main-banner

Jurisprudência


TRF3 0001563-23.2002.4.03.6181 00015632320024036181

Ementa
PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIARIA. ARTIGO 168-A, §1º, INCISO I, C/C O ARTIGO 71, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. PRESCRIÇÃO PARCIAL DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL, NA MODALIDADE RETROATIVA. NULIDADE DA SENTENÇA NÃO VERIFICADA. DOSIMETRIA DA PENA. APELAÇÃO DO RÉU PROVIDA EM PARTE. - Não importa em abolitio criminis a revogação do artigo 95, alínea "d", da Lei nº 8.212/1991, pela Lei nº 9.983/2000, que inseriu o artigo 168-A ao Código Penal, haja vista que restou mantida a figura típica anterior em seu aspecto substancial e a antijuridicidade da conduta. Precedentes jurisprudenciais do C. STF e C. STJ. - O artigo 168-A do Código Penal contém norma mais favorável ao réu, uma vez que a pena cominada (dois a cinco anos de reclusão) é inferior a anteriormente prevista para o artigo 95, alínea "d", da Lei n.º 8.212/1991, que era a estabelecida no artigo 5º da Lei n.º 7.492/1986 (dois a seis anos de reclusão). Aplicação do disposto no artigo 168-A do Código Penal mesmo aos fatos ocorridos sob a égide da lei anterior, nos termos do artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal e artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal. - O inciso I do § 1º do artigo 168-A do Código Penal trata-se de figura assemelhada à disposta no caput, sendo certo que nas mesmas penas incorre aquele que "deixar de recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à Previdência Social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público". - Caracteriza-se o crime com o não recolhimento aos cofres públicos das contribuições previdenciárias, no prazo e forma legais, após a retenção do desconto dos funcionários. É, pois, norma penal em branco, a ser integrada pela legislação previdenciária. -Trata-se de crime omissivo próprio, não se admitindo a tentativa. - O objeto material é o valor recolhido e não repassado aos cofres públicos, excluídos os juros de mora e a multa. Precedente do STJ. - O crime é formal, não havendo a necessidade da constituição definitiva do crédito tributário para que se possa dar início à persecução penal, não sendo o caso de aplicação da Súmula Vinculante n.º 24 do STF, de modo que o delito perfectibiliza-se com o vencimento do prazo para o recolhimento (omissão do repasse). - Ocorrência em parte da prescrição da pretensão punitiva estatal, com a extinção da punibilidade do réu no que tange à competência de janeiro de 1996, nos termos dos artigos 107, inciso IV, 1ª parte, 109, inciso IV, artigo 110, §§ 1º e 2º, e artigo 119, todos do Código Penal, c.c o artigo 61 do Código de Processo Penal. - Não há que se falar em nulidade da sentença ante o indeferimento de diligência, pois eventual exame pericial nas guias de recolhimento trazidas aos autos não teria o condão de suspender o curso do processo, visto que não se comprovou adesão ao programa REFIS, tampouco de levar à absolvição do réu. - Não se desincumbiu a defesa de afastar a presunção de autenticidade e validade de que goza a Notificação Fiscal de Lançamento de Débito. - Em que pese não tenha havido insurgência no que concerne à materialidade delitiva, impende registrar que ela veio comprovada pela Representação Fiscal para Fins Penais e os documentos que a integram, cumprindo destacar a Representação Fiscal, a Notificação Fiscal de Lançamento de Débito, o Relatório da NFLD, os Discriminativos Analíticos do Débito, os Discriminativos Sintéticos de Débito, o Termo de encerramento da Ação Fiscal, bem como os Relatórios dos Fatos Geradores, com base nas folhas de pagamentos dos empregados efetivos e temporários, e as cópias dos Livros "Diário" de 1996, 1997 e 1998. - Tais elementos probatórios revelam eficazmente que as contribuições sociais destinadas à Previdência Social foram descontadas dos salários dos segurados empregados da empresa (efetivos e temporários), todavia, não foram objeto de recolhimento, no prazo legal, aos cofres públicos. - A autoria delitiva não questionada e, ao que se depreende do conjunto probatório, igualmente restou comprovada, tendo sido demonstrado, por meio do Contrato Social e pelo interrogatório do réu, que à época da ocorrência dos fatos o increpado exercia a administração da empresa e, portanto, detinha a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições. - Para o delito estampado no artigo 168-A do Código Penal não se exige o dolo específico, sendo suficiente o dolo genérico, ou seja, a vontade livre e consciente de deixar de recolher aos cofres públicos, no prazo legal, contribuição descontada dos salários dos trabalhadores segurados, dispensando-se a intenção de apropriar-se das importâncias descontadas. Não há a exigência de que se comprove especial fim de agir - animus rem sibi habendi. Basta o dolo genérico. - Dolo suficientemente demonstrado, porquanto o réu como responsável pela administração da empresa deixou de recolher as contribuições previdenciárias descontadas dos empregados, aos cofres públicos, no prazo devido. - Em que pese não ter havido recurso quanto à dosimetria da pena, a pena-base deve ser reduzida para 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão em face das consequências do crime. O alto valor do débito é circunstância judicial capaz de ensejar a exasperação da pena base do delito de apropriação indébita previdenciária. - Ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes. - O crime continuado não deve ser aferido na terceira fase, pois o concurso de crimes não integra o sistema trifásico da pena, devendo a eventual majoração pela sua ocorrência dar-se após o encerramento da última fase da dosimetria, notadamente porque só há que se falar em sua aplicação após conhecidos todos os delitos sancionados pelo julgador. À míngua de causas de aumento ou diminuição, a reprimenda permaneceu fixada até a terceira fase em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão. - Considerando que a conduta delitiva foi perpetrada de forma reiterada e tendo em vista a ocorrência de crimes de mesma espécie, além da semelhança das condições de tempo, lugar e maneira de execução, revela-se imperioso o reconhecimento do crime continuado (artigo 71 do Código Penal). - Em acórdão relatado pelo Des. Fed. Nelton dos Santos, a Segunda Turma deste E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região adotou o critério de aumento decorrente da continuidade delitiva segundo o número de parcelas não recolhidas, nos seguintes termos: de dois meses a um ano de omissão no recolhimento das contribuições previdenciárias, o acréscimo é de 1/6 (um sexto); de um a dois anos de omissão, aumenta-se 1/5 (um quinto); de dois a três anos de omissão, ¼ (um quarto); de três a quatro anos de omissão, 1/3 (um terço); de quatro a cinco anos de omissão, ½ (um meio); e acima de cinco anos de omissão, 2/3 (dois terços) de aumento. (TRF 3ª Região, Segunda Turma, ACR n.º 11780, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos). - Considerando o critério adotado e que a prática reiterada perdurou por quase dois anos (fevereiro a março de 1996, setembro/1996 a fevereiro/1998 e décimo terceiro de 1998), o aumento deve ser na proporção de 1/5 (um quinto), resultando a reprimenda em 03 (três) anos de reclusão. - A fixação da pena de multa deve levar em consideração seus limites mínimo e máximo com adoção de proporcionalidade em face da pena privativa de liberdade, atendendo, pois, aos preceitos constitucionais (da legalidade, da proporcionalidade e da individualidade) e legais (Exposição de Motivos da Reforma da Parte Geral do Código Penal). - No caso concreto, verifica-se que o juízo a quo não observou o critério da proporcionalidade, o que resultaria em pena superior à fixada em primeiro grau. À míngua de recurso da acusação e sob pena de reformatio in pejus, deve ser mantida a pena de multa estabelecida em 62 (sessenta e dois) dias-multa. - Ante a ausência de elementos constantes nos autos o valor do dia-multa foi corretamente fixado em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos. - O regime inicial de cumprimento de pena deve ser mantido o ABERTO, em consonância com o disposto no art. 33, § 2º, alínea "c", do Código Penal. - Presentes os requisitos dos incisos I e II do art. 44 do Código Penal (pena privativa de liberdade aplicada não superior a quatro anos, crime praticado sem violência ou grave ameaça e réu não reincidente em crime doloso), e sendo a medida suficiente (art. 44, inciso III, do Código Penal), a pena privativa corporal foi substituída por duas penas restritivas de direitos consistentes em prestação de serviços à comunidade e pagamento de prestação pecuniária no valor equivalente a 50 (cinquenta) salários mínimos para entidade pública ou privada com destinação social, a ser estabelecida pelo Juízo da Execução Penal. À míngua de recurso da defesa e tendo em vista que os critérios utilizados pelo juízo a quo na substituição da reprimenda corporal coadunam-se ao previsto em lei e atentaram à individualização da pena, nada há a ser modificado. - Apelação do réu parcialmente provida. - Redução da pena de ofício.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA DEFESA para declarar a prescrição parcial da pretensão punitiva estatal, com a consequente extinção da punibilidade do réu quanto ao crime do art. 168-A, §1º, inciso I, do Código Penal, no que tange à competência de janeiro de 1996, nos termos dos artigos 107, inciso IV, 1ª parte, 109, inciso IV, artigo 110, §§ 1º e 2º, todos do Código Penal, c.c o artigo 61 do Código de Processo Penal, e, DE OFÍCIO, reduzir a pena aplicada para 03 (três) anos de reclusão, nos termos da fundamentação, mantendo, no mais, a r. sentença recorrida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 27/11/2018
Data da Publicação : 04/12/2018
Classe/Assunto : Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 47260
Órgão Julgador : DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940 LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-168A PAR-1 INC-1 ART-107 INC-4 ART-109 INC-4 ART-110 PAR-1 PAR-2 ART-119 ART-71 ART-33 PAR-2 LET-C ART-44 INC-1 INC-2 INC-3 ***** LOSS-91 LEI ORGÂNICA DA SEGURIDADE SOCIAL LEG-FED LEI-8212 ANO-1991 ART-95 LET-D LEG-FED LEI-9983 ANO-2000 ***** LCCSF-86 LEI DOS CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL LEG-FED LEI-7492 ANO-1986 ART-5 ***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-40 ***** STFV SÚMULA VINCULANTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL LEG-FED SUV-24 ***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-61
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/12/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão