TRF3 0000343-61.2010.4.03.6002 00003436120104036002
AÇÃO ORDINÁRIA - APELAÇÃO INOVADORA : NÃO CONHECIMENTO -
COMERCIALIZAÇÃO DE SOJA SEM REGISTRO NO CADASTRO NACIONAL DE CULTIVARES -
PODER DE POLÍCIA ESTATAL A CONFERIR O DIREITO DE INGRESSO DE FISCAIS NO
ESTABELECIMENTO, A FIM DE QUE DOCUMENTOS E ELEMENTOS SEJAM AVERIGUADOS,
ART. 37, § 2º, DA LEI 10.711/2003 - COMETIMENTO DA INFRAÇÃO COMPROVADO
- IMPROCEDÊNCIA AO PEDIDO - PARCIAL CONHECIMENTO DA APELAÇÃO E, NO QUE
CONHECIDA, IMPROVIDA
Destaque-se que a função da análise em apelo, como de sua essência,
traduz-se em uma reapreciação do que suscitado e julgado em Primeira
Instância, em grau de apelo.
Claramente a apelação interposta, no que pertinente à ausência de menção
sobre a presença de representantes da empresa no Termo de Fiscalização, bem
como pela falta de informação da hora em que lavrado e sobre autorização
do Governo do Estado (Mato Grosso do Sul), por inexistência de relação
interestadual a justificar a atuação de agentes do MAPA, traz temas não
levantados perante o E. Juízo a quo, bastando singelo cotejo com a prefacial.
Se devolve o apelo ao Tribunal o conhecimento da matéria controvertida,
a partir da preambular e da r. sentença lavrada é que se procederá ao
reexame do litígio, de tal arte a, em refugindo ao debate, inaugural da
causa, o teor do apelo, deste tecnicamente sequer se poderá conhecer, sob
efeito até de indevida supressão do duplo grau de jurisdição, dogma
este somente excepcionável na medida da própria legalidade processual,
este o grande vetor a todo o sistema processual.
Impossibilitada fica a análise do quanto acima mencionado, pois a cuidar
de temática não discutida pelo polo autor perante o foro adequado, o E
Juízo da origem: qualquer conhecimento a respeito, então, feriria o duplo
grau de jurisdição. Precedente.
Inúmeros são os direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição
Federal : civis, individuais, políticos, de dignidade humana, relacionados
à essência da humanidade, de desenvolvimento econômico, à paz etc.
Esses direitos exigem do Estado a satisfação de necessidades e carências
individuais, focando para uma conjunção coletiva de formas de relacionamentos
socioeconômicos e de desenvolvimento.
Toda vez que falamos em medidas coativas ou restritivas, que possam causar
incômodo ou que possam ferir a dignidade, a honra e a privacidade das pessoas,
faz-se necessário reportar ao Texto Constitucional e seus princípios
reguladores.
A Constituição Federal de 1988, que trouxe muitas garantias e direitos
fundamentais, dispõe em seu artigo 5º, inciso III, a garantia da incolumidade
física e moral do indivíduo; no inciso X, o direito à vida privada e
a intimidade; e finalmente no inciso XI, o direito à inviolabilidade de
domicílio.
A questão da garantia constitucional destes princípios deve ser interpretada
como uma vontade do legislador constituinte de elevar a um status máximo os
preceitos que carecem de resguardo e aplicação incontestável, afinal,
se não fossem assegurados tais princípios, teríamos consequências
desastrosas ao Estado Democrático de Direito e ao devido processo legal,
além de gerar uma instabilidade social de resultados irreparáveis.
A relação de liberdade e coação está localizada em uma linha muito
tênue em que o Estado deve zelar pela ordem e paz da sociedade, mas, ao
mesmo tempo, deve garantir o cumprimento do ordenamento e inibir a prática
de condutas ilícitas, utilizando-se, para tanto, do poder de polícia que
lhe é inerente.
Dentro desta exposição de liberdade e coação, afigura-se controverso
o entendimento sobre até onde o Estado deve interferir no regramento e na
vida das pessoas; todavia, esta indagação tem sua resposta no próprio Texto
Constitucional, que disciplina pontos onde presente auto limitação estatal,
quando, por um lado, tem-se a garantia da inviolabilidade de domicílio,
observadas as suas exceções, porém, em contrapartida, presentes também
dispositivos que permitem ultrapassar este limite constitucional. Um
exemplo disto é o caso de declaração de estado de sítio do artigo 139
da Constituição Federal, em que o Estado poderá proceder à busca e
apreensão sem ater-se a estas garantias individuais.
Interessante destacar o que seria intimidade e privacidade, uma vez que a
primeira é decorrente da segunda : privacidade vem a ser a preservação de
atos e situações em que pessoas mantêm reserva em relação ao público;
intimidade é a proteção jurídica na defesa de lesões à vida privada
e aos atos que as pessoas queiram manter em sigilo, como exemplificam Vidal
Serrano e Luiz Alberto David de Araújo. Para eles, as relações bancárias e
os relacionamentos profissionais de um indivíduo estão dentro do círculo da
privacidade : deste modo, tanto o rol de clientes, como os segredos pessoais,
a orientação sexual e as dúvidas existenciais compõem o universo da
intimidade. (Curso de Direito Constitucional - 5ª Edição, São Paulo,
Saraiva, 2001, p.110, Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes).
A Constituição, ao disciplinar tais garantias e limites, fornece um vasto
mecanismo de proteção social, dando ênfase ao seguimento estrito de suas
formalidades.
Já principiando o próprio legislador por afirmar, no caput do art. 194,
CTN, o tom subsidiário das regras de Fiscalização ali estatuídas, naquele
capítulo, em face de tantas outras especiais regendo este ou aquele assunto
em específico, de seu parágrafo emana sua mais ampla abrangência, de modo
a submeter ao ímpeto estatal fiscalizador a toda e qualquer pessoa.
O acesso aos elementos de convicção para o trabalho fiscal, de sua parte,
tais como livros, mercadorias, arquivos e documentos em geral, da mesma forma,
vem dilargado, nos termos do caput do art. 195, CTN, afastando este ditame
regramentos normativos excludentes ou limitadores do alcance a referidas
fontes probatórias.
Desfruta a Administração, pois, de ampla liberdade investigatória, na
vasculha de elementos de convicção, na apuração dos fatos.
Tomando por base a gama de preceitos envolvendo a Fiscalização Tributária,
aqui aplicável por analogia, prevê o art. 37, § 2º, da Lei 10.711/2003,
que os Fiscais do MAPA têm livre acesso a quaisquer estabelecimentos,
documentos ou pessoas que estejam sujeitos à sua supervisão.
Como bem frisado pelo E. Juízo a quo, não restou comprovada aos autos
qualquer conduta abusiva por parte dos agentes estatais, que, no cumprimento de
seu dever funcional, solicitaram documentação à empresa, tendo analisado e
tirado cópia dos elementos que interessavam ao procedimento, colhendo provas
em escritório de Contabilidade que prestava serviços à parte apelante,
fls. 43.
Sem qualquer sentido intente a parte privada que o Estado, no exercício do
poder de polícia que lhe é inerente, para que possa empregar procedimentos de
Fiscalização, esteja munido de ordem judicial, fato este que inviabilizaria
o agir estatal, por evidente, além de assoberbar o já atulhado Judiciário,
em prejuízo amplo à coletividade.
A realização de Fiscalização difere, em muito, de procedimento de busca e
apreensão, esta sim carecedora de ordem judicial, afigurando-se equivocada
a invocação recursal de malferimento à disposição da Lei 9.296/96,
fls. 1.340, que trata de interceptação de comunicações telefônicas e
sistemas de informática, tendo sido analisados documentos arquivados no
Escritório de Contabilidade, fls. 43, repise-se.
Plena de legalidade a atuação do Ministério da Agricultura, que apurou
conduta irregular praticada pelo polo privado. Precedente.
A r. sentença mui bem flagrou a comprovação de venda irregular de sementes,
exaurindo a discussão a respeito, tanto que a parte apelante não logra
afastar referidas conclusões, mas apenas tenta "negar o inegável",
fls. 1.328-v.
Parcial conhecimento da apelação e, no que conhecida, improvida, na forma
aqui estatuída.
Ementa
AÇÃO ORDINÁRIA - APELAÇÃO INOVADORA : NÃO CONHECIMENTO -
COMERCIALIZAÇÃO DE SOJA SEM REGISTRO NO CADASTRO NACIONAL DE CULTIVARES -
PODER DE POLÍCIA ESTATAL A CONFERIR O DIREITO DE INGRESSO DE FISCAIS NO
ESTABELECIMENTO, A FIM DE QUE DOCUMENTOS E ELEMENTOS SEJAM AVERIGUADOS,
ART. 37, § 2º, DA LEI 10.711/2003 - COMETIMENTO DA INFRAÇÃO COMPROVADO
- IMPROCEDÊNCIA AO PEDIDO - PARCIAL CONHECIMENTO DA APELAÇÃO E, NO QUE
CONHECIDA, IMPROVIDA
Destaque-se que a função da análise em apelo, como de sua essência,
traduz-se em uma reapreciação do que suscitado e julgado em Primeira
Instância, em grau de apelo.
Claramente a apelação interposta, no que pertinente à ausência de menção
sobre a presença de representantes da empresa no Termo de Fiscalização, bem
como pela falta de informação da hora em que lavrado e sobre autorização
do Governo do Estado (Mato Grosso do Sul), por inexistência de relação
interestadual a justificar a atuação de agentes do MAPA, traz temas não
levantados perante o E. Juízo a quo, bastando singelo cotejo com a prefacial.
Se devolve o apelo ao Tribunal o conhecimento da matéria controvertida,
a partir da preambular e da r. sentença lavrada é que se procederá ao
reexame do litígio, de tal arte a, em refugindo ao debate, inaugural da
causa, o teor do apelo, deste tecnicamente sequer se poderá conhecer, sob
efeito até de indevida supressão do duplo grau de jurisdição, dogma
este somente excepcionável na medida da própria legalidade processual,
este o grande vetor a todo o sistema processual.
Impossibilitada fica a análise do quanto acima mencionado, pois a cuidar
de temática não discutida pelo polo autor perante o foro adequado, o E
Juízo da origem: qualquer conhecimento a respeito, então, feriria o duplo
grau de jurisdição. Precedente.
Inúmeros são os direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição
Federal : civis, individuais, políticos, de dignidade humana, relacionados
à essência da humanidade, de desenvolvimento econômico, à paz etc.
Esses direitos exigem do Estado a satisfação de necessidades e carências
individuais, focando para uma conjunção coletiva de formas de relacionamentos
socioeconômicos e de desenvolvimento.
Toda vez que falamos em medidas coativas ou restritivas, que possam causar
incômodo ou que possam ferir a dignidade, a honra e a privacidade das pessoas,
faz-se necessário reportar ao Texto Constitucional e seus princípios
reguladores.
A Constituição Federal de 1988, que trouxe muitas garantias e direitos
fundamentais, dispõe em seu artigo 5º, inciso III, a garantia da incolumidade
física e moral do indivíduo; no inciso X, o direito à vida privada e
a intimidade; e finalmente no inciso XI, o direito à inviolabilidade de
domicílio.
A questão da garantia constitucional destes princípios deve ser interpretada
como uma vontade do legislador constituinte de elevar a um status máximo os
preceitos que carecem de resguardo e aplicação incontestável, afinal,
se não fossem assegurados tais princípios, teríamos consequências
desastrosas ao Estado Democrático de Direito e ao devido processo legal,
além de gerar uma instabilidade social de resultados irreparáveis.
A relação de liberdade e coação está localizada em uma linha muito
tênue em que o Estado deve zelar pela ordem e paz da sociedade, mas, ao
mesmo tempo, deve garantir o cumprimento do ordenamento e inibir a prática
de condutas ilícitas, utilizando-se, para tanto, do poder de polícia que
lhe é inerente.
Dentro desta exposição de liberdade e coação, afigura-se controverso
o entendimento sobre até onde o Estado deve interferir no regramento e na
vida das pessoas; todavia, esta indagação tem sua resposta no próprio Texto
Constitucional, que disciplina pontos onde presente auto limitação estatal,
quando, por um lado, tem-se a garantia da inviolabilidade de domicílio,
observadas as suas exceções, porém, em contrapartida, presentes também
dispositivos que permitem ultrapassar este limite constitucional. Um
exemplo disto é o caso de declaração de estado de sítio do artigo 139
da Constituição Federal, em que o Estado poderá proceder à busca e
apreensão sem ater-se a estas garantias individuais.
Interessante destacar o que seria intimidade e privacidade, uma vez que a
primeira é decorrente da segunda : privacidade vem a ser a preservação de
atos e situações em que pessoas mantêm reserva em relação ao público;
intimidade é a proteção jurídica na defesa de lesões à vida privada
e aos atos que as pessoas queiram manter em sigilo, como exemplificam Vidal
Serrano e Luiz Alberto David de Araújo. Para eles, as relações bancárias e
os relacionamentos profissionais de um indivíduo estão dentro do círculo da
privacidade : deste modo, tanto o rol de clientes, como os segredos pessoais,
a orientação sexual e as dúvidas existenciais compõem o universo da
intimidade. (Curso de Direito Constitucional - 5ª Edição, São Paulo,
Saraiva, 2001, p.110, Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes).
A Constituição, ao disciplinar tais garantias e limites, fornece um vasto
mecanismo de proteção social, dando ênfase ao seguimento estrito de suas
formalidades.
Já principiando o próprio legislador por afirmar, no caput do art. 194,
CTN, o tom subsidiário das regras de Fiscalização ali estatuídas, naquele
capítulo, em face de tantas outras especiais regendo este ou aquele assunto
em específico, de seu parágrafo emana sua mais ampla abrangência, de modo
a submeter ao ímpeto estatal fiscalizador a toda e qualquer pessoa.
O acesso aos elementos de convicção para o trabalho fiscal, de sua parte,
tais como livros, mercadorias, arquivos e documentos em geral, da mesma forma,
vem dilargado, nos termos do caput do art. 195, CTN, afastando este ditame
regramentos normativos excludentes ou limitadores do alcance a referidas
fontes probatórias.
Desfruta a Administração, pois, de ampla liberdade investigatória, na
vasculha de elementos de convicção, na apuração dos fatos.
Tomando por base a gama de preceitos envolvendo a Fiscalização Tributária,
aqui aplicável por analogia, prevê o art. 37, § 2º, da Lei 10.711/2003,
que os Fiscais do MAPA têm livre acesso a quaisquer estabelecimentos,
documentos ou pessoas que estejam sujeitos à sua supervisão.
Como bem frisado pelo E. Juízo a quo, não restou comprovada aos autos
qualquer conduta abusiva por parte dos agentes estatais, que, no cumprimento de
seu dever funcional, solicitaram documentação à empresa, tendo analisado e
tirado cópia dos elementos que interessavam ao procedimento, colhendo provas
em escritório de Contabilidade que prestava serviços à parte apelante,
fls. 43.
Sem qualquer sentido intente a parte privada que o Estado, no exercício do
poder de polícia que lhe é inerente, para que possa empregar procedimentos de
Fiscalização, esteja munido de ordem judicial, fato este que inviabilizaria
o agir estatal, por evidente, além de assoberbar o já atulhado Judiciário,
em prejuízo amplo à coletividade.
A realização de Fiscalização difere, em muito, de procedimento de busca e
apreensão, esta sim carecedora de ordem judicial, afigurando-se equivocada
a invocação recursal de malferimento à disposição da Lei 9.296/96,
fls. 1.340, que trata de interceptação de comunicações telefônicas e
sistemas de informática, tendo sido analisados documentos arquivados no
Escritório de Contabilidade, fls. 43, repise-se.
Plena de legalidade a atuação do Ministério da Agricultura, que apurou
conduta irregular praticada pelo polo privado. Precedente.
A r. sentença mui bem flagrou a comprovação de venda irregular de sementes,
exaurindo a discussão a respeito, tanto que a parte apelante não logra
afastar referidas conclusões, mas apenas tenta "negar o inegável",
fls. 1.328-v.
Parcial conhecimento da apelação e, no que conhecida, improvida, na forma
aqui estatuída.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, conhecer parcialmente da apelação e, no que conhecida,
negar-lhe provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
06/12/2017
Data da Publicação
:
15/12/2017
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1895137
Órgão Julgador
:
TERCEIRA TURMA
Relator(a)
:
JUIZ CONVOCADO SILVA NETO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Doutrina
:
Autor: LUIZ ALBERTO DAVID ARAÚJO
Título: CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL SÃO PAULO , Editora:
SARAIVA , Ed.: 5 2001 , Pag.: 110
Referência
legislativa
:
LEG-FED LEI-10711 ANO-2003 ART-37 PAR-2 ART-5 INC-3 INC-10 INC-11 ART-139
***** CTN-66 CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL
LEG-FED LEI-5172 ANO-1966 ART-194 ART-195
LEG-FED LEI-9296 ANO-1996
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/12/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão