TRF3 0000910-61.2012.4.03.6119 00009106120124036119
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO
POR DANOS MORAIS. CANCELAMENTO INDEVIDO DO BENEFÍCIO
PREVIDENCIÁRIO. PERÍCIA MÉDICA. INCAPACIDADE LABORATIVA ATESTADA. AÇÃO
PREVIDENCIÁRIA. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. ORDEM JUDICIAL NÃO
CUMPRIDA. PRIVAÇÃO DE VERBA ALIMENTAR. DANO MORAL VERIFICADO. JUROS DE
MORA. LEI 11.960. APELAÇÕES PROVIDAS EM PARTE.
1. A questão posta nos autos diz respeito a pedido de indenização por
danos materiais e morais, pleiteado por José Barbosa de Lima, em face do
Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, em razão de cancelamento indevido
de auxílio doença mesmo após perícia médica que atestou a incapacidade
laborativa do segurado e ordem judicial determinando o pagamento do benefício
previdenciário.
2. O Magistrado a quo julgou o feito parcialmente procedente, reconhecendo
a responsabilidade da autarquia federal, condenando-a, contudo somente ao
pagamento de indenização por danos morais. Ambas as partes apelaram. O INSS
pugna pela improcedência da ação, ou, subsidiariamente, pela redução
do quantum indenizatório e adequação dos juros de mora ao advento
da Lei 11.960. O autor requer a majoração da indenização por danos
morais. Portanto, a questão dos danos materiais não foi devolvida a este
E. Tribunal, prevalecendo o indeferimento decidido em primeira instância.
3. O mérito da discussão recai sobre o tema da responsabilidade civil do
Estado, de modo que se fazem pertinentes algumas considerações doutrinárias
e jurisprudenciais. São elementos da responsabilidade civil a ação ou
omissão do agente, a culpa, o nexo causal e o dano, do qual surge o dever
de indenizar.
4. No direito brasileiro, a responsabilidade civil do Estado é, em regra,
objetiva, isto é, prescinde da comprovação de culpa do agente, bastando-se
que se comprove o nexo causal entre a conduta do agente e o dano. Está
consagrada na norma do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal.
5. Pois bem, no caso dos autos, é patente a aplicação do instituto da
responsabilidade objetiva, visto que o INSS praticou uma conduta comissiva,
qual seja a cessação do benefício previdenciário, ainda que sob a forma
de negação.
6. Pela consulta aos autos, observa-se, às fls. 40/43, decisão judicial
proferida pela MM. Juíza Federal da 2ª Vara Federal de Guarulhos/SP,
em 30.07.2009, no bojo dos autos nº 2009.61.19.004218-0, deferindo a
antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, para determinar o
restabelecimento imediato do auxílio doença em nome do autor.
7. Nesse sentido, o documento de fl. 44 apresenta uma comunicação do INSS
informando ao Juízo da 2ª Vara Federal de Guarulhos/SP o cumprimento da
determinação judicial. O segurado ainda acostou aos autos três perícias
médicas, realizadas pelo INSS, em 22.03.2010, 06.08.2010 e 31.01.2011
(fls. 45/47), atestando sua incapacidade laborativa. Ainda assim, a despeito
da ordem judicial e do estado de saúde debilitado do autor, o beneficio
previdenciário restou cessado em 15.03.2011 (fl. 48).
8. Instado a se manifestar, ainda no bojo da ação previdenciária, o INSS
informou que o cancelamento do benefício se deu em razão da perícia médica
realizada em 31.01.2011, em nítida confusão lógica, uma vez que a referida
perícia comprou justamente a necessidade da manutenção do auxílio doença.
9. Com efeito, resta plenamente incontroversa a questão acerca da incapacidade
laborativa do autor, e, por conseguinte, encontra-se provado descabimento
do cancelamento do benefício previdenciário por parte do INSS. Logo,
não mais de discute a ilegalidade da conduta no INSS, mas somente o nexo
causal e o dano moral decorrente. É certo que o evento danoso, isto é, a
privação de verba alimentar, decorreu da cessação indevida do benefício
previdenciário, em desrespeito à ordem judicial e má observação da
perícia realizada. Destarte, inquestionável o nexo de causalidade.
10. Quanto ao dano moral, a doutrina o conceitua enquanto "dor, vexame,
sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente
no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições,
angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento,
mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano
moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia,
no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais
situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio
psicológico do indivíduo. (Cavalieri, Sérgio. Responsabilidade Civil. São
Paulo: Saraiva, 2002, p. 549)"
11. Nesse sentido, é patente que o fato de a verba possuir caráter
alimentar já é o suficiente para se presumir que o cancelamento indevido
tenha acarretado prejuízos de ordem moral ao segurado, pois o não pagamento
da verba o privou de parte fonte de renda, implicando sacrifício parcial
de seu sustento. Agrava-se ainda a presente situação pelo fato do autor
ser portador do vírus HIV, conforme se verifica pelas perícias médicas
(fls. 45/47), e, portanto, possui saúde frágil que necessita cuidados
médicos especiais. No mais, o demandante ainda comprova que, por conta
da redução de sua verba mensal, não conseguiu arcar com as parcelas de
dois empréstimos feitos junto ao extinto Unibanco (fls. 60/67), bem como
com as parcelas de prestações contraídas junto à empresa Casas Bahia
(fls. 71/84). Por fim, ainda demonstra que a cessação de seu benefício
o fez atrasar o aluguel e ser ameaçado de despejo (fl. 70).
12. Irrefutável, portanto, a ocorrência de dano moral indenizável,
passando-se, então, à valoração do quantum indenizatório. Acerca da
fixação da indenização por danos morais, é sabido que seu arbitramento
deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, observando
ainda a condição social e viabilidade econômica do ofensor e do ofendido,
e a proporcionalidade à ofensa, conforme o grau de culpa e gravidade do dano,
sem, contudo, incorrer em enriquecimento ilícito.
13. Assim, considerando ser o autor pessoa de poucos recursos, portador
do vírus HIV, e a parte ré ser autarquia federal, bem como o valor do
benefício em tela (em torno de R$ 1.200,00, em fevereiro de 2012 - fl. 89)
e o tempo de privação (aproximadamente 7 meses), reputo adequado majorar
o valor da indenização para R$ 15.000,00 (quinze mil reais).
14. Por fim, assiste razão ao INSS quanto à necessidade de ajustar-se a
incidência dos juros de mora ao advento da Lei 11.960 /2009. Assim, deve-se
observar o comando do Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos
na Justiça Federal, ressalvando-se que, em razão da Lei 11.960 /09 que
alterou a 1º - F da Lei 9.494/97, os juros de mora ficam estabelecidos
da seguinte forma: 1% ao mês entre a vigência do atual Código Civil e o
advento da Lei 11.960 /09, e 0,5% ao mês após a vigência desta.
15. Apelações providas em parte.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO
POR DANOS MORAIS. CANCELAMENTO INDEVIDO DO BENEFÍCIO
PREVIDENCIÁRIO. PERÍCIA MÉDICA. INCAPACIDADE LABORATIVA ATESTADA. AÇÃO
PREVIDENCIÁRIA. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. ORDEM JUDICIAL NÃO
CUMPRIDA. PRIVAÇÃO DE VERBA ALIMENTAR. DANO MORAL VERIFICADO. JUROS DE
MORA. LEI 11.960. APELAÇÕES PROVIDAS EM PARTE.
1. A questão posta nos autos diz respeito a pedido de indenização por
danos materiais e morais, pleiteado por José Barbosa de Lima, em face do
Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, em razão de cancelamento indevido
de auxílio doença mesmo após perícia médica que atestou a incapacidade
laborativa do segurado e ordem judicial determinando o pagamento do benefício
previdenciário.
2. O Magistrado a quo julgou o feito parcialmente procedente, reconhecendo
a responsabilidade da autarquia federal, condenando-a, contudo somente ao
pagamento de indenização por danos morais. Ambas as partes apelaram. O INSS
pugna pela improcedência da ação, ou, subsidiariamente, pela redução
do quantum indenizatório e adequação dos juros de mora ao advento
da Lei 11.960. O autor requer a majoração da indenização por danos
morais. Portanto, a questão dos danos materiais não foi devolvida a este
E. Tribunal, prevalecendo o indeferimento decidido em primeira instância.
3. O mérito da discussão recai sobre o tema da responsabilidade civil do
Estado, de modo que se fazem pertinentes algumas considerações doutrinárias
e jurisprudenciais. São elementos da responsabilidade civil a ação ou
omissão do agente, a culpa, o nexo causal e o dano, do qual surge o dever
de indenizar.
4. No direito brasileiro, a responsabilidade civil do Estado é, em regra,
objetiva, isto é, prescinde da comprovação de culpa do agente, bastando-se
que se comprove o nexo causal entre a conduta do agente e o dano. Está
consagrada na norma do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal.
5. Pois bem, no caso dos autos, é patente a aplicação do instituto da
responsabilidade objetiva, visto que o INSS praticou uma conduta comissiva,
qual seja a cessação do benefício previdenciário, ainda que sob a forma
de negação.
6. Pela consulta aos autos, observa-se, às fls. 40/43, decisão judicial
proferida pela MM. Juíza Federal da 2ª Vara Federal de Guarulhos/SP,
em 30.07.2009, no bojo dos autos nº 2009.61.19.004218-0, deferindo a
antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, para determinar o
restabelecimento imediato do auxílio doença em nome do autor.
7. Nesse sentido, o documento de fl. 44 apresenta uma comunicação do INSS
informando ao Juízo da 2ª Vara Federal de Guarulhos/SP o cumprimento da
determinação judicial. O segurado ainda acostou aos autos três perícias
médicas, realizadas pelo INSS, em 22.03.2010, 06.08.2010 e 31.01.2011
(fls. 45/47), atestando sua incapacidade laborativa. Ainda assim, a despeito
da ordem judicial e do estado de saúde debilitado do autor, o beneficio
previdenciário restou cessado em 15.03.2011 (fl. 48).
8. Instado a se manifestar, ainda no bojo da ação previdenciária, o INSS
informou que o cancelamento do benefício se deu em razão da perícia médica
realizada em 31.01.2011, em nítida confusão lógica, uma vez que a referida
perícia comprou justamente a necessidade da manutenção do auxílio doença.
9. Com efeito, resta plenamente incontroversa a questão acerca da incapacidade
laborativa do autor, e, por conseguinte, encontra-se provado descabimento
do cancelamento do benefício previdenciário por parte do INSS. Logo,
não mais de discute a ilegalidade da conduta no INSS, mas somente o nexo
causal e o dano moral decorrente. É certo que o evento danoso, isto é, a
privação de verba alimentar, decorreu da cessação indevida do benefício
previdenciário, em desrespeito à ordem judicial e má observação da
perícia realizada. Destarte, inquestionável o nexo de causalidade.
10. Quanto ao dano moral, a doutrina o conceitua enquanto "dor, vexame,
sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente
no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições,
angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento,
mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano
moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia,
no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais
situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio
psicológico do indivíduo. (Cavalieri, Sérgio. Responsabilidade Civil. São
Paulo: Saraiva, 2002, p. 549)"
11. Nesse sentido, é patente que o fato de a verba possuir caráter
alimentar já é o suficiente para se presumir que o cancelamento indevido
tenha acarretado prejuízos de ordem moral ao segurado, pois o não pagamento
da verba o privou de parte fonte de renda, implicando sacrifício parcial
de seu sustento. Agrava-se ainda a presente situação pelo fato do autor
ser portador do vírus HIV, conforme se verifica pelas perícias médicas
(fls. 45/47), e, portanto, possui saúde frágil que necessita cuidados
médicos especiais. No mais, o demandante ainda comprova que, por conta
da redução de sua verba mensal, não conseguiu arcar com as parcelas de
dois empréstimos feitos junto ao extinto Unibanco (fls. 60/67), bem como
com as parcelas de prestações contraídas junto à empresa Casas Bahia
(fls. 71/84). Por fim, ainda demonstra que a cessação de seu benefício
o fez atrasar o aluguel e ser ameaçado de despejo (fl. 70).
12. Irrefutável, portanto, a ocorrência de dano moral indenizável,
passando-se, então, à valoração do quantum indenizatório. Acerca da
fixação da indenização por danos morais, é sabido que seu arbitramento
deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, observando
ainda a condição social e viabilidade econômica do ofensor e do ofendido,
e a proporcionalidade à ofensa, conforme o grau de culpa e gravidade do dano,
sem, contudo, incorrer em enriquecimento ilícito.
13. Assim, considerando ser o autor pessoa de poucos recursos, portador
do vírus HIV, e a parte ré ser autarquia federal, bem como o valor do
benefício em tela (em torno de R$ 1.200,00, em fevereiro de 2012 - fl. 89)
e o tempo de privação (aproximadamente 7 meses), reputo adequado majorar
o valor da indenização para R$ 15.000,00 (quinze mil reais).
14. Por fim, assiste razão ao INSS quanto à necessidade de ajustar-se a
incidência dos juros de mora ao advento da Lei 11.960 /2009. Assim, deve-se
observar o comando do Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos
na Justiça Federal, ressalvando-se que, em razão da Lei 11.960 /09 que
alterou a 1º - F da Lei 9.494/97, os juros de mora ficam estabelecidos
da seguinte forma: 1% ao mês entre a vigência do atual Código Civil e o
advento da Lei 11.960 /09, e 0,5% ao mês após a vigência desta.
15. Apelações providas em parte.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar provimento parcial provimento à apelação do autor,
para majorar a indenização por danos morais para R$ 15.000,00 (quinze mil
reais), e dar parcial provimento à apelação do INSS, somente para adequar
a incidência de juros de mora ao advento da Lei 11.960/09, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
04/08/2016
Data da Publicação
:
15/08/2016
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1837185
Órgão Julgador
:
TERCEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/08/2016
..FONTE_REPUBLICACAO:
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