TRF3 0001726-49.2016.4.03.6104 00017264920164036104
APELAÇÕES CRIMINAIS. OPERAÇÃO CORRIEU. CRIME DE ORGANIZAÇÃO
CRIMINOSA. LEI Nº 12.850/2013. CONDENAÇÃO MANTIDA. ART. 383 DO CÓDIGO DE
PROCESSO PENAL. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DOS CRIMES DE FURTO MEDIANTE
FRAUDE E PECULATO. CONDIÇÃO DE FUNCIONÁRIO PÚBLICO. ART. 30 DO CÓDIGO
PENAL. DOSIMETRIA DAS PENAS. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
1. As interceptações telefônicas realizadas a partir do pedido de quebra
de sigilo telefônico expõem a existência de organização criminosa
estruturada para desviar cartões enviados por instituições financeiras por
meio da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). A organização
criminosa em questão, sob o comando do acusado, montou uma verdadeira
estrutura empresarial, que contava com a participação de pessoas desde a
entrega dos cartões desviados da Baixada Santista para São Paulo até a
realização de ligações telefônicas aos titulares dos cartões, por parte
de mulheres contratadas pelo acusado, que se passavam por pessoas autorizadas
pelas instituições financeiras, a fim de obter as senhas necessárias ao
desbloqueio e uso dos cartões desviados.
2. As provas dos autos deixaram claro a posição de comando do acusado dentro
da hierarquia da organização criminosa, de sorte que está caracterizada
a incidência da agravante prevista no § 3º do art. 2º da Lei nº
12.850/2013. À luz das interceptações telefônicas e dos depoimentos
das testemunhas ouvidas em Juízo, restou claro que o principal gestor da
organização criminosa era o acusado, responsável pela estruturação e
quantidade de agentes que participavam das atividades, em seus respectivos
núcleos de atuação.
3. A materialidade, a autoria e o dolo do crime do art. 312 do Código Penal
estão plenamente comprovados.
4. O crime de peculato é um delito próprio, cometido por pessoa que
ostenta a condição de funcionário público. Todavia, não há vedação
à participação de particular na sua prática, visto que a condição
pessoal de funcionário público, exigida pelo tipo penal, por ser elementar
do crime, comunica-se ao coautor ou ao partícipe, nos termos do art. 30 do
Código Penal. Precedentes.
5. A participação direta do réu nos delitos de peculato praticados pelo
funcionário público dos Correios ficou suficientemente demonstrada. As
provas dos autos evidenciam que ele efetivamente agiu sobre a vontade do
autor do peculato, induzindo-o ou instigando-o à prática desse delito,
restando inconteste o reconhecimento da participação dele na consumação
do crime previsto no art. 312 do Código Penal, por ter concorrido para que
os desvios fossem realizados.
6. A materialidade, a autoria e o dolo do crime do art. 155, § 4º, II,
do Código Penal estão plenamente comprovados pelas interceptações
telefônicas e pelos depoimentos das testemunhas, e corroboradas pela
confissão do próprio réu.
7. O furto mediante fraude e o estelionato não se confundem. Quando, em
razão do engodo, a vítima entrega voluntariamente o próprio bem ao agente,
trata-se de estelionato; quando, em razão do engodo, a vigilância e o zelo
da vítima são reduzidos ou superados para se alcançar o bem pretendido,
trata-se de furto. Precedentes.
8. Dosimetria das penas. Mantidas as penas-base no patamar fixado pelo juízo,
acima do mínimo legal, em razão do grande alcance das consequências da
empreitada criminosa. A conduta social do acusado não serve de fundamento para
a exacerbação das penas-base. Os maus antecedentes já foram considerados
em seu desfavor, não se justificando a exasperação das penas em patamar
mais elevado.
9. Mantida a incidência da agravante prevista no § 3º do art. 2º da Lei
nº 12.850/2013, na proporção de 1/6 (um sexto).
10. Incide a causa de aumento de pena prevista no inciso II do § 4º do
art. 2º da Lei nº 12.850/2013, pois a organização criminosa valia-se
de funcionário público para a prática das infrações penais. Mantida a
fração de aumento em 1/6 (um sexto).
11. Mantida a incidência da atenuante da confissão. O acusado admitiu
em juízo a prática dos delitos de peculato e de furto qualificado, tendo
dito em seu interrogatório que realmente comprava os cartões bancários
desviados pelo carteiro, e que participou dos saques e compras fraudulentas
com esses cartões desviados, tendo suas declarações sido expressamente
consideradas para fundamentar a condenação.
12. Continuidade delitiva. O critério mais adequado à fixação do
quantum de aumento previsto no art. 71 do CP é o número de infrações
cometidas. Configurada a prática de muito mais do que 7 (sete) infrações,
e seguindo a jurisprudência consolidada no âmbito dos tribunais superiores,
o aumento decorrente da continuidade delitiva deve ser fixado no patamar
máximo de 2/3 (dois terços).
13. Penas de multa fixadas de forma proporcional às penas corporais, conforme
precedentes desta Turma (ACR 0002526-47.2011.4.03.6106/SP, Rel. Des. Federal
Nino Toldo, j. 01.09.2015, e-DJF3 Judicial 1 03.09.2015).
14. Concurso material. Soma das penas (CP, art. 69).
15. Mantido o regime fechado para início do cumprimento da pena. Procedida
à detração, o desconto do período de prisão provisória cumprido pelo
condenado não lhe dá direito a início do cumprimento da pena em regime
menos gravoso.
16. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas
de direitos, pois não se encontram preenchidos os requisitos previstos no
art. 44, I, do Código Penal.
17. Apelação da acusação parcialmente provida. Apelação da defesa
desprovida.
Ementa
APELAÇÕES CRIMINAIS. OPERAÇÃO CORRIEU. CRIME DE ORGANIZAÇÃO
CRIMINOSA. LEI Nº 12.850/2013. CONDENAÇÃO MANTIDA. ART. 383 DO CÓDIGO DE
PROCESSO PENAL. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO DOS CRIMES DE FURTO MEDIANTE
FRAUDE E PECULATO. CONDIÇÃO DE FUNCIONÁRIO PÚBLICO. ART. 30 DO CÓDIGO
PENAL. DOSIMETRIA DAS PENAS. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
1. As interceptações telefônicas realizadas a partir do pedido de quebra
de sigilo telefônico expõem a existência de organização criminosa
estruturada para desviar cartões enviados por instituições financeiras por
meio da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). A organização
criminosa em questão, sob o comando do acusado, montou uma verdadeira
estrutura empresarial, que contava com a participação de pessoas desde a
entrega dos cartões desviados da Baixada Santista para São Paulo até a
realização de ligações telefônicas aos titulares dos cartões, por parte
de mulheres contratadas pelo acusado, que se passavam por pessoas autorizadas
pelas instituições financeiras, a fim de obter as senhas necessárias ao
desbloqueio e uso dos cartões desviados.
2. As provas dos autos deixaram claro a posição de comando do acusado dentro
da hierarquia da organização criminosa, de sorte que está caracterizada
a incidência da agravante prevista no § 3º do art. 2º da Lei nº
12.850/2013. À luz das interceptações telefônicas e dos depoimentos
das testemunhas ouvidas em Juízo, restou claro que o principal gestor da
organização criminosa era o acusado, responsável pela estruturação e
quantidade de agentes que participavam das atividades, em seus respectivos
núcleos de atuação.
3. A materialidade, a autoria e o dolo do crime do art. 312 do Código Penal
estão plenamente comprovados.
4. O crime de peculato é um delito próprio, cometido por pessoa que
ostenta a condição de funcionário público. Todavia, não há vedação
à participação de particular na sua prática, visto que a condição
pessoal de funcionário público, exigida pelo tipo penal, por ser elementar
do crime, comunica-se ao coautor ou ao partícipe, nos termos do art. 30 do
Código Penal. Precedentes.
5. A participação direta do réu nos delitos de peculato praticados pelo
funcionário público dos Correios ficou suficientemente demonstrada. As
provas dos autos evidenciam que ele efetivamente agiu sobre a vontade do
autor do peculato, induzindo-o ou instigando-o à prática desse delito,
restando inconteste o reconhecimento da participação dele na consumação
do crime previsto no art. 312 do Código Penal, por ter concorrido para que
os desvios fossem realizados.
6. A materialidade, a autoria e o dolo do crime do art. 155, § 4º, II,
do Código Penal estão plenamente comprovados pelas interceptações
telefônicas e pelos depoimentos das testemunhas, e corroboradas pela
confissão do próprio réu.
7. O furto mediante fraude e o estelionato não se confundem. Quando, em
razão do engodo, a vítima entrega voluntariamente o próprio bem ao agente,
trata-se de estelionato; quando, em razão do engodo, a vigilância e o zelo
da vítima são reduzidos ou superados para se alcançar o bem pretendido,
trata-se de furto. Precedentes.
8. Dosimetria das penas. Mantidas as penas-base no patamar fixado pelo juízo,
acima do mínimo legal, em razão do grande alcance das consequências da
empreitada criminosa. A conduta social do acusado não serve de fundamento para
a exacerbação das penas-base. Os maus antecedentes já foram considerados
em seu desfavor, não se justificando a exasperação das penas em patamar
mais elevado.
9. Mantida a incidência da agravante prevista no § 3º do art. 2º da Lei
nº 12.850/2013, na proporção de 1/6 (um sexto).
10. Incide a causa de aumento de pena prevista no inciso II do § 4º do
art. 2º da Lei nº 12.850/2013, pois a organização criminosa valia-se
de funcionário público para a prática das infrações penais. Mantida a
fração de aumento em 1/6 (um sexto).
11. Mantida a incidência da atenuante da confissão. O acusado admitiu
em juízo a prática dos delitos de peculato e de furto qualificado, tendo
dito em seu interrogatório que realmente comprava os cartões bancários
desviados pelo carteiro, e que participou dos saques e compras fraudulentas
com esses cartões desviados, tendo suas declarações sido expressamente
consideradas para fundamentar a condenação.
12. Continuidade delitiva. O critério mais adequado à fixação do
quantum de aumento previsto no art. 71 do CP é o número de infrações
cometidas. Configurada a prática de muito mais do que 7 (sete) infrações,
e seguindo a jurisprudência consolidada no âmbito dos tribunais superiores,
o aumento decorrente da continuidade delitiva deve ser fixado no patamar
máximo de 2/3 (dois terços).
13. Penas de multa fixadas de forma proporcional às penas corporais, conforme
precedentes desta Turma (ACR 0002526-47.2011.4.03.6106/SP, Rel. Des. Federal
Nino Toldo, j. 01.09.2015, e-DJF3 Judicial 1 03.09.2015).
14. Concurso material. Soma das penas (CP, art. 69).
15. Mantido o regime fechado para início do cumprimento da pena. Procedida
à detração, o desconto do período de prisão provisória cumprido pelo
condenado não lhe dá direito a início do cumprimento da pena em regime
menos gravoso.
16. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas
de direitos, pois não se encontram preenchidos os requisitos previstos no
art. 44, I, do Código Penal.
17. Apelação da acusação parcialmente provida. Apelação da defesa
desprovida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da
3ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação da defesa e
DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação da acusação para majorar a fração
de aumento de pena decorrente da continuidade delitiva para os crimes de
furto qualificado e peculato, ficando a pena definitiva total estabelecida
em 14 (quatorze) anos, 5 (cinco) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 59
(cinquenta e nove) dias-multa, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
05/02/2019
Data da Publicação
:
11/02/2019
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 76343
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Observações
:
OPERAÇÃO CORRIEU DA POLÍCIA FEDERAL. /
OBJETO MATERIAL DO CRIME: CARTÕES MAGNETICOS BANCÁRIOS.
Referência
legislativa
:
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-383
LEG-FED LEI-12850 ANO-2013 ART-2 PAR-3
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-30 ART-155 PAR-4 INC-2 ART-312 ART-71 ART-69
ART-44 INC-1
LEG-FED LEI-12850 ANO-2013 ART-2 PAR-4 INC-2
PROC:AP. 0002526-47.2011.4.03.6106/SP ÓRGÃO:DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
JUIZ:DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO
AUD:01/09/2015
DATA:03/09/2015 PG:
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/02/2019
..FONTE_REPUBLICACAO:
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