TRF3 0000628-37.2013.4.03.6006 00006283720134036006
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA. GUARDA DE
FATO. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- Pedido de pensão pela morte da avó.
- Constam dos autos: certidão de óbito da avó do requerente, ocorrido em
31.03.2012, em razão de "falência de múltiplos órgãos, desnutrição,
neoplasia metastática, tabagismo" - a falecida foi qualificada como
solteira, com 71 amos de idade, residente na R. Copaíba, 275, Ipe, Naviraí;
certidão de nascimento do autor, em 12.01.2001; comunicado de decisão que
indeferiu o requerimento administrativo, formulado em 07.02.2013; petição
solicitando homologação de acordo de guarda, alimentos e direito de
visitas, protocolado pelos pais do autor em 07.04.2010 junto à Vara Única
da Comarca de Itaquiraí, MS, na qual mencionam ser pais de quatro menores,
entre eles o autor, sendo que o requerente encontrava-se então sob guarda
de fato da avó paterna, em outro município, motivo pelo qual não seriam
juntados os documentos dele e ele não seria incluído nas disposições da
avença - a guarda dos outros três menores ficaria com a mãe, e foi fixado
o pagamento de pensão pelo pai apenas a estes três menores; declaração
emitida pela Escola Municipal de Ensino Fundamental Prof. Maria de Lourdes
Aquino Sotana, Prefeitura Municipal de Naviraí, informando que o autor
esteve matriculado naquela unidade escolar de 2007 até 02.08.2011, sendo
que a responsável pelo acompanhamento escolar do aluno era a avó paterna,
Maria Matias da Silva, a falecida - a declaração veio acompanhada dos
respectivos requerimentos de matricula, todos assinados pela falecida,
mencionando endereço na R. Copaíba, 275, Ipê, e de relatório escolar
sem data, assinado por professora, que menciona entrevista com a avó, que
declarou que o autor sofreu maus tratos quando criança e presenciou brigas
violentas entre os pais - consta, ainda, que o autor residia com a avó,
sendo o pai muito ausente da vida do filho; ficha de atendimento do autor
junto à Gerência Municipal de Saúde de Naviraí, em 12.01.2001, mencionando
residência na R. Copaíba, 275; laudo de eletroencefalograma realizado no
autor em 23.05.2008, motivado pela existência de déficit escolar, seguido
de prescrição de medicamentos; extratos do sistema Dataprev, verificando-se
que a falecida recebeu aposentadoria por idade rural de 14.02.1996 até
a morte. Nenhum vínculo empregatício foi relacionado quanto à mãe
do requerente. Quanto ao pai do requerente, foram relacionados vínculos
empregatícios mantidos de 01.02.2002 a 15.02.2002, 01.08.2008 a data não
especificada, 01.09.2011 a 02.03.2012 e de 01.06.2012 a 07.2013.
- Em audiência, foram tomados os depoimentos da mãe do autor e de duas
testemunhas. A mãe do autor declarou que o filho morava com a avó desde os
cinco anos de idade, a pedido da falecida, pois os pais não tinham muitas
condições, estavam em crise no casamento e tinham outros filhos. A avó
possuía melhores condições de cuidar dele, que nunca mais voltou a morar
om a depoente. O pai do autor não colaborava com o sustento do filho, e a
depoente também não enviava nenhum dinheiro. Após a morte da avó, o pai
do autor levou-o para casa, e depois para a casa da cunhada da depoente,
que queria ficar com ele. A depoente foi busca-lo, mas a cunhada não quis
entrega-lo, motivo pelo qual buscou o Conselho tutelar. Além do autor, a
autora tem mais seis filhos, sendo uma mais velha que o autor, seguida de
três filhos com o pai do autor e dois outros filhos que nasceram após a
separação. A separação ocorreu três anos após o autor ter ido morar
com a avó.
- As testemunhas declararam que o falecido morava com a avó, sendo os dois
os únicos habitantes da casa. Segundo uma das testemunhas, a falecida dizia
que não queria morrer até o neto "virar homem", não queria deixa-lo, e
quem tinha amor pela criança era ela, e não os pais. Mencionou que o pai
não levava nada para ajudar na criação e que a avó levava e buscava o
autor na escola, dizendo à depoente que gastava toda a aposentadoria com o
neto. A testemunha afirmou, ainda, que o autor estudou na APAE porque tinha
problemas, e que a avó queria cria-lo devido a estes problemas.
- A falecida recebia aposentadoria por idade por ocasião da morte, não se
cogitando que não ostentasse a qualidade de segurada.
- O conjunto probatório indica que o autor encontrava-se sob a guarda de
fato da de cujus desde os cinco anos de idade, ou seja, desde 2006.
- Em que pese a alteração legislativa (Lei nº 9.528, de 10.12.1997),
inexistem óbices substanciais à inclusão do menor sob guarda como
dependente do guardião segurado, em face dos mandamentos constitucionais de
proteção integral e prioritária à criança e ao adolescente, inclusive
com a garantia de direitos previdenciários (art. 227, § 3º, II, da CF);
há de se prestigiar o acolhimento do menor, sob a forma de guarda, nos
termos do art. 227, §3º, VI, da Magna Carta. O Estatuto da Criança e
do Adolescente, em seu art. 33, § 3º, dispõe que "a guarda confere à
criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e
efeitos de direito, inclusive previdenciários".
- Similitude entre os institutos da tutela e da guarda, por se destinarem à
proteção da criança ou adolescente que, por alguma das razões legais,
não tem, em sua família originária, a garantia dos direitos à vida
e desenvolvimento plenos. A finalidade protetiva permite incluir o menor
sob guarda na expressão "menor tutelado" do § 2º do art. 16 da Lei nº
8.213/91.
- A possibilidade de inscrição do menor sob guarda não afasta a necessária
comprovação da dependência econômica, em relação ao segurado guardião,
nas relações estabelecidas sob a égide da Medida Provisória nº 1.523,
de 11.10.1996, e suas posteriores reedições, que culminaram na Lei nº
9.528/97.
- O conjunto probatório indica que o autor era criança com problemas de
saúde e efetivamente cuidada pela avó, que era quem acompanhava sua vida
escolar, sua saúde e providenciava seu sustento, sem a ajuda dos pais do
requerente. Após a morte da avó, o autor só passou a estar sob os cuidados
da mãe depois de algum tempo, passando antes um curto período com o pai,
que terminou por deixa-lo com uma tia, sendo ao final, ao que parece,
necessária a intervenção do Conselho Tutelar para regularização da
situação. A mãe não conta com qualquer renda noticiada nos autos e
possui outros seis filhos. Enfim, tudo indica que o autor realmente era
cuidado pela avó e guardiã.
- Comprovado o preenchimento dos requisitos legais para concessão de pensão
por morte, o direito que persegue o requerente merece ser reconhecido.
- Considerando que a avó do autor faleceu em 31.03.2012 e que só foi
formulado requerimento administrativo em 07.02.2013, deveriam ser aplicadas
as regras segundo as modificações introduzidas pela Lei nº 9.528/97,
sendo devido o benefício com termo inicial na data do requerimento
administrativo. Todavia, o termo inicial do benefício deve ser fixado na
data do óbito da segurada, porquanto o trintídio do art. 74 da Lei nº
8.213/91 não flui contra os absolutamente incapazes, caso do requerente.
- A renda mensal inicial será calculada de acordo com o art. 75, da Lei
nº 8.213/91.
- A correção monetária e os juros moratórios incidirão nos termos do
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
em vigor por ocasião da execução do julgado.
- A verba honorária deve ser fixada em 10% sobre o valor da condenação,
até a data desta decisão, considerando que o pedido foi julgado improcedente
pelo juízo "a quo".
- As Autarquias Federais são isentas de custas, cabendo somente quando em
reembolso.
- Cuidando-se de prestação de natureza alimentar, presentes os pressupostos
do art. 300 c.c. 497 do CPC, é possível a antecipação da tutela.
- Apelo da parte autora parcialmente provido.
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA. GUARDA DE
FATO. PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- Pedido de pensão pela morte da avó.
- Constam dos autos: certidão de óbito da avó do requerente, ocorrido em
31.03.2012, em razão de "falência de múltiplos órgãos, desnutrição,
neoplasia metastática, tabagismo" - a falecida foi qualificada como
solteira, com 71 amos de idade, residente na R. Copaíba, 275, Ipe, Naviraí;
certidão de nascimento do autor, em 12.01.2001; comunicado de decisão que
indeferiu o requerimento administrativo, formulado em 07.02.2013; petição
solicitando homologação de acordo de guarda, alimentos e direito de
visitas, protocolado pelos pais do autor em 07.04.2010 junto à Vara Única
da Comarca de Itaquiraí, MS, na qual mencionam ser pais de quatro menores,
entre eles o autor, sendo que o requerente encontrava-se então sob guarda
de fato da avó paterna, em outro município, motivo pelo qual não seriam
juntados os documentos dele e ele não seria incluído nas disposições da
avença - a guarda dos outros três menores ficaria com a mãe, e foi fixado
o pagamento de pensão pelo pai apenas a estes três menores; declaração
emitida pela Escola Municipal de Ensino Fundamental Prof. Maria de Lourdes
Aquino Sotana, Prefeitura Municipal de Naviraí, informando que o autor
esteve matriculado naquela unidade escolar de 2007 até 02.08.2011, sendo
que a responsável pelo acompanhamento escolar do aluno era a avó paterna,
Maria Matias da Silva, a falecida - a declaração veio acompanhada dos
respectivos requerimentos de matricula, todos assinados pela falecida,
mencionando endereço na R. Copaíba, 275, Ipê, e de relatório escolar
sem data, assinado por professora, que menciona entrevista com a avó, que
declarou que o autor sofreu maus tratos quando criança e presenciou brigas
violentas entre os pais - consta, ainda, que o autor residia com a avó,
sendo o pai muito ausente da vida do filho; ficha de atendimento do autor
junto à Gerência Municipal de Saúde de Naviraí, em 12.01.2001, mencionando
residência na R. Copaíba, 275; laudo de eletroencefalograma realizado no
autor em 23.05.2008, motivado pela existência de déficit escolar, seguido
de prescrição de medicamentos; extratos do sistema Dataprev, verificando-se
que a falecida recebeu aposentadoria por idade rural de 14.02.1996 até
a morte. Nenhum vínculo empregatício foi relacionado quanto à mãe
do requerente. Quanto ao pai do requerente, foram relacionados vínculos
empregatícios mantidos de 01.02.2002 a 15.02.2002, 01.08.2008 a data não
especificada, 01.09.2011 a 02.03.2012 e de 01.06.2012 a 07.2013.
- Em audiência, foram tomados os depoimentos da mãe do autor e de duas
testemunhas. A mãe do autor declarou que o filho morava com a avó desde os
cinco anos de idade, a pedido da falecida, pois os pais não tinham muitas
condições, estavam em crise no casamento e tinham outros filhos. A avó
possuía melhores condições de cuidar dele, que nunca mais voltou a morar
om a depoente. O pai do autor não colaborava com o sustento do filho, e a
depoente também não enviava nenhum dinheiro. Após a morte da avó, o pai
do autor levou-o para casa, e depois para a casa da cunhada da depoente,
que queria ficar com ele. A depoente foi busca-lo, mas a cunhada não quis
entrega-lo, motivo pelo qual buscou o Conselho tutelar. Além do autor, a
autora tem mais seis filhos, sendo uma mais velha que o autor, seguida de
três filhos com o pai do autor e dois outros filhos que nasceram após a
separação. A separação ocorreu três anos após o autor ter ido morar
com a avó.
- As testemunhas declararam que o falecido morava com a avó, sendo os dois
os únicos habitantes da casa. Segundo uma das testemunhas, a falecida dizia
que não queria morrer até o neto "virar homem", não queria deixa-lo, e
quem tinha amor pela criança era ela, e não os pais. Mencionou que o pai
não levava nada para ajudar na criação e que a avó levava e buscava o
autor na escola, dizendo à depoente que gastava toda a aposentadoria com o
neto. A testemunha afirmou, ainda, que o autor estudou na APAE porque tinha
problemas, e que a avó queria cria-lo devido a estes problemas.
- A falecida recebia aposentadoria por idade por ocasião da morte, não se
cogitando que não ostentasse a qualidade de segurada.
- O conjunto probatório indica que o autor encontrava-se sob a guarda de
fato da de cujus desde os cinco anos de idade, ou seja, desde 2006.
- Em que pese a alteração legislativa (Lei nº 9.528, de 10.12.1997),
inexistem óbices substanciais à inclusão do menor sob guarda como
dependente do guardião segurado, em face dos mandamentos constitucionais de
proteção integral e prioritária à criança e ao adolescente, inclusive
com a garantia de direitos previdenciários (art. 227, § 3º, II, da CF);
há de se prestigiar o acolhimento do menor, sob a forma de guarda, nos
termos do art. 227, §3º, VI, da Magna Carta. O Estatuto da Criança e
do Adolescente, em seu art. 33, § 3º, dispõe que "a guarda confere à
criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e
efeitos de direito, inclusive previdenciários".
- Similitude entre os institutos da tutela e da guarda, por se destinarem à
proteção da criança ou adolescente que, por alguma das razões legais,
não tem, em sua família originária, a garantia dos direitos à vida
e desenvolvimento plenos. A finalidade protetiva permite incluir o menor
sob guarda na expressão "menor tutelado" do § 2º do art. 16 da Lei nº
8.213/91.
- A possibilidade de inscrição do menor sob guarda não afasta a necessária
comprovação da dependência econômica, em relação ao segurado guardião,
nas relações estabelecidas sob a égide da Medida Provisória nº 1.523,
de 11.10.1996, e suas posteriores reedições, que culminaram na Lei nº
9.528/97.
- O conjunto probatório indica que o autor era criança com problemas de
saúde e efetivamente cuidada pela avó, que era quem acompanhava sua vida
escolar, sua saúde e providenciava seu sustento, sem a ajuda dos pais do
requerente. Após a morte da avó, o autor só passou a estar sob os cuidados
da mãe depois de algum tempo, passando antes um curto período com o pai,
que terminou por deixa-lo com uma tia, sendo ao final, ao que parece,
necessária a intervenção do Conselho Tutelar para regularização da
situação. A mãe não conta com qualquer renda noticiada nos autos e
possui outros seis filhos. Enfim, tudo indica que o autor realmente era
cuidado pela avó e guardiã.
- Comprovado o preenchimento dos requisitos legais para concessão de pensão
por morte, o direito que persegue o requerente merece ser reconhecido.
- Considerando que a avó do autor faleceu em 31.03.2012 e que só foi
formulado requerimento administrativo em 07.02.2013, deveriam ser aplicadas
as regras segundo as modificações introduzidas pela Lei nº 9.528/97,
sendo devido o benefício com termo inicial na data do requerimento
administrativo. Todavia, o termo inicial do benefício deve ser fixado na
data do óbito da segurada, porquanto o trintídio do art. 74 da Lei nº
8.213/91 não flui contra os absolutamente incapazes, caso do requerente.
- A renda mensal inicial será calculada de acordo com o art. 75, da Lei
nº 8.213/91.
- A correção monetária e os juros moratórios incidirão nos termos do
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
em vigor por ocasião da execução do julgado.
- A verba honorária deve ser fixada em 10% sobre o valor da condenação,
até a data desta decisão, considerando que o pedido foi julgado improcedente
pelo juízo "a quo".
- As Autarquias Federais são isentas de custas, cabendo somente quando em
reembolso.
- Cuidando-se de prestação de natureza alimentar, presentes os pressupostos
do art. 300 c.c. 497 do CPC, é possível a antecipação da tutela.
- Apelo da parte autora parcialmente provido.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, dar parcial provimento ao apelo da parte autora e, de ofício,
conceder a tutela antecipada, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
08/08/2016
Data da Publicação
:
23/08/2016
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2159699
Órgão Julgador
:
OITAVA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/08/2016
..FONTE_REPUBLICACAO:
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