TRF3 0000301-56.2017.4.03.6005 00003015620174036005
PENAL. ART. 33 C. C. ART. 40, INCISO I, DA LEI Nº 11.343/2006. PRISÃO
EM FLAGRANTE. MATERIALIDADE. AUTORIA. DOSIMETRIA. CAUSA DE DIMINUIÇÃO
DO ART. 33, § 4º, DA MESMA LEI. NÃO APLICÁVEL. REGIME INICIAL. PENA DE
MULTA. PROPORCIONALIDADE. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1) A Apelação é relativa apenas à dosimetria da pena, não havendo
insurgência contra a materialidade e a autoria delitiva (que são
incontroversas, dadas as constatações expendidas no voto - as quais,
mesmo que de forma resumida, permitem afiançar com a certeza necessária
o cometimento do crime em questão); tampouco verifica-se a necessidade de
reparos a serem realizados de ofício na sentença, cabendo apenas ressaltar
que, no tocante ao delito de receptação, o Juízo a quo acertadamente
asseverou: "No caso, restou comprovado que o réu recebeu o carro em sua
cidade (Tangará da Serra/MT), das mãos de seu contratante (ou de quem
para ele trabalhava), sem documentação veicular, para deslocar-se até uma
região de fronteira nacionalmente conhecida pelo tráfico de drogas/armas
e receptação/exportação de veículos roubados/furtados, para fazer uma
viagem até Cuiabá/MT, com carro carregado com cerca de 267 kg (duzentos e
sessenta e sete quilogramas) de maconha. Nessas circunstâncias, especialmente
pela condição de quem ofereceu, o réu deveria presumir se tratar de bem
obtido por meio de criminoso. Trata-se de situação previsível a qualquer
cidadão. Assim, se faz igualmente presente os elementos ensejadores da
condenação do réu pelo crime do art. 180, 3º, do Código Penal". Desse
modo, mantém-se a condenação.
2) Não há que ser aplicada, no presente caso, a causa de diminuição
do art. 33, § 4º, da Lei de Drogas. Isso porque tal dispositivo prevê
a redução de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços) na pena, para o agente
que for primário, possuir bons antecedentes, não se dedicar a atividades
criminosas e não integrar organização criminosa. A última condição
não está preenchida no caso dos autos, uma vez que o acusado, ainda que
na condição de "mula", integrou organização criminosa com o objetivo
de efetivar o crime de tráfico de drogas que estava em curso quando de
sua prisão em flagrante, mesmo considerando que sua participação estaria
adstrita ao transporte da substância entorpecente. Importante ressaltar que a
causa de diminuição em comento não exige habitualidade, pois, do contrário,
presente estaria a figura típica do art. 35 da Lei nº 11.343/2006 - assim,
basta uma única atuação para que a pessoa já integre a atividade ou a
organização criminosa, afastando a possibilidade de reconhecimento da
respectiva causa de diminuição. Note-se, ainda, que foram apreendidos
mais de 250kg (duzentos e cinquenta quilos) de maconha com o acusado e
que ele declarou, em Juízo, que receberia R$ 10.000,00 (dez mil reais)
pelo transporte, o que demonstra expressivo investimento financeiro por
parte do(s) contratante(s) e a plena confiança que este(s) depositava(m)
no réu. Com efeito, tal circunstância, bem como o modus operandi utilizado
(destacando-se a duplicidade de delitos), indicam a integração do réu a
organização criminosa. É de se ressaltar que não se está aqui considerando
a quantidade da droga apreendida, já valorada na primeira fase da dosimetria,
mas a vultuosa operação e seu meticuloso planejamento, o que permite afastar
a causa de diminuição em tela. Nesse sentido: STF, HC nº 126.971/SP,
Rel. Min. Dias Toffoli, 2ª Turma, j. 02/06/2015; STF, HC nº 125.429
AgR-ED/MS, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª Turma, j. 28.04.2015. Destaque-se,
finalmente, que os fins econômicos demonstram a existência de uma atividade
ou de uma organização criminosa necessariamente subjacente, o que tem o
condão de excluir a incidência do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas,
apesar da primariedade e dos bons antecedentes do acusado. Diferente
seria a hipótese daquele que transporta drogas para entregar a terceiros
por questões divorciadas de qualquer sentido econômico, situação que,
em tese, ensejaria a aplicação da causa de diminuição em questão.
3) Considerado o tempo da condenação e o disposto no art. 33, § 2º,
"b", do Código Penal, além da ausência de recurso da acusação, a pena
privativa de liberdade deve ser inicialmente cumprida no regime fixado pela
sentença, qual seja, o SEMIABERTO.
4) A pena de multa é literalmente prevista pelo art. 33 da Lei nº
11.343/2006, e, na sentença, seu quantum foi calculado corretamente,
dentro dos parâmetros legais e de maneira proporcional à pena privativa de
liberdade estabelecida na mesma decisão. Ademais, o valor dos dias-multa já
foi fixado pelo Juízo a quo no mínimo legal - tudo de acordo com o art. 43
da Lei de Drogas e os arts. 49 e 59 do Código Penal. Nesse sentido: TRF-3;
ACr nº 2015.61.19.005955-6; 5ª Turma; Rel. Des. Fed. André Nekatschalow;
j. 23.05.2016. Desse modo, não é possível qualquer redução na pena de
multa, cabendo ao réu discutir a forma de seu pagamento perante o Juízo
de Execução.
5) Acerca da possibilidade de execução provisória da pena, deve prevalecer
o entendimento adotado pelo C. Supremo Tribunal Federal que, ao reinterpretar
o princípio da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da CF) e o disposto
no art. 283 do CPP, nos autos do Habeas Corpus nº. 126.292/SP e das Ações
Declaratórias de Constitucionalidade nº. 43 e nº. 44, pronunciou-se no
sentido de que não há óbice ao início do cumprimento da pena antes do
trânsito em julgado, desde que esgotados os recursos cabíveis perante as
instâncias ordinárias. Assim, exauridos os recursos cabíveis perante esta
Corte, mesmo que ainda pendente o julgamento de recursos interpostos perante
as Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), deve ser
expedida Carta de Sentença, bem como comunicação ao juízo de origem,
a fim de que se inicie, provisoriamente, a execução da pena imposta por
meio de acórdão condenatório exarado em sede de Apelação. Em havendo
o trânsito em julgado, hipótese em que a execução será definitiva, ou
no caso de já ter sido expedida guia provisória de execução, tornam-se
desnecessárias tais providências. Saliente-se que a detração de que trata
o artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei nº
12.736/2012, não influencia no regime inicial já que, ainda que descontado
o período da prisão preventiva entre a data dos fatos (14.02.2017) e a
data de publicação da sentença (16.08.2017), a pena remanescente continua
superando 04 (quatro) anos de reclusão.
6) Apelação desprovida.
Ementa
PENAL. ART. 33 C. C. ART. 40, INCISO I, DA LEI Nº 11.343/2006. PRISÃO
EM FLAGRANTE. MATERIALIDADE. AUTORIA. DOSIMETRIA. CAUSA DE DIMINUIÇÃO
DO ART. 33, § 4º, DA MESMA LEI. NÃO APLICÁVEL. REGIME INICIAL. PENA DE
MULTA. PROPORCIONALIDADE. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1) A Apelação é relativa apenas à dosimetria da pena, não havendo
insurgência contra a materialidade e a autoria delitiva (que são
incontroversas, dadas as constatações expendidas no voto - as quais,
mesmo que de forma resumida, permitem afiançar com a certeza necessária
o cometimento do crime em questão); tampouco verifica-se a necessidade de
reparos a serem realizados de ofício na sentença, cabendo apenas ressaltar
que, no tocante ao delito de receptação, o Juízo a quo acertadamente
asseverou: "No caso, restou comprovado que o réu recebeu o carro em sua
cidade (Tangará da Serra/MT), das mãos de seu contratante (ou de quem
para ele trabalhava), sem documentação veicular, para deslocar-se até uma
região de fronteira nacionalmente conhecida pelo tráfico de drogas/armas
e receptação/exportação de veículos roubados/furtados, para fazer uma
viagem até Cuiabá/MT, com carro carregado com cerca de 267 kg (duzentos e
sessenta e sete quilogramas) de maconha. Nessas circunstâncias, especialmente
pela condição de quem ofereceu, o réu deveria presumir se tratar de bem
obtido por meio de criminoso. Trata-se de situação previsível a qualquer
cidadão. Assim, se faz igualmente presente os elementos ensejadores da
condenação do réu pelo crime do art. 180, 3º, do Código Penal". Desse
modo, mantém-se a condenação.
2) Não há que ser aplicada, no presente caso, a causa de diminuição
do art. 33, § 4º, da Lei de Drogas. Isso porque tal dispositivo prevê
a redução de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços) na pena, para o agente
que for primário, possuir bons antecedentes, não se dedicar a atividades
criminosas e não integrar organização criminosa. A última condição
não está preenchida no caso dos autos, uma vez que o acusado, ainda que
na condição de "mula", integrou organização criminosa com o objetivo
de efetivar o crime de tráfico de drogas que estava em curso quando de
sua prisão em flagrante, mesmo considerando que sua participação estaria
adstrita ao transporte da substância entorpecente. Importante ressaltar que a
causa de diminuição em comento não exige habitualidade, pois, do contrário,
presente estaria a figura típica do art. 35 da Lei nº 11.343/2006 - assim,
basta uma única atuação para que a pessoa já integre a atividade ou a
organização criminosa, afastando a possibilidade de reconhecimento da
respectiva causa de diminuição. Note-se, ainda, que foram apreendidos
mais de 250kg (duzentos e cinquenta quilos) de maconha com o acusado e
que ele declarou, em Juízo, que receberia R$ 10.000,00 (dez mil reais)
pelo transporte, o que demonstra expressivo investimento financeiro por
parte do(s) contratante(s) e a plena confiança que este(s) depositava(m)
no réu. Com efeito, tal circunstância, bem como o modus operandi utilizado
(destacando-se a duplicidade de delitos), indicam a integração do réu a
organização criminosa. É de se ressaltar que não se está aqui considerando
a quantidade da droga apreendida, já valorada na primeira fase da dosimetria,
mas a vultuosa operação e seu meticuloso planejamento, o que permite afastar
a causa de diminuição em tela. Nesse sentido: STF, HC nº 126.971/SP,
Rel. Min. Dias Toffoli, 2ª Turma, j. 02/06/2015; STF, HC nº 125.429
AgR-ED/MS, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª Turma, j. 28.04.2015. Destaque-se,
finalmente, que os fins econômicos demonstram a existência de uma atividade
ou de uma organização criminosa necessariamente subjacente, o que tem o
condão de excluir a incidência do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas,
apesar da primariedade e dos bons antecedentes do acusado. Diferente
seria a hipótese daquele que transporta drogas para entregar a terceiros
por questões divorciadas de qualquer sentido econômico, situação que,
em tese, ensejaria a aplicação da causa de diminuição em questão.
3) Considerado o tempo da condenação e o disposto no art. 33, § 2º,
"b", do Código Penal, além da ausência de recurso da acusação, a pena
privativa de liberdade deve ser inicialmente cumprida no regime fixado pela
sentença, qual seja, o SEMIABERTO.
4) A pena de multa é literalmente prevista pelo art. 33 da Lei nº
11.343/2006, e, na sentença, seu quantum foi calculado corretamente,
dentro dos parâmetros legais e de maneira proporcional à pena privativa de
liberdade estabelecida na mesma decisão. Ademais, o valor dos dias-multa já
foi fixado pelo Juízo a quo no mínimo legal - tudo de acordo com o art. 43
da Lei de Drogas e os arts. 49 e 59 do Código Penal. Nesse sentido: TRF-3;
ACr nº 2015.61.19.005955-6; 5ª Turma; Rel. Des. Fed. André Nekatschalow;
j. 23.05.2016. Desse modo, não é possível qualquer redução na pena de
multa, cabendo ao réu discutir a forma de seu pagamento perante o Juízo
de Execução.
5) Acerca da possibilidade de execução provisória da pena, deve prevalecer
o entendimento adotado pelo C. Supremo Tribunal Federal que, ao reinterpretar
o princípio da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da CF) e o disposto
no art. 283 do CPP, nos autos do Habeas Corpus nº. 126.292/SP e das Ações
Declaratórias de Constitucionalidade nº. 43 e nº. 44, pronunciou-se no
sentido de que não há óbice ao início do cumprimento da pena antes do
trânsito em julgado, desde que esgotados os recursos cabíveis perante as
instâncias ordinárias. Assim, exauridos os recursos cabíveis perante esta
Corte, mesmo que ainda pendente o julgamento de recursos interpostos perante
as Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), deve ser
expedida Carta de Sentença, bem como comunicação ao juízo de origem,
a fim de que se inicie, provisoriamente, a execução da pena imposta por
meio de acórdão condenatório exarado em sede de Apelação. Em havendo
o trânsito em julgado, hipótese em que a execução será definitiva, ou
no caso de já ter sido expedida guia provisória de execução, tornam-se
desnecessárias tais providências. Saliente-se que a detração de que trata
o artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei nº
12.736/2012, não influencia no regime inicial já que, ainda que descontado
o período da prisão preventiva entre a data dos fatos (14.02.2017) e a
data de publicação da sentença (16.08.2017), a pena remanescente continua
superando 04 (quatro) anos de reclusão.
6) Apelação desprovida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, negar provimento à Apelação, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
04/09/2018
Data da Publicação
:
17/09/2018
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 73510
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** LDR-06 LEI DE DROGAS
LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-40 INC-1 ART-33 PAR-4 ART-35 ART-43
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-180 PAR-3 ART-33 PAR-2 LET-B ART-49 ART-59
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-57
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-283 ART-387 PAR-2
LEG-FED LEI-12736 ANO-2012
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/09/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão