TRF3 0000648-22.2009.4.03.6118 00006482220094036118
AUXÍLIO ACIDENTE E APOSENTADORIA. CUMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PLEITO QUE,
CONTUDO, FOI RECONHECIDO NA VIA ADMINISTRATIVA, APÓS LONGO PROCEDIMENTO
ADMINISTRATIVO E JUDICIAL. SEGURANÇA JURÍDICA. CANCELAMENTO DA
APOSENTADORIA. ABUSO DE DIREITO. CONDENAÇÃO EM DANO MORAL. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. APELAÇÃO DO AUTOR
PROVIDA. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL DA AUTARQUIA IMPROVIDOS.
1) O autor teve concedido auxílio acidente em 18-09-1993 e aposentadoria
por tempo de contribuição em 15-09-2000. Em 26-05-2003, a autarquia
encaminhou-lhe correspondência informando ser indevida a cumulação dos
benefícios - aposentadoria e auxílio acidente - e que seria cessado o
auxílio acidente. Rejeitada a defesa administrativa, seguiu-se comunicação
de que o benefício auxílio acidente seria cessado em 31-03-2008. Apresentado
recurso administrativo, em 22-04-2008, e sem resposta da autarquia em
tempo adequado, o autor ingressou com ação judicial, em 26-08-2008,
obtendo a antecipação da tutela para restabelecimento do benefício em
08-09-2008. Sobreveio, em 09-12-2008, sentença julgando procedente, não
só o pedido de restabelecimento do auxílio acidente, mas, também, o de
aumento de coeficiente de cálculo do referido benefício de 30% para 50%
do salário de benefício, bem como o de declaração de inexistência da
dívida relativa às parcelas recebidas a título de auxílio-acidente no
período que intermediou a concessão da aposentadoria e o da cessação do
auxílio acidente. Durante o curso do feito no Tribunal de Justiça de São
Paulo, sobreveio a Súmula 44 da AGU, de 14-09-2009, autorizando a cumulação
de auxílio acidente com aposentadoria nos casos em que a consolidação das
lesões tivesse ocorrido até 10-11-1997 (caso dos autos), bem como decisão
(em 09-10-2009) no recurso administrativo interposto pelo autor permitindo tal
cumulação. Posteriormente, em 15-06-2010, apreciando o recurso interposto
pela autarquia, bem como a remessa oficial, o Tribunal de Justiça de São
Paulo deu por prejudicado o pedido de reforma da sentença em relação
ao pedido de restabelecimento do auxílio acidente, pois tal direito já
havia sido reconhecido na via administrativa, e analisou, tão-somente,
o pedido de revisão do coeficiente de cálculo do benefício acidentário,
o qual foi julgado improcedente.
2) Percorridos todos os caminhos dos procedimentos administrativo e
judicial, com declaração final do direito do segurado, não pode a
autarquia reinaugurar o litígio, desta feita cancelando o pagamento da
própria aposentadoria, para a qual o segurado já havia preenchido todos
os requisitos segundo a lei vigente ao tempo de sua reunião, sob pena de
negar eficácia à própria decisão por ela proferida e, com isso violar
segurança jurídica, viga mestre de nosso sistema jurídico.
3) É direito da autarquia utilizar dos instrumentos legais para a defesa
do patrimônio público, mas deve fazê-lo respeitando os postulados
constitucionais que orientam a Administração Pública (art. 37, caput,
CF), bem como os direitos e garantias individuais do segurado (direito de
defesa e direito de petição). Ao se afastar de tais postulados, a autarquia
exorbitou das suas funções, abusou do direito, trazendo danos à esfera
de direitos do autor, gerando, por conseguinte, o dever de indenizar.
4) Conquanto a submissão do jurisdicionado aos procedimentos administrativo e
judicial não seja causa para a imposição de condenação em danos morais,
a jurisprudência do STJ vem reconhecendo tal direito nos casos em que reste
configurado o abuso da Administração, notadamente nos casos em que o ato em
si gere, ou agrave, a situação de aflição psicológica e de angústia
no espírito do segurado, tais como o desconto indevido no benefício,
indeferimento imotivado e cessação indevida, como é o caso. Precedentes
do STJ.
5) Não é por outra razão que aquela Corte tem ampliado o leque de
situações nas quais o próprio fato em si já configura o dano, sendo
desnecessária a apresentação de provas que demonstrem a ofensa moral da
pessoa (dano in re ipsa).
6) Embora a tese defendida pela autarquia tenha sido, posteriormente,
acolhida pelo STJ ((REsp 1296673/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA
SEÇÃO, julgado em 22/08/2012, DJe 03/09/2012), no sentido de ser indevida
a cumulação de auxílio acidente com aposentadoria, fato é que, ao tempo
em que foi proferida a decisão administrativa reconhecendo o direito do
segurado (09-10-2009) -, a questão estava pacificada no âmbito da própria
Administração Pública, razão pela qual foi reconhecida a ausência de
interesse processual da autarquia no julgamento - quanto ao ponto - do recurso
por ela interposto da sentença judicial que assegurou tal direito ao autor.
7) Tal fato é reforçado, no curso desta demanda, pela conduta da autarquia
que, ciente de que o pleito já havia sido deferido na via administrativa,
fez proposta de acordo ao autor no qual propunha a manutenção definitiva
da tutela antecipada (restabelecimento da aposentadoria) e pagamento dos
atrasados sem deságio.
8) O valor da reparação pelo dano moral deve se situar em patamar suficiente
a reparar o mal causado durante o período em que o segurado ficou sem o
pagamento do benefício e que, ao mesmo tempo, oriente a conduta da autarquia
de modo a evitar que o mesmo problema venha a ocorrer com outros segurados
(efeito educativo-persuasivo). O critério da proporcionalidade melhor se
adequa ao caso.
9) Tratando-se de benefício que deixou de ser pago por cerca de seis meses
(valor de cada parcela: R$ 1.111,04), é de se fixar o valor da reparação
em metade do valor de cada parcela que deixou de ser paga, com correção
monetária a partir dos respectivos vencimentos.
10) A correção monetária será aplicada nos termos da Lei n. 6.899/91
e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de
Procedimentos para os cálculos da Justiça Federal, observado o disposto
na Lei n. 11.960/2009 (Repercussão Geral no RE n. 870.947).
11) Os juros moratórios serão calculados de forma global para as
parcelas vencidas antes da citação, e incidirão a partir dos respectivos
vencimentos para as parcelas vencidas após a citação. Serão de 0,5%
(meio por cento) ao mês, na forma dos arts. 1.062 do antigo CC e 219 do
CPC/1973, até a vigência do CC/2002, a partir de quando serão de 1%
(um por cento) ao mês, na forma dos arts. 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do
CTN. A partir de julho de 2.009, os juros moratórios serão de 0,5% (meio
por cento) ao mês, observado o disposto no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97,
alterado pelo art. 5º da Lei n. 11.960/2009, pela MP n. 567, de 13.05.2012,
convertida na Lei n. 12.703, de 07.08.2012, e legislação superveniente.
12) Os honorários advocatícios são fixados em 10% sobre o valor da
condenação (art. 20, § 3º, do CPC).
13) Apelação do autor parcialmente provida. Apelação da autarquia e
remessa oficial improvidas.
Ementa
AUXÍLIO ACIDENTE E APOSENTADORIA. CUMULAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PLEITO QUE,
CONTUDO, FOI RECONHECIDO NA VIA ADMINISTRATIVA, APÓS LONGO PROCEDIMENTO
ADMINISTRATIVO E JUDICIAL. SEGURANÇA JURÍDICA. CANCELAMENTO DA
APOSENTADORIA. ABUSO DE DIREITO. CONDENAÇÃO EM DANO MORAL. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. APELAÇÃO DO AUTOR
PROVIDA. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL DA AUTARQUIA IMPROVIDOS.
1) O autor teve concedido auxílio acidente em 18-09-1993 e aposentadoria
por tempo de contribuição em 15-09-2000. Em 26-05-2003, a autarquia
encaminhou-lhe correspondência informando ser indevida a cumulação dos
benefícios - aposentadoria e auxílio acidente - e que seria cessado o
auxílio acidente. Rejeitada a defesa administrativa, seguiu-se comunicação
de que o benefício auxílio acidente seria cessado em 31-03-2008. Apresentado
recurso administrativo, em 22-04-2008, e sem resposta da autarquia em
tempo adequado, o autor ingressou com ação judicial, em 26-08-2008,
obtendo a antecipação da tutela para restabelecimento do benefício em
08-09-2008. Sobreveio, em 09-12-2008, sentença julgando procedente, não
só o pedido de restabelecimento do auxílio acidente, mas, também, o de
aumento de coeficiente de cálculo do referido benefício de 30% para 50%
do salário de benefício, bem como o de declaração de inexistência da
dívida relativa às parcelas recebidas a título de auxílio-acidente no
período que intermediou a concessão da aposentadoria e o da cessação do
auxílio acidente. Durante o curso do feito no Tribunal de Justiça de São
Paulo, sobreveio a Súmula 44 da AGU, de 14-09-2009, autorizando a cumulação
de auxílio acidente com aposentadoria nos casos em que a consolidação das
lesões tivesse ocorrido até 10-11-1997 (caso dos autos), bem como decisão
(em 09-10-2009) no recurso administrativo interposto pelo autor permitindo tal
cumulação. Posteriormente, em 15-06-2010, apreciando o recurso interposto
pela autarquia, bem como a remessa oficial, o Tribunal de Justiça de São
Paulo deu por prejudicado o pedido de reforma da sentença em relação
ao pedido de restabelecimento do auxílio acidente, pois tal direito já
havia sido reconhecido na via administrativa, e analisou, tão-somente,
o pedido de revisão do coeficiente de cálculo do benefício acidentário,
o qual foi julgado improcedente.
2) Percorridos todos os caminhos dos procedimentos administrativo e
judicial, com declaração final do direito do segurado, não pode a
autarquia reinaugurar o litígio, desta feita cancelando o pagamento da
própria aposentadoria, para a qual o segurado já havia preenchido todos
os requisitos segundo a lei vigente ao tempo de sua reunião, sob pena de
negar eficácia à própria decisão por ela proferida e, com isso violar
segurança jurídica, viga mestre de nosso sistema jurídico.
3) É direito da autarquia utilizar dos instrumentos legais para a defesa
do patrimônio público, mas deve fazê-lo respeitando os postulados
constitucionais que orientam a Administração Pública (art. 37, caput,
CF), bem como os direitos e garantias individuais do segurado (direito de
defesa e direito de petição). Ao se afastar de tais postulados, a autarquia
exorbitou das suas funções, abusou do direito, trazendo danos à esfera
de direitos do autor, gerando, por conseguinte, o dever de indenizar.
4) Conquanto a submissão do jurisdicionado aos procedimentos administrativo e
judicial não seja causa para a imposição de condenação em danos morais,
a jurisprudência do STJ vem reconhecendo tal direito nos casos em que reste
configurado o abuso da Administração, notadamente nos casos em que o ato em
si gere, ou agrave, a situação de aflição psicológica e de angústia
no espírito do segurado, tais como o desconto indevido no benefício,
indeferimento imotivado e cessação indevida, como é o caso. Precedentes
do STJ.
5) Não é por outra razão que aquela Corte tem ampliado o leque de
situações nas quais o próprio fato em si já configura o dano, sendo
desnecessária a apresentação de provas que demonstrem a ofensa moral da
pessoa (dano in re ipsa).
6) Embora a tese defendida pela autarquia tenha sido, posteriormente,
acolhida pelo STJ ((REsp 1296673/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA
SEÇÃO, julgado em 22/08/2012, DJe 03/09/2012), no sentido de ser indevida
a cumulação de auxílio acidente com aposentadoria, fato é que, ao tempo
em que foi proferida a decisão administrativa reconhecendo o direito do
segurado (09-10-2009) -, a questão estava pacificada no âmbito da própria
Administração Pública, razão pela qual foi reconhecida a ausência de
interesse processual da autarquia no julgamento - quanto ao ponto - do recurso
por ela interposto da sentença judicial que assegurou tal direito ao autor.
7) Tal fato é reforçado, no curso desta demanda, pela conduta da autarquia
que, ciente de que o pleito já havia sido deferido na via administrativa,
fez proposta de acordo ao autor no qual propunha a manutenção definitiva
da tutela antecipada (restabelecimento da aposentadoria) e pagamento dos
atrasados sem deságio.
8) O valor da reparação pelo dano moral deve se situar em patamar suficiente
a reparar o mal causado durante o período em que o segurado ficou sem o
pagamento do benefício e que, ao mesmo tempo, oriente a conduta da autarquia
de modo a evitar que o mesmo problema venha a ocorrer com outros segurados
(efeito educativo-persuasivo). O critério da proporcionalidade melhor se
adequa ao caso.
9) Tratando-se de benefício que deixou de ser pago por cerca de seis meses
(valor de cada parcela: R$ 1.111,04), é de se fixar o valor da reparação
em metade do valor de cada parcela que deixou de ser paga, com correção
monetária a partir dos respectivos vencimentos.
10) A correção monetária será aplicada nos termos da Lei n. 6.899/91
e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de
Procedimentos para os cálculos da Justiça Federal, observado o disposto
na Lei n. 11.960/2009 (Repercussão Geral no RE n. 870.947).
11) Os juros moratórios serão calculados de forma global para as
parcelas vencidas antes da citação, e incidirão a partir dos respectivos
vencimentos para as parcelas vencidas após a citação. Serão de 0,5%
(meio por cento) ao mês, na forma dos arts. 1.062 do antigo CC e 219 do
CPC/1973, até a vigência do CC/2002, a partir de quando serão de 1%
(um por cento) ao mês, na forma dos arts. 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do
CTN. A partir de julho de 2.009, os juros moratórios serão de 0,5% (meio
por cento) ao mês, observado o disposto no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97,
alterado pelo art. 5º da Lei n. 11.960/2009, pela MP n. 567, de 13.05.2012,
convertida na Lei n. 12.703, de 07.08.2012, e legislação superveniente.
12) Os honorários advocatícios são fixados em 10% sobre o valor da
condenação (art. 20, § 3º, do CPC).
13) Apelação do autor parcialmente provida. Apelação da autarquia e
remessa oficial improvidas.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, dar parcial provimento ao recurso do autor e negar provimento
ao recurso da autarquia e à remessa oficial, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
10/04/2017
Data da Publicação
:
28/04/2017
Classe/Assunto
:
APELREEX - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1958546
Órgão Julgador
:
NONA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/04/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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