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Jurisprudência


TRF3 0001189-22.2013.4.03.6116 00011892220134036116

Ementa
APELAÇÃO CRIMINAL. PENAL. SUPOSTO ESTELIONATO NO ÂMBITO DO PROGRAMA HABITACIONAL MINHA CASA, MINHA VIDA - LOCAÇÃO DE IMÓVEL DESTINADO À MORADIA DO BENEFICIÁRIO (ART. 171, § 3º, DO CP) - AUSÊNCIA DE DOLO E ATIPICIDADE DA CONDUTA. 1. Acusação de obtenção de vantagem ilícita, consistente no recebimento de alugueres provenientes de imóvel adquirido mediante financiamento com alienação fiduciária pelo programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, que deveria ser destinado à residência própria ou de sua família, supostamente mediante fraude contra a Caixa Econômica Federal. 2. Consta dos autos instrumento contratual de locação residencial do imóvel em questão, com estipulação do prazo de 06 (seis) meses, a partir de 08.09.2011 e a terminar em 08.03.2012, mediante o preço de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais) mensais, com adiantamento do valor equivalente a dois meses - R$ 500,00 (quinhentos reais), o que não permite a conclusão inequívoca de que o caso retrata estelionato, pois o interrogatório judicial do acusado e o depoimento do locatário dão conta de a locação ocorreu em um contexto peculiar, denotando a ausência de intenção de fraudar. 3. Considerando todas as peculiaridades do caso, especialmente o curto prazo da locação e a prova oral no sentido de que o acusado pretendia residir no imóvel, a versão do apelante mostra-se não apenas possível, mas provável, haja vista que a locação em questão foi acordada em âmbito de relacionamento de amizade íntima, influenciada pela necessidade pessoal dos locatários e por curta duração, sendo certo que o acusado manifestou sua intenção de lá residir, de forma que a relação locatícia decorreu de fatores acidentais. 4. Ausência de intenção preordenada de obter um imóvel financiado pelo programa habitacional Minha Casa, Minha Vida a fim de alugá-lo para fazer renda, diversamente do que alega a acusação. 5. Nem sempre se constituem em condutas criminosas as hipóteses de descumprimento contratual que se resolvem com mecanismos endocontratuais: a rescisão da avença e a execução da garantia em favor da Caixa Econômica Federal. Diante da ausência de dolo de deturpar a finalidade do imóvel, não se pode afirmar que o financiamento foi fraudado, embora tenha sido, sim, descumprido. 6. Não se pode olvidar do caráter fragmentário do Direito Penal, que não deve atuar diante de casos cuja resolução se perfaz completamente no âmbito cível, sob pena de converter o mero descumprimento contratual em figura penalmente relevante, o que traria insegurança jurídica à sociedade. Tanto é assim que a própria denúncia preocupa-se em corporificar o elemento subjetivo ao afirmar que o acusado teria atuado com dolo antecedente, alegando que ele se cadastrou no programa federal Minha Casa, Minha Vida previamente determinado a locar o imóvel com o qual viesse a ser contemplado, quando o exame da prova demonstra que, ao menos na celebração do contrato, o acusado portou-se com boa fé, vindo posteriormente a fazer uso pontual indevido do imóvel, dando causa à resolução contratual. 7. Embora a locação, ainda que nos termos peculiares do presente caso, seja vedada pelos termos do financiamento assistido pelo programa habitacional Minha Casa, Minha Vida, tal fato não caracteriza o ilícito penal sob exame. 8. Resta clara a ausência de dolo do acusado em dar destinação diversa ao imóvel (obter renda com a locação) da que seria cabível pelos termos programa habitacional, caracterizando-se a locação examinada como mero descumprimento contratual, resolvido na esfera cível, que não caracteriza a fraude tipificada pelo art. 171 do Código Penal, de sorte a impor-se a absolvição do acusado, nos termos do art. 386, III, do Código de Processo Penal. 9. Apelação defensiva provida.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à Apelação de LUIS CARLOS DA SILVA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 27/11/2018
Data da Publicação : 04/12/2018
Classe/Assunto : Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 64095
Órgão Julgador : DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940 LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-171 PAR-3 ***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-386 INC-3
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/12/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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