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Jurisprudência


TRF3 0000700-62.2007.4.03.6126 00007006220074036126

Ementa
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. ART. 37, §6º, DA CF. PERSEGUIÇÃO NA ÉPOCA DA DITADURA MILITAR. PRISÃO NÃO COMPROVADA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INCABIMENTO 1. O Juiz, na avaliação da prova material, submete-se ao princípio do livre convencimento motivado, podendo, desde que observados os fatos e as circunstâncias dos autos, apreciar livre mente as provas, devendo, nos termos do art. 131, do CPC/73, apontar na decisão, as razões de seu convencimento. 2. Dessa forma, em análise às questões trazidas aos autos e considerando o quadro probatório existente, poderá o magistrado, a fim de formar sua convicção, entender pela necessidade ou não da realização das provas orais e periciais (arts. 130 e 131, do CPC/73). 3. O indeferimento de realização de prova oral e técnica, não configura, por si só, cerceamento do direito de defesa tampouco violação às garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. 4. Afastada a alegação preliminar de ocorrência de prescrição, visto tratar-se de pedido de indenização por danos morais decorrentes de perseguições políticas sofridas durante o regime de ditadura militar, por atos praticados pelos agentes administrativos naquele período, em que os jurisdicionados não podiam deduzir suas pretensões a contento, sendo certo que a jurisprudência dos Tribunais Superiores já se pacificou no sentido da imprescritibilidade dessas ações. Nesse sentido, cito os precedentes do C. STJ: AgRg no AI 1.392.493/RJ, Segunda Turma, relator Ministro Castro Meira, j. 16/6/2011, DJ 01/7/2011; AgRg no RESP 828.178/PR, Segunda Turma, relator Ministro Mauro Campbell Marques, j. 20/8/2009, DJ 08/09/2009; RESP 890.930/RJ, Primeira Turma, relatora Ministra Denise Arruda, j. 17/5/2007, DJ 14/6/2007. 5. Para a caracterização da responsabilidade objetiva do agente público, ensejadora da indenização por danos morais e patrimoniais, é essencial a ocorrência de três fatores: o dano, a ação do agente e o nexo causal. 6. O cerne da questão em desate encontra-se na comprovação da existência de danos efetivos causados pelos atos de agentes administrativos, no período da ditadura militar. 7. Nesse aspecto, relata a autora (fls. 04) que sua prisão ocorreu em dezembro de 1970 em Mauá, onde foi detida e presa pela Polícia Civil Seccional do ABC e levada para a Delegacia de Polícia de São Bernardo do Campo. Em seguida, após aproximadamente duas semanas a Autora foi transferida para o DOI-CODI, onde funcionava a sede da OBAN (OPERAÇÃO BANDEIRANTES) e lá torturada fisicamente e psicologicamente por agentes do Estado e Militares. Aponta que lhe foram imputadas torturas de todos os gêneros, levando choques elétricos por todo o corpo, socos, agressões no pau-de-arara, além dos horrores da tortura mental, durante exaustivos e violentos interrogatórios. Nos interrogatórios, os prepostos estatais buscavam saber se a autora era militante de organização subversiva denominada Ação Popular. 8. Alega não ter praticado qualquer ato delituoso, tendo apenas lutado por ideais, tendo sido presa e sofrido profundos traumas psicológicos, além de outras sequelas decorrentes dos traumas e medo vivenciados no período de horror e tortura sofridos naquela época, de total desrespeito aos direitos humanos mais elementares, requerendo a indenização por danos morais. 9. Os fatos foram comprovados na farta documentação acostada aos autos, dentre os quais o documento expedido pela Secretaria de Estado dos Negócios da Segurança Pública (fls. 26), demonstrando que a autora foi investigada e processada durante o período do regime militar. 10. A autora ainda figurou como ré em ação judicial, oportunidade em que foi declarada sua absolvição, diante do alegado arrependimento. 11. No que pertine aos danos morais, embora não haja, por óbvio, relato documental das torturas físicas sofridas, houve a comprovação da prisão efetuada por motivos exclusivamente políticos e ideológicos e da coação exercida pelos agentes federais, em graves situações de repressão e restrições à pessoa do autor, de forma ostensiva, com repercussão claramente contundente e prejudicial em sua vida. 12. O intenso prejuízo no âmbito pessoal, psicológico, profissional, familiar e social da autora, banido à condição de pária, marginal subversivo, criminoso, sob o tormento constante do terror vigente à época e o risco de sofrer novas prisões e torturas, tornam inquestionável o lamentável abalo sofrido pelo autor, que ultrapassa completamente os limites dos dissabores aos quais se sujeitam os cidadãos comuns, sendo certo que o quadro probatório produzido foi suficiente para que se possa afirmar que houve a efetiva ocorrência de danos morais, causados de forma manifestamente injusta pela repressão política, em atos praticados pelos agentes administrativos. 13. Comprovada a ocorrência dos danos morais e a relação de causalidade, necessária a responsabilização dos réus, para fins de indenização por danos morais, sendo então necessária a apuração do quantum indenitário, em valor que não pode ser ínfimo nem abusivo, devendo ter cunho reparador à vítima, minimizando a sua dor, sem ensejar o seu enriquecimento sem causa, nem perder o caráter punitivo ao ofensor. 14. Condenação ao pagamento de dano moral no importe de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), quantia também já considerada adequada em caso semelhante, diante da gravidade da situação ocorrida com a autora e dos lamentáveis reflexos perpetrados em sua vida pessoal e profissional. 15. O quantum fixado deverá ser corrigido monetariamente, a partir da data do arbitramento (Súmula nº 362 do C. STJ), com a incidência de juros moratórios desde o evento dano so (Súmula nº 54 do C. STJ), utilizando-se os índices previstos na Resolução nº 267/2013 do CJF, excluídos os índices da poupança, tendo em vista que o C. STF entendeu pela inconstitucionalidade do art. 5º da Lei nº 11.960/2009, adotando o posicionamento de que a eleição legal do índice da caderneta de poupança para fins de atualização monetária e juros de mora ofende o direito de propriedade (ADI 4357, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 14/03/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-188 DIVULG 25-09-2014 PUBLIC 26-09-2014). Nesse sentido: RE 798541 AgR, Relatora Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 22/04/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-084 DIVULG 05-05-2014 PUBLIC 06-05-2014. 16. Condenação da União Federal ao pagamento dos honorários advocatícios fixados em R$ 20.000,00 (vinte mil reais), em virtude da natureza da causa e do trabalho realizado pelo advogado. 17. Apelação provida.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 30/06/2016
Data da Publicação : 12/07/2016
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1397902
Órgão Julgador : SEXTA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 LEG-FED ANO-1988 ART-37 PAR-6 ***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-130 ART-131 ***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA LEG-FED SUM-362 ***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA LEG-FED SUM-54 ***** MCP-13 MANUAL DE ORIENTAÇÃO DE PROCEDIMENTOS PARA OS CÁLCULOS NA JF LEG-FED RES-267 ANO-2013 CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL LEG-FED LEI-11960 ANO-2009 ART-5
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/07/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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