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Jurisprudência


TRF3 0001025-12.2003.4.03.6115 00010251220034036115

Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. ASSISTÊNCIA SOCIAL. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. INCAPACIDADE ABSOLUTA E IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO CONFIGURADOS. LAUDO PERICIAL. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO NO MOMENTO DA DII. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DESCUMPRIMENTO DO ÔNUS PROBATÓRIO. ART. 333, I, DO CPC/1973. ART. 373, I, DO CPC/2015. MÁXIMAS DA EXPERIÊNCIA. OBSERVAÇÃO DO QUE ORDINARIAMENTE ACONTECE. ART. 335 DO CPC/1973. ART. 375 DO CPC/2015. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO PAGO AO IDOSO. EXCLUSÃO. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 10.741/03. APLICAÇÃO POR ANALOGIA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DO STJ (REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA). STF. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 20 DA LEI Nº 8.742/93, SEM PRONÚNCIA DE NULIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO ISOLADA. ANÁLISE DA MISERABILIDADE EM CONJUNTO COM DEMAIS FATORES. AFASTADA SITUAÇÃO DE RISCO. RENDA FAMILIAR SUFICIENTE PARA COM AS DESPESAS. IMÓVEL COM SATISFATÓRIAS CONDIÇÕES DE HABITABILIDADE. HIPOSSUFICIÊNCIA NÃO DEMONSTRADA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. 1 - A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal. 2 - A Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, preconiza que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para exercício da atividade que lhe garanta a subsistência. 3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis). 4 - O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017). 5 - Independe de carência, entretanto, a concessão do benefício nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, conforme art. 26, II, da Lei nº 8.213/91, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 do mesmo diploma legislativo. 6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento do benefício se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia. 7 - Necessário para o implemento do beneplácito em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, o qual pode ser prorrogado por 24 (vinte e quatro) meses aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, nos termos do art. 15 e §1º da Lei. 8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017). 9 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo, com base em exame pericial de fls. 100/104, diagnosticou a parte autora como portadora de "hipertensão arterial Sistêmica (CID10 - I.10)", "diabetes mellitus tipo II (CID10 - E10.9)", "hipercolesterolemia (CID10 - E.78)" e "lombalgia". Assevera que a autora apresenta Hipertensão Arterial de "difícil controle medicamentoso". Relata, também, que "conforme orientação médica faz uso de vários medicamentos sem melhora dos sintomas". Concluiu, por conseguinte, que a demandante "encontra-se inapta a exercer atividade remunerada para a sua subsistência". Não fixou a data de início da incapacidade (DII). 10 - A despeito dessa indeterminação, tem-se que, conforme as máximas da experiência subministradas pelo que ordinariamente acontece (arts. 335 do CPC/1973 e 375 do CPC/2015), em cotejo com a análise apurado dos autos, que a incapacidade surgiu quando a autora já não era mais segurada da Previdência Social. Informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, as quais seguem anexas aos autos, dão conta que a parte autora teve encerrado seu último vínculo empregatício, junto à IBATE S/A, em 06/08/1998. Portanto, permaneceu como filiado ao RGPS, computando-se o total de 12 (doze) meses de manutenção de segurado, até 15/10/1999 (art. 30 da Lei 8.212/91 c/c art. 14 do Decreto 3.048/99). 11 - Os documentos médicos acostados aos autos pela parte autora, que indicam grave cardiopatia, são datadas de período no qual esta já não era mais filiada ao RGPS. Com efeito, relatório emitido pelo Departamento de Hemodinâmica da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Araraquara/SP, de 10/07/1997, atestou que não havia lesão obstrutiva importante no coração da requerente (fl. 57). Os exames de fls. 58/66 não indicam alterações importantes no estado de saúde da autora, a não serem índices pouco acima do normal de glicemia. À fl. 67, consta nível de colesterol considerado de alto risco, porém, o exame é datado de 28/03/2001, quando de há muito, a requerente não era mais segurada da Previdência Social. Por sua vez, declaração médica de fl. 69, a qual assevera estar a demandante "impossibilitada de exercer suas atividades profissionais", é datada de 11/12/2002. 12 - Cabia a parte autora demonstrar que já estava incapacitada para o trabalho, quando ainda era filiada no RGPS, seja por meio da juntada de outros documentos, seja por meio de impugnação do laudo pericial, conforme determina o art. 333, I, do CPC/1973 (reproduzido pelo art. 373, I, do CPC/2015). 13 - Como bem destacado pelo MM. Juiz a quo, "apesar das alegações da autora de que a doença surgiu quando ainda detinha a condição de segurada, tal fato não restou comprovado já que a declaração médica de fls. 69 é datada de 11/12/2002, quando já havia perdido a condição de segurada. Infere-se, daí, que a autora não deixou de trabalhar por estar incapacitada para o trabalho. Assim, a autora não produziu qualquer outra prova de que tenha deixado de filiar-se à Previdência Social, após o término de seu último vínculo empregatício, em razão da doença" (fl. 177). 14 - Cumpre lembrar que ainda que a autora comprovasse a situação de desemprego, nos termos do disposto do §2º do artigo 15, da Lei 8.213/91, permanecendo como segurada por mais 12 (doze) meses, até 15/10/2000, portanto, a incapacidade teria surgido mais de 2 (dois) anos depois. 15 - Em suma, não tendo demonstrado a qualidade de segurada quando da DII, como exigem os já citados artigos 42 e 59 da Lei 8.213/91, de rigor o indeferimento dos pedidos de auxílio-doença e da aposentadoria por invalidez. 16 - O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo social, assegurando o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 17 - A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os requisitos para a concessão do referido benefício, a saber: pessoa deficiente ou idoso com 65 anos ou mais e que comprove possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo. 18 - Nessa senda, reconhecida a incapacidade absoluta e permanente para o labor, inequívoca a presença, por conseguinte, do impedimento de longo prazo, característica que qualifica a Pessoa com deficiência, para os fins do disposto no artigo 20, §§2º e 10º, da Lei 8.742/93. 19 - No que se refere a hipossuficiência econômica, a Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova. Precedente jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia. 20 - No que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para comprovar a condição de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93. 21 - O estudo social realizado em 06 de maio de 2009 (fls. 163/165) informou ser o núcleo familiar composto por 4 (quatro) pessoas: a autora, seu cônjuge, um filho e um neto. Segundo relatado pela assistente social, "no que se refere às condições de moradia a construção é de alvenaria, com laje, as paredes são rebocadas e pintadas, o banheiro é azulejado, o piso é de cerâmica. Possui água encanada, rede esgoto e energia elétrica. O quintal nos fundos tem uma parte cimentada onde fica o tanque para lavar roupa e o varal para secar roupa, outra parte de terra. Na frente tem uma garagem coberta e um portão de ferro. No que tange à limpeza, higiene e organização pude observar que tudo estava muito limpo e organizado". A renda familiar conforme indicado no estudo social, é composta pela aposentadoria do cônjuge da requerente, no valor de R$2.200,00, pelo salário percebido por seu filho, no montante de R$790,00, totalizando, à época, a quantia de R$2.990,00, além de uma cesta básica recebida por este último. Em contrapartida, os gastos informados pela família, giram em torno de R$2.686,19, por mês, incluindo financiamento de 2 (duas) motocicletas e da residência, gastos com supermercado, alimentação, luz, água, gás, IPTU, medicações, combustível, transporte intermunicipal, dentre outros. Acresce a assistente que "todas as contas estão devidamente em dia" e que a demandante recebe parte dos medicamentos do Poder Público, além de fazer acompanhamento em Unidade Básica de Saúde, vinculada ao SUS. 22 - Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório, verifica-se que o núcleo familiar não se enquadra na concepção legal de hipossuficiência econômica, não fazendo jus a autora, também, ao benefício assistencial de prestação continuada. 23 - O benefício assistencial da prestação continuada é auxílio que deve ser prestado pelo Estado, portanto, por toda a sociedade, in extremis, ou seja, nas específicas situações que preencham os requisitos legais estritos, bem como se e quando a situação de quem o pleiteia efetivamente o recomende, no que se refere ao pouco deixado pelo legislador para a livre interpretação do Poder Judiciário. 24 - Ainda que o magistrado sensibilize-se com a situação apresentada pela parte autora e compadeça-se com a horripilante realidade a que são submetidos os trabalhadores em geral, não pode determinar à Seguridade a obrigação de pagamento de benefício, que independe de contribuição, ou seja, cujo custeio sairá da receita do órgão pagador - contribuições previdenciárias e sociais - e cujos requisitos mínimos não foram preenchidos, sob pena de criar perigoso precedente que poderia causar de vez a falência do já cambaleado Instituto Securitário. 25 - O benefício em questão, que independe de custeio, não se destina à complementação da renda familiar baixa e a sua concessão exige do julgador exerça a ingrata tarefa de distinguir faticamente entre as situações de pobreza e de miserabilidade, eis que tem por finalidade precípua prover a subsistência daquele que o requer. 26 - Apelação da parte autora desprovida. Sentença mantida. Ação julgada improcedente.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, mantendo íntegra, com acréscimo de fundamentos, a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 06/11/2017
Data da Publicação : 16/11/2017
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1521676
Órgão Julgador : SÉTIMA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/11/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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