TRF3 0001629-36.2013.4.03.6110 00016293620134036110
PENAL. PROCESSO PENAL. ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. ART. 171,
§ 3º, DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINARES. PRESCRIÇÃO. ILEGITIMIDADE
PASSIVA. INOCORRÊNCIA. BIS IN IDEM CONFIGURADO. MATERIALIDADE E
AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS. DOSIMETRIA DA PENA. INDENIZAÇÃO
CIVIL. IMPOSSIBILIDADE.
1. O crime de estelionato qualificado (artigo 171, § 3º, do Código Penal),
é delito de natureza binária, conforme entendimento consolidado pelos
Tribunais Superiores. Será crime permanente quando praticado pelo próprio
beneficiário da Previdência Social, fluindo o prazo prescricional a partir
da cessação da permanência, ou seja, com a supressão do recebimento
indevido. Quando praticado por terceiros não beneficiários, será crime
instantâneo de efeitos permanentes, hipótese em que o termo inicial da
prescrição será a data do início do pagamento do benefício fraudulento. O
mesmo entendimento deve ser aplicado ao crime previsto no art. 313-A, do
Código Penal.
2. No caso em tela, MARILENE LEITE DA SILVA foi definitivamente condenado
à pena de 05 (cinco) anos, 09 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão,
contra a qual não recorreu o parquet, aplicando-se o prazo prescricional
de 12 (doze) anos, nos termos do art. 109, inciso III, do estatuto repressivo.
3. Diante deste quadro, considerando que a ré não foi a própria
beneficiária da prestação previdenciária indevida, a pretensão punitiva
não se encontra prescrita, vez que o fato delitivo iniciou em 13.05.2003
(data da concessão do benefício previdenciário indevido), e o recebimento
da denúncia se deu em 25.03.2013 (fl. 126); a sentença condenatória,
por sua vez, foi publicada em 27.02.2015 (fls. 523/528), não tendo sido
superado, entre nenhum destes marcos interruptivos da prescrição, o lapso
temporal de doze anos. Preliminar rejeitada.
4. MARILENE também aduziu preliminarmente a ausência de justa causa para o
processo, tendo em vista ser parte ilegítima. Deixo de apreciar a matéria,
visto que se confunde com o mérito da demanda, relativo à autoria delitiva
dos crimes imputados a ambas as acusadas.
5. A preliminar de bis in idem deve ser acolhida, consoante entendimento
esposado pela jurisprudência, indicando a impossibilidade de dupla punição
pelos mesmos fatos (ne bis in idem), bem como pela incidência do princípio
da especialidade. Assim, absolvo VERA LÚCIA e, em virtude do art. 580,
do Código de Processo Penal, também a corré MARILENE LEITE do delito
cominado no art. 171, § 3º, do Código Penal, prosseguindo os autos apenas
em relação ao delito previsto no art. 313-A, do Código Penal.
6. Materialidade e autoria delitivas comprovadas. Dolo amplamente demonstrado
pelas circunstâncias em que se deu o delito.
7. A pena-base de ambas as rés foi fixada em 5 (cinco) anos de reclusão e 120
(cento e vinte) dias-multa, considerando sua personalidade voltada ao crime
(certidões criminais acostadas aos autos, fls. 160/177, 194/208 e 223/248),
bem como pela repercussão econômica do crime praticado.
8. Entretanto, referida pena-base deve ser reduzida, pois o magistrado a quo
levou em consideração, para fixa-la, inquéritos policiais e condenações
criminais sem trânsito em julgado, o que é vedado pelo enunciado contido
na Súmula 444, do Superior Tribunal de Justiça.
9. Assim, reduzo a pena-base para 03 (três) anos de reclusão e 80 (oitenta)
dias-multa, afastando a exasperação decorrente da personalidade do agente,
visto que inquéritos policiais e condenações se trânsito em julgado
não podem ensejar sua majoração, nos moldes da Súmula 444, do Superior
Tribunal de Justiça, mas sublinho que não se pode fixar a pena-base no
mínimo legal em virtude das consequências econômicas do crime, que são
expressivas, tendo ocorrido prejuízo de R$ 41.940,87 (quarenta e um mil
novecentos e quarenta reais e oitenta e sete centavos) aos cofres públicos.
10. Na segunda fase da pena, devem ser excluídas as agravantes previstas
no art. 61, II, g, do Código Penal, vez que a violação a dever funcional
é elemento ínsito do tipo penal, e no art. 62, IV, do Código Penal,
pois o intento de lucro faz parte do próprio tipo penal. Inocorrentes
outras circunstâncias agravantes ou atenuantes, bem como quaisquer causas
de aumento ou diminuição de pena, tem-se que aquela pena torna-se a pena
definitiva, estabelecida, portanto, em 03 (três) anos de reclusão e 80
(oitenta) dias-multa, em ambos os casos.
11. A redução da pena aplicada a ambas as rés autoriza a fixação do
regime inicial de cumprimento como sendo o aberto, nos termos do a rt. 33,
§ 2º, alínea c, do Código Penal. Em que pese a quantidade de pena
privativa de liberdade aplicada às rés, deixo de substituí-las, em ambos
os casos, por penas restritivas de direitos, tendo em vista a culpabilidade,
a conduta social e personalidade das condenadas, que praticaram inúmeros
delitos semelhantes ao aqui reprimido, o que demonstra a insuficiência da
substituição no caso em tela, nos termos do art. 44, III, do Código Penal
12. A condenação com a finalidade de reparação dos danos causados à
sociedade deve atender aos parâmetros fixados na jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça. No caso em tela, verifica-se da simples leitura da
exordial acusatória que não houve pedido expresso a respeito da reparação
civil. De sorte que, de ofício, excluo a condenação dos réus na reparação
civil autorizada pelo art. 387, IV, do Código de Processo Penal.
13. Preliminares de prescrição e ilegitimidade passiva rejeitadas;
preliminar de bis in idem trazida no parecer ministerial e no apelo de
VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS acolhida, para que as rés sejam processadas
e julgadas apenas pelo delito previsto no art. 313-A, do Código Penal;
recurso de apelação de MARILENE LEITE DA SILVA a que se nega provimento
e recurso de VERA LÚCIA DA SILVA a que se dá parcial provimento, para
reduzir a pena-base para o patamar de 03 (três) anos de reclusão e 80
(oitenta) dias-multa e afastar a incidência das agravantes previstas nos
arts. 61, II, g, e 62, IV, do Código Penal, redundando na pena definitiva
de 03 (três) anos de reclusão e 80 (oitenta) dias-multa, a ser cumprida
no regime inicial aberto. De ofício, reduz-se a pena-base aplicada para
MARILENE, nos termos da Súmula 444, do STJ, fixando-a em 03 (três) anos
de reclusão e 80 (oitenta) dias-multa, no regime aberto, que resta como
sua pena definitiva; além disso, exclui-se a condenação à reparação
civil prevista no art. 387, IV, do Código de Processo Penal, mantendo,
no restante, a sentença, nos termos explicitados no voto.
Ementa
PENAL. PROCESSO PENAL. ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. ART. 171,
§ 3º, DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINARES. PRESCRIÇÃO. ILEGITIMIDADE
PASSIVA. INOCORRÊNCIA. BIS IN IDEM CONFIGURADO. MATERIALIDADE E
AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS. DOSIMETRIA DA PENA. INDENIZAÇÃO
CIVIL. IMPOSSIBILIDADE.
1. O crime de estelionato qualificado (artigo 171, § 3º, do Código Penal),
é delito de natureza binária, conforme entendimento consolidado pelos
Tribunais Superiores. Será crime permanente quando praticado pelo próprio
beneficiário da Previdência Social, fluindo o prazo prescricional a partir
da cessação da permanência, ou seja, com a supressão do recebimento
indevido. Quando praticado por terceiros não beneficiários, será crime
instantâneo de efeitos permanentes, hipótese em que o termo inicial da
prescrição será a data do início do pagamento do benefício fraudulento. O
mesmo entendimento deve ser aplicado ao crime previsto no art. 313-A, do
Código Penal.
2. No caso em tela, MARILENE LEITE DA SILVA foi definitivamente condenado
à pena de 05 (cinco) anos, 09 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão,
contra a qual não recorreu o parquet, aplicando-se o prazo prescricional
de 12 (doze) anos, nos termos do art. 109, inciso III, do estatuto repressivo.
3. Diante deste quadro, considerando que a ré não foi a própria
beneficiária da prestação previdenciária indevida, a pretensão punitiva
não se encontra prescrita, vez que o fato delitivo iniciou em 13.05.2003
(data da concessão do benefício previdenciário indevido), e o recebimento
da denúncia se deu em 25.03.2013 (fl. 126); a sentença condenatória,
por sua vez, foi publicada em 27.02.2015 (fls. 523/528), não tendo sido
superado, entre nenhum destes marcos interruptivos da prescrição, o lapso
temporal de doze anos. Preliminar rejeitada.
4. MARILENE também aduziu preliminarmente a ausência de justa causa para o
processo, tendo em vista ser parte ilegítima. Deixo de apreciar a matéria,
visto que se confunde com o mérito da demanda, relativo à autoria delitiva
dos crimes imputados a ambas as acusadas.
5. A preliminar de bis in idem deve ser acolhida, consoante entendimento
esposado pela jurisprudência, indicando a impossibilidade de dupla punição
pelos mesmos fatos (ne bis in idem), bem como pela incidência do princípio
da especialidade. Assim, absolvo VERA LÚCIA e, em virtude do art. 580,
do Código de Processo Penal, também a corré MARILENE LEITE do delito
cominado no art. 171, § 3º, do Código Penal, prosseguindo os autos apenas
em relação ao delito previsto no art. 313-A, do Código Penal.
6. Materialidade e autoria delitivas comprovadas. Dolo amplamente demonstrado
pelas circunstâncias em que se deu o delito.
7. A pena-base de ambas as rés foi fixada em 5 (cinco) anos de reclusão e 120
(cento e vinte) dias-multa, considerando sua personalidade voltada ao crime
(certidões criminais acostadas aos autos, fls. 160/177, 194/208 e 223/248),
bem como pela repercussão econômica do crime praticado.
8. Entretanto, referida pena-base deve ser reduzida, pois o magistrado a quo
levou em consideração, para fixa-la, inquéritos policiais e condenações
criminais sem trânsito em julgado, o que é vedado pelo enunciado contido
na Súmula 444, do Superior Tribunal de Justiça.
9. Assim, reduzo a pena-base para 03 (três) anos de reclusão e 80 (oitenta)
dias-multa, afastando a exasperação decorrente da personalidade do agente,
visto que inquéritos policiais e condenações se trânsito em julgado
não podem ensejar sua majoração, nos moldes da Súmula 444, do Superior
Tribunal de Justiça, mas sublinho que não se pode fixar a pena-base no
mínimo legal em virtude das consequências econômicas do crime, que são
expressivas, tendo ocorrido prejuízo de R$ 41.940,87 (quarenta e um mil
novecentos e quarenta reais e oitenta e sete centavos) aos cofres públicos.
10. Na segunda fase da pena, devem ser excluídas as agravantes previstas
no art. 61, II, g, do Código Penal, vez que a violação a dever funcional
é elemento ínsito do tipo penal, e no art. 62, IV, do Código Penal,
pois o intento de lucro faz parte do próprio tipo penal. Inocorrentes
outras circunstâncias agravantes ou atenuantes, bem como quaisquer causas
de aumento ou diminuição de pena, tem-se que aquela pena torna-se a pena
definitiva, estabelecida, portanto, em 03 (três) anos de reclusão e 80
(oitenta) dias-multa, em ambos os casos.
11. A redução da pena aplicada a ambas as rés autoriza a fixação do
regime inicial de cumprimento como sendo o aberto, nos termos do a rt. 33,
§ 2º, alínea c, do Código Penal. Em que pese a quantidade de pena
privativa de liberdade aplicada às rés, deixo de substituí-las, em ambos
os casos, por penas restritivas de direitos, tendo em vista a culpabilidade,
a conduta social e personalidade das condenadas, que praticaram inúmeros
delitos semelhantes ao aqui reprimido, o que demonstra a insuficiência da
substituição no caso em tela, nos termos do art. 44, III, do Código Penal
12. A condenação com a finalidade de reparação dos danos causados à
sociedade deve atender aos parâmetros fixados na jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça. No caso em tela, verifica-se da simples leitura da
exordial acusatória que não houve pedido expresso a respeito da reparação
civil. De sorte que, de ofício, excluo a condenação dos réus na reparação
civil autorizada pelo art. 387, IV, do Código de Processo Penal.
13. Preliminares de prescrição e ilegitimidade passiva rejeitadas;
preliminar de bis in idem trazida no parecer ministerial e no apelo de
VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS acolhida, para que as rés sejam processadas
e julgadas apenas pelo delito previsto no art. 313-A, do Código Penal;
recurso de apelação de MARILENE LEITE DA SILVA a que se nega provimento
e recurso de VERA LÚCIA DA SILVA a que se dá parcial provimento, para
reduzir a pena-base para o patamar de 03 (três) anos de reclusão e 80
(oitenta) dias-multa e afastar a incidência das agravantes previstas nos
arts. 61, II, g, e 62, IV, do Código Penal, redundando na pena definitiva
de 03 (três) anos de reclusão e 80 (oitenta) dias-multa, a ser cumprida
no regime inicial aberto. De ofício, reduz-se a pena-base aplicada para
MARILENE, nos termos da Súmula 444, do STJ, fixando-a em 03 (três) anos
de reclusão e 80 (oitenta) dias-multa, no regime aberto, que resta como
sua pena definitiva; além disso, exclui-se a condenação à reparação
civil prevista no art. 387, IV, do Código de Processo Penal, mantendo,
no restante, a sentença, nos termos explicitados no voto.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, rejeitar as preliminares de ilegitimidade passiva e prescrição;
acolher a preliminar de bis in idem trazida no parecer ministerial e no
apelo de VERA LÚCIA DA SILVA SANTOS, para que as rés sejam processadas e
julgadas apenas pelo delito previsto no art. 313-A, do Código Penal; negar
provimento ao recurso de apelação de MARILENE LEITE DA SILVA e dar parcial
provimento ao recurso de VERA LÚCIA DA SILVA, para reduzir a pena-base para o
patamar de 03 (três) anos de reclusão e 80 (oitenta) dias-multa e afastar a
incidência das agravantes previstas nos arts. 61, II, g, e 62, IV, do Código
Penal, redundando na pena definitiva de 03 (três) anos de reclusão e 80
(oitenta) dias-multa, a ser cumprida no regime inicial aberto; de ofício,
reduzir a pena-base aplicada para MARILENE, nos termos da Súmula 444, do
STJ, fixando-a em 03 (três) anos de reclusão e 80 (oitenta) dias-multa,
no regime aberto, que resta como sua pena definitiva, além disso, afastar
a condenação à reparação civil prevista no art. 387, IV, do Código de
Processo Penal, mantendo, no restante, a sentença, nos termos do relatório
e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
28/03/2016
Data da Publicação
:
01/04/2016
Classe/Assunto
:
ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 64418
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Referência
legislativa
:
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-33 PAR-2 LET-C ART-44 INC-3 ART-61 INC-2
LET-G ART-109 INC-3 ART-171 PAR-3 ART-313A
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-387 INC-4 ART-580
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-444
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/04/2016
..FONTE_REPUBLICACAO:
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