TRF3 0001353-55.2011.4.03.6116 00013535520114036116
PENAL. ART. 273, § 1º E § 1º-B, I, DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO DA
INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO. MATERIALIDADE E AUTORIA
DELITIVAS DEVIDAMENTE COMPROVADAS. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO IMPOSTA
NO 1º GRAU DE JURISDIÇÃO. QUESTÃO RELATIVA À PROPORCIONALIDADE DO
PRECEITO SECUNDÁRIO DO ART. 273, § 1º-B, I, DO CÓDIGO PENAL. ADOÇÃO DO
ENTENDIMENTO QUE SUFRAGA A INCIDÊNCIA DAS PENAS CONSTANTES DO ART. 33 DA
LEI Nº 11.343/2006 AO AGENTE QUE COMETE A INFRAÇÃO CONTIDA NO ART. 273,
§ 1º-B, I, DO CÓDIGO PENAL. DOSIMETRIA PENAL.
- O princípio da insignificância (ou da bagatela) demanda ser interpretado
à luz dos postulados da mínima intervenção do Direito Penal e da ultima
ratio no sentido de que este não pode ser a primeira opção prevista no
ordenamento jurídico como forma de debelar uma situação concreta (daí
porque sua necessidade de intervenção mínima e no contexto da última
fronteira para restabelecer a paz social). Em outras palavras, entende-se que
o Direito Penal não deve interferir em demasia na vida do indivíduo para
tolher sua autonomia ou sua liberdade na justa medida em que determinados fatos
ou determinada situação ensejam a incidência de outros ramos do Direito
(que se mostram aptos a afastar a crise que se instaurou) - na falta de
solução adequada à lide instaurada na sociedade (não resolvida, portanto,
pela atuação dos demais segmentos do Direito), tem cabimento ser chamado
à baila o legislador pátrio a fim de que a conduta não pacificada seja
tipificada como delito por meio da edição de uma lei penal incriminadora.
- A insignificância surge como forma de afastar a aplicação do Direito
Penal a fatos de somenos importância (e que, portanto, podem ser debelados
com supedâneo nos demais ramos da Ciência Jurídica - fragmentariedade do
Direito Penal), afastando a tipicidade da conduta sob o aspecto material ao
reconhecer que ela possui um reduzido grau de reprovabilidade e que houve
pequena ofensa ao bem jurídico tutelado, remanescendo apenas a tipicidade
formal, ou seja, a adequação do fato à lei penal incriminadora.
- A jurisprudência do C. Supremo Tribunal Federal tem exigido, para a
aplicação do referido postulado, o preenchimento concomitante dos seguintes
requisitos: 1) mínima ofensividade da conduta do agente; 2) ausência de
periculosidade social da ação; 3) reduzido grau de reprovabilidade do
comportamento; e 4) relativa inexpressividade da lesão jurídica. Logo,
depreende-se que a incidência da bagatela demanda análise criteriosa caso
a caso.
- Especificamente no que tange ao crime elencado no art. 273, § 1º e §
1º-B, do Código Penal, mostra-se impertinente o pleito de incidência do
postulado da bagatela tendo em vista que o delito mencionado visa tutelar
a saúde pública (bem jurídico de titularidade coletiva), possuindo,
imbricado ao juízo de valor levado a efeito pelo legislador, um alto
grau de reprovabilidade do comportamento daquele que perpetra a conduta,
sem se descurar da grave periculosidade social decorrente da importação de
medicamento não aprovado pelo órgão regulamentar competente - desta feita,
diante de mácula a bem jurídico de suma importância, impossível cogitar-se
da incidência do postulado em tela. Precedentes do C. Supremo Tribunal
Federal, do E. Superior Tribunal de Justiça e desta C. Corte Regional.
- Materialidade e autoria delitivas devidamente comprovadas, sendo imperiosa
a manutenção de édito penal condenatório em desfavor do acusado.
- A função jurisdicional é limitada (sobretudo pelo principio constitucional
da separação de poderes), sendo a análise da proporcionalidade da pena
um ato que cabe, fundamentalmente, ao legislador. No entanto, em casos que
se enquadram no tipo penal do art. 273, § 1º-B, do Código Penal, em que a
desproporcionalidade é não apenas evidente como gritante, é dever do juiz
proceder com a adequada valoração da conduta do réu levando em conta se
esta realmente corresponde àquela que a norma estabeleça um dever de evitar.
- Os crimes contra a saúde pública acarretam punições mais rigorosas por
sua própria natureza, uma vez que possuem, em regra, um grande potencial
lesivo à comunidade. Ademais, geralmente são caracterizados pela alta
probabilidade de que as vítimas sejam ludibriadas, fato que não ocorre
nos delitos envolvendo entorpecentes (abrangidos pela Lei nº 11.343/2006),
pois nestes normalmente as vítimas estão cientes acerca da ilicitude da
substância e das chances consideráveis de ter sido adulterada.
- Portanto, se por um lado justifica-se a previsão de penas mais severas
para condutas mais censuráveis, como as do caput e as dos §§ 1º e 1º-A
do art. 273 do Código Penal, que implicam necessariamente em dano potencial
às vítimas diretas, de outro não se pode tolher a individualização da
pena às circunstâncias do caso concreto quando estas forem relativas ao §
1º-B do mesmo dispositivo. É evidente que, fazendo-se uma comparação,
ainda que breve, tratam-se de atos muito distintos - e que implicam riscos
quase incomparáveis entre si - os de: a) introduzir no país medicamentos
que não têm registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária -
ANVISA, mesmo que não seja para uso pessoal e b) falsificar, adulterar ou
vender remédios e produtos relacionados sabidamente alterados (casos em que,
em regra, o adquirente desconhece tal fato e, ao consumir o que comprou,
não alcança o efeito desejado e/ou prejudica sua própria saúde).
- Assim, no tocante ao art. 273, § 1º-B, do Código Penal, tem-se que só é
justificável a aplicação da pena prevista quando a conduta delitiva possa
gerar grandes danos à saúde pública - o que, ressalte-se, não significa
necessariamente o reconhecimento de inconstitucionalidade da Lei nº 9.677/1998
(que incluiu o referido dispositivo no estatuto repressivo). Em casos como
o dos autos, é razoável a utilização da pena prevista para o tráfico de
drogas (art. 33 da Lei nº 11.343/2006), aplicando, para tanto, uma analogia
em favor do réu. De qualquer maneira, o C. Superior Tribunal de Justiça, em
sede de Arguição de Inconstitucionalidade (AI no HC 239.363/PR), declarou
inconstitucional o preceito secundário do art. 273, § 1º-B, do Código
Penal, por ofensa aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade,
estabelecendo a possibilidade de aplicação do preceito secundário do
art. 33 da Lei nº 11.343/2006 pela semelhança entre as condutas.
- Conquanto o Órgão Especial desta C. Corte Regional tenha se pronunciado
pela constitucionalidade do preceito sancionador do delito previsto
no art. 273, § 1º-B, do Código Penal, nos autos de Arguição de
Inconstitucionalidade nº 000793-60.2009.4.03.6124 (e-DJF3 23/08/2013),
imperioso curvar-se ao novel entendimento sufragado na matéria pelo
E. Superior Tribunal de Justiça (guardião da legislação federal).
- Negado provimento ao recurso de Apelação interposto pelo acusado LEONARDO
RIBEIRO DE ALMEIDA.
Ementa
PENAL. ART. 273, § 1º E § 1º-B, I, DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO DA
INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO. MATERIALIDADE E AUTORIA
DELITIVAS DEVIDAMENTE COMPROVADAS. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO IMPOSTA
NO 1º GRAU DE JURISDIÇÃO. QUESTÃO RELATIVA À PROPORCIONALIDADE DO
PRECEITO SECUNDÁRIO DO ART. 273, § 1º-B, I, DO CÓDIGO PENAL. ADOÇÃO DO
ENTENDIMENTO QUE SUFRAGA A INCIDÊNCIA DAS PENAS CONSTANTES DO ART. 33 DA
LEI Nº 11.343/2006 AO AGENTE QUE COMETE A INFRAÇÃO CONTIDA NO ART. 273,
§ 1º-B, I, DO CÓDIGO PENAL. DOSIMETRIA PENAL.
- O princípio da insignificância (ou da bagatela) demanda ser interpretado
à luz dos postulados da mínima intervenção do Direito Penal e da ultima
ratio no sentido de que este não pode ser a primeira opção prevista no
ordenamento jurídico como forma de debelar uma situação concreta (daí
porque sua necessidade de intervenção mínima e no contexto da última
fronteira para restabelecer a paz social). Em outras palavras, entende-se que
o Direito Penal não deve interferir em demasia na vida do indivíduo para
tolher sua autonomia ou sua liberdade na justa medida em que determinados fatos
ou determinada situação ensejam a incidência de outros ramos do Direito
(que se mostram aptos a afastar a crise que se instaurou) - na falta de
solução adequada à lide instaurada na sociedade (não resolvida, portanto,
pela atuação dos demais segmentos do Direito), tem cabimento ser chamado
à baila o legislador pátrio a fim de que a conduta não pacificada seja
tipificada como delito por meio da edição de uma lei penal incriminadora.
- A insignificância surge como forma de afastar a aplicação do Direito
Penal a fatos de somenos importância (e que, portanto, podem ser debelados
com supedâneo nos demais ramos da Ciência Jurídica - fragmentariedade do
Direito Penal), afastando a tipicidade da conduta sob o aspecto material ao
reconhecer que ela possui um reduzido grau de reprovabilidade e que houve
pequena ofensa ao bem jurídico tutelado, remanescendo apenas a tipicidade
formal, ou seja, a adequação do fato à lei penal incriminadora.
- A jurisprudência do C. Supremo Tribunal Federal tem exigido, para a
aplicação do referido postulado, o preenchimento concomitante dos seguintes
requisitos: 1) mínima ofensividade da conduta do agente; 2) ausência de
periculosidade social da ação; 3) reduzido grau de reprovabilidade do
comportamento; e 4) relativa inexpressividade da lesão jurídica. Logo,
depreende-se que a incidência da bagatela demanda análise criteriosa caso
a caso.
- Especificamente no que tange ao crime elencado no art. 273, § 1º e §
1º-B, do Código Penal, mostra-se impertinente o pleito de incidência do
postulado da bagatela tendo em vista que o delito mencionado visa tutelar
a saúde pública (bem jurídico de titularidade coletiva), possuindo,
imbricado ao juízo de valor levado a efeito pelo legislador, um alto
grau de reprovabilidade do comportamento daquele que perpetra a conduta,
sem se descurar da grave periculosidade social decorrente da importação de
medicamento não aprovado pelo órgão regulamentar competente - desta feita,
diante de mácula a bem jurídico de suma importância, impossível cogitar-se
da incidência do postulado em tela. Precedentes do C. Supremo Tribunal
Federal, do E. Superior Tribunal de Justiça e desta C. Corte Regional.
- Materialidade e autoria delitivas devidamente comprovadas, sendo imperiosa
a manutenção de édito penal condenatório em desfavor do acusado.
- A função jurisdicional é limitada (sobretudo pelo principio constitucional
da separação de poderes), sendo a análise da proporcionalidade da pena
um ato que cabe, fundamentalmente, ao legislador. No entanto, em casos que
se enquadram no tipo penal do art. 273, § 1º-B, do Código Penal, em que a
desproporcionalidade é não apenas evidente como gritante, é dever do juiz
proceder com a adequada valoração da conduta do réu levando em conta se
esta realmente corresponde àquela que a norma estabeleça um dever de evitar.
- Os crimes contra a saúde pública acarretam punições mais rigorosas por
sua própria natureza, uma vez que possuem, em regra, um grande potencial
lesivo à comunidade. Ademais, geralmente são caracterizados pela alta
probabilidade de que as vítimas sejam ludibriadas, fato que não ocorre
nos delitos envolvendo entorpecentes (abrangidos pela Lei nº 11.343/2006),
pois nestes normalmente as vítimas estão cientes acerca da ilicitude da
substância e das chances consideráveis de ter sido adulterada.
- Portanto, se por um lado justifica-se a previsão de penas mais severas
para condutas mais censuráveis, como as do caput e as dos §§ 1º e 1º-A
do art. 273 do Código Penal, que implicam necessariamente em dano potencial
às vítimas diretas, de outro não se pode tolher a individualização da
pena às circunstâncias do caso concreto quando estas forem relativas ao §
1º-B do mesmo dispositivo. É evidente que, fazendo-se uma comparação,
ainda que breve, tratam-se de atos muito distintos - e que implicam riscos
quase incomparáveis entre si - os de: a) introduzir no país medicamentos
que não têm registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária -
ANVISA, mesmo que não seja para uso pessoal e b) falsificar, adulterar ou
vender remédios e produtos relacionados sabidamente alterados (casos em que,
em regra, o adquirente desconhece tal fato e, ao consumir o que comprou,
não alcança o efeito desejado e/ou prejudica sua própria saúde).
- Assim, no tocante ao art. 273, § 1º-B, do Código Penal, tem-se que só é
justificável a aplicação da pena prevista quando a conduta delitiva possa
gerar grandes danos à saúde pública - o que, ressalte-se, não significa
necessariamente o reconhecimento de inconstitucionalidade da Lei nº 9.677/1998
(que incluiu o referido dispositivo no estatuto repressivo). Em casos como
o dos autos, é razoável a utilização da pena prevista para o tráfico de
drogas (art. 33 da Lei nº 11.343/2006), aplicando, para tanto, uma analogia
em favor do réu. De qualquer maneira, o C. Superior Tribunal de Justiça, em
sede de Arguição de Inconstitucionalidade (AI no HC 239.363/PR), declarou
inconstitucional o preceito secundário do art. 273, § 1º-B, do Código
Penal, por ofensa aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade,
estabelecendo a possibilidade de aplicação do preceito secundário do
art. 33 da Lei nº 11.343/2006 pela semelhança entre as condutas.
- Conquanto o Órgão Especial desta C. Corte Regional tenha se pronunciado
pela constitucionalidade do preceito sancionador do delito previsto
no art. 273, § 1º-B, do Código Penal, nos autos de Arguição de
Inconstitucionalidade nº 000793-60.2009.4.03.6124 (e-DJF3 23/08/2013),
imperioso curvar-se ao novel entendimento sufragado na matéria pelo
E. Superior Tribunal de Justiça (guardião da legislação federal).
- Negado provimento ao recurso de Apelação interposto pelo acusado LEONARDO
RIBEIRO DE ALMEIDA.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO ao recurso de Apelação interposto pelo
acusado LEONARDO RIBEIRO DE ALMEIDA, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
23/10/2018
Data da Publicação
:
05/11/2018
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 72507
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-273 PAR-1 PAR-1A PAR-1B INC-1
LEG-FED LEI-9677 ANO-1998
***** LDR-06 LEI DE DROGAS
LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-33
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/11/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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