TRF3 0000188-41.2018.4.03.0000 00001884120184030000
REVISÃO CRIMINAL. PROTEÇÃO À COISA JULGADA E HIPÓTESES DE CABIMENTO. CASO
CONCRETO. PLEITO PARA QUE SEJA RECONHECIDA OFENSA AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL
DA INDIVIDUALIZAÇÃO DAS PENAS QUANDO DA DOSIMETRIA PENAL RELATIVA AO
CRIME DE CORRUPÇÃO DE MENORES. PLEITO PARA QUE SEJA RECONHECIDA OFENSA AO
ENTENDIMENTO PLASMADO NA SÚM. 444/STJ. PROCEDÊNCIA DAS PRETENSÕES. NOVA
DOSIMETRIA PENAL.
- O Ordenamento Constitucional de 1988 elencou a coisa julgada como direito
fundamental do cidadão (art. 5º, XXXVI), conferindo indispensável
proteção ao valor segurança jurídica com o escopo de que as relações
sociais fossem pacificadas após a exaração de provimento judicial dotado
de imutabilidade. Sobrevindo a impossibilidade de apresentação de recurso
em face de uma decisão judicial, há que ser reconhecida a imutabilidade
do provimento tendo como base a formação tanto de coisa julgada formal
(esgotamento da instância) como de coisa julgada material (predicado que
torna imutável o que restou decidido pelo Poder Judiciário, prestigiando,
assim, a justiça e a ordem social).
- Situações excepcionais, fundadas na ponderação de interesses de
assento constitucional, permitem o afastamento de tal característica da
imutabilidade das decisões exaradas pelo Poder Judiciário a fim de que
prevaleça outro interesse (também tutelado constitucionalmente), sendo
justamente neste panorama que nosso sistema jurídico prevê a existência de
Ação Rescisória (a permitir o afastamento da coisa julgada no âmbito do
Processo Civil) e de Revisão Criminal (a possibilitar referido afastamento
na senda do Processo Penal).
- No âmbito do Processo Penal, para que seja possível a reconsideração
do que restou decidido sob o manto da coisa julgada, deve ocorrer no caso
concreto uma das situações previstas para tanto no ordenamento jurídico
como hipótese de cabimento da Revisão Criminal nos termos do art. 621
do Código de Processo Penal. Assim, permite-se o ajuizamento de Revisão
Criminal fundada em argumentação no sentido de que (a) a sentença proferida
encontra-se contrária a texto expresso de lei ou a evidência dos autos;
(b) a sentença exarada fundou-se em prova comprovadamente falsa; e (c) houve
o surgimento de prova nova, posterior à sentença, de que o condenado seria
inocente ou de circunstância que permitiria a diminuição da reprimenda
então imposta.
- A Revisão Criminal não se mostra como via adequada para que haja um
rejulgamento do conjunto fático-probatório constante da relação processual
originária, razão pela qual impertinente a formulação de argumentação que
já foi apreciada e rechaçada pelo juízo condenatório. Sequer a existência
de interpretação controvertida permite a propositura do expediente em
tela, pois tal situação (controvérsia de tema na jurisprudência) não
se enquadra na ideia necessária para que o instrumento tenha fundamento de
validade no inciso I do art. 621 do Código de Processo Penal.
- Somente se mostra possível o manejo de Revisão Criminal com o objetivo
de se alterar a reprimenda quando constatada prima facie a ocorrência de
flagrante ilegalidade ou de manifesto abuso de poder no proceder por meio do
qual levou-se em consideração para sua fixação. Precedentes do C. Superior
Tribunal de Justiça.
- Postula o revisionando o reconhecimento de ofensa ao princípio
constitucional da individualização das penas quando da dosimetria penal
relativa ao crime de corrupção de menores tendo em vista que não teria
havido o cumprimento dos ditames insculpidos no art. 68 do Código Penal,
levando-se em consideração, ainda, o comando previsto no art. 119 do mesmo
diploma segundo o qual o cálculo do lapso prescricional deve ser obtido
com base em cada uma das infrações imputadas ao agente de forma isolada -
desta feita, como o édito penal condenatório transitado em julgado se omitiu
em calcular de forma explícita e apartada a pena que deveria ser imposta
ao revisionando em decorrência da perpetração do crime de corrupção de
menores, sequer mostrar-se-ia possível inferir qual seria o interregno em
que ocorreria a extinção de sua punibilidade pelo advento da prescrição,
tornando, assim, a hipótese retratada na Ação Penal subjacente um indevido
e inconstitucional caso de imprescritibilidade.
- Analisando os termos em que versada a dosimetria penal imposta
ao revisionando, denota-se que, de fato, houve ofensa ao princípio
da individualização das penas na justa medida em que deveria ter sido
elaborada duas dosimetrias penais no âmbito da Ação Penal subjacente tendo
em vista que o revisionando foi condenado pela perpetração dos crimes de
moeda falsa e de corrupção de menores. Tal proceder não se mostra como
uma mera formalidade (despida de maiores relevâncias práticas) que deveria
ter sido cumprida, ainda que ulteriormente assentada a prática do concurso
formal de delitos (a prevalecer a "pena mais grave" sobre a qual incidiria
a fração majorante), na justa medida em que tem importância jurídica a
fixação de reprimendas apartadas para cada uma das infrações executadas
com o escopo de se constatar o lapso prescricional que tem o condão de
extinguir a punibilidade do agente (art. 119 do Código Penal).
- Almeja, também, o revisionando o reconhecimento de que o entendimento
contido na Súm. 444/STJ (É vedada a utilização de inquéritos policiais e
ações penais em curso para agravar a pena-base), firmado nos idos de 28 de
abril de 2010, restou vilipendiado pelo édito penal condenatório na justa
medida em que foram considerados, quando da fixação da sua reprimenda
(especificamente no que tange ao cometimento do crime de moeda falsa),
como maus antecedentes (a repercutir também nas rubricas "personalidade"
e "conduta social"), inquéritos e ações penais em curso (ou seja, sem a
pecha de definitividade decorrente da sobrevinda do trânsito em julgado).
- O magistrado sentenciante entendeu por bem, a despeito de serem neutras
as circunstâncias judiciais da culpabilidade, dos motivos do crime,
das circunstâncias e das consequências da infração, recrudescer a
pena-base então em cálculo em razão de que o revisionando possuiria maus
antecedentes criminais, o que denotaria, por tabela, uma conduta social
desfavorável e uma personalidade voltada para a criminalidade. Ocorre,
entretanto, que o compulsar atento da Folha de Antecedentes que fundamentou
tal conclusão não tinha o condão de permitir a majoração da pena-base
então levada a efeito justamente porque esse tal proceder, acaso realizado,
macularia o entendimento que se encontrava cristalizado desde os idos de
2010 no Verbete nº 444 da Súmula do C. Superior Tribunal de Justiça,
uma vez que os apontamentos lá constantes não indicavam a sobrevinda
de trânsito em julgado, mas apenas a existência ou de investigações em
curso, ou de ações penais em tramitação, ou de feitos nos quais extinta a
punibilidade do agente. Desta forma, a majoração de pena imprimida no édito
penal condenatório transitado em julgado mostra-se flagrantemente ilegal.
- Como consequência do acolhimento das pretensões formuladas nesta via
estreita, realizada novas dosimetrias penais em relação aos delitos de
moeda falsa e de corrupção de menores.
- Revisão Criminal julgada procedente.
Ementa
REVISÃO CRIMINAL. PROTEÇÃO À COISA JULGADA E HIPÓTESES DE CABIMENTO. CASO
CONCRETO. PLEITO PARA QUE SEJA RECONHECIDA OFENSA AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL
DA INDIVIDUALIZAÇÃO DAS PENAS QUANDO DA DOSIMETRIA PENAL RELATIVA AO
CRIME DE CORRUPÇÃO DE MENORES. PLEITO PARA QUE SEJA RECONHECIDA OFENSA AO
ENTENDIMENTO PLASMADO NA SÚM. 444/STJ. PROCEDÊNCIA DAS PRETENSÕES. NOVA
DOSIMETRIA PENAL.
- O Ordenamento Constitucional de 1988 elencou a coisa julgada como direito
fundamental do cidadão (art. 5º, XXXVI), conferindo indispensável
proteção ao valor segurança jurídica com o escopo de que as relações
sociais fossem pacificadas após a exaração de provimento judicial dotado
de imutabilidade. Sobrevindo a impossibilidade de apresentação de recurso
em face de uma decisão judicial, há que ser reconhecida a imutabilidade
do provimento tendo como base a formação tanto de coisa julgada formal
(esgotamento da instância) como de coisa julgada material (predicado que
torna imutável o que restou decidido pelo Poder Judiciário, prestigiando,
assim, a justiça e a ordem social).
- Situações excepcionais, fundadas na ponderação de interesses de
assento constitucional, permitem o afastamento de tal característica da
imutabilidade das decisões exaradas pelo Poder Judiciário a fim de que
prevaleça outro interesse (também tutelado constitucionalmente), sendo
justamente neste panorama que nosso sistema jurídico prevê a existência de
Ação Rescisória (a permitir o afastamento da coisa julgada no âmbito do
Processo Civil) e de Revisão Criminal (a possibilitar referido afastamento
na senda do Processo Penal).
- No âmbito do Processo Penal, para que seja possível a reconsideração
do que restou decidido sob o manto da coisa julgada, deve ocorrer no caso
concreto uma das situações previstas para tanto no ordenamento jurídico
como hipótese de cabimento da Revisão Criminal nos termos do art. 621
do Código de Processo Penal. Assim, permite-se o ajuizamento de Revisão
Criminal fundada em argumentação no sentido de que (a) a sentença proferida
encontra-se contrária a texto expresso de lei ou a evidência dos autos;
(b) a sentença exarada fundou-se em prova comprovadamente falsa; e (c) houve
o surgimento de prova nova, posterior à sentença, de que o condenado seria
inocente ou de circunstância que permitiria a diminuição da reprimenda
então imposta.
- A Revisão Criminal não se mostra como via adequada para que haja um
rejulgamento do conjunto fático-probatório constante da relação processual
originária, razão pela qual impertinente a formulação de argumentação que
já foi apreciada e rechaçada pelo juízo condenatório. Sequer a existência
de interpretação controvertida permite a propositura do expediente em
tela, pois tal situação (controvérsia de tema na jurisprudência) não
se enquadra na ideia necessária para que o instrumento tenha fundamento de
validade no inciso I do art. 621 do Código de Processo Penal.
- Somente se mostra possível o manejo de Revisão Criminal com o objetivo
de se alterar a reprimenda quando constatada prima facie a ocorrência de
flagrante ilegalidade ou de manifesto abuso de poder no proceder por meio do
qual levou-se em consideração para sua fixação. Precedentes do C. Superior
Tribunal de Justiça.
- Postula o revisionando o reconhecimento de ofensa ao princípio
constitucional da individualização das penas quando da dosimetria penal
relativa ao crime de corrupção de menores tendo em vista que não teria
havido o cumprimento dos ditames insculpidos no art. 68 do Código Penal,
levando-se em consideração, ainda, o comando previsto no art. 119 do mesmo
diploma segundo o qual o cálculo do lapso prescricional deve ser obtido
com base em cada uma das infrações imputadas ao agente de forma isolada -
desta feita, como o édito penal condenatório transitado em julgado se omitiu
em calcular de forma explícita e apartada a pena que deveria ser imposta
ao revisionando em decorrência da perpetração do crime de corrupção de
menores, sequer mostrar-se-ia possível inferir qual seria o interregno em
que ocorreria a extinção de sua punibilidade pelo advento da prescrição,
tornando, assim, a hipótese retratada na Ação Penal subjacente um indevido
e inconstitucional caso de imprescritibilidade.
- Analisando os termos em que versada a dosimetria penal imposta
ao revisionando, denota-se que, de fato, houve ofensa ao princípio
da individualização das penas na justa medida em que deveria ter sido
elaborada duas dosimetrias penais no âmbito da Ação Penal subjacente tendo
em vista que o revisionando foi condenado pela perpetração dos crimes de
moeda falsa e de corrupção de menores. Tal proceder não se mostra como
uma mera formalidade (despida de maiores relevâncias práticas) que deveria
ter sido cumprida, ainda que ulteriormente assentada a prática do concurso
formal de delitos (a prevalecer a "pena mais grave" sobre a qual incidiria
a fração majorante), na justa medida em que tem importância jurídica a
fixação de reprimendas apartadas para cada uma das infrações executadas
com o escopo de se constatar o lapso prescricional que tem o condão de
extinguir a punibilidade do agente (art. 119 do Código Penal).
- Almeja, também, o revisionando o reconhecimento de que o entendimento
contido na Súm. 444/STJ (É vedada a utilização de inquéritos policiais e
ações penais em curso para agravar a pena-base), firmado nos idos de 28 de
abril de 2010, restou vilipendiado pelo édito penal condenatório na justa
medida em que foram considerados, quando da fixação da sua reprimenda
(especificamente no que tange ao cometimento do crime de moeda falsa),
como maus antecedentes (a repercutir também nas rubricas "personalidade"
e "conduta social"), inquéritos e ações penais em curso (ou seja, sem a
pecha de definitividade decorrente da sobrevinda do trânsito em julgado).
- O magistrado sentenciante entendeu por bem, a despeito de serem neutras
as circunstâncias judiciais da culpabilidade, dos motivos do crime,
das circunstâncias e das consequências da infração, recrudescer a
pena-base então em cálculo em razão de que o revisionando possuiria maus
antecedentes criminais, o que denotaria, por tabela, uma conduta social
desfavorável e uma personalidade voltada para a criminalidade. Ocorre,
entretanto, que o compulsar atento da Folha de Antecedentes que fundamentou
tal conclusão não tinha o condão de permitir a majoração da pena-base
então levada a efeito justamente porque esse tal proceder, acaso realizado,
macularia o entendimento que se encontrava cristalizado desde os idos de
2010 no Verbete nº 444 da Súmula do C. Superior Tribunal de Justiça,
uma vez que os apontamentos lá constantes não indicavam a sobrevinda
de trânsito em julgado, mas apenas a existência ou de investigações em
curso, ou de ações penais em tramitação, ou de feitos nos quais extinta a
punibilidade do agente. Desta forma, a majoração de pena imprimida no édito
penal condenatório transitado em julgado mostra-se flagrantemente ilegal.
- Como consequência do acolhimento das pretensões formuladas nesta via
estreita, realizada novas dosimetrias penais em relação aos delitos de
moeda falsa e de corrupção de menores.
- Revisão Criminal julgada procedente.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, JULGAR PROCEDENTE o pleito revisional, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
21/03/2019
Data da Publicação
:
28/03/2019
Classe/Assunto
:
RvC - REVISÃO CRIMINAL - 1457
Órgão Julgador
:
QUARTA SEÇÃO
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-444
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-36
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-621 INC-1
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-68 ART-119
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/03/2019
..FONTE_REPUBLICACAO:
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