TRF3 0000327-69.2008.4.03.6005 00003276920084036005
CIVIL, PROCESSO CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO ORDINÁRIA. TARIFA BANCÁRIA
PELA DEVOLUÇÃO DE CHEQUE SEM FUNDO, QUANDO DA APRESENTAÇÃO SIMULTÂNEA
DE CHEQUES. CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. APELAÇÕES DESPROVIDAS.
1. Não é caso de se aplicar o prazo previsto no art. 206, § 3º, IV,
do CC, porquanto tal dispositivo regulamenta o prazo prescricional da
pretensão de ressarcimento por enriquecimento sem causa. No presente caso,
a pretensão da parte autora é pelo ressarcimento pelos valores cobrados
a título de tarifa bancária e declaração de ilegalidade da cobrança
de juros capitalizados. Trata-se de pretensão de natureza pessoal, sendo
aplicável o art. 205, do CC, ou seja, o prazo decenal.
2. Quanto ao mérito, o BACEN identificou irregularidades na cobrança de tais
tarifas, tendo alterado a rotina de débito dos cheques nas circunstâncias
supracitadas, o que pode ser observado também a partir da documentação
de fls. 25/ss.. Contudo, é importante ressaltar que não se trata da
devolução de todas as tarifas aplicadas em decorrência das devoluções
de cheques por falta de fundos. Como esclareceu o BACEN, a cobrança de
tarifa sobre devolução de cheque sem provisão de fundos é regular, pois
se trata de pagamento por serviço prestado. Foi considerada irregular tão
somente a cobrança de tarifas por apresentação de cheque sem fundos em
certas e determinadas circunstâncias, a saber: quando da apresentação
simultânea de dois ou mais cheques, o que veio a ser corrigido pela CEF a
partir de 16/04/2007. Assim, a fim de verificar quais cobranças são de fato
indevidas, deve ser aplicada a sistemática adotada pela CEF após 16.04.2007
também no período anterior, desde a abertura da conta da parte autora
(dezembro de 2005). E, como decorrência, a restituição à autora deve se
limitar somente àquelas tarifas que, em confronto com o novo regramento,
mostrem-se indevidas. Ademais, ressalte-se que o Ministério Público Federal
- Procuradoria do Mato Grosso do Sul ajuizou a ação civil pública nº
2007.60.00.008319-1 contra a Caixa Econômica Federal - CEF, em razão do
mesmo procedimento discutido nestes autos, a saber: a cobrança da tarifa
pela emissão de cheque sem provisão de fundos quando da apresentação
simultânea de dois ou mais cheques. E essa ACP foi julgada procedente, nos
termos abaixo transcritos, e atualmente se encontra em fase de cumprimento de
sentença. Assim, é inequívoca a irregularidade da tarifa bancária pela
devolução de cheque sem fundo, a qual deve ser devolvida à parte autora,
quando da apresentação simultânea de dois ou mais cheques.
3. Quanto ao pleito de devolução em dobro dos valores indevidamente pagos,
com fundamento no artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor c.c artigo 940
do Código de Processo Civil, que correspondia ao artigo 1531 do Código Civil
de 1916, observo que a Súmula 159 do E. Supremo Tribunal Federal preconiza:
"Cobrança excessiva, mas de boa-fé, não dá lugar às sanções do artigo
1531 do Código Civil." No caso, não restou comprovado que a CEF tenha
agido de má-fé na cobrança da tarifa em questão, deve modo que o autor
faz jus apenas à repetição simples.
4. No que diz respeito à capitalização de juros vale ressaltar que, diante
da vedação contida no artigo 4º do Decreto nº 22.626, de 07 de abril de
1.933, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula nº 121. Com a edição
Medida Provisória nº 1963-17 de 31.03.00 (reeditada sob o nº 2.170-36,
de 23/082001), a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça,
acompanhando a evolução legislativa, assentou o entendimento no sentido
de que "é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior
a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação
da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001),
desde que expressamente pactuada." (REsp 973827/RS, submetido ao rito dos
recursos repetitivos (artigo. 543-C do CPC) Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
08/08/2012, DJe 24/09/2012). Conquanto recentemente o E. Superior Tribunal de
Justiça, no julgamento do REsp nº 1.388.972/SC, tambem sob a sistemática
dos recursos representativos de controvérsia, tenha firmado a tese de que:
"A cobrança de juros capitalizados nos contratos de mútuo é permitida
quando houver expressa pactuação", persiste a restrição temporal firmada
no julgamento do REsp nº 973.827/RS e na Súmula nº 539 do STJ no sentido
de somente ser permitida a capitalização de juros nos contratos celebrados
após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000
(em vigor como MP 2.170-36/2001). A meu ver, a nova tese apenas reforça
o entendimento que já existia em relação à necessidade de pactuação
expressa. É importante destacar ainda que o E. Superior Tribunal de
Justiça, no julgamento do REsp nº 973.827, cuja ementa encontra-se supra
transcrita, consolidou que a pactuação da capitalização dos juros tem
que ser realizada de forma expressa e clara, bem como que basta a previsão
no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da
mensal para que seja lícita a cobrança da capitalização. Neste sentido,
confiram-se as súmulas nºs 539 e 541 do Superior Tribunal de Justiça.
5. No caso dos autos, admite-se a capitalização mensal dos juros
remuneratórios, desde que expressamente pactuados (ou, nos termos da tese
firmada pelo STJ, conste no contrato que a taxa de juros anual seja superior
ao duodécuplo da mensal), pois o contrato de abertura de conta corrente foi
celebrado em dezembro de 2005 (conforme a parte autora afirma na inicial),
isto é, em data posterior à edição da aludida medida provisória. Todavia,
as partes não juntaram aos autos o contrato de abertura de conta corrente
e outros pactos, como a contratação de crédito rotativo, de modo que não
é possível aferir se a capitalização mensal dos juros remuneratórios foi
expressamente prevista em alguma das cláusulas ou se a taxa de juros anual
ultrapassa o duodécuplo da taxa mensal pactuada. Desse modo, inexistindo
prova da ausência de pactuação, não é possível reconhecer a eventual
ilegalidade na sua cobrança.
6. Apelações da CEF e da autora desprovidas.
Ementa
CIVIL, PROCESSO CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO ORDINÁRIA. TARIFA BANCÁRIA
PELA DEVOLUÇÃO DE CHEQUE SEM FUNDO, QUANDO DA APRESENTAÇÃO SIMULTÂNEA
DE CHEQUES. CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. APELAÇÕES DESPROVIDAS.
1. Não é caso de se aplicar o prazo previsto no art. 206, § 3º, IV,
do CC, porquanto tal dispositivo regulamenta o prazo prescricional da
pretensão de ressarcimento por enriquecimento sem causa. No presente caso,
a pretensão da parte autora é pelo ressarcimento pelos valores cobrados
a título de tarifa bancária e declaração de ilegalidade da cobrança
de juros capitalizados. Trata-se de pretensão de natureza pessoal, sendo
aplicável o art. 205, do CC, ou seja, o prazo decenal.
2. Quanto ao mérito, o BACEN identificou irregularidades na cobrança de tais
tarifas, tendo alterado a rotina de débito dos cheques nas circunstâncias
supracitadas, o que pode ser observado também a partir da documentação
de fls. 25/ss.. Contudo, é importante ressaltar que não se trata da
devolução de todas as tarifas aplicadas em decorrência das devoluções
de cheques por falta de fundos. Como esclareceu o BACEN, a cobrança de
tarifa sobre devolução de cheque sem provisão de fundos é regular, pois
se trata de pagamento por serviço prestado. Foi considerada irregular tão
somente a cobrança de tarifas por apresentação de cheque sem fundos em
certas e determinadas circunstâncias, a saber: quando da apresentação
simultânea de dois ou mais cheques, o que veio a ser corrigido pela CEF a
partir de 16/04/2007. Assim, a fim de verificar quais cobranças são de fato
indevidas, deve ser aplicada a sistemática adotada pela CEF após 16.04.2007
também no período anterior, desde a abertura da conta da parte autora
(dezembro de 2005). E, como decorrência, a restituição à autora deve se
limitar somente àquelas tarifas que, em confronto com o novo regramento,
mostrem-se indevidas. Ademais, ressalte-se que o Ministério Público Federal
- Procuradoria do Mato Grosso do Sul ajuizou a ação civil pública nº
2007.60.00.008319-1 contra a Caixa Econômica Federal - CEF, em razão do
mesmo procedimento discutido nestes autos, a saber: a cobrança da tarifa
pela emissão de cheque sem provisão de fundos quando da apresentação
simultânea de dois ou mais cheques. E essa ACP foi julgada procedente, nos
termos abaixo transcritos, e atualmente se encontra em fase de cumprimento de
sentença. Assim, é inequívoca a irregularidade da tarifa bancária pela
devolução de cheque sem fundo, a qual deve ser devolvida à parte autora,
quando da apresentação simultânea de dois ou mais cheques.
3. Quanto ao pleito de devolução em dobro dos valores indevidamente pagos,
com fundamento no artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor c.c artigo 940
do Código de Processo Civil, que correspondia ao artigo 1531 do Código Civil
de 1916, observo que a Súmula 159 do E. Supremo Tribunal Federal preconiza:
"Cobrança excessiva, mas de boa-fé, não dá lugar às sanções do artigo
1531 do Código Civil." No caso, não restou comprovado que a CEF tenha
agido de má-fé na cobrança da tarifa em questão, deve modo que o autor
faz jus apenas à repetição simples.
4. No que diz respeito à capitalização de juros vale ressaltar que, diante
da vedação contida no artigo 4º do Decreto nº 22.626, de 07 de abril de
1.933, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula nº 121. Com a edição
Medida Provisória nº 1963-17 de 31.03.00 (reeditada sob o nº 2.170-36,
de 23/082001), a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça,
acompanhando a evolução legislativa, assentou o entendimento no sentido
de que "é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior
a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação
da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001),
desde que expressamente pactuada." (REsp 973827/RS, submetido ao rito dos
recursos repetitivos (artigo. 543-C do CPC) Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em
08/08/2012, DJe 24/09/2012). Conquanto recentemente o E. Superior Tribunal de
Justiça, no julgamento do REsp nº 1.388.972/SC, tambem sob a sistemática
dos recursos representativos de controvérsia, tenha firmado a tese de que:
"A cobrança de juros capitalizados nos contratos de mútuo é permitida
quando houver expressa pactuação", persiste a restrição temporal firmada
no julgamento do REsp nº 973.827/RS e na Súmula nº 539 do STJ no sentido
de somente ser permitida a capitalização de juros nos contratos celebrados
após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000
(em vigor como MP 2.170-36/2001). A meu ver, a nova tese apenas reforça
o entendimento que já existia em relação à necessidade de pactuação
expressa. É importante destacar ainda que o E. Superior Tribunal de
Justiça, no julgamento do REsp nº 973.827, cuja ementa encontra-se supra
transcrita, consolidou que a pactuação da capitalização dos juros tem
que ser realizada de forma expressa e clara, bem como que basta a previsão
no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da
mensal para que seja lícita a cobrança da capitalização. Neste sentido,
confiram-se as súmulas nºs 539 e 541 do Superior Tribunal de Justiça.
5. No caso dos autos, admite-se a capitalização mensal dos juros
remuneratórios, desde que expressamente pactuados (ou, nos termos da tese
firmada pelo STJ, conste no contrato que a taxa de juros anual seja superior
ao duodécuplo da mensal), pois o contrato de abertura de conta corrente foi
celebrado em dezembro de 2005 (conforme a parte autora afirma na inicial),
isto é, em data posterior à edição da aludida medida provisória. Todavia,
as partes não juntaram aos autos o contrato de abertura de conta corrente
e outros pactos, como a contratação de crédito rotativo, de modo que não
é possível aferir se a capitalização mensal dos juros remuneratórios foi
expressamente prevista em alguma das cláusulas ou se a taxa de juros anual
ultrapassa o duodécuplo da taxa mensal pactuada. Desse modo, inexistindo
prova da ausência de pactuação, não é possível reconhecer a eventual
ilegalidade na sua cobrança.
6. Apelações da CEF e da autora desprovidas.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, negar provimento aos recursos de apelação da parte autora e
da CEF, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Data do Julgamento
:
21/01/2019
Data da Publicação
:
28/01/2019
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1915241
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
JUIZ CONVOCADO SILVIO GEMAQUE
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CC-02 CÓDIGO CIVIL DE 2002
LEG-FED LEI-10406 ANO-2002 ART-205 ART-206 PAR-3 INC-4 ART-1531
***** CDC-90 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
LEG-FED LEI-8078 ANO-1990 ART-42
***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-940
***** STF SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
LEG-FED SUM-159 SUM-121
***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-543C
***** LU-33 LEI DE USURA
LEG-FED DEC-22626 ANO-1933 ART-4
LEG-FED MPR-1963 ANO-2000
EDIÇÃO 17
LEG-FED MPR-2170 ANO-2001
EDIÇÃO 36
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-539 SUM-541
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/01/2019
..FONTE_REPUBLICACAO:
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