TRF3 0001413-86.2015.4.03.6116 00014138620154036116
PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 171, § 3º, C. C. O ART. 71, DO CÓDIGO
PENAL. PROGRAMA FARMÁCIA POPULAR. PRELIMINAR. SENTENÇA CITRA
PETITA. RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. ANULAÇÃO. INADMISSIBILIDADE.
DENÚNCIA. INÉPCIA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. JUSTA CAUSA. INDÍCIOS SUFICIENTES
DE AUTORIA E MATERIALIDE. SENTENÇA. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. NULIDADE
POR OFENSA AO ART. 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NÃO
OCORRÊNCIA. PROVA EMPRESTADA. ADMISSIBILIDADE. EXAME DE CORPO DE
DELITO. ESTELIONATO. MATERIALIDADE. COMPROVAÇÃO. AUTORIA. COMPROVAÇÃO
EM PARTE. DOSIMETRIA. BIS IN IDEM. REDUÇÃO DA PENA. APELAÇÃO CRIMINAL
PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Reza a Súmula n. 160 do Supremo Tribunal Federal: "É nula a decisão
do tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não arguida no recurso
da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício". Precedentes
do Superior Tribunal de Justiça desabonam a anulação da sentença para
agravar a situação do réu quando a acusação não postulou sanar o vício:
"1. É vedado ao Tribunal a quo agravar a situação do Paciente, em sede
de recurso de apelação criminal interposta exclusivamente pela Defesa, sob
pena de incorrer em violação ao princípio da ne reformatio in pejus. 2. Se
o Ministério Público não se insurgiu contra a omissão, não pode a Corte
estadual reconhecer de ofício que a sentença foi citra petita e determinar
que o Juízo monocrático se pronuncie sobre toda a extensão da inicial
acusadora" (STJ, HC n. 107990, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 28.08.08). Ainda que
anulada a sentença, é defeso ao juiz agravar a sanção penal: "I. 'Anulada
uma decisão em face de recurso exclusivo da defesa, não é possível,
em novo julgamento, agravar a sua situação. Como o Ministério Público
se conformara com a primeira decisão, não apelando dela, não pode o Juiz,
após a anulação daquela, proferir uma decisão mais severa contra o réu'"
(STJ, REsp n. 225248, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 02.02.06).
2. Denúncia. O juízo realizado no recebimento da denúncia é de cognição
sumária e requer a verificação da existência de suporte probatório
mínimo da materialidade do crime e de indícios suficientes da autoria. A
denúncia deve atender aos requisitos do art. 41 do Código de Processo
Penal e não incidir em nenhuma das hipóteses do art. 395 do Código de
Processo Penal. Atenderá aos requisitos legais a denúncia que contiver
a exposição do fato criminoso com todas as circunstâncias necessárias
à configuração do delito, os indícios de autoria, a classificação
jurídica do delito e, se necessário, o rol de testemunhas, possibilitando
ao acusado compreender a acusação que sobre ele recai e sua atuação
na prática delitiva para assegurar o exercício do contraditório e da
ampla defesa. A rejeição da denúncia ocorrerá apenas quando, de plano,
não se verificarem os requisitos formais a evidenciar sua inépcia,
faltar pressuposto processual para seu exercício ou não houver justa
causa, incidindo, em casos duvidosos, o princípio in dubio pro societate,
a determinar a instauração da ação penal para esclarecimento dos fatos
durante a instrução processual penal. Precedentes do Supremo Tribunal Federal
(STF, Inq n. 2589, Rel. Min. Luiz Fux, j. 16.09.14; Inq n. 3537, Rel. Min. Dias
Toffoli, j. 09.09.14 e HC n. 100908, Rel. Min. Carlos Britto, j. 24.11.09).
3. No caso, a denúncia preencheu satisfatoriamente os requisitos legais,
inviável considerá-la inepta. A ré foi acusada porque era proprietária e
administradora de farmácia credenciada ao programa federal Farmácia Popular
e, nessa condição, registrou vendas indevidas mediante apresentação de
cópias de receitas médicas adulteradas, para induzir em erro o Ministério
da Saúde e obter pagamento subsidiado pelo governo em razão da compra de
medicamentos falsamente prescritos. A acusação foi acompanhada de suporte
probatório mínimo de indícios de autoria e prova de materialidade contra
a ré.
4. Embora úteis para elucidar os fatos relativos ao delito de estelionato,
os exames periciais não se qualificam como exame de corpo de delito (CPP,
art. 158 c. c. art. 564, III, b), pois esse crime pode ser cometido sem que
dele resultem vestígios. Exame de corpo de delito é aquele que concerne
à conduta núcleo do tipo penal, cuja realização necessariamente deixe
vestígios.
5. É admissível a utilização da prova emprestada no processo penal
quando não constitua o único elemento de prova para embasar a sentença
condenatória e desde que assegurados o contraditório e a ampla defesa
quanto a esse meio de prova (STJ, HC n. 155.149-RJ, Min. Felix Fischer,
j. 29.04.10 e HC n. 47311/SP, Rel. Min. Og Fernandes, j. 11.12.09).
6. Segundo entendimento já pacificado pelo Supremo Tribunal Federal, somente
a inexistência de fundamentação constitui causa de nulidade da decisão por
ofensa ao art. 93, IX, da Constituição da República (STF, ARE-AgR n. 725564,
Rel. Min. Rosa Weber, j. 12.05.15; ARE-AgR n. 707178, Rel. Min. Gilmar Mendes,
j. 11.12.12; ARE-ED n. 676198, Rel. Min. Luiz Fux, j. 02.10.12).
7. Materialidade comprovada.
8. Autoria parcialmente comprovada, absolvida a ré por prática dos crimes
discriminados nas tabelas 1 e 4 da denúncia por insuficiência probatória.
9. Reduzida a condenação em razão do reconhecimento de bis in idem entre
a circunstância judicial desfavorável ensejadora do aumento da pena-base
e a causa de diminuição do art. 171, § 3º, do Código Penal.
10. Apelação parcialmente provida.
Ementa
PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 171, § 3º, C. C. O ART. 71, DO CÓDIGO
PENAL. PROGRAMA FARMÁCIA POPULAR. PRELIMINAR. SENTENÇA CITRA
PETITA. RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. ANULAÇÃO. INADMISSIBILIDADE.
DENÚNCIA. INÉPCIA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. JUSTA CAUSA. INDÍCIOS SUFICIENTES
DE AUTORIA E MATERIALIDE. SENTENÇA. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. NULIDADE
POR OFENSA AO ART. 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NÃO
OCORRÊNCIA. PROVA EMPRESTADA. ADMISSIBILIDADE. EXAME DE CORPO DE
DELITO. ESTELIONATO. MATERIALIDADE. COMPROVAÇÃO. AUTORIA. COMPROVAÇÃO
EM PARTE. DOSIMETRIA. BIS IN IDEM. REDUÇÃO DA PENA. APELAÇÃO CRIMINAL
PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Reza a Súmula n. 160 do Supremo Tribunal Federal: "É nula a decisão
do tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não arguida no recurso
da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício". Precedentes
do Superior Tribunal de Justiça desabonam a anulação da sentença para
agravar a situação do réu quando a acusação não postulou sanar o vício:
"1. É vedado ao Tribunal a quo agravar a situação do Paciente, em sede
de recurso de apelação criminal interposta exclusivamente pela Defesa, sob
pena de incorrer em violação ao princípio da ne reformatio in pejus. 2. Se
o Ministério Público não se insurgiu contra a omissão, não pode a Corte
estadual reconhecer de ofício que a sentença foi citra petita e determinar
que o Juízo monocrático se pronuncie sobre toda a extensão da inicial
acusadora" (STJ, HC n. 107990, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 28.08.08). Ainda que
anulada a sentença, é defeso ao juiz agravar a sanção penal: "I. 'Anulada
uma decisão em face de recurso exclusivo da defesa, não é possível,
em novo julgamento, agravar a sua situação. Como o Ministério Público
se conformara com a primeira decisão, não apelando dela, não pode o Juiz,
após a anulação daquela, proferir uma decisão mais severa contra o réu'"
(STJ, REsp n. 225248, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 02.02.06).
2. Denúncia. O juízo realizado no recebimento da denúncia é de cognição
sumária e requer a verificação da existência de suporte probatório
mínimo da materialidade do crime e de indícios suficientes da autoria. A
denúncia deve atender aos requisitos do art. 41 do Código de Processo
Penal e não incidir em nenhuma das hipóteses do art. 395 do Código de
Processo Penal. Atenderá aos requisitos legais a denúncia que contiver
a exposição do fato criminoso com todas as circunstâncias necessárias
à configuração do delito, os indícios de autoria, a classificação
jurídica do delito e, se necessário, o rol de testemunhas, possibilitando
ao acusado compreender a acusação que sobre ele recai e sua atuação
na prática delitiva para assegurar o exercício do contraditório e da
ampla defesa. A rejeição da denúncia ocorrerá apenas quando, de plano,
não se verificarem os requisitos formais a evidenciar sua inépcia,
faltar pressuposto processual para seu exercício ou não houver justa
causa, incidindo, em casos duvidosos, o princípio in dubio pro societate,
a determinar a instauração da ação penal para esclarecimento dos fatos
durante a instrução processual penal. Precedentes do Supremo Tribunal Federal
(STF, Inq n. 2589, Rel. Min. Luiz Fux, j. 16.09.14; Inq n. 3537, Rel. Min. Dias
Toffoli, j. 09.09.14 e HC n. 100908, Rel. Min. Carlos Britto, j. 24.11.09).
3. No caso, a denúncia preencheu satisfatoriamente os requisitos legais,
inviável considerá-la inepta. A ré foi acusada porque era proprietária e
administradora de farmácia credenciada ao programa federal Farmácia Popular
e, nessa condição, registrou vendas indevidas mediante apresentação de
cópias de receitas médicas adulteradas, para induzir em erro o Ministério
da Saúde e obter pagamento subsidiado pelo governo em razão da compra de
medicamentos falsamente prescritos. A acusação foi acompanhada de suporte
probatório mínimo de indícios de autoria e prova de materialidade contra
a ré.
4. Embora úteis para elucidar os fatos relativos ao delito de estelionato,
os exames periciais não se qualificam como exame de corpo de delito (CPP,
art. 158 c. c. art. 564, III, b), pois esse crime pode ser cometido sem que
dele resultem vestígios. Exame de corpo de delito é aquele que concerne
à conduta núcleo do tipo penal, cuja realização necessariamente deixe
vestígios.
5. É admissível a utilização da prova emprestada no processo penal
quando não constitua o único elemento de prova para embasar a sentença
condenatória e desde que assegurados o contraditório e a ampla defesa
quanto a esse meio de prova (STJ, HC n. 155.149-RJ, Min. Felix Fischer,
j. 29.04.10 e HC n. 47311/SP, Rel. Min. Og Fernandes, j. 11.12.09).
6. Segundo entendimento já pacificado pelo Supremo Tribunal Federal, somente
a inexistência de fundamentação constitui causa de nulidade da decisão por
ofensa ao art. 93, IX, da Constituição da República (STF, ARE-AgR n. 725564,
Rel. Min. Rosa Weber, j. 12.05.15; ARE-AgR n. 707178, Rel. Min. Gilmar Mendes,
j. 11.12.12; ARE-ED n. 676198, Rel. Min. Luiz Fux, j. 02.10.12).
7. Materialidade comprovada.
8. Autoria parcialmente comprovada, absolvida a ré por prática dos crimes
discriminados nas tabelas 1 e 4 da denúncia por insuficiência probatória.
9. Reduzida a condenação em razão do reconhecimento de bis in idem entre
a circunstância judicial desfavorável ensejadora do aumento da pena-base
e a causa de diminuição do art. 171, § 3º, do Código Penal.
10. Apelação parcialmente provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, rejeitar a preliminar de nulidade parcial da sentença
suscitada pela Procuradoria Regional da República e dar parcial provimento
à apelação criminal para absolver a ré das imputações de prática de
estelionato indicadas nas tabelas 1 e 4 da denúncia (fls. 151v./152v.),
por insuficiência probatória (CPP, art. 386, VII), e afastar uma
circunstância judicial desfavorável do cálculo da pena, assim obtida a
redução da condenação às penas de 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 20
(vinte) dias de reclusão e 21 (vinte e um) dias-multa, substituída a pena
privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos consistentes
em prestação pecuniária de 1 (um) salário mínimo em favor de entidade
beneficente e prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas,
pelo mesmo tempo da pena de reclusão, por prática do crime do art. 171,
caput e § 3º, c. c. o art. 71 do Código Penal, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
13/03/2017
Data da Publicação
:
16/03/2017
Classe/Assunto
:
ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 69527
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Observações
:
STF INQ 2589; INQ 3537; HC 100908; ARE-AGR 725564; ARE-AGR 707178;
ARE-ED 676198;
STJ HC 155149/RJ; HC 47311/SP; HC 107990; RESP 225248.
Referência
legislativa
:
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-171 PAR-3 ART-71
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-93 INC-9
***** STF SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
LEG-FED SUM-160
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-41 ART-395 ART-158 ART-564 INC-3 LET-B
ART-386 INC-7
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/03/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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