TRF3 0000447-29.2016.4.03.6136 00004472920164036136
PENAL. PROCESSUAL PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITVAS COMPROVADAS. DOLO
COMPROVADO. CRIMES DO ARTIGO 29, PARÁGRAFO 1º, INCISO III, DA LEI N.º
9.605/1998 E ART. 296, § 1º, I E III, DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO
DA INSIGNIFICÂNCIA AFASTADO. CONDENAÇÃO. PERDÃO JUDICIAL NÃO
APLICÁVEL. DOSIMETRIA DA PENA. SUBSTITUIÇÃO DE PENA RESTRITIVA DE
DIREITOS. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROVIDA.
- Princípio da Insignificância. O princípio da insignificância demanda ser
interpretado à luz dos postulados da mínima intervenção do Direito Penal
e da ultima ratio como forma de afastar a aplicação do Direito Penal a fatos
de menor importância (e que, portanto, podem ser debelados com supedâneo nos
demais ramos da Ciência Jurídica - fragmentariedade do Direito Penal). Com
relação ao delito do art. 29, § 1º, inciso I, da Lei 9.605/1998,
consigno que, no trato das questões que envolvem o meio ambiente, deve-se
ter extrema cautela com a aplicação do princípio da insignificância,
devendo esta ficar reservada a situações excepcionalíssimas, em que sejam
ínfimas a ofensividade e a reprovabilidade social da conduta. Não me parece
ser esta a hipótese dos autos, de modo que assiste razão ao Ministério
Público Federal, ao apontar que a manutenção de quatro espécimes da
fauna silvestre desprovidos da devida permissão, licença ou autorização
da autoridade competente não pode ser considerada irrelevante penalmente,
ainda mais quando praticado em concurso com outro crime. Como bem ressalta
o Ministério Público Federal (fl. 148), "o bem jurídico tutelado não
se limita a proteção daqueles exemplares individualmente considerados,
mas o ecossistema como um todo, sob a perspectiva do direito fundamental
a um meio ambiente ecologicamente equilibrado". Com efeito, na natureza,
nada é isolado ou independente, tudo depende de tudo e se relaciona com
tudo, de modo que um dano que, isoladamente, possa parecer ínfimo, pode se
revelar capaz de alcançar todo um ecossistema, por exemplo. Ademais, não
se deve perder de vista que o escopo da norma é impedir a atitude lesiva
ao meio ambiente, devendo-se evitar que a impunidade leve à proliferação
de condutas a ele danosas. O objetivo é proteger não apenas as gerações
presentes, mas também as futuras (inteligência do art. 225, caput, da CF),
de modo que a aplicação do princípio da insignificância deve se restringir
a casos efetivamente diminutos. Logo, afasto o reconhecimento da atipicidade
da conduta com base no referido princípio.
- A materialidade e autoria delitiva atribuída ao réu, bem como o elemento
subjetivo exigido pelo tipo penal, igualmente restaram demonstrados pelo
conjunto probatório carreado aos autos.
- O Laudo de Perícia Criminal (fls. 47/52) concluiu que o referido
material não estava em conformidade com as especificações exigidas em
lei, apresentando diâmetros interno e externo e a espessura da parede fora
dos padrões oficiais, observando, ainda, que a anilha de nº OA 2,8 387474
estava seccionada próximo à palavra IBAMA.
- Demais disso e ao contrário do alegado, o réu tinha conhecimento de que
a guarda de ave silvestre da fauna brasileira, em cativeiro, sem a devida
autorização, era ilegal. O acusado é criador passeriforme há mais de
10 (dez) anos da data dos fatos, consoante afirmado em seu interrogatório
policial, inclusive, mantenedor de registro perante o IBAMA, assim sendo, com
conhecimento acima do homem médio. Destarte, tinha a ciência da necessidade
da manutenção atualizada dos dados no SISPASS, cuja responsabilidade é
do criador das aves.
- O conjunto probatório foi conclusivo no sentido de que a conduta perpetrada
pela ré amolda-se perfeitamente aos tipos penais delineado nos artigos 29,
§1º, III, da Lei n.º 9.605/1998 e art. 296, § 1º, incisos I e III,
do Código Penal.
- Incabível a concessão de perdão judicial previsto no art. 29, § 2º, da
Lei nº 9.605/98, já que as condutas praticadas pela acusada extrapolaram a
simples guarda doméstica de animais silvestres não ameaçados de extinção,
alcançando, inclusive, o bem jurídico da fé pública em razão do uso de
anilhas falsificadas ou adulteradas.
- Ausentes atenuantes, agravantes, causas de aumento ou diminuição, ambos
os delitos restam fixados no mínimo legal.
- A pena resta definitivamente fixada em 02 (dois) anos de reclusão e 06
(seis) meses de detenção, a ser cumprida em regime inicial ABERTO, nos termos
do art. 33, § 2º, c, do Código Penal, e pagamento de 20 (vinte) dias-multa.
- Preenchidos os requisitos do artigo 44 do Código Penal, deve ser
substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas
de direito, consistentes na prestação de serviços à comunidade ou a
entidades públicas, na forma a ser estabelecida pelo Juízo da Execução,
pelo mesmo prazo da pena privativa de liberdade e, prestação pecuniária na
quantia de 01 (um) salário mínimo, ao tempo do pagamento, a ser destinada
à entidade beneficente.
- Apelação do Ministério Público Federal provida.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITVAS COMPROVADAS. DOLO
COMPROVADO. CRIMES DO ARTIGO 29, PARÁGRAFO 1º, INCISO III, DA LEI N.º
9.605/1998 E ART. 296, § 1º, I E III, DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO
DA INSIGNIFICÂNCIA AFASTADO. CONDENAÇÃO. PERDÃO JUDICIAL NÃO
APLICÁVEL. DOSIMETRIA DA PENA. SUBSTITUIÇÃO DE PENA RESTRITIVA DE
DIREITOS. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROVIDA.
- Princípio da Insignificância. O princípio da insignificância demanda ser
interpretado à luz dos postulados da mínima intervenção do Direito Penal
e da ultima ratio como forma de afastar a aplicação do Direito Penal a fatos
de menor importância (e que, portanto, podem ser debelados com supedâneo nos
demais ramos da Ciência Jurídica - fragmentariedade do Direito Penal). Com
relação ao delito do art. 29, § 1º, inciso I, da Lei 9.605/1998,
consigno que, no trato das questões que envolvem o meio ambiente, deve-se
ter extrema cautela com a aplicação do princípio da insignificância,
devendo esta ficar reservada a situações excepcionalíssimas, em que sejam
ínfimas a ofensividade e a reprovabilidade social da conduta. Não me parece
ser esta a hipótese dos autos, de modo que assiste razão ao Ministério
Público Federal, ao apontar que a manutenção de quatro espécimes da
fauna silvestre desprovidos da devida permissão, licença ou autorização
da autoridade competente não pode ser considerada irrelevante penalmente,
ainda mais quando praticado em concurso com outro crime. Como bem ressalta
o Ministério Público Federal (fl. 148), "o bem jurídico tutelado não
se limita a proteção daqueles exemplares individualmente considerados,
mas o ecossistema como um todo, sob a perspectiva do direito fundamental
a um meio ambiente ecologicamente equilibrado". Com efeito, na natureza,
nada é isolado ou independente, tudo depende de tudo e se relaciona com
tudo, de modo que um dano que, isoladamente, possa parecer ínfimo, pode se
revelar capaz de alcançar todo um ecossistema, por exemplo. Ademais, não
se deve perder de vista que o escopo da norma é impedir a atitude lesiva
ao meio ambiente, devendo-se evitar que a impunidade leve à proliferação
de condutas a ele danosas. O objetivo é proteger não apenas as gerações
presentes, mas também as futuras (inteligência do art. 225, caput, da CF),
de modo que a aplicação do princípio da insignificância deve se restringir
a casos efetivamente diminutos. Logo, afasto o reconhecimento da atipicidade
da conduta com base no referido princípio.
- A materialidade e autoria delitiva atribuída ao réu, bem como o elemento
subjetivo exigido pelo tipo penal, igualmente restaram demonstrados pelo
conjunto probatório carreado aos autos.
- O Laudo de Perícia Criminal (fls. 47/52) concluiu que o referido
material não estava em conformidade com as especificações exigidas em
lei, apresentando diâmetros interno e externo e a espessura da parede fora
dos padrões oficiais, observando, ainda, que a anilha de nº OA 2,8 387474
estava seccionada próximo à palavra IBAMA.
- Demais disso e ao contrário do alegado, o réu tinha conhecimento de que
a guarda de ave silvestre da fauna brasileira, em cativeiro, sem a devida
autorização, era ilegal. O acusado é criador passeriforme há mais de
10 (dez) anos da data dos fatos, consoante afirmado em seu interrogatório
policial, inclusive, mantenedor de registro perante o IBAMA, assim sendo, com
conhecimento acima do homem médio. Destarte, tinha a ciência da necessidade
da manutenção atualizada dos dados no SISPASS, cuja responsabilidade é
do criador das aves.
- O conjunto probatório foi conclusivo no sentido de que a conduta perpetrada
pela ré amolda-se perfeitamente aos tipos penais delineado nos artigos 29,
§1º, III, da Lei n.º 9.605/1998 e art. 296, § 1º, incisos I e III,
do Código Penal.
- Incabível a concessão de perdão judicial previsto no art. 29, § 2º, da
Lei nº 9.605/98, já que as condutas praticadas pela acusada extrapolaram a
simples guarda doméstica de animais silvestres não ameaçados de extinção,
alcançando, inclusive, o bem jurídico da fé pública em razão do uso de
anilhas falsificadas ou adulteradas.
- Ausentes atenuantes, agravantes, causas de aumento ou diminuição, ambos
os delitos restam fixados no mínimo legal.
- A pena resta definitivamente fixada em 02 (dois) anos de reclusão e 06
(seis) meses de detenção, a ser cumprida em regime inicial ABERTO, nos termos
do art. 33, § 2º, c, do Código Penal, e pagamento de 20 (vinte) dias-multa.
- Preenchidos os requisitos do artigo 44 do Código Penal, deve ser
substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas
de direito, consistentes na prestação de serviços à comunidade ou a
entidades públicas, na forma a ser estabelecida pelo Juízo da Execução,
pelo mesmo prazo da pena privativa de liberdade e, prestação pecuniária na
quantia de 01 (um) salário mínimo, ao tempo do pagamento, a ser destinada
à entidade beneficente.
- Apelação do Ministério Público Federal provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, DAR PROVIMENTO à Apelação do Ministério Público Federal
para condenar GERALDO MELUZZO pelos delitos do art. 29, § 1º, inciso III,
da Lei nº 9.605/1998, e art. 296, 1º, incisos I e III, do Código Penal;
restando sua pena definitiva em 02 (dois) anos de reclusão e 06 (seis)
meses de detenção, a ser cumprida em regime inicial ABERTO, nos termos do
art. 33, § 2º, c, do Código Penal, e pagamento de 20 (vinte) dias-multa,
substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas
de direito, consistentes na prestação de serviços à comunidade ou a
entidades públicas, na forma a ser estabelecida pelo Juízo da Execução,
pelo mesmo prazo da pena privativa de liberdade e, prestação pecuniária na
quantia de 01 (um) salário mínimo, ao tempo do pagamento, a ser destinada
à entidade beneficente, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
19/02/2019
Data da Publicação
:
28/02/2019
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 72553
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED LEI-9605 ANO-1998 ART-29 PAR-1 PAR-2
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-225
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-296 PAR-1 INC-3 ART-33 PAR-2 LET-C ART-44
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/02/2019
..FONTE_REPUBLICACAO:
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