES. TRANSNACIONALIDADE. BIS IN IDEM.
1. Constitui direito do acusado a faculdade de estar presente em audiências
de instrução realizadas para a oitiva de testemunhas ou corréus, consoante
o princípio constitucional da ampla defesa (art. 5º, LV) e as previsões do
art. 14, n. 3, d, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos
(Decreto nº 592/92) e do art. 8º, § 2º, d e f, da Convenção Americana
de Direitos Humanos (Decreto nº 678/92).
2. A necessidade de assegurar-se a higidez de bens jurídicos e princípios
constitucionais, como a segurança pública, a incolumidade física do
indivíduo (dignidade da pessoa humana) e a celeridade processual (razoável
duração do processo), justificam restrição ao direito de presença do
réu em audiências de instrução.
3. A justificada restrição ao direito de presença do réu em audiências
de instrução não atinge a garantia irrevocável conferida ao réu de que
sua defesa técnica seja previamente notificada da realização dos atos
processuais.
4. A eventual infração ao direito de presença do réu em audiências
de instrução acarreta nulidade de natureza relativa, cabendo à parte
interessada a demonstração do efetivo prejuízo sofrido (arts. 156 e 563,
CPP). Precedentes.
5. Inexiste previsão legal que determine intimação de advogados de defesa
ou de coacusados para que participem em audiências de instrução realizadas
em processos desmembrados. A separação do processo originário em diversos
outros processos leva à fragmentação do polo passivo então existente,
remanescendo como vínculo processual entre os coacusados somente a conexão
pelos crimes denunciados (art. 76, CPP).
6. Cabe à polícia judiciária dirigir representação por medida cautelar
preventiva de interceptação telemática e telefônica ao juízo aparentemente
competente, segundo as regras ordinárias de competência (ratione loci e
ratione materiae), sem que o posterior reconhecimento de incompetência pelo
juízo acarrete nulidade da decisão de deferimento da medida.
7. Ainda que genérica, basta que a decisão de deferimento de interceptação
telefônica e/ou telemática esteja suficientemente fundamentada para que
seja válida. Medida cautelar invasiva que se mostrava necessária e adequada
para dar continuidade às investigações e minimizar as chances de serem
frustradas.
8. Não há óbice na reiteração dos fundamentos da decisão originária de
autorização de interceptação telefônica e/ou telemática (motivação
per relationem), se o contexto fático que evidenciava a necessidade e
adequação da medida manteve-se inalterado no decorrer da investigação.
9. A norma prevista no art. 41 do CPP, que exige que a denúncia descreva todas
as circunstâncias do fato criminoso imputado, é mitigada pelo preceito do
art. 385 do CPP, que prevê exceção quanto às circunstâncias agravantes.
10. Materialidade, autoria e dolo, referentes a crime de constituir, promover
e integrar organização criminosa, comprovados. Farto acervo probatório
apresentado pela acusação que revela que o réu mantinha posição de
comando em uma associação de mais de 4 (quatro) pessoas, estruturalmente
ordenada por divisão informal de tarefas, que tinha por objetivo de obter,
direta e indiretamente, vantagem econômica, mediante a prática de crimes
de tráfico de drogas e, em menor proporção, de armas de fogo, de caráter
nacional e transnacional.
11. Condenação anterior transitada em julgado, alcançada pelo prazo de 5
(cinco) anos referido no artigo 64, I, do CP e que já não gera efeitos
negativos da reincidência, não enseja o agravamento da pena-base, de
acordo com a vedação de pena de caráter perpétuo (artigo 5º, XLVII,
"b", da CF) e com os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade,
da proporcionalidade e da razoabilidade.
12. O aspecto negativo da personalidade do agente que guarde nexo causal
com o fato criminoso permite a exasperação da pena-base. Caso em que a
agressividade revelada pelo réu é por ele utilizada para intimidar e coagir
outros integrantes da organização criminosa a agirem conforme sua vontade,
fator que influenciava o modo por qual a organização criminosa operava-se.
13. Os elementos objetivos de transnacionalidade previstos no art. 1º,
§ 1º, e no art. 2º, § 4º, V, da Lei nº 12.850/13 não se confundem,
porquanto o primeiro refere-se às infrações penais cometidas por
uma organização criminosa enquanto o segundo à própria estrutura da
organização. Inocorrência de bis in idem.
14. Apelação de defesa não provida. Apelação ministerial parcialmente
provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, negar provimento ao recurso de apelação interposto pela
defesa de Gilmar Flores e dar parcial provimento ao recurso interposto pelo
Ministério Público Federal, para majorar a pena-base aplicada e reconhecer
a circunstância agravante de reincidência e a causa de aumento de pena
prevista no art. 2º, § 4º, V, da Lei nº 12.850/2013, fixando a pena
definitiva do réu em 13 (treze) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em
regime inicial fechado, e 266 (duzentos e sessenta e seis) dias-multa, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Data do Julgamento
:
25/06/2018
Data da Publicação
:
06/07/2018
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 66449
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL MAURICIO KATO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED LEI-12850 ANO-2013 ART-2 PAR-2 PAR-4 INC-5
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-55 INC-47 LET-B
LEG-FED DEC-592 ANO-1992 ART-14
LEG-FED DEC-678 ANO-1992 ART-8 PAR-2 LET-D LET-F
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-156 ART-563 ART-76 ART-41 ART-385
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-64 INC-1
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/07/2018
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