TRF3 0001554-84.2014.4.03.6102 00015548420144036102
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. AGENTE BIOLÓGICO. AUXILIAR
DE ENFERMAGEM. DO USO DE EPI. INEFICÁCIA. AGENTE QUALITATIVO. DA CORREÇÃO
MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO.
1. Recebidas as apelações interpostas pelo INSS e pela parte autora, já que
manejadas tempestivamente, conforme certificado nos autos, e com observância
da regularidade formal, nos termos do Código de Processo Civil/2015.
2. O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será
devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições),
ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20
(vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei". Considerando
a evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i)
a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter
exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente
nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve,
em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor,
admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de
reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não
previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade;
(iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem
intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja
indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as
condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas
normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP,
SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
3. A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas
alterações. Diante de tal evolução normativa e do princípio tempus
regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de
acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -,
reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB
(até 06.03.97); superior a 90dB (de 06.03.1997 a 17.11.2003); e superior
a 85 dB, a partir de 18.11.2003. O C. STJ, quando do julgamento do Recurso
Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, firmou a
tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto 4.882/2003:
"O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de
serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a
18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto
3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003,
que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB
(ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
4. O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese
segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de
Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial
para aposentadoria". Logo, no caso de ruído, ainda que haja registro no PPP
de que o segurado fazia uso de EPI ou EPC, reconhece-se a especialidade do
labor quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado, não havendo
como se sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de
prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§
6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva
contribuição não pode ser atribuída ao trabalhador, mas sim à inércia
estatal no exercício do seu poder de polícia.
5. As atribuições do atendente de enfermagem e de auxiliar de enfermagem
equivalem, para fins de enquadramento como atividade especial, à de
enfermeira, sendo, destarte, consideradas insalubres pelos Códigos 2.1.3
do Decreto 53.831/1964 e 2.1.3, Anexo II, do Decreto 83.080/1979, já que
o contato com doentes ou materiais infecto-contagiantes é inerente às
atividades desenvolvidas por tais profissionais.
6. Como visto, até 28.04.1995, o enquadramento do labor especial poderia
ser feito com base na categoria profissional. Após essa data, o segurado
passou a ter que provar, por meio de formulário específico, a exposição
a agente nocivo, no caso biológico, previsto no item 3.0.1 do Anexo IV dos
Decretos 2.172/97 e 3.048/99.
7. No caso dos autos, considerando que, conforme se extrai dos formulários
legais em apreço, as atividades desenvolvidas pela autora, nos períodos sub
judice, implicavam em contato habitual e permanente com agentes biológicos
considerados nocivos pela legislação de regência, devem tais interregnos,
nos quais a autora trabalhou no Hospital das Clínicas da FMUSP e no Instituto
Santa Lydia, ser enquadrados como especial.
8. Não persistem dúvidas de que os PPP's noticiam a exposição a sangue,
secreção, e materiais infecto-contagiosos, sendo certo que as atividades
desenvolvidas pela segurada, nesses intervalos de tempo, importam no seu
contato com agentes biológicos nocivos de forma habitual. A descrição das
atividades deixa claro que ela executava tarefas de atendimento direto ao
paciente, estando exposta a agentes nocivos de forma habitual, o que impõe
a manutenção do reconhecimento do labor especial no período.
9. Constando do PPP que o segurado ficava exposto a agente nocivo acima do
limite de tolerância, deve-se concluir que tal exposição era, nos termos
do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência Social, não ocasional
nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da prestação do
serviço. De fato, não se pode exigir menção expressa, no formulário,
a habitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, já que no
modelo de PPP concebido pelo INSS não existe campo específico para tanto.
10. Extrai-se dos elementos residentes nos autos que a exposição da parte
autora a tais agentes nocivos era inerente à atividade que ela desenvolvia,
donde se conclui que tal exposição deve ser considerada permanente, nos
termos do artigo 65, do RPS, o qual, consoante já destacado, reputa trabalho
permanente "aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente,
no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado
ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação
do serviço". Não se exige, portanto, que o trabalhador se exponha durante
todo o período da sua jornada ao agente nocivo, o que interdita o acolhimento
da alegação autárquica em sentido contrário.
11. Ademais, o fornecimento de EPI não é suficiente a afastar o malefício
do ambiente de trabalho quando se tratar de agente nocivo qualitativo, tendo
em vista a própria natureza deste, cuja ofensividade decorre da sua simples
presença no ambiente de trabalho, não havendo limites de tolerância
ou doses como parâmetro configurador da insalubridade, tampouco como se
divisar que o EPI ou EPC possa neutralizá-la. Isso, no mais das vezes,
é reconhecido pelo próprio INSS.
12. O fornecimento de EPI indicado no PPP juntado aos autos não é suficiente
para afastar o reconhecimento da especialidade do labor sub judice, motivo
pelo qual deve ser considerado como especiais os interregnos antes mencionados,
em razão da exposição da parte autora a agentes biológicos nocivos.
13. A limitação imposta pelo artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, não se
aplica à hipótese dos autos, em que a aposentadoria especial foi deferida
apenas judicialmente.
14. Tal dispositivo estabelece que "Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado
aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou
operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida
no art. 58 desta Lei". Já o artigo 46, da Lei 8.231/91, determina que "o
aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá
sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno".
15. Considerando período de tempo enquadrado neste feito, tem-se que a parte
autora comprovou o labor em condições especiais por período superior a 25
anos, de sorte que ela faz jus à aposentadoria especial, a qual é devida
desde a data do requerimento administrativo, em função do quanto estabelecido
no artigo 57, §2° c.c. o artigo 49, I, b, ambos da Lei 8.213/91.
16. A inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido
pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que
foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/PE, repercussão
geral). Apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp
repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério
de correção monetária, não pode subsistir a sentença na parte em
que determinou a sua aplicação, porque em confronto com o julgado acima
mencionado, impondo-se a sua modificação, inclusive, de ofício.
17. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se,
até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos
no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça
Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando
a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo
C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/PE, realizado em
20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral. De acordo com a decisão
do Egrégio STF, os juros moratórios serão calculados segundo o índice de
remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo
1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e
a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo
Especial - IPCA-E.
18. A inteligência do artigo 57, §8° c.c o artigo 46, ambos da Lei
8.231/91, revela que o segurado que estiver recebendo aposentadoria especial
terá tal benefício cancelado se retornar voluntariamente ao exercício da
atividade especial. Logo, só há que se falar em cancelamento do benefício
e, consequentemente, em incompatibilidade entre o recebimento deste e a
continuidade do exercício da atividade especial se houver (i) a concessão
do benefício e, posteriormente, (ii) o retorno ao labor especial.
19. No caso, não houve a concessão da aposentadoria especial, tampouco o
posterior retorno ao labor especial. A parte autora requereu o benefício; o
INSS o indeferiu na esfera administrativa, circunstância que, evidentemente,
levou o segurado a continuar a trabalhar, até mesmo para poder prover a
sua subsistência e da sua família.
20. Considerando que a aposentadoria especial só foi concedida na esfera
judicial e que o segurado não retornou ao trabalho em ambiente nocivo, mas
sim continuou nele trabalhando após o INSS ter indeferido seu requerimento
administrativo, tem-se que a situação fática verificada in casu não se
amolda ao disposto no artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, de sorte que esse
dispositivo não pode ser aplicado ao caso vertente, ao menos até que ocorra
o trânsito em julgado da decisão que concedeu a aposentadoria especial.
21. Destaque-se que esta C. Turma, ao interpretar tal dispositivo, já
decidiu que "Não há que se falar na impossibilidade do beneficiário
continuar exercendo atividade especial, pois diferentemente do benefício
por incapacidade, cujo exercício de atividade remunerada é incompatível
com a própria natureza da cobertura securitária, a continuidade do labor
sob condições especiais na pendência de ação judicial, na qual postula
justamente o respectivo enquadramento, revela cautela do segurado e não atenta
contra os princípios gerais de direito; pelo contrário, privilegia a norma
protetiva do trabalhador". (ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1928650
/ SP 0002680-43.2012.4.03.6102, DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS).
22. Não se pode olvidar, ainda, que o entendimento que, com base numa
interpretação extensiva, aplica o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91,
a casos em que a aposentadoria especial é concedida apenas judicialmente,
impedindo o pagamento dos valores correspondentes à aposentadoria especial
no período em que o segurado continuou trabalhando em ambiente nocivo,
não se coaduna com a interpretação teleológica, tampouco com o postulado
da proporcionalidade e com a proibição do venire contra factum proprium
(manifestação da boa-fé objetiva).
23. De fato, o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, tem como finalidade proteger
a saúde do trabalhador, vedando que o beneficiário de uma aposentadoria
especial continue trabalhando num ambiente nocivo. Sendo assim, considerando
que tal norma visa proteger o trabalhador, ela não pode ser utilizada para
prejudicar aquele que se viu na contingência de continuar trabalhando pelo
fato de o INSS ter indevidamente indeferido seu benefício.
24. A par disso, negar ao segurado os valores correspondentes à aposentadoria
especial do período em que ele, após o indevido indeferimento do benefício
pelo INSS, continuou trabalhando em ambiente nocivo significa, a um só tempo,
beneficiar o INSS por um equívoco seu - já que, nesse cenário, a autarquia
deixaria de pagar valores a que o segurado fazia jus por ter indeferido
indevidamente o requerido - e prejudicar duplamente o trabalhador - que se
viu na contingência de continuar trabalhando em ambiente nocivo mesmo quando
já tinha direito ao benefício que fora indevidamente indeferido pelo INSS -
o que colide com os princípios da proporcionalidade e da boa-fé objetiva
(venire contra factum proprium).
25. Por tais razões, reconheço que o disposto no artigo 57, §8°, da Lei
8.213/91, não se aplica ao caso dos autos, não havendo, por conseguinte,
que se falar em descontos, na fase de liquidação, das parcelas atrasadas dos
períodos em que a parte autora permaneceu exercendo atividades consideradas
especiais.
26. Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento das verbas honorárias,
ora majoradas para 10% do valor das prestações vencidas até a data da
sentença, na forma da Súmula 111 do STJ.
27. Apelação do INSS e reexame necessário desprovidos e da parte autora
parcialmente provido. Correção monetária corrigida de ofício.
Ementa
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. AGENTE BIOLÓGICO. AUXILIAR
DE ENFERMAGEM. DO USO DE EPI. INEFICÁCIA. AGENTE QUALITATIVO. DA CORREÇÃO
MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO.
1. Recebidas as apelações interpostas pelo INSS e pela parte autora, já que
manejadas tempestivamente, conforme certificado nos autos, e com observância
da regularidade formal, nos termos do Código de Processo Civil/2015.
2. O artigo 57, da Lei 8.213/91, estabelece que "A aposentadoria especial será
devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei (180 contribuições),
ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20
(vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei". Considerando
a evolução da legislação de regência pode-se concluir que (i)
a aposentadoria especial será concedida ao segurado que comprovar ter
exercido trabalho permanente em ambiente no qual estava exposto a agente
nocivo à sua saúde ou integridade física; (ii) o agente nocivo deve,
em regra, assim ser definido em legislação contemporânea ao labor,
admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva para fins de
reconhecimento de labor especial a sujeição do segurado a agente não
previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva danosidade;
(iii) reputa-se permanente o labor exercido de forma não ocasional nem
intermitente, no qual a exposição do segurado ao agente nocivo seja
indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço; e (iv) as
condições de trabalho podem ser provadas pelos instrumentos previstos nas
normas de proteção ao ambiente laboral (PPRA, PGR, PCMAT, PCMSO, LTCAT, PPP,
SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030 e CAT) ou outros meios de prova.
3. A regulamentação sobre a nocividade do ruído sofreu algumas
alterações. Diante de tal evolução normativa e do princípio tempus
regit actum - segundo o qual o trabalho é reconhecido como especial de
acordo com a legislação vigente no momento da respectiva prestação -,
reconhece-se como especial o trabalho sujeito a ruído superior a 80 dB
(até 06.03.97); superior a 90dB (de 06.03.1997 a 17.11.2003); e superior
a 85 dB, a partir de 18.11.2003. O C. STJ, quando do julgamento do Recurso
Especial nº 1.398.260/PR, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, firmou a
tese de que não se pode aplicar retroativamente o Decreto 4.882/2003:
"O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de
serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a
18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto
3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003,
que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB
(ex-LICC)" (Tema Repetitivo 694).
4. O E. STF, de seu turno, no julgamento do ARE 664335, assentou a tese
segundo a qual "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), da eficácia do Equipamento de
Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial
para aposentadoria". Logo, no caso de ruído, ainda que haja registro no PPP
de que o segurado fazia uso de EPI ou EPC, reconhece-se a especialidade do
labor quando os níveis de ruído forem superiores ao tolerado, não havendo
como se sonegar tal direito do segurado sob o argumento de ausência de
prévia fonte de custeio (195, §§ 5° e 6°, da CF/88 e artigo 57, §§
6° e 7°, da Lei 8.213/91), até porque o não recolhimento da respectiva
contribuição não pode ser atribuída ao trabalhador, mas sim à inércia
estatal no exercício do seu poder de polícia.
5. As atribuições do atendente de enfermagem e de auxiliar de enfermagem
equivalem, para fins de enquadramento como atividade especial, à de
enfermeira, sendo, destarte, consideradas insalubres pelos Códigos 2.1.3
do Decreto 53.831/1964 e 2.1.3, Anexo II, do Decreto 83.080/1979, já que
o contato com doentes ou materiais infecto-contagiantes é inerente às
atividades desenvolvidas por tais profissionais.
6. Como visto, até 28.04.1995, o enquadramento do labor especial poderia
ser feito com base na categoria profissional. Após essa data, o segurado
passou a ter que provar, por meio de formulário específico, a exposição
a agente nocivo, no caso biológico, previsto no item 3.0.1 do Anexo IV dos
Decretos 2.172/97 e 3.048/99.
7. No caso dos autos, considerando que, conforme se extrai dos formulários
legais em apreço, as atividades desenvolvidas pela autora, nos períodos sub
judice, implicavam em contato habitual e permanente com agentes biológicos
considerados nocivos pela legislação de regência, devem tais interregnos,
nos quais a autora trabalhou no Hospital das Clínicas da FMUSP e no Instituto
Santa Lydia, ser enquadrados como especial.
8. Não persistem dúvidas de que os PPP's noticiam a exposição a sangue,
secreção, e materiais infecto-contagiosos, sendo certo que as atividades
desenvolvidas pela segurada, nesses intervalos de tempo, importam no seu
contato com agentes biológicos nocivos de forma habitual. A descrição das
atividades deixa claro que ela executava tarefas de atendimento direto ao
paciente, estando exposta a agentes nocivos de forma habitual, o que impõe
a manutenção do reconhecimento do labor especial no período.
9. Constando do PPP que o segurado ficava exposto a agente nocivo acima do
limite de tolerância, deve-se concluir que tal exposição era, nos termos
do artigo 65, do RPS - Regulamento da Previdência Social, não ocasional
nem intermitente e indissociável da produção do bem ou da prestação do
serviço. De fato, não se pode exigir menção expressa, no formulário,
a habitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, já que no
modelo de PPP concebido pelo INSS não existe campo específico para tanto.
10. Extrai-se dos elementos residentes nos autos que a exposição da parte
autora a tais agentes nocivos era inerente à atividade que ela desenvolvia,
donde se conclui que tal exposição deve ser considerada permanente, nos
termos do artigo 65, do RPS, o qual, consoante já destacado, reputa trabalho
permanente "aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente,
no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado
ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação
do serviço". Não se exige, portanto, que o trabalhador se exponha durante
todo o período da sua jornada ao agente nocivo, o que interdita o acolhimento
da alegação autárquica em sentido contrário.
11. Ademais, o fornecimento de EPI não é suficiente a afastar o malefício
do ambiente de trabalho quando se tratar de agente nocivo qualitativo, tendo
em vista a própria natureza deste, cuja ofensividade decorre da sua simples
presença no ambiente de trabalho, não havendo limites de tolerância
ou doses como parâmetro configurador da insalubridade, tampouco como se
divisar que o EPI ou EPC possa neutralizá-la. Isso, no mais das vezes,
é reconhecido pelo próprio INSS.
12. O fornecimento de EPI indicado no PPP juntado aos autos não é suficiente
para afastar o reconhecimento da especialidade do labor sub judice, motivo
pelo qual deve ser considerado como especiais os interregnos antes mencionados,
em razão da exposição da parte autora a agentes biológicos nocivos.
13. A limitação imposta pelo artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, não se
aplica à hipótese dos autos, em que a aposentadoria especial foi deferida
apenas judicialmente.
14. Tal dispositivo estabelece que "Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado
aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou
operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida
no art. 58 desta Lei". Já o artigo 46, da Lei 8.231/91, determina que "o
aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá
sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno".
15. Considerando período de tempo enquadrado neste feito, tem-se que a parte
autora comprovou o labor em condições especiais por período superior a 25
anos, de sorte que ela faz jus à aposentadoria especial, a qual é devida
desde a data do requerimento administrativo, em função do quanto estabelecido
no artigo 57, §2° c.c. o artigo 49, I, b, ambos da Lei 8.213/91.
16. A inconstitucionalidade do critério de correção monetária introduzido
pela Lei nº 11.960/2009 foi declarada pelo Egrégio STF, ocasião em que
foi determinada a aplicação do IPCA-e (RE nº 870.947/PE, repercussão
geral). Apesar da recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (REsp
repetitivo nº 1.495.146/MG), que estabelece o INPC/IBGE como critério
de correção monetária, não pode subsistir a sentença na parte em
que determinou a sua aplicação, porque em confronto com o julgado acima
mencionado, impondo-se a sua modificação, inclusive, de ofício.
17. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se,
até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos
no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça
Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando
a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo
C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/PE, realizado em
20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral. De acordo com a decisão
do Egrégio STF, os juros moratórios serão calculados segundo o índice de
remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo
1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e
a correção monetária, segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo
Especial - IPCA-E.
18. A inteligência do artigo 57, §8° c.c o artigo 46, ambos da Lei
8.231/91, revela que o segurado que estiver recebendo aposentadoria especial
terá tal benefício cancelado se retornar voluntariamente ao exercício da
atividade especial. Logo, só há que se falar em cancelamento do benefício
e, consequentemente, em incompatibilidade entre o recebimento deste e a
continuidade do exercício da atividade especial se houver (i) a concessão
do benefício e, posteriormente, (ii) o retorno ao labor especial.
19. No caso, não houve a concessão da aposentadoria especial, tampouco o
posterior retorno ao labor especial. A parte autora requereu o benefício; o
INSS o indeferiu na esfera administrativa, circunstância que, evidentemente,
levou o segurado a continuar a trabalhar, até mesmo para poder prover a
sua subsistência e da sua família.
20. Considerando que a aposentadoria especial só foi concedida na esfera
judicial e que o segurado não retornou ao trabalho em ambiente nocivo, mas
sim continuou nele trabalhando após o INSS ter indeferido seu requerimento
administrativo, tem-se que a situação fática verificada in casu não se
amolda ao disposto no artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, de sorte que esse
dispositivo não pode ser aplicado ao caso vertente, ao menos até que ocorra
o trânsito em julgado da decisão que concedeu a aposentadoria especial.
21. Destaque-se que esta C. Turma, ao interpretar tal dispositivo, já
decidiu que "Não há que se falar na impossibilidade do beneficiário
continuar exercendo atividade especial, pois diferentemente do benefício
por incapacidade, cujo exercício de atividade remunerada é incompatível
com a própria natureza da cobertura securitária, a continuidade do labor
sob condições especiais na pendência de ação judicial, na qual postula
justamente o respectivo enquadramento, revela cautela do segurado e não atenta
contra os princípios gerais de direito; pelo contrário, privilegia a norma
protetiva do trabalhador". (ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1928650
/ SP 0002680-43.2012.4.03.6102, DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS).
22. Não se pode olvidar, ainda, que o entendimento que, com base numa
interpretação extensiva, aplica o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91,
a casos em que a aposentadoria especial é concedida apenas judicialmente,
impedindo o pagamento dos valores correspondentes à aposentadoria especial
no período em que o segurado continuou trabalhando em ambiente nocivo,
não se coaduna com a interpretação teleológica, tampouco com o postulado
da proporcionalidade e com a proibição do venire contra factum proprium
(manifestação da boa-fé objetiva).
23. De fato, o artigo 57, §8°, da Lei 8.213/91, tem como finalidade proteger
a saúde do trabalhador, vedando que o beneficiário de uma aposentadoria
especial continue trabalhando num ambiente nocivo. Sendo assim, considerando
que tal norma visa proteger o trabalhador, ela não pode ser utilizada para
prejudicar aquele que se viu na contingência de continuar trabalhando pelo
fato de o INSS ter indevidamente indeferido seu benefício.
24. A par disso, negar ao segurado os valores correspondentes à aposentadoria
especial do período em que ele, após o indevido indeferimento do benefício
pelo INSS, continuou trabalhando em ambiente nocivo significa, a um só tempo,
beneficiar o INSS por um equívoco seu - já que, nesse cenário, a autarquia
deixaria de pagar valores a que o segurado fazia jus por ter indeferido
indevidamente o requerido - e prejudicar duplamente o trabalhador - que se
viu na contingência de continuar trabalhando em ambiente nocivo mesmo quando
já tinha direito ao benefício que fora indevidamente indeferido pelo INSS -
o que colide com os princípios da proporcionalidade e da boa-fé objetiva
(venire contra factum proprium).
25. Por tais razões, reconheço que o disposto no artigo 57, §8°, da Lei
8.213/91, não se aplica ao caso dos autos, não havendo, por conseguinte,
que se falar em descontos, na fase de liquidação, das parcelas atrasadas dos
períodos em que a parte autora permaneceu exercendo atividades consideradas
especiais.
26. Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento das verbas honorárias,
ora majoradas para 10% do valor das prestações vencidas até a data da
sentença, na forma da Súmula 111 do STJ.
27. Apelação do INSS e reexame necessário desprovidos e da parte autora
parcialmente provido. Correção monetária corrigida de ofício.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e ao reexame necessário, e
dar parcial provimento à apelação da parte autora para majorar o pagamento
das verbas honorárias para 10% do valor das prestações vencidas até a
data da sentença e, de ofício, corrigir a correção monetária, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
30/07/2018
Data da Publicação
:
13/08/2018
Classe/Assunto
:
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1999221
Órgão Julgador
:
SÉTIMA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/08/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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