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Jurisprudência


TRF3 0000207-78.2012.4.03.6201 00002077820124036201

Ementa
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. SOLIDARIEDADE DOS ENTES FEDERATIVOS. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. ASMA BRÔNQUICA. TRTAMENTO COM "OMALIZUMABE (XOLAIR)". HIPOSSUFICIÊNCIA. MULTA COMINATÓRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÕES E REMESSA OFICIAL DESPROVIDAS. 1. Trata-se de reexame necessário e recursos de apelação, nos quais se discute a responsabilidade da União e do Estado de Mato Grosso do Sul à concessão de "OMALIZUMABE (XOLAIR)" para o tratamento de Asma Brônquica persistente (CID 10 J45.0). 2. Primeiramente, sobre as alegações preliminares de ausência do interesse de agir e ilegitimidade ad causam, sem razão, eis que, de um lado, há a comprovação da doença da autora e sua necessidade de tratamento médico (fl. 35/40), por outro, a Constituição Federal de 1988 determina, em seu art. 196, que o direito fundamental à saúde é dever de todos os entes federativos, respondendo eles de forma solidária pela prestação de tal serviço público. 3. Em relação ao mérito, tendo-se em vista que a Carta de 1988, ao constitucionalizar o direito à saúde como direito fundamental, inovou a ordem jurídica nacional, na medida em que nas Constituições anteriores tal direito se restringia à salvaguarda específica de direitos dos trabalhadores, além de disposições sobre regras de competência que não tinham, todavia, o condão de garantir o acesso universal à saúde. 4. É de se notar que a Constituição, ao dispor do direito à saúde, não se limita a aspectos de natureza curativa, mas estabelece que as ações devem ser amplas no sentido de garantir um tratamento curativo, mas de determinar também que as políticas públicas devem ter como o escopo a profilaxia de doenças. 5. Observe-se que os direitos e valores munidos de fundamentalidade na ordem constitucional não tem completude a menos que se garantam as condições necessárias para sua efetivação. Continuando-se o raciocínio, a garantia do direito fundamental de acesso à saúde é, sim, uma garantia de toda a sociedade, gerando um dever por parte do poder público de implementar políticas públicas que visem ao bem-estar geral da população. 6. A guarda dos direitos fundamentais, especialmente no que concerne ao chamado mínimo existencial, pode ser argumento válido no sentido de justificar intervenção judicial quando não houver, por parte do poder público, o devido suprimento às necessidades básicas do indivíduo. Bem assim, ainda que, no campo da definição de políticas públicas, seja possível priorizar a tutela das necessidades coletivas, não se pode, com esse raciocínio, supor que há qualquer legitimidade em se negar em sua plenitude a condição de titularidade do direito pelo indivíduo. Prosseguindo-se o juízo, na medida em que o direito à saúde se consubstancia, também, como direito subjetivo do indivíduo, não me parecem legítimas as afirmações segundo as quais a tutela individual trataria uma inaceitável intervenção do Poder Judiciário sobre o Executivo e as políticas públicas que este leva a cabo. 7. Sabendo-se que, como já afirmado, o direito à saúde, além aspecto coletivo, constrói-se como direito fundamental subjetivo de cada indivíduo; verificando-se, outrossim, a ausência ou deficiência do poder público em promover as necessárias políticas que garantam ao indivíduo condições de saúde dignas, não é razoável supor se pudesse negar ao indivíduo a tutela jurisdicional, uma vez que é obrigação do Estado zelar pela saúde de todos, mas também pela de cada um dos indivíduos do país. 8. Assim tem se posicionado majoritariamente a jurisprudência pátria, no sentido de que se protejam tanto aquelas hipóteses de iminente risco para a vida humana, quanto aquelas em que caiba restabelecer a noção de mínimo existencial, que estabelece o parâmetro intangível e nuclear da dignidade da pessoa humana, sem o que toda a base principiológica do texto constitucional estaria mortalmente comprometida. 9. In casu, o autor Waldeci Aleixo é portador de Asma Brônquica persistente grave, diagnosticado em 1983, sendo que em 2011 sua médica assistente lhe receitou o medicamento "OMALIZUMABE (XOLAIR) 150mg", 02 frascos, a cada quatro semanas, por tempo indeterminado. No entanto, tal medicamento não consta da lista de medicamento do SUS, impossibilitando a sua concessão gratuita e, em consequência atrapalhando o tratamento do autor, com risco para suas saúde e vida. 10. De acordo com o laudo pericial de fls. 237/248, em quesito formulado pelo juízo (Item "A", pontos 2 e 3), o perito médico judicial adverte que o medicamento indicado ao autor não é fornecido pelo SUS e que não há medicamento similar ou com mesmo princípio ativo fornecido pelo sistema estatal ou que possua igual eficácia, sendo que "o medicamento é imprescindível, para evitar crises graves da patologia" (Item "A", ponto 5 - fl. 242). Ademais, ao quesito nº 6 apresentado pela Prefeitura de Campo Grande - "Existe Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para a doença em questão? A parte preenche os requisitos para o tratamento? Já esgotou todas as possibilidades de tratamento previstas no protocolo?" - a resposta do perito é imperativa: "Existe [Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas]; a parte preenche os requisitos e já se esgotaram as possibilidades previstas" (fl. 243). Não obstante, foi concluído que a "eficácia do medicamento prescrito é boa e deve ser utilizado continuamente e por prazo indeterminado" (fl. 243), sendo que o não uso do medicamento prescrito "facilitara o aparecimento de crises agudas com suas consequências" (fl. 244), havendo risco relativo ao paciente, eis que "o medicamento solicitado tende a evitar as crises que aumentam o risco de morte quando acontecem" (fl. 245). Por fim, concluiu que confirma o diagnostico do autor e a real necessidade de utilização do medicamento pretendido, em detrimento do tratamento disponível na rede pública de saúde (fl. 245 - ponto 17). 11. Não cabe a Administração decidir qual o melhor - ou menos oneroso - tratamento médico deve ser aplicado ao paciente, ao contrário, esta decisão é discricionária do médico responsável pela análise do quadro médico do paciente, somente ele, por ter formação técnica específica e contato direito com o submetido ao tratamento para saber o que melhor convém a este.. 12. Uma leitura constitucional do caso demonstra que o postulado da dignidade da pessoa humana não permite, em nenhuma hipótese, o estabelecimento rígido do fornecimento de determinado medicamento/tratamento, sem chances de modificação, ainda que gere efeitos mais danosos ao paciente, somente para que assim se onere menos o Estado. Todos, sem exceção, devem ter acesso a tratamento médico digno e eficaz, mormente quando não se possuam recursos para custeá-lo. Nesse universo se insere inclusive medicamentos que não constam da lista do SUS e não podem ser substituídos com a mesma eficácia pelo poder público. 13. vasta jurisprudência do E. STJ sedimentou o entendimento da possibilidade de fixação de multa diária a fim de assegurar o cumprimento da obrigação de concessão de medicamento. 14. Condenação em honorários advocatícios mantida. 15 Apelações e remessa oficial desprovidas.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao reexame necessário e aos recursos de apelação da União e do Estado do Mato Grosso do Sul, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 18/08/2016
Data da Publicação : 26/08/2016
Classe/Assunto : ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2118910
Órgão Julgador : TERCEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/08/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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