TRF3 0000180-44.2007.4.03.6113 00001804420074036113
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSS. EXTRAVIO
DE DOCUMENTAÇÃO. DANO MATERIAL NÃO VERIFICADO. DANO MORAL IN RE
IPSA. DIMINUIÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. APELAÇÃO DO AUTOR
DESPROVIDA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA EM PARTE.
1. A questão posta nos autos diz respeito a pedido de indenização por
danos materiais e morais, em razão de extravio de documentos, em especial
de CTPS, por parte do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
2. O mérito da discussão recai sobre o tema da responsabilidade civil do
Estado, de modo que se fazem pertinentes algumas considerações doutrinárias
e jurisprudenciais. São elementos da responsabilidade civil a ação ou
omissão do agente, a culpa, o nexo causal e o dano, do qual surge o dever
de indenizar.
3. No direito brasileiro, a responsabilidade civil do Estado é, em regra,
objetiva, isto é, prescinde da comprovação de culpa do agente, bastando-se
que se comprove o nexo causal entre a conduta do agente e o dano. Está
consagrada na norma do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal.
4. No caso dos autos, a perda da documentação do segurado por parte do
INSS é fato incontroverso (fls. 16/20) e apto a ensejar a aplicação do
instituto da responsabilidade civil objetiva, cabendo discussão somente no
tocante à analise dos danos.
5. O demandante argumenta que a privação de sua CTPS o impediu de encontrar
trabalho, tendo exercido ao longo desse período o ofício de servente de
pedreiro, uma vez que outros empregos exigiam comprovação de experiências
profissionais anteriores. Ainda que sejam plausíveis as alegações do
autor, este não conseguiu demonstrar nos autos as oportunidades de emprego
perdidas, não sendo razoável presumi-las tendo em vista que, diferentemente
do que ocorre em algumas situações peculiares envolvendo dano moral,
o dano material deve ser sempre cabalmente comprovado.
6. Já acerca do dano moral, a doutrina o conceitua enquanto "dor, vexame,
sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente
no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições,
angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento,
mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano
moral , porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia,
no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais
situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio
psicológico do indivíduo. (Cavalieri, Sérgio. Responsabilidade Civil. São
Paulo: Saraiva, 2002, p. 549)".
7. É nítido não ser o caso de mero aborrecimento, tanto que a posse dos
próprios documentos de identificação pessoal é bem jurídico tutelado
pela Lei 5.553/68.
8. A CTPS é o documento de registro de todas as atividades do cidadão
enquanto trabalhador, garantindo-lhe os principais direitos trabalhistas
como o seguro desemprego, o FGTS e os benefícios da Previdência Social,
e constituindo peça obrigatória a toda pessoa que preste serviço de
maneira regularizada.
9. Destaca-se que, ao contrário do que ocorre com o extravio de documentos
meramente indentificatórios, quando a simples expedição de uma segunda
via substitui plenamente o original perdido, a carteira de trabalho possui
um conteúdo muitas vezes irrecuperável, cuja perda põe em risco a garantia
dos direitos trabalhistas mencionados.
10. A hipótese em comento, portanto, encerra um típico caso de dano moral
in re ipsa, no qual a mera comprovação fática do acontecimento gera um
constrangimento presumido capaz de ensejar indenização.
11. Quanto à fixação da indenização por danos morais, é sabido que seu
arbitramento deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade,
observando ainda a condição social e viabilidade econômica do ofensor
e do ofendido, e a proporcionalidade à ofensa, conforme o grau de culpa e
gravidade do dano, sem, contudo, incorrer em enriquecimento ilícito.
12. No caso em tela, segundo consta à fl. 17, o demandante se viu privado
de sua CTPS por aproximadamente 24 meses (de 29.06.2004 até 26.07.2006),
sendo que ao final do procedimento administrativo obteve a concessão de
aposentadoria no valor mensal de R$ 797,47 (benefício nº 133.969.292-6).
13. Entende-se, contudo, demasiada a indenização por danos morais
estabelecida pelo Juiz de piso em R$ 38.236,56. Reputa-se mais adequada a
fixação no importe de R$ 19.139,28, qual seja, o valor de uma parcela da
aposentadoria por mês de retenção indevida da documentação, incidindo
correção monetária a partir desta decisão (Súmula 362 do STJ), e juros
de mora a partir do evento danoso (Súmula 54 do STJ).
14. Em relação à verba honorária, não obstante a vigência do atual
CPC, entende-se que a sentença foi proferida sob a égide do antigo CPC,
de modo que é de ser reconhecida a ocorrência de sucumbência recíproca,
compensando-se os valores, nos termos do art. 21 do referido diploma legal.
15. Apelação do Autor desprovida.
16. Apelação do INSS provida em parte.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSS. EXTRAVIO
DE DOCUMENTAÇÃO. DANO MATERIAL NÃO VERIFICADO. DANO MORAL IN RE
IPSA. DIMINUIÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. APELAÇÃO DO AUTOR
DESPROVIDA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA EM PARTE.
1. A questão posta nos autos diz respeito a pedido de indenização por
danos materiais e morais, em razão de extravio de documentos, em especial
de CTPS, por parte do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
2. O mérito da discussão recai sobre o tema da responsabilidade civil do
Estado, de modo que se fazem pertinentes algumas considerações doutrinárias
e jurisprudenciais. São elementos da responsabilidade civil a ação ou
omissão do agente, a culpa, o nexo causal e o dano, do qual surge o dever
de indenizar.
3. No direito brasileiro, a responsabilidade civil do Estado é, em regra,
objetiva, isto é, prescinde da comprovação de culpa do agente, bastando-se
que se comprove o nexo causal entre a conduta do agente e o dano. Está
consagrada na norma do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal.
4. No caso dos autos, a perda da documentação do segurado por parte do
INSS é fato incontroverso (fls. 16/20) e apto a ensejar a aplicação do
instituto da responsabilidade civil objetiva, cabendo discussão somente no
tocante à analise dos danos.
5. O demandante argumenta que a privação de sua CTPS o impediu de encontrar
trabalho, tendo exercido ao longo desse período o ofício de servente de
pedreiro, uma vez que outros empregos exigiam comprovação de experiências
profissionais anteriores. Ainda que sejam plausíveis as alegações do
autor, este não conseguiu demonstrar nos autos as oportunidades de emprego
perdidas, não sendo razoável presumi-las tendo em vista que, diferentemente
do que ocorre em algumas situações peculiares envolvendo dano moral,
o dano material deve ser sempre cabalmente comprovado.
6. Já acerca do dano moral, a doutrina o conceitua enquanto "dor, vexame,
sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente
no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições,
angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento,
mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano
moral , porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia,
no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais
situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio
psicológico do indivíduo. (Cavalieri, Sérgio. Responsabilidade Civil. São
Paulo: Saraiva, 2002, p. 549)".
7. É nítido não ser o caso de mero aborrecimento, tanto que a posse dos
próprios documentos de identificação pessoal é bem jurídico tutelado
pela Lei 5.553/68.
8. A CTPS é o documento de registro de todas as atividades do cidadão
enquanto trabalhador, garantindo-lhe os principais direitos trabalhistas
como o seguro desemprego, o FGTS e os benefícios da Previdência Social,
e constituindo peça obrigatória a toda pessoa que preste serviço de
maneira regularizada.
9. Destaca-se que, ao contrário do que ocorre com o extravio de documentos
meramente indentificatórios, quando a simples expedição de uma segunda
via substitui plenamente o original perdido, a carteira de trabalho possui
um conteúdo muitas vezes irrecuperável, cuja perda põe em risco a garantia
dos direitos trabalhistas mencionados.
10. A hipótese em comento, portanto, encerra um típico caso de dano moral
in re ipsa, no qual a mera comprovação fática do acontecimento gera um
constrangimento presumido capaz de ensejar indenização.
11. Quanto à fixação da indenização por danos morais, é sabido que seu
arbitramento deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade,
observando ainda a condição social e viabilidade econômica do ofensor
e do ofendido, e a proporcionalidade à ofensa, conforme o grau de culpa e
gravidade do dano, sem, contudo, incorrer em enriquecimento ilícito.
12. No caso em tela, segundo consta à fl. 17, o demandante se viu privado
de sua CTPS por aproximadamente 24 meses (de 29.06.2004 até 26.07.2006),
sendo que ao final do procedimento administrativo obteve a concessão de
aposentadoria no valor mensal de R$ 797,47 (benefício nº 133.969.292-6).
13. Entende-se, contudo, demasiada a indenização por danos morais
estabelecida pelo Juiz de piso em R$ 38.236,56. Reputa-se mais adequada a
fixação no importe de R$ 19.139,28, qual seja, o valor de uma parcela da
aposentadoria por mês de retenção indevida da documentação, incidindo
correção monetária a partir desta decisão (Súmula 362 do STJ), e juros
de mora a partir do evento danoso (Súmula 54 do STJ).
14. Em relação à verba honorária, não obstante a vigência do atual
CPC, entende-se que a sentença foi proferida sob a égide do antigo CPC,
de modo que é de ser reconhecida a ocorrência de sucumbência recíproca,
compensando-se os valores, nos termos do art. 21 do referido diploma legal.
15. Apelação do Autor desprovida.
16. Apelação do INSS provida em parte.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora e dar parcial
provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
05/09/2018
Data da Publicação
:
12/09/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1338821
Órgão Julgador
:
TERCEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/09/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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