TRF3 0001015-80.2012.4.03.6105 00010158020124036105
DIREITO PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. TRANSPORTADOR
EVENTUAL. "MULA". CAUSA DE DIMINUIÇÃO. LEI 11.343/06. ART. 33, §
4º. INCIDÊNCIA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. EMBARGOS PROVIDOS.
1. Embargos infringentes opostos contra acórdão exarado pela C. Segunda
Turma desta Corte, por meio do qual foi dado parcial provimento a recurso
de apelação anteriormente interposto pelo Ministério Público Federal,
para excluir da dosimetria penal do ora embargante a incidência da causa
de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, nos autos
de ação penal pública incondicionada em face do embargante ajuizada pelo
MPF pela prática do delito tipificado no art. 33, caput, c/c art. 40, I,
ambos da Lei 11.343/06.
2. A lei exige, para incidência do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, em
casos concretos, que o agente não "integre organização criminosa". Integrar
significar se incorporar a algo, dele passando a fazer parte. O próprio
vocábulo contido no texto normativo indica a ideia de pertencimento mínimo,
de vinculação com mínima estabilidade. A mera contratação de alguém
para auxílio eventual e remunerado a práticas ilícitas, contratação
esta feita por um braço de organização criminosa, não indica, por
si, pertencimento do "contratado" ou cooptado à organização criminosa
"contratante" ou "cooptante". Precedentes deste E. Tribunal.
3. É certo que organizações podem possuir um núcleo estável e se
utilizarem de diversas "contratações" ou cooptações pontuais para
tarefas operacionais específicas. Tomadas em seu conjunto, essas atividades
exercidas por "contratados" pontuais/eventuais são de grande relevância
à organização. No entanto, o requisito legal para incidência da causa
de diminuição não é o de "não ter participado de parcela de atividade
relevante no desenvolvimento de organização criminosa", mas sim "não
integrar organização criminosa". Assim, ter sido pontualmente útil a
uma organização criminosa não se relaciona jurídica ou faticamente com
a integração do utilizado a ela, o que dependerá de outros elementos a
serem provados, como busquei salientar (é dizer, elementos que denotem
participação com vínculo mínimo de estabilidade e pertencimento, de
onde se depreenderia a "integração" da pessoa ao grupo, e não seu mero
uso eventual/pontual).
4. A dedicação a atividades criminosas não se relaciona com presunções
a respeito de escolhas de vida de um acusado. No caso dos autos, trata-se
de jovem preso com vinte anos de idade, que havia ingerido pouco mais de
duzentos gramas de cocaína em cápsulas. O próprio modo de transporte da
droga (a acarretar risco grave de morte no caso de uma cápsula estourar no
interior do organismo do acusado), somado à pouca idade do acusado, apenas
reforçam a eventualidade da conduta e falta de premeditação interna,
e não a opção por um "projeto de vida" (vida essa com risco efetivo de
interrupção pelo modo de acondicionamento da droga no interior do organismo
do réu). Além disso, a pequena quantidade de entorpecentes (pouco mais de
duzentos gramas) também é elemento no sentido de não haver contato anterior
firme do acusado com o mundo do crime, em especial do crime organizado.
5. Projetos ou conjecturas do réu (ainda que fosse possível ler assim
sua conduta, para o que se necessitaria de dados empíricos e psíquicos que
inexistem nos autos) não demonstrariam "dedicação a atividades criminosas",
mas "possível projeto de dedicação posterior a atividades criminosas",
o que não se relaciona com a causa de diminuição em tela, e nem com a
punição objetiva por fatos concretos.
6. Embargos providos. Reconhecida a incidência da causa de diminuição
constante do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06. Por consequência, estabelecida
a pena nos patamares da sentença de primeiro grau.
Ementa
DIREITO PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. TRANSPORTADOR
EVENTUAL. "MULA". CAUSA DE DIMINUIÇÃO. LEI 11.343/06. ART. 33, §
4º. INCIDÊNCIA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. EMBARGOS PROVIDOS.
1. Embargos infringentes opostos contra acórdão exarado pela C. Segunda
Turma desta Corte, por meio do qual foi dado parcial provimento a recurso
de apelação anteriormente interposto pelo Ministério Público Federal,
para excluir da dosimetria penal do ora embargante a incidência da causa
de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, nos autos
de ação penal pública incondicionada em face do embargante ajuizada pelo
MPF pela prática do delito tipificado no art. 33, caput, c/c art. 40, I,
ambos da Lei 11.343/06.
2. A lei exige, para incidência do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, em
casos concretos, que o agente não "integre organização criminosa". Integrar
significar se incorporar a algo, dele passando a fazer parte. O próprio
vocábulo contido no texto normativo indica a ideia de pertencimento mínimo,
de vinculação com mínima estabilidade. A mera contratação de alguém
para auxílio eventual e remunerado a práticas ilícitas, contratação
esta feita por um braço de organização criminosa, não indica, por
si, pertencimento do "contratado" ou cooptado à organização criminosa
"contratante" ou "cooptante". Precedentes deste E. Tribunal.
3. É certo que organizações podem possuir um núcleo estável e se
utilizarem de diversas "contratações" ou cooptações pontuais para
tarefas operacionais específicas. Tomadas em seu conjunto, essas atividades
exercidas por "contratados" pontuais/eventuais são de grande relevância
à organização. No entanto, o requisito legal para incidência da causa
de diminuição não é o de "não ter participado de parcela de atividade
relevante no desenvolvimento de organização criminosa", mas sim "não
integrar organização criminosa". Assim, ter sido pontualmente útil a
uma organização criminosa não se relaciona jurídica ou faticamente com
a integração do utilizado a ela, o que dependerá de outros elementos a
serem provados, como busquei salientar (é dizer, elementos que denotem
participação com vínculo mínimo de estabilidade e pertencimento, de
onde se depreenderia a "integração" da pessoa ao grupo, e não seu mero
uso eventual/pontual).
4. A dedicação a atividades criminosas não se relaciona com presunções
a respeito de escolhas de vida de um acusado. No caso dos autos, trata-se
de jovem preso com vinte anos de idade, que havia ingerido pouco mais de
duzentos gramas de cocaína em cápsulas. O próprio modo de transporte da
droga (a acarretar risco grave de morte no caso de uma cápsula estourar no
interior do organismo do acusado), somado à pouca idade do acusado, apenas
reforçam a eventualidade da conduta e falta de premeditação interna,
e não a opção por um "projeto de vida" (vida essa com risco efetivo de
interrupção pelo modo de acondicionamento da droga no interior do organismo
do réu). Além disso, a pequena quantidade de entorpecentes (pouco mais de
duzentos gramas) também é elemento no sentido de não haver contato anterior
firme do acusado com o mundo do crime, em especial do crime organizado.
5. Projetos ou conjecturas do réu (ainda que fosse possível ler assim
sua conduta, para o que se necessitaria de dados empíricos e psíquicos que
inexistem nos autos) não demonstrariam "dedicação a atividades criminosas",
mas "possível projeto de dedicação posterior a atividades criminosas",
o que não se relaciona com a causa de diminuição em tela, e nem com a
punição objetiva por fatos concretos.
6. Embargos providos. Reconhecida a incidência da causa de diminuição
constante do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06. Por consequência, estabelecida
a pena nos patamares da sentença de primeiro grau.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, conhecer dos embargos infringentes e, no mérito, dar-lhes
provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Data do Julgamento
:
15/12/2016
Data da Publicação
:
12/01/2017
Classe/Assunto
:
EIFNU - EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE - 51620
Órgão Julgador
:
QUARTA SEÇÃO
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** LDR-06 LEI DE DROGAS
LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-33 PAR-4 ART-40 INC-1
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/01/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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