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Jurisprudência


TRF3 0000407-87.2009.4.03.6105 00004078720094036105

Ementa
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DOENÇA OCUPACIONAL. ASSÉDIO. MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. PRESUNÇÃO DE CULPA. NEXO CAUSAL VERIFICADO. DANO MORAL PELA DEBILIDADE FÍSICA. ASSÉDIO NÃO DEMONSTRADO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 1. A questão posta nos autos diz respeito a pedido de indenização por danos morais, pleiteada por Nilma Helena Viscardi em face da União Federal, por ter desenvolvido doença ocupacional e por ter sofrido assédio quando laborava junto ao Ministério Público do Trabalho, em razão das condições precárias de trabalho do local. 2. A Magistrada a quo julgou a ação improcedente, por entender que não restou configurada a responsabilidade civil do Estado, não se identificando nexo de causalidade. Ainda, afirmou descaber indenização por já ter a autora obtido aposentadoria por invalidez. Em suas razões recursais, a autora requereu a apreciação do agravo retido, interposto em razão do indeferimento de produção da prova pericial. Ainda, suscitou preliminar de cerceamento de defesa por ter sido desconsiderado o depoimento de uma das testemunhas. No mais, defendeu a responsabilidade do Estado pelo acometimento de doença ocupacional e por sofrimento de assédio no âmbito de seu trabalho. 3. Passo, então, à análise do agravo retido. A demandante requereu a produção de prova pericial médica, a fim de que pudesse ser atestada sua condição clínica e comprovada a relação de causalidade entre suas atividades laborais e as patologias apresentadas. Contudo, a Julgadora entendeu ser desnecessária a referida prova, tendo em vista a farta documentação acostada aos autos. 4. Não vislumbro cerceamento de defesa. Como sabido, o destinatário da prova é o juiz, que tem capacidade para avaliar, dentro do quadro probatório existente, quais diligências serão úteis ao bom desenvolvimento do processo, e quais diligências serão meramente protelatórias, de modo que não é todo indeferimento de produção de prova que provoca automaticamente cerceamento de defesa. Precedentes. 5. Nesse contexto, destaca-se que a proponente juntou aos autos diversos documentos (fls. 52/94) aptos a atestarem sua condição de saúde, inclusive perícias médicas já realizadas anteriormente. Portanto, não verifico a existência de nulidade processual por cerceamento de defesa, devendo ser negado provimento ao agravo retido. 6. Ainda no âmbito das preliminares, passo à análise do suposto cerceamento de defesa por desconsideração do depoimento da testemunha Maria Geny Brino Mattus. Novamente, não vislumbro cerceamento de defesa. Verifica-se que o ordenamento brasileiro adotou o princípio da instrumentalidade das formas e, em repúdio a formalismos inúteis, determinou que nenhuma nulidade pode ser proclamada se não houver prejuízo às partes. É pertinente, portanto, considerar que, no caso dos autos, a testemunha foi ouvida, afirmando a Magistrada a quo somente que avaliaria o depoimento em questão com reservas, por ter a colega de trabalho aforado ação idêntica à presente demanda. 7. Não há que se falar em desconsideração do depoimento prestado e nem em prejuízo à autora em decorrência modo como foi promovida a contradita, uma vez que, pelo próprio princípio do livre convencimento motivado, a Magistrada poderia ter procedido da mesma maneira. É de ser afastada a preliminar de cerceamento de defesa. 8. O mérito da discussão recai sobre o tema da responsabilidade civil do Estado, de modo que se fazem pertinentes algumas considerações doutrinárias e jurisprudenciais. São elementos da responsabilidade civil a ação ou omissão do agente, a culpa, o nexo causal e o dano, do qual surge o dever de indenizar. 9. No direito brasileiro, a responsabilidade civil do Estado é, em regra, objetiva, isto é, prescinde da comprovação de culpa do agente, bastando-se que se comprove o nexo causal entre a conduta do agente e o dano. Está consagrada na norma do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. Entretanto, nos casos em que verificados danos por omissão, só deve ser responsabilizado o Estado quando, embora obrigado a impedir o dano, descumpre o seu dever legal. Em outros termos, nos atos omissivos, só há responsabilidade quando decorrente de ato ilícito. 10. É evidente que, no caso dos autos, aplica-se o instituto da responsabilidade subjetiva, posto que a suposta conduta estatal é omissiva e se traduz na não observância das normas de segurança no trabalho. 11. É certo tratar-se de obrigação do empregador preservar a incolumidade física e psicológica do em pregado no ambiente de trabalho, cumprindo e fazendo cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho e instruindo os empregados quanto às precauções a tomar no sentido de evitar a acidentes de trabalho e doenças ocupacionais (art. 7º, XXII, da CF). 12. Nesse diapasão, o STJ manifestou-se no sentido da presunção relativa de culpa do empregador, considerando que na responsabilidade contratual, para obtenção de perdas e danos o contratante não precisa demonstrar a culpa do inadimplente, bastando a prova do descumprimento do contrato, caberia ao caberia ao empregador o ônus da prova de alguma causa excludente do dever de indenizar. Entende-se que, no caso dos autos, mesmo não se tratando de contrato de trabalho, é nítida a relação de hipossuficiência da servidora pública frente ao Ministério Público do Trabalho, e, portanto, essa vulnerabilidade deve ser considerada no momento de valoração da prova. 13. O depoimento da testemunha Yara Therezinha de Lima Santos (fls. 346/347) corrobora a informação de que o volume de trabalho era enorme, chegando inclusive a ser foco de reportagem midiática. Ainda, esclarece que, em razão do número elevado de processos, estes eram armazenados em uma sala, ao lado da garagem, sem janela ou ventilação, na qual tanto a depoente como a autora realizavam trabalhos em época de mutirão. Confirma que o trabalho era manual, e exercido sem ajudantes. É igualmente no mesmo sentido o depoimento da testemunha Maria Geny Brino Mattus. 14. A União Federal, por outro lado, não trouxe aos autos prova que pudesse demonstrar o cumprimento das normas de saúde e segurança no trabalho, como, por exemplo, o fomento de adequadas condições ergonômicas no ambiente laborativo. 15. Pois bem, conforme asseverou a Magistrada de piso, é incontroversa a incapacidade laborativa da autora por acometimento de doença ocupacional, tendo em vista, inclusive, sua aposentadoria por invalidez. Por outro lado, não se vislumbra conteúdo probatório suficiente para assegurar a ocorrência de assédio. Identifico, portanto, o nexo de causalidade entre a omissão da ré e o prejuízo suportado pela autora, referente desenvolvimento de doença ocupacional. 16. Ainda sobre o dano moral, a doutrina o conceitua enquanto "dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. (Cavalieri, Sérgio. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 549)" 17. Ademais, sabe-se que, em alguns casos, o dever de indenizar dispensa a prova objetiva do abalo moral, exigindo-se como prova apenas o fato ensejador do dano. Nas presentes circunstâncias, é nítido o dano moral sofrido pela demandante devida às dificuldades funcionais acarretadas que se estenderão pelo resto de sua vida. 18. Passa-se, então, à valoração do quantum indenizatório. Acerca da fixação da indenização por danos morais, é sabido que seu arbitramento deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, observando ainda a condição social e viabilidade econômica do ofensor e do ofendido, e a proporcionalidade à ofensa, conforme o grau de culpa e gravidade do dano, sem, contudo, incorrer em enriquecimento ilícito. 19. No corrente caso, em se tratando de pessoa acometida por deficiência permanente e incapacitante até das atividades normais do cotidiano, entendo adequada a fixação de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais, incidindo correção monetária a partir desta decisão (Súmula 362 do STJ), e juros de mora a partir do evento danoso (Súmula 54 do STJ). 20. Com base nas circunstâncias que envolveram a demanda, nos termos do artigo 20, §§ 3º e 4º, do antigo Código de Processo Civil, fixo os honorários advocatícios, em favor da autora, em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. 21. Agravo retido desprovido e apelação parcialmente provida.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido e dar parcial provimento à apelação, para afastar a preliminar de cerceamento de defesa, e condenar a União Federal ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de indenização por danos morais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 02/06/2016
Data da Publicação : 10/06/2016
Classe/Assunto : AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1640322
Órgão Julgador : TERCEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/06/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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