TRF3 0000236-95.2002.4.03.6002 00002369520024036002
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA
PREVIDENCIÁRIA. CONTINUIDADE DELITIVA. PRELIMINAR SUSCITADA EM
CONTRARRAZÕES REJEITADA. AFASTADA A PRELIMINAR DE EXTINÇÃO DA PUNILIDADE
PELO PARCELAMENTO DO DÉBITO. PRESCRIÇÃO PARCIAL DA PRETENSÃO PUNITIVA
RECONHECIDA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOLO DEMONSTRADO. NÃO
CONFIGURADO O ERRO DE TIPO. INOCORRÊNCIA DE INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA
DIVERSA. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA DA PENA.
1. O órgão ministerial, em contrarrazões, pleiteia o não conhecimento
do recurso de apelação do réu, sob o argumento de ser extemporâneo. Da
análise dos autos, observa-se que a r. sentença foi publicada em
21/02/2011. O acusado opôs embargos de declaração, que foram rejeitados
em decisão publicada em 28/03/2012, de modo que o prazo final para a
interposição do recurso, de fato, seria 02/04/2012, nos termos do artigo
593, I, do Código de Processo Penal.
2. Ocorre que a intimação pessoal do réu se deu em 03/05/2012, sendo
que o prazo para a interposição da apelação começou a fluir somente a
partir desta data, nos estritos termos dos artigos 392, II, e 798, §5º,
"a", do Código de Processo Penal. Dessa forma, tem-se que o recurso de
apelação, protocolado em 03/04/2012, é tempestivo.
3. Eventual parcelamento da dívida na via administrativa não é hábil
a ensejar a extinção da punibilidade do réu, mas, tão somente,
o sobrestamento do feito, em razão da suspensão da exigibilidade do
crédito. Ademais, ainda que se admitisse a aplicação do disposto no artigo
34 da Lei nº 9.249/95 ao caso dos autos, tal dispositivo exige que, para
haver a extinção da punibilidade, o pagamento do débito deve ser integral,
o que não ocorreu, já que a empresa do acusado foi excluída do REFIS por
inadimplência. Precedentes.
4. Reconhecida a prescrição retroativa da pretensão punitiva quanto aos
fatos ocorridos no período de julho de 1991 a abril de 1994, declarando-se
extinta a punibilidade do acusado no tocante ao mencionado período.
5. A materialidade delitiva está comprovada através das Notificações
Fiscais de Lançamento de Débito, além das demais peças de informação
constantes do processo administrativo, como o discriminativo analítico de
débito, o relatório de lançamentos, as cópias das folhas de pagamento da
empresa, que bem demonstram que os valores foram descontados dos salários
dos empregados e não repassados ao INSS, no período em questão.
6. Os débitos relativos às NFLD´s foram definitivamente constituídos,
mediante inscrição em Dívida Ativa, em 26/01/1996, antes, portanto,
do início da ação penal, que se deu com o recebimento da denúncia,
em 16/10/2009.
7. Não prospera a alegação de atipicidade da conduta por ausência de
dolo, pois, o tipo penal da apropriação indébita exige apenas o dolo
genérico consistente na conduta omissiva de deixar de recolher, no prazo
legal, as contribuições destinadas à Previdência Social, que tenham sido
descontadas de pagamentos efetuados, como, de fato, ocorreu.
8. A autoria do delito restou demonstrada pelo Contrato Social da empresa
Sulmat Engenharia Ltda., onde consta que, na época dos fatos, o acusado era
diretor administrativo da sociedade, sendo tal informação corroborada pelo
relato das testemunhas de defesa. Além disso, em seu depoimento ao Juízo,
o réu admitiu a ausência de recolhimento das contribuições no período
em questão.
9. Não prospera a alegação do apelante de ocorrência de erro de tipo, sob
o argumento de que acreditava que os valores relativos às contribuições
previdenciárias, descontados dos empregados, estavam sendo corretamente
recolhidos, de modo a excluir o dolo em sua conduta. Isso porque, não
é crível que o réu, na qualidade de sócio administrador da empresa,
desconhecesse o fato de que as contribuições previdenciárias não estavam
sendo recolhidas. Ademais, o contador Vilmar Barbosa da Silva afirmou ao
Juízo que, embora não informasse especificamente sobre a existência de
débitos referentes às contribuições previdenciárias, nunca deixou de
informar ao réu a existência e o valor de dívidas com o INSS.
10. Ressalte-se, ainda, que, a consumação do delito em questão se dá
com a mera ausência de recolhimento das contribuições previdenciárias,
uma vez que o tipo penal da apropriação indébita exige apenas o dolo
genérico consistente na conduta omissiva de deixar de recolher, no prazo
legal, as contribuições destinadas à Previdência Social, que tenham sido
descontadas de pagamentos efetuados, não exigindo do agente o animus rem
sibi habendi dos valores descontados e não repassados.
11. Para se caracterizar a inexigibilidade de conduta diversa como causa
supralegal de exclusão de punibilidade, as dificuldades devem ser de tal ordem
que coloquem em risco a própria existência do negócio. No caso, a defesa
não conseguiu comprovar que as dificuldades financeiras vivenciadas pela
empresa tenham sido diferentes daquelas comuns a qualquer outra atividade de
risco, como, por exemplo, o desfazimento de patrimônio pessoal para quitar as
dívidas, antes de se deixar de recolher as contribuições previdenciárias.
12. Mantida a condenação imposta ao apelante.
13. Manutenção da pena-base, acima do mínimo legal, pois, tratando-se de
apropriação indébita previdenciária, a consequência da conduta do agente
é o dano expressivo causado à Previdência Social e, em última análise,
à própria coletividade.
14. Diante do reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva
em relação ao período de julho de 1991 a abril de 1994, o patamar de
majoração da pena relativo à continuidade delitiva (artigo 71 do Código
Penal) deve ser reduzido para 1/5 (um quinto).
15. A pena do acusado Walter resulta definitiva em 03 (três) anos, 07
(sete) meses e 06 (seis) dias de reclusão. Com base nos mesmos critérios de
fixação da pena privativa de liberdade, estabelece-se a pena pecuniária
em 18 (dezoito) dias-multa, no valor unitário de 01 (um) salário mínimo
vigente na data do fato, devidamente corrigido.
16. Diante da redução da pena privativa de liberdade, o regime inicial de
cumprimento da pena deverá ser o aberto, nos termos do artigo 33, §2º,
"c", do Código Penal, pois, embora haja circunstância judicial desfavorável
ao réu, esta não configura razão suficiente para ensejar um regime mais
gravoso da pena.
17. A existência de circunstância judicial desfavorável ao réu obstaria
a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos,
nos moldes do artigo 44, inciso III, do Código Penal. No entanto, resta
mantida a substituição à míngua de apelo do órgão ministerial.
18. Alteração, de ofício, da destinação da pena de prestação
pecuniária, posto que, sendo a União Federal a entidade lesada com ação
delituosa, o valor de 10 (dez) salários mínimos deverá ser revertido aos
seus cofres, em conformidade com o disposto no artigo 45, §1° do Código
Penal.
19. Preliminar suscitada em contrarrazões pelo Ministério Público Federal
rejeitada. Preliminar de extinção da punibilidade pelo parcelamento do
débito rejeitada. Preliminar de ocorrência da prescrição parcial da
pretensão punitiva acolhida. Apelação a que se dá parcial provimento.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA
PREVIDENCIÁRIA. CONTINUIDADE DELITIVA. PRELIMINAR SUSCITADA EM
CONTRARRAZÕES REJEITADA. AFASTADA A PRELIMINAR DE EXTINÇÃO DA PUNILIDADE
PELO PARCELAMENTO DO DÉBITO. PRESCRIÇÃO PARCIAL DA PRETENSÃO PUNITIVA
RECONHECIDA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOLO DEMONSTRADO. NÃO
CONFIGURADO O ERRO DE TIPO. INOCORRÊNCIA DE INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA
DIVERSA. CONDENAÇÃO MANTIDA. DOSIMETRIA DA PENA.
1. O órgão ministerial, em contrarrazões, pleiteia o não conhecimento
do recurso de apelação do réu, sob o argumento de ser extemporâneo. Da
análise dos autos, observa-se que a r. sentença foi publicada em
21/02/2011. O acusado opôs embargos de declaração, que foram rejeitados
em decisão publicada em 28/03/2012, de modo que o prazo final para a
interposição do recurso, de fato, seria 02/04/2012, nos termos do artigo
593, I, do Código de Processo Penal.
2. Ocorre que a intimação pessoal do réu se deu em 03/05/2012, sendo
que o prazo para a interposição da apelação começou a fluir somente a
partir desta data, nos estritos termos dos artigos 392, II, e 798, §5º,
"a", do Código de Processo Penal. Dessa forma, tem-se que o recurso de
apelação, protocolado em 03/04/2012, é tempestivo.
3. Eventual parcelamento da dívida na via administrativa não é hábil
a ensejar a extinção da punibilidade do réu, mas, tão somente,
o sobrestamento do feito, em razão da suspensão da exigibilidade do
crédito. Ademais, ainda que se admitisse a aplicação do disposto no artigo
34 da Lei nº 9.249/95 ao caso dos autos, tal dispositivo exige que, para
haver a extinção da punibilidade, o pagamento do débito deve ser integral,
o que não ocorreu, já que a empresa do acusado foi excluída do REFIS por
inadimplência. Precedentes.
4. Reconhecida a prescrição retroativa da pretensão punitiva quanto aos
fatos ocorridos no período de julho de 1991 a abril de 1994, declarando-se
extinta a punibilidade do acusado no tocante ao mencionado período.
5. A materialidade delitiva está comprovada através das Notificações
Fiscais de Lançamento de Débito, além das demais peças de informação
constantes do processo administrativo, como o discriminativo analítico de
débito, o relatório de lançamentos, as cópias das folhas de pagamento da
empresa, que bem demonstram que os valores foram descontados dos salários
dos empregados e não repassados ao INSS, no período em questão.
6. Os débitos relativos às NFLD´s foram definitivamente constituídos,
mediante inscrição em Dívida Ativa, em 26/01/1996, antes, portanto,
do início da ação penal, que se deu com o recebimento da denúncia,
em 16/10/2009.
7. Não prospera a alegação de atipicidade da conduta por ausência de
dolo, pois, o tipo penal da apropriação indébita exige apenas o dolo
genérico consistente na conduta omissiva de deixar de recolher, no prazo
legal, as contribuições destinadas à Previdência Social, que tenham sido
descontadas de pagamentos efetuados, como, de fato, ocorreu.
8. A autoria do delito restou demonstrada pelo Contrato Social da empresa
Sulmat Engenharia Ltda., onde consta que, na época dos fatos, o acusado era
diretor administrativo da sociedade, sendo tal informação corroborada pelo
relato das testemunhas de defesa. Além disso, em seu depoimento ao Juízo,
o réu admitiu a ausência de recolhimento das contribuições no período
em questão.
9. Não prospera a alegação do apelante de ocorrência de erro de tipo, sob
o argumento de que acreditava que os valores relativos às contribuições
previdenciárias, descontados dos empregados, estavam sendo corretamente
recolhidos, de modo a excluir o dolo em sua conduta. Isso porque, não
é crível que o réu, na qualidade de sócio administrador da empresa,
desconhecesse o fato de que as contribuições previdenciárias não estavam
sendo recolhidas. Ademais, o contador Vilmar Barbosa da Silva afirmou ao
Juízo que, embora não informasse especificamente sobre a existência de
débitos referentes às contribuições previdenciárias, nunca deixou de
informar ao réu a existência e o valor de dívidas com o INSS.
10. Ressalte-se, ainda, que, a consumação do delito em questão se dá
com a mera ausência de recolhimento das contribuições previdenciárias,
uma vez que o tipo penal da apropriação indébita exige apenas o dolo
genérico consistente na conduta omissiva de deixar de recolher, no prazo
legal, as contribuições destinadas à Previdência Social, que tenham sido
descontadas de pagamentos efetuados, não exigindo do agente o animus rem
sibi habendi dos valores descontados e não repassados.
11. Para se caracterizar a inexigibilidade de conduta diversa como causa
supralegal de exclusão de punibilidade, as dificuldades devem ser de tal ordem
que coloquem em risco a própria existência do negócio. No caso, a defesa
não conseguiu comprovar que as dificuldades financeiras vivenciadas pela
empresa tenham sido diferentes daquelas comuns a qualquer outra atividade de
risco, como, por exemplo, o desfazimento de patrimônio pessoal para quitar as
dívidas, antes de se deixar de recolher as contribuições previdenciárias.
12. Mantida a condenação imposta ao apelante.
13. Manutenção da pena-base, acima do mínimo legal, pois, tratando-se de
apropriação indébita previdenciária, a consequência da conduta do agente
é o dano expressivo causado à Previdência Social e, em última análise,
à própria coletividade.
14. Diante do reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva
em relação ao período de julho de 1991 a abril de 1994, o patamar de
majoração da pena relativo à continuidade delitiva (artigo 71 do Código
Penal) deve ser reduzido para 1/5 (um quinto).
15. A pena do acusado Walter resulta definitiva em 03 (três) anos, 07
(sete) meses e 06 (seis) dias de reclusão. Com base nos mesmos critérios de
fixação da pena privativa de liberdade, estabelece-se a pena pecuniária
em 18 (dezoito) dias-multa, no valor unitário de 01 (um) salário mínimo
vigente na data do fato, devidamente corrigido.
16. Diante da redução da pena privativa de liberdade, o regime inicial de
cumprimento da pena deverá ser o aberto, nos termos do artigo 33, §2º,
"c", do Código Penal, pois, embora haja circunstância judicial desfavorável
ao réu, esta não configura razão suficiente para ensejar um regime mais
gravoso da pena.
17. A existência de circunstância judicial desfavorável ao réu obstaria
a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos,
nos moldes do artigo 44, inciso III, do Código Penal. No entanto, resta
mantida a substituição à míngua de apelo do órgão ministerial.
18. Alteração, de ofício, da destinação da pena de prestação
pecuniária, posto que, sendo a União Federal a entidade lesada com ação
delituosa, o valor de 10 (dez) salários mínimos deverá ser revertido aos
seus cofres, em conformidade com o disposto no artigo 45, §1° do Código
Penal.
19. Preliminar suscitada em contrarrazões pelo Ministério Público Federal
rejeitada. Preliminar de extinção da punibilidade pelo parcelamento do
débito rejeitada. Preliminar de ocorrência da prescrição parcial da
pretensão punitiva acolhida. Apelação a que se dá parcial provimento.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, rejeitar a preliminar suscitada em contrarrazões pelo Ministério
Público Federal, rejeitar a preliminar de extinção da punibilidade pelo
parcelamento do débito, acolher a preliminar de ocorrência da prescrição
parcial da pretensão punitiva e, no mérito, dar parcial provimento ao
recurso de apelação, e alterar, de ofício, a destinação da pena de
prestação pecuniária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
24/01/2017
Data da Publicação
:
08/02/2017
Classe/Assunto
:
ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 51411
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-593 INC-1 ART-392 INC-2 ART-798 PAR-5
LEG-FED LEI-9249 ANO-1995 ART-34
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-71 ART-33 PAR-2 LET-C ART-44 INC-3 ART-45
PAR-1
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/02/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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