TRF3 0000064-56.2016.4.03.6005 00000645620164036005
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE
DROGAS. TRANSNACIONALIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO
DEMONSTRADOS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. QUANTIDADE E NATUREZA DA
DROGA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. INCIDÊNCIA DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO
DE PENA DO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI 11.343/2006. CAUSA DE AUMENTO
DECORRENTE DA TRANSNACIONALIDADE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. NÃO INCIDÊNCIA
DA CAUSA DE AUMENTO PREVISTA NO ARTIGO 40, III, DA LEI DE DROGAS. REGIME
SEMIABERTO. APELAÇÃO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDA.
1. A materialidade, autoria e dolo do crime restaram comprovados nos autos.
2. Dosimetria. Primeira fase. A finalidade lucrativa é absolutamente
comum (conquanto não necessariamente inerente) ao crime de tráfico de
entorpecentes, mormente na condição de transportador eventual contratado
("mula"), em que a pessoa aceita executar a prática delitiva exatamente
motivada pelo pagamento ou por condições concretas. Em verdade, no caso
de mulas o crime se dá por motivação econômica na quase totalidade dos
casos. Desse modo, os motivos não fogem ao padrão para a prática delitiva
em exame, e não devem exasperar a pena concreta, já tendo sido levados
em consideração na própria fixação abstrata do preceito secundário do
tipo constante do art. 33, caput, da Lei 11.343/06.
3. Trata-se de apelante primária, que não ostenta maus antecedentes, bem
como as demais circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não
lhe são desfavoráveis. Considerando que restou afastada a circunstância
desfavorável da ganância e sopesando a natureza e quantidade da droga
apreendida, 2,9 kg (dois quilos e novecentos gramas) de cocaína e 3,9 kg
(três quilos e novecentos gramas) de maconha, com fundamento no art. 42
da Lei n.º 11.343/06, a pena-base merece exasperação em 1/5, consoante
entendimento desta 11ª Turma, pelo que, de ofício, fixo a pena nesta fase
em 06 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa.
4. Segunda fase da dosimetria. A defesa da ré apela, pleiteando o
reconhecimento da atenuante prevista no artigo 65, I, do CP e aplicação
da atenuante da confissão espontânea. A ré nasceu em 17/09/1993 e na data
dos fatos (13/01/2016) contava com mais de 21 anos, bem como, evidentemente,
na data da sentença era menor de 70 anos. Desta forma, a referida atenuante
não se aplica à ré.
5. A defesa da ré pede a aplicação da atenuante da confissão espontânea,
ocorre que o magistrado de primeiro grau fez incidir a referida atenuante. Em
razão disso, não há qualquer razão ao pleito da defesa da ré.
6. Mantida a incidência da atenuante da confissão espontânea, a pena deve
ser reduzida em 1/6 a partir daquela fixada na primeira fase, pelo que resta
estabelecida em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.
7. Terceira fase da dosimetria. Mantida a majoração da pena em decorrência
da causa de aumento prevista no art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06
(transnacionalidade do delito), no percentual mínimo de 1/6 (um sexto).
8. Em situações nas quais o transporte do entorpecente ocorre de forma
dissimulada, sem que exista a oferta do produto ilegal a outros passageiros,
ou seja, quando não há o fornecimento do entorpecente aos usuários do
transporte coletivo, não deve ser reconhecida a causa de aumento prevista
no inciso III do art. 40 da Lei 11.343/06. Afastada, portanto, de ofício.
9. Aplicada a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei
n.º 11.343/06, pois se trata de apelante primária, que não ostenta
maus antecedentes. Não há prova nos autos de que se dedica a atividades
criminosas, nem elementos para concluir que integra organização criminosa,
apesar de encarregada do transporte da droga. Certamente, estava a serviço
de bando criminoso internacional, o que não significa, porém, que fosse
integrante dele. Portanto, faz jus à aplicação da referida causa de
diminuição, entretanto, no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), pois se
associou, de maneira eventual e esporádica, a uma organização criminosa
de tráfico internacional de drogas.
10. Pena definitivamente fixada em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10
(dez) dias de reclusão e pagamento de 485 (quatrocentos e oitenta e cinco)
dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo,
vigente na data dos fatos.
11. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus
n.º 111840, em 27 de junho de 2012, deferiu, por maioria, a ordem e declarou
incidenter tantum a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei nº
8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/2007, motivo pelo qual o
regime inicial de cumprimento de pena deve ser fixado nos termos do art. 33,
§ 2º, "b", e § 3º do Código Penal.
12. Trata-se de ré primária, que não ostenta maus antecedentes. A pena-base
foi fixada no mínimo legal e a pena definitiva em 4 (quatro) anos, 10 (dez)
meses e 10 (dez) dias de reclusão, o que indica seja fixado, de ofício,
o regime inicial semiaberto, com fundamento no art. 33, § 2º, b, do Código
Penal.
13. Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos, tendo em vista que a pena definitiva aplicada supera
quatro anos de reclusão, não se encontrando preenchidos os requisitos do
art. 44 do Código Penal.
14. O requerimento de execução provisória da pena cominada ao réu,
formulado pela Procuradoria Regional da República em seu parecer, merece ser
acolhido. Aplicação do entendimento firmado no Supremo Tribunal Federal,
que no julgamento do HC 126.292 -SP reinterpretou o princípio da presunção
de inocência, reconhecendo que "A execução provisória de acórdão penal
condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso
especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional
da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da
Constituição Federal", e em sessão de 05 de outubro de 2016 indeferiu
liminares pleiteadas nas Ações Declaratórias de Constitucionalidade 43
e 44, entendendo que o art. 283 do Código de Processo Penal não veda o
início do cumprimento da pena após esgotadas as instâncias ordinárias.
15. Apelação da defesa parcialmente provida. De ofício, afastada a a
circunstância desfavorável da ganância, a causa de aumento prevista no
inciso III do art. 40 da Lei 11.343/06 e fixado o regime prisional semiaberto.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE
DROGAS. TRANSNACIONALIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO
DEMONSTRADOS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. QUANTIDADE E NATUREZA DA
DROGA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. INCIDÊNCIA DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO
DE PENA DO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI 11.343/2006. CAUSA DE AUMENTO
DECORRENTE DA TRANSNACIONALIDADE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. NÃO INCIDÊNCIA
DA CAUSA DE AUMENTO PREVISTA NO ARTIGO 40, III, DA LEI DE DROGAS. REGIME
SEMIABERTO. APELAÇÃO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDA.
1. A materialidade, autoria e dolo do crime restaram comprovados nos autos.
2. Dosimetria. Primeira fase. A finalidade lucrativa é absolutamente
comum (conquanto não necessariamente inerente) ao crime de tráfico de
entorpecentes, mormente na condição de transportador eventual contratado
("mula"), em que a pessoa aceita executar a prática delitiva exatamente
motivada pelo pagamento ou por condições concretas. Em verdade, no caso
de mulas o crime se dá por motivação econômica na quase totalidade dos
casos. Desse modo, os motivos não fogem ao padrão para a prática delitiva
em exame, e não devem exasperar a pena concreta, já tendo sido levados
em consideração na própria fixação abstrata do preceito secundário do
tipo constante do art. 33, caput, da Lei 11.343/06.
3. Trata-se de apelante primária, que não ostenta maus antecedentes, bem
como as demais circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal não
lhe são desfavoráveis. Considerando que restou afastada a circunstância
desfavorável da ganância e sopesando a natureza e quantidade da droga
apreendida, 2,9 kg (dois quilos e novecentos gramas) de cocaína e 3,9 kg
(três quilos e novecentos gramas) de maconha, com fundamento no art. 42
da Lei n.º 11.343/06, a pena-base merece exasperação em 1/5, consoante
entendimento desta 11ª Turma, pelo que, de ofício, fixo a pena nesta fase
em 06 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa.
4. Segunda fase da dosimetria. A defesa da ré apela, pleiteando o
reconhecimento da atenuante prevista no artigo 65, I, do CP e aplicação
da atenuante da confissão espontânea. A ré nasceu em 17/09/1993 e na data
dos fatos (13/01/2016) contava com mais de 21 anos, bem como, evidentemente,
na data da sentença era menor de 70 anos. Desta forma, a referida atenuante
não se aplica à ré.
5. A defesa da ré pede a aplicação da atenuante da confissão espontânea,
ocorre que o magistrado de primeiro grau fez incidir a referida atenuante. Em
razão disso, não há qualquer razão ao pleito da defesa da ré.
6. Mantida a incidência da atenuante da confissão espontânea, a pena deve
ser reduzida em 1/6 a partir daquela fixada na primeira fase, pelo que resta
estabelecida em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.
7. Terceira fase da dosimetria. Mantida a majoração da pena em decorrência
da causa de aumento prevista no art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06
(transnacionalidade do delito), no percentual mínimo de 1/6 (um sexto).
8. Em situações nas quais o transporte do entorpecente ocorre de forma
dissimulada, sem que exista a oferta do produto ilegal a outros passageiros,
ou seja, quando não há o fornecimento do entorpecente aos usuários do
transporte coletivo, não deve ser reconhecida a causa de aumento prevista
no inciso III do art. 40 da Lei 11.343/06. Afastada, portanto, de ofício.
9. Aplicada a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei
n.º 11.343/06, pois se trata de apelante primária, que não ostenta
maus antecedentes. Não há prova nos autos de que se dedica a atividades
criminosas, nem elementos para concluir que integra organização criminosa,
apesar de encarregada do transporte da droga. Certamente, estava a serviço
de bando criminoso internacional, o que não significa, porém, que fosse
integrante dele. Portanto, faz jus à aplicação da referida causa de
diminuição, entretanto, no percentual mínimo de 1/6 (um sexto), pois se
associou, de maneira eventual e esporádica, a uma organização criminosa
de tráfico internacional de drogas.
10. Pena definitivamente fixada em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10
(dez) dias de reclusão e pagamento de 485 (quatrocentos e oitenta e cinco)
dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo,
vigente na data dos fatos.
11. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus
n.º 111840, em 27 de junho de 2012, deferiu, por maioria, a ordem e declarou
incidenter tantum a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei nº
8.072/90, com a redação dada pela Lei nº 11.464/2007, motivo pelo qual o
regime inicial de cumprimento de pena deve ser fixado nos termos do art. 33,
§ 2º, "b", e § 3º do Código Penal.
12. Trata-se de ré primária, que não ostenta maus antecedentes. A pena-base
foi fixada no mínimo legal e a pena definitiva em 4 (quatro) anos, 10 (dez)
meses e 10 (dez) dias de reclusão, o que indica seja fixado, de ofício,
o regime inicial semiaberto, com fundamento no art. 33, § 2º, b, do Código
Penal.
13. Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos, tendo em vista que a pena definitiva aplicada supera
quatro anos de reclusão, não se encontrando preenchidos os requisitos do
art. 44 do Código Penal.
14. O requerimento de execução provisória da pena cominada ao réu,
formulado pela Procuradoria Regional da República em seu parecer, merece ser
acolhido. Aplicação do entendimento firmado no Supremo Tribunal Federal,
que no julgamento do HC 126.292 -SP reinterpretou o princípio da presunção
de inocência, reconhecendo que "A execução provisória de acórdão penal
condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso
especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional
da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da
Constituição Federal", e em sessão de 05 de outubro de 2016 indeferiu
liminares pleiteadas nas Ações Declaratórias de Constitucionalidade 43
e 44, entendendo que o art. 283 do Código de Processo Penal não veda o
início do cumprimento da pena após esgotadas as instâncias ordinárias.
15. Apelação da defesa parcialmente provida. De ofício, afastada a a
circunstância desfavorável da ganância, a causa de aumento prevista no
inciso III do art. 40 da Lei 11.343/06 e fixado o regime prisional semiaberto.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da
3ª Região, por unanimidade, de ofício, afastar a valoração negativa
da ganância como circunstância na primeira fase da dosimetria da pena,
a causa de aumento prevista no artigo 40, III, da Lei 11.343/06 e fixar o
regime inicial semiaberto, bem como dar parcial provimento à apelação da
defesa, para fazer incidir a causa de diminuição de pena prevista no § 4º
do artigo 33 da Lei 11.342/2006, em 1/6, fixando a pena de MAYARA FLORENCIO
ANGELI em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão, no
regime prisional semiaberto e a condeno no pagamento de 485 (quatrocentos
e oitenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo)
do salário mínimo, vigente na data dos fatos e determinar a expedição de
Guia de Execução Provisória, bem como a comunicação do Juízo de Origem
para início da execução da pena imposta à ré, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
13/12/2016
Data da Publicação
:
09/01/2017
Classe/Assunto
:
ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 68946
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** LDR-06 LEI DE DROGAS
LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-33 PAR-4 ART-40 INC-3 ART-42
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-59 ART-65 INC-1
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/01/2017
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