TRF3 0001328-74.2013.4.03.6115 00013287420134036115
PENAL. PROCESSUAL. ARTIGO 34, PARÁGRAFO ÚNICO, II, DA LEI 9.605/98. PESCA
AMADORA PREDATÓRIA, MEDIANTE PETRECHO DE USO NÃO PEMITIDO, NOS TERMOS
DO ARTIGO 7º E 8º DA INSTRUÇÃO NORMATIVA IBAMA N. 26/2009. REDE
DE NYLON DURO DO TIPO TARRAFA COM MALHAS DE 70 A 80MM E 25 METROS DE
CIRCUNFERÊNCIA. IRRELEVÂNCIA DA QUANTIDADE EFETIVAMENTE PESCADA PELOS
COACUSADOS, EM CONCURSO DE PESSOAS. CONDUTAS TÍPICAS. INAPLICABILIDADE DO
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NO CASO CONCRETO. DIREITO AO MEIO AMBIENTE
ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO. MATERIALIDADE E AUTORIA INCONTROVERSAS. DOLO
CONFIGURADO. PENA CORPORAL FIXADA NO MÍNIMO PATAMAR LEGAL E SUBSTITUÍDA
POR UMA ÚNICA RESTRITIVA DE DIREITOS. APELO MINISTERIAL PROVIDO.
1. Os apelados EDSON ROGÉRIO DOS SANTOS e RENATO MARÇAL DE OLIVEIRA foram
absolvidos, pelo Juízo Federal da 1ª Vara Federal de São Carlos/SP, do
crime previsto no artigo 34, parágrafo único, inciso II, da Lei 9.605/98,
em concurso de pessoas, com fulcro no artigo 386, III, do Código de Processo
Penal.
2. Em suas razões de apelação (fls. 237/245), o Ministério Público
Federal pleiteia, acertadamente, a reforma da r. sentença, para que os
corréus sejam condenados nos termos da denúncia, uma vez que o princípio
da insignificância restaria inaplicável na presente hipótese.
3. De início, observou-se que a materialidade delitiva e a autoria, assim como
o dolo dos coacusados, restaram incontestes: Boletim de Ocorrência Ambiental
n. 121620 (fls. 04/05 - Apenso I); Autos de Infração Ambiental n. 271983
(fl. 06 - Apenso I) e n. 271984 (fl. 07 - Apenso I); Laudo Pericial Ambiental
n. 256/2013 (fls. 22/24); depoimentos das testemunhas em sede policial (fl. 26)
e em juízo (fls. 195/196); interrogatórios dos coacusados em sede policial
(fls. 12 e 14) e em juízo (fls. 197/201-mídia).
4. Incursos no artigo 34, parágrafo único, II, da Lei 9.605/98, ficou,
de fato, comprovado que os pescadores amadores EDSON ROGÉRIO DOS SANTOS e
RENATO MARÇAL DE OLIVEIRA, em concurso de pessoas, incorreram, de maneira
livre e consciente, em 09/05/2012, em atos de pesca proibida, na modalidade
embarcada, no Rio Mogi-Guaçu, no Município de Porto Ferreira/SP, mediante
petrecho de uso não permitido para pescadores amadores, a saber, uma rede
de nylon duro do tipo tarrafa com 25 metros de circunferência e malhas de 70
a 80mm, a qual restou consigo apreendida ainda em estado molhado no interior
da embarcação motorizada utilizada pelos corréus na ocasião da referida
abordagem policial ambiental, em claro desacordo com os artigos 7º e 8º
da Instrução Normativa IBAMA n. 26/2009.
5. Com efeito, a Instrução Normativa IBAMA n. 26, de 02 de setembro de
2009, ao estabelecer normas gerais de pesca para a bacia hidrográfica do
rio Paraná, veio a elencar, taxativamente, em seus artigos 7º e 8º, os
petrechos de uso permitido para pesca amadora, entre os quais não se incluem
aquele apreendido, de maneira incontroversa, em poder dos coacusados às
fls. 04/05 do Apenso (uma tarrafa de nylon duro do tipo tarrafa com malhas
de 70 a 80mm e 25 metros de circunferência).
6. A despeito da posição adotada pelo Juízo Federal a quo, entendeu-se
que a conduta imputada aos corréus não admite, no caso concreto, eventual
incidência do princípio da insignificância (cuja aplicação não pode
ser banalizada, ainda mais em crimes ambientais), uma vez que o bem penal
juridicamente tutelado não se limita à proteção daqueles exemplares
de pescados individualmente considerados, mas do ecossistema como um todo
(ecologicamente equilibrado), enquanto macrobem essencial à sadia qualidade
de vida das presentes e futuras gerações, e particularmente do ecossistema
aquático, no que concerne à conservação e reprodução das espécies da
fauna ictiológica (microbens), colocadas em risco a partir da pesca amadora
predatória, em tese, praticada pelos apelados, mediante o uso de petrecho,
sabidamente, não permitido para pescadores amadores (rede de nylon duro
do tipo tarrafa), nos termos dos artigos 7º e 8º da Instrução Normativa
IBAMA n. 26, de 02 de setembro de 2009.
7. Trata-se de crime formal que se perfectibiliza com qualquer ato tendente
a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes
ictiológicos, consumando-se com a simples conduta capaz de produzir
materialmente o resultado danoso, ainda que nenhuma quantidade de peixe
houvesse sido efetivamente capturada pelos coacusados, a qual, em existindo,
consistiria, em mero exaurimento do tipo penal em comento. Precedentes do
STJ e deste E-TRF3.
8. A propósito, é pacífica na doutrina e na jurisprudência a independência
entre a esfera administrativa e a criminal, mormente em matéria ambiental,
nos termos do artigo 225, § 3º, da Constituição Federal ("As condutas e
atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores,
pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados").
9. No mais, restaram incontestes a materialidade e autoria delitivas, assim
como o dolo de EDSON ROGÉRIO DOS SANTOS e RENATO MARÇAL DE OLIVEIRA, em
relação à prática do delito previsto no artigo 34, parágrafo único,
inciso II, da Lei 9.605/98, à míngua de eventual erro sobre a ilicitude
do fato ou mesmo sobre os elementos do tipo, impondo-se, de rigor, a sua
condenação, em concurso de pessoas.
10. Pena corporal de cada corréu fixada no mínimo patamar legal, a saber,
01 (um) ano de detenção, em regime inicial aberto, substituída por uma
única restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à
comunidade, pelo mesmo prazo da pena corporal substituída, em entidade
a ser designada pelo Juízo de Execução, nos moldes dos artigos 8º, I,
e 9º da Lei 9.605/98.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL. ARTIGO 34, PARÁGRAFO ÚNICO, II, DA LEI 9.605/98. PESCA
AMADORA PREDATÓRIA, MEDIANTE PETRECHO DE USO NÃO PEMITIDO, NOS TERMOS
DO ARTIGO 7º E 8º DA INSTRUÇÃO NORMATIVA IBAMA N. 26/2009. REDE
DE NYLON DURO DO TIPO TARRAFA COM MALHAS DE 70 A 80MM E 25 METROS DE
CIRCUNFERÊNCIA. IRRELEVÂNCIA DA QUANTIDADE EFETIVAMENTE PESCADA PELOS
COACUSADOS, EM CONCURSO DE PESSOAS. CONDUTAS TÍPICAS. INAPLICABILIDADE DO
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NO CASO CONCRETO. DIREITO AO MEIO AMBIENTE
ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO. MATERIALIDADE E AUTORIA INCONTROVERSAS. DOLO
CONFIGURADO. PENA CORPORAL FIXADA NO MÍNIMO PATAMAR LEGAL E SUBSTITUÍDA
POR UMA ÚNICA RESTRITIVA DE DIREITOS. APELO MINISTERIAL PROVIDO.
1. Os apelados EDSON ROGÉRIO DOS SANTOS e RENATO MARÇAL DE OLIVEIRA foram
absolvidos, pelo Juízo Federal da 1ª Vara Federal de São Carlos/SP, do
crime previsto no artigo 34, parágrafo único, inciso II, da Lei 9.605/98,
em concurso de pessoas, com fulcro no artigo 386, III, do Código de Processo
Penal.
2. Em suas razões de apelação (fls. 237/245), o Ministério Público
Federal pleiteia, acertadamente, a reforma da r. sentença, para que os
corréus sejam condenados nos termos da denúncia, uma vez que o princípio
da insignificância restaria inaplicável na presente hipótese.
3. De início, observou-se que a materialidade delitiva e a autoria, assim como
o dolo dos coacusados, restaram incontestes: Boletim de Ocorrência Ambiental
n. 121620 (fls. 04/05 - Apenso I); Autos de Infração Ambiental n. 271983
(fl. 06 - Apenso I) e n. 271984 (fl. 07 - Apenso I); Laudo Pericial Ambiental
n. 256/2013 (fls. 22/24); depoimentos das testemunhas em sede policial (fl. 26)
e em juízo (fls. 195/196); interrogatórios dos coacusados em sede policial
(fls. 12 e 14) e em juízo (fls. 197/201-mídia).
4. Incursos no artigo 34, parágrafo único, II, da Lei 9.605/98, ficou,
de fato, comprovado que os pescadores amadores EDSON ROGÉRIO DOS SANTOS e
RENATO MARÇAL DE OLIVEIRA, em concurso de pessoas, incorreram, de maneira
livre e consciente, em 09/05/2012, em atos de pesca proibida, na modalidade
embarcada, no Rio Mogi-Guaçu, no Município de Porto Ferreira/SP, mediante
petrecho de uso não permitido para pescadores amadores, a saber, uma rede
de nylon duro do tipo tarrafa com 25 metros de circunferência e malhas de 70
a 80mm, a qual restou consigo apreendida ainda em estado molhado no interior
da embarcação motorizada utilizada pelos corréus na ocasião da referida
abordagem policial ambiental, em claro desacordo com os artigos 7º e 8º
da Instrução Normativa IBAMA n. 26/2009.
5. Com efeito, a Instrução Normativa IBAMA n. 26, de 02 de setembro de
2009, ao estabelecer normas gerais de pesca para a bacia hidrográfica do
rio Paraná, veio a elencar, taxativamente, em seus artigos 7º e 8º, os
petrechos de uso permitido para pesca amadora, entre os quais não se incluem
aquele apreendido, de maneira incontroversa, em poder dos coacusados às
fls. 04/05 do Apenso (uma tarrafa de nylon duro do tipo tarrafa com malhas
de 70 a 80mm e 25 metros de circunferência).
6. A despeito da posição adotada pelo Juízo Federal a quo, entendeu-se
que a conduta imputada aos corréus não admite, no caso concreto, eventual
incidência do princípio da insignificância (cuja aplicação não pode
ser banalizada, ainda mais em crimes ambientais), uma vez que o bem penal
juridicamente tutelado não se limita à proteção daqueles exemplares
de pescados individualmente considerados, mas do ecossistema como um todo
(ecologicamente equilibrado), enquanto macrobem essencial à sadia qualidade
de vida das presentes e futuras gerações, e particularmente do ecossistema
aquático, no que concerne à conservação e reprodução das espécies da
fauna ictiológica (microbens), colocadas em risco a partir da pesca amadora
predatória, em tese, praticada pelos apelados, mediante o uso de petrecho,
sabidamente, não permitido para pescadores amadores (rede de nylon duro
do tipo tarrafa), nos termos dos artigos 7º e 8º da Instrução Normativa
IBAMA n. 26, de 02 de setembro de 2009.
7. Trata-se de crime formal que se perfectibiliza com qualquer ato tendente
a retirar, extrair, coletar, apanhar, apreender ou capturar espécimes
ictiológicos, consumando-se com a simples conduta capaz de produzir
materialmente o resultado danoso, ainda que nenhuma quantidade de peixe
houvesse sido efetivamente capturada pelos coacusados, a qual, em existindo,
consistiria, em mero exaurimento do tipo penal em comento. Precedentes do
STJ e deste E-TRF3.
8. A propósito, é pacífica na doutrina e na jurisprudência a independência
entre a esfera administrativa e a criminal, mormente em matéria ambiental,
nos termos do artigo 225, § 3º, da Constituição Federal ("As condutas e
atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores,
pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados").
9. No mais, restaram incontestes a materialidade e autoria delitivas, assim
como o dolo de EDSON ROGÉRIO DOS SANTOS e RENATO MARÇAL DE OLIVEIRA, em
relação à prática do delito previsto no artigo 34, parágrafo único,
inciso II, da Lei 9.605/98, à míngua de eventual erro sobre a ilicitude
do fato ou mesmo sobre os elementos do tipo, impondo-se, de rigor, a sua
condenação, em concurso de pessoas.
10. Pena corporal de cada corréu fixada no mínimo patamar legal, a saber,
01 (um) ano de detenção, em regime inicial aberto, substituída por uma
única restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à
comunidade, pelo mesmo prazo da pena corporal substituída, em entidade
a ser designada pelo Juízo de Execução, nos moldes dos artigos 8º, I,
e 9º da Lei 9.605/98.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da
3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação ministerial,
para reformar a r. sentença, condenando EDSON ROGÉRIO DOS SANTOS e
RENATO MARÇAL DE OLIVEIRA, pela prática delitiva descrita no artigo 34,
parágrafo único, inciso II, da Lei 9.605/98, em concurso de pessoas, à
pena de 01 (um) ano de detenção, em regime inicial aberto, substituída
a pena privativa de liberdade de cada corréu por uma única restritiva
de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade, pelo
mesmo prazo da pena corporal substituída, em entidade a ser designada pelo
Juízo de Execução, nos moldes dos artigos 8º, I, e 9º da Lei 9.605/98,
em consonância com o relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado. Votaram os(as) Juíza Conv. Giselle França e Juiz
Conv. Alessandro Diaferia. Ausente justificadamente o(a) Des. Fed. Nino Toldo.
Data do Julgamento
:
26/09/2017
Data da Publicação
:
06/10/2017
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 71780
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED LEI-9605 ANO-1998 ART-34 PAR-ÚNICO INC-2 ART-8 INC-1 ART-9
LEG-FED INT-26 ANO-2009 ART-7 ART-8
IBAMA
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-386 INC-3
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-225 PAR-3
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/10/2017
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