TRF3 0001896-36.2016.4.03.6002 00018963620164036002
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL
DE DROGAS. NÃO OCORRÊNCIA DE ERRO DE PROIBIÇÃO. CRIME ART. 183,
CAPUT, DA LEI Nº 9.472/97. INSIGNIFICÂNCIA NÃO PRESENTE. NÃO
RECONHECIDA A DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DO ART. 70 DA LEI Nº
4.117/62. TRANSNACIONALIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO
DEMONSTRADOS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. QUANTIDADE E NATUREZA DA
DROGA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA FIXADA EM 1/6. AFASTADAS AS AGRAVANTES DOS
ARTIGOS 61, II, "C" E 62, IV DO CP. NÃO INCIDÊNCIA DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO
DE PENA DO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI 11.343/2006. CAUSA DE AUMENTO DECORRENTE
DA TRANSNACIONALIDADE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. REGIME SEMIABERTO. APELAÇÃO
DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Consoante o artigo 40, I, da Lei n° 11.343/2006, é necessário somente
que "a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido
e as circunstâncias do fato evidenciem a transnacionalidade do delito",
e não que haja a efetiva transposição de fronteiras entre os países.
2. O erro de proibição é aquele que incide sobre a ilicitude do fato. O
agente pratica a conduta definida no tipo penal sem consciência de que age
ilicitamente, excluindo-se, por essa razão, a culpabilidade. A alegação de
que não sabia que estava cometendo um delito, não tem o condão de ilidir
a conduta criminosa. Isso porque o erro de proibição somente se verifica
quando o agente não tem possibilidade de saber que o fato é proibido,
o que não é a hipótese.
3. O crime do artigo 183 da Lei nº 9.472 /97 é formal. Consuma-se com a
simples instalação ou utilização de aparelhos de telecomunicação sem a
autorização da autoridade competente, prescindindo do resultado para sua
configuração. É indiferente o grau do dano às radiocomunicações que
pode advir do funcionamento de estações de radiodifusão em desacordo com
as determinações legais. Do Laudo Pericial (fls. 49-55), infere-se que o
rádio estava apto ao funcionamento, configurado para operar na frequência
de 27,015 MHz, com potência de aproximadamente 11 Watts. Em outro ponto,
os peritos afirmaram que o rádio tinha, potencialmente, a capacidade de
operar em outras frequências, inserindo-se em serviços regulamentados;
e poderia dificultar e até mesmo impedir a recepção de sinais oriundos
de outros equipamentos de comunicação via rádio que operassem na mesma
frequência, em frequência próxima ou em frequências múltiplas. Rejeitada,
assim, a insignificância.
4. O tipo penal definido no art. 183, caput, da Lei n.º 9.472/97 reafirmou
a ilicitude da atividade de radiodifusão clandestina, sendo até então
prevista no art. 70 da Lei n.º 4.117/62 a utilização de telecomunicação
sem observância do disposto em lei e nos regulamentos. Desse modo, enquanto o
delito da Lei n.º 4.117/62 incrimina o desenvolvimento de telecomunicação,
em desacordo com os regulamentos, embora com a devida autorização para
funcionar, o delito insculpido no art. 183, caput, da Lei n.º 9.472/97
tipifica a operação clandestina de tal atividade, ou seja, sem a devida
autorização, como no caso dos autos, em que se mantinha em funcionamento
rádio transceptor ligado e em funcionamento no momento da apreensão,
sem autorização da ANATEL.
5. A materialidade, autoria e dolo restaram comprovados nos autos quanto aos
crimes do art. 183, caput, da Lei n.º 9.472/97 e de tráfico de entorpecentes
previsto nos arts. 33, caput , c. c. art. 40, I, da Lei n° 11.343/06.
6. Dosimetria da Pena do crime previsto no art. 183, caput, da Lei n°
9.472/97. Primeira fase. O magistrado de piso fixou a pena-base no mínimo
legal, em 2 (dois) anos de detenção e ausente apelação da acusação,
bem como considerando que se trata de réu primário, que não ostenta maus
antecedentes, bem como as demais circunstâncias judiciais do art. 59 do
Código Penal não lhe são desfavoráveis, resta mantida a pena-base em 2
(dois) anos de detenção. Segunda fase. Sem atenuantes ou agravantes,
resta mantida a pena em 2 (dois) anos de detenção. Terceira fase da
dosimetria. Ausentes causas de aumento ou de diminuição, fica mantida a
pena definitiva estabelecida em Primeiro Grau de jurisdição, em 2 (dois)
anos de detenção.
6.a. O Órgão Especial do TRF da 3ª Região, em Argüição de
Inconstitucionalidade Criminal, declarou a inconstitucionalidade da expressão
"R$ 10.000,00" contida no preceito secundário do art. 183 da Lei n. 9.472/97,
por entender violado o princípio da individualização da pena, previsto no
art. 5º, XLVI, da Constituição da República. Afastada a pena pecuniária
prevista no art. 183 da Lei n. 9.472/97, tem-se aplicado as disposições do
Código Penal. Portanto, nos termos do Código Penal e proporcionalmente à
pena privativa de liberdade fixada, estabeleço a pena de multa no mínimo
legal em 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo)
do salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente.
7. Dosimetria da pena do crime de tráfico de entorpecentes. Primeira
fase. Não cabe valorar negativamente - como circunstância judicial -
a culpabilidade em razão do preparo, pois essa é inerente à própria
conduta no crime de tráfico transnacional de entorpecentes, assim como as
circunstâncias também são inerentes ao tipo penal e normais na espécie,
ou seja, cometido em etapas e com o uso de entrepostos.
8. Segunda fase: Da agravante do artigo 61, II, "c" (à traição, de
emboscada, ou mediante dissimulação, ou outro recurso que dificultou ou
tornou impossível a defesa do ofendido). Além do magistrado de primeiro grau
ter considerado o compartimento secreto para majorar a pena na primeira fase,
pois lá o tratou como preparo, o que já revelaria "bis in idem", os fatos
aqui descritos não conduzem à aplicação da dita agravante, seja porque
não se trata de defesa do ofendido (saúde pública), seja porque o meio é
próprio ao cometimento do delito previsto no tipo penal, pelo que, sem mais
digressões, resta afastada, de ofício, a agravante do artigo 61, II, "c".
9. Da agravante prevista no artigo 62, IV do Código Penal. O pagamento
de recompensa é circunstância ordinária no delito de tráfico de drogas,
ocorrendo na quase totalidade dos casos de prática desse delito, mostrando-se,
portanto, indevida a incidência da agravante com base nesse argumento.
10. A confissão do réu, porque espontânea, ou seja, sem a intervenção de
fatores externos, autoriza o reconhecimento da atenuante genérica, em 1/6,
inclusive porque foi utilizada como um dos fundamentos da condenação.
11. Terceira fase da dosimetria. Mantida a majoração da pena em decorrência
da causa de aumento prevista no art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06
(transnacionalidade do delito), no percentual mínimo de 1/6 (um sexto).
12. Inaplicável a causa de diminuição prevista no artigo 33, §4º, da Lei
n.º 11.343/06, que prevê a redução de 1/6 a 2/3 para o agente que seja
primário, possua bons antecedentes e não se dedique a atividades criminosas
nem integre organização criminosa. Toda a operação revela sofisticação,
envolvendo uma carreta e um cavalo, equipado com rádio transmissor, que
continham locais preparados previamente para ocultação de mais de 500 kg
de maconha e mais de 50 kg de cocaína, o que não seria entregue a qualquer
desavisado, senão a um dos integrantes da organização criminosa.
13. Não há prova nos autos sobre os rendimentos auferidos pelo réu, assim
os dias-multa devem ser fixados no valor unitário de 1/30 (um trigésimo)
do salário mínimo, vigente na data dos fatos.
14. Pena definitiva fixada em 7 (sete) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias,
e 777 (setecentos e setenta e sete) dias-multa, no valor unitário de 1/30
(um trigésimo) do salário mínimo, vigente na data dos fatos.
15. Incide a regra constante do art. 69 do Código Penal, posto que o réu
cometeu dois crimes diferentes por meio de condutas diversas. Reconhecido
o concurso material, deve haver o somatório de penas; no caso concreto,
estas devem ser aplicadas distintamente, devido à sua natureza diversa,
em obediência aos comandos insertos no art. 69, parte final, e no art. 76,
ambos do Código Penal. Ocorre, entretanto, que, neste ponto, o magistrado
de piso contrariou o expressamente disposto na norma legal ao, antes de
reconhecer o concurso material, substituir a pena privativa de liberdade
(2 anos de detenção) fixada para o crime previsto no artigo 183 da Lei
9.472/1997, por 2 (duas) restritivas de direitos. O §1°, do art. 69 do CP
é expresso ao vedar tal possibilidade, quando ao agente tiver sido aplicada
pena privativa de liberdade, não suspensa, por um dos crimes.
16. É o caso, pois o réu também foi condenado em primeiro grau de
jurisdição à pena privativa de liberdade de 12 (doze) anos e 3 (três)
meses de reclusão, pela prática do crime previsto na Lei 11.343/2006, artigo
33 c/c 40, I, pena esta ora reduzida para 7 (sete) anos, 9 (nove) meses e 10
(dez) dias, e 777 (setecentos e setenta e sete) dias-multa. Evidentemente,
o magistrado a quo não poderia ter realizado a substituição mencionada,
até porque o artigo 44, I do CP trata de pena privativa de liberdade, ou seja,
o gênero, da qual a reclusão e detenção são espécies, como preceitua o
artigo 33 do mesmo diploma legal. O magistrado o fez e a acusação não se
insurgiu contra tal decisão, aliás, a acusação não interpôs qualquer
recurso, sequer opôs embargos de declaração. Em decorrência, houve o
trânsito em julgado para ela. A consequência direta disto é que não
é possível, agora, piorar a situação do réu e não permitir a citada
substituição, ainda que esta tenha sido fixada de forma teratológica,
malferindo o artigo 617 do CPP.
17. Fica estabelecido o concurso material e para efeito do regime prisional
inicial deverá ser considerada somente a pena privativa de liberdade
estabelecida para o crime de tráfico de entorpecentes, esta em 7 (sete)
anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão.
18. Embora a sanção (desconsiderada a pena privativa de liberdade de 2 anos
de detenção fixada para o crime previsto no artigo 183 da Lei 9.472/1997,
pelas razões retro expostas) seja inferior a 8 (oito) anos, as circunstâncias
do caso (toda a operação revela sofisticação, envolvendo uma carreta e
um cavalo, equipado com rádio transmissor, que continham locais preparados
previamente para ocultação de mais de 500 kg de maconha e mais de 50 kg de
cocaína) indicam que o réu dedica-se à atividade criminosa, o que recomenda
a adoção do regime inicial fechado, tal como determinado na sentença.
19. Não há amparo normativo para o pleito de revogação da determinação
de perda dos veículos (Mercedes Benz LS1935, placas IBY-1973 - cavalo
trator - e Semirreboque Guerra, placas HQN-9012). Os bens foram utilizados
como instrumento para a prática do crime de tráfico de entorpecentes;
assim, há regra específica que comanda a decretação do perdimento,
independentemente de sua ilicitude, regra esta constante do art. 63 da Lei
11.343/06. Portanto, não cabe a restituição em tela.
20. Exauridos os recursos nesta Corte e interpostos recursos dirigidos às
Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), expeça-se
Carta de Sentença, bem como comunique-se ao Juízo de Origem para o início
da execução da pena imposta à ré, sendo dispensadas tais providências
em caso de trânsito em julgado, hipótese em que terá início a execução
definitiva da pena.
21. Apelação da defesa parcialmente provida.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL
DE DROGAS. NÃO OCORRÊNCIA DE ERRO DE PROIBIÇÃO. CRIME ART. 183,
CAPUT, DA LEI Nº 9.472/97. INSIGNIFICÂNCIA NÃO PRESENTE. NÃO
RECONHECIDA A DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DO ART. 70 DA LEI Nº
4.117/62. TRANSNACIONALIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO
DEMONSTRADOS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. QUANTIDADE E NATUREZA DA
DROGA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA FIXADA EM 1/6. AFASTADAS AS AGRAVANTES DOS
ARTIGOS 61, II, "C" E 62, IV DO CP. NÃO INCIDÊNCIA DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO
DE PENA DO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI 11.343/2006. CAUSA DE AUMENTO DECORRENTE
DA TRANSNACIONALIDADE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. REGIME SEMIABERTO. APELAÇÃO
DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDA.
1. Consoante o artigo 40, I, da Lei n° 11.343/2006, é necessário somente
que "a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido
e as circunstâncias do fato evidenciem a transnacionalidade do delito",
e não que haja a efetiva transposição de fronteiras entre os países.
2. O erro de proibição é aquele que incide sobre a ilicitude do fato. O
agente pratica a conduta definida no tipo penal sem consciência de que age
ilicitamente, excluindo-se, por essa razão, a culpabilidade. A alegação de
que não sabia que estava cometendo um delito, não tem o condão de ilidir
a conduta criminosa. Isso porque o erro de proibição somente se verifica
quando o agente não tem possibilidade de saber que o fato é proibido,
o que não é a hipótese.
3. O crime do artigo 183 da Lei nº 9.472 /97 é formal. Consuma-se com a
simples instalação ou utilização de aparelhos de telecomunicação sem a
autorização da autoridade competente, prescindindo do resultado para sua
configuração. É indiferente o grau do dano às radiocomunicações que
pode advir do funcionamento de estações de radiodifusão em desacordo com
as determinações legais. Do Laudo Pericial (fls. 49-55), infere-se que o
rádio estava apto ao funcionamento, configurado para operar na frequência
de 27,015 MHz, com potência de aproximadamente 11 Watts. Em outro ponto,
os peritos afirmaram que o rádio tinha, potencialmente, a capacidade de
operar em outras frequências, inserindo-se em serviços regulamentados;
e poderia dificultar e até mesmo impedir a recepção de sinais oriundos
de outros equipamentos de comunicação via rádio que operassem na mesma
frequência, em frequência próxima ou em frequências múltiplas. Rejeitada,
assim, a insignificância.
4. O tipo penal definido no art. 183, caput, da Lei n.º 9.472/97 reafirmou
a ilicitude da atividade de radiodifusão clandestina, sendo até então
prevista no art. 70 da Lei n.º 4.117/62 a utilização de telecomunicação
sem observância do disposto em lei e nos regulamentos. Desse modo, enquanto o
delito da Lei n.º 4.117/62 incrimina o desenvolvimento de telecomunicação,
em desacordo com os regulamentos, embora com a devida autorização para
funcionar, o delito insculpido no art. 183, caput, da Lei n.º 9.472/97
tipifica a operação clandestina de tal atividade, ou seja, sem a devida
autorização, como no caso dos autos, em que se mantinha em funcionamento
rádio transceptor ligado e em funcionamento no momento da apreensão,
sem autorização da ANATEL.
5. A materialidade, autoria e dolo restaram comprovados nos autos quanto aos
crimes do art. 183, caput, da Lei n.º 9.472/97 e de tráfico de entorpecentes
previsto nos arts. 33, caput , c. c. art. 40, I, da Lei n° 11.343/06.
6. Dosimetria da Pena do crime previsto no art. 183, caput, da Lei n°
9.472/97. Primeira fase. O magistrado de piso fixou a pena-base no mínimo
legal, em 2 (dois) anos de detenção e ausente apelação da acusação,
bem como considerando que se trata de réu primário, que não ostenta maus
antecedentes, bem como as demais circunstâncias judiciais do art. 59 do
Código Penal não lhe são desfavoráveis, resta mantida a pena-base em 2
(dois) anos de detenção. Segunda fase. Sem atenuantes ou agravantes,
resta mantida a pena em 2 (dois) anos de detenção. Terceira fase da
dosimetria. Ausentes causas de aumento ou de diminuição, fica mantida a
pena definitiva estabelecida em Primeiro Grau de jurisdição, em 2 (dois)
anos de detenção.
6.a. O Órgão Especial do TRF da 3ª Região, em Argüição de
Inconstitucionalidade Criminal, declarou a inconstitucionalidade da expressão
"R$ 10.000,00" contida no preceito secundário do art. 183 da Lei n. 9.472/97,
por entender violado o princípio da individualização da pena, previsto no
art. 5º, XLVI, da Constituição da República. Afastada a pena pecuniária
prevista no art. 183 da Lei n. 9.472/97, tem-se aplicado as disposições do
Código Penal. Portanto, nos termos do Código Penal e proporcionalmente à
pena privativa de liberdade fixada, estabeleço a pena de multa no mínimo
legal em 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo)
do salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente.
7. Dosimetria da pena do crime de tráfico de entorpecentes. Primeira
fase. Não cabe valorar negativamente - como circunstância judicial -
a culpabilidade em razão do preparo, pois essa é inerente à própria
conduta no crime de tráfico transnacional de entorpecentes, assim como as
circunstâncias também são inerentes ao tipo penal e normais na espécie,
ou seja, cometido em etapas e com o uso de entrepostos.
8. Segunda fase: Da agravante do artigo 61, II, "c" (à traição, de
emboscada, ou mediante dissimulação, ou outro recurso que dificultou ou
tornou impossível a defesa do ofendido). Além do magistrado de primeiro grau
ter considerado o compartimento secreto para majorar a pena na primeira fase,
pois lá o tratou como preparo, o que já revelaria "bis in idem", os fatos
aqui descritos não conduzem à aplicação da dita agravante, seja porque
não se trata de defesa do ofendido (saúde pública), seja porque o meio é
próprio ao cometimento do delito previsto no tipo penal, pelo que, sem mais
digressões, resta afastada, de ofício, a agravante do artigo 61, II, "c".
9. Da agravante prevista no artigo 62, IV do Código Penal. O pagamento
de recompensa é circunstância ordinária no delito de tráfico de drogas,
ocorrendo na quase totalidade dos casos de prática desse delito, mostrando-se,
portanto, indevida a incidência da agravante com base nesse argumento.
10. A confissão do réu, porque espontânea, ou seja, sem a intervenção de
fatores externos, autoriza o reconhecimento da atenuante genérica, em 1/6,
inclusive porque foi utilizada como um dos fundamentos da condenação.
11. Terceira fase da dosimetria. Mantida a majoração da pena em decorrência
da causa de aumento prevista no art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06
(transnacionalidade do delito), no percentual mínimo de 1/6 (um sexto).
12. Inaplicável a causa de diminuição prevista no artigo 33, §4º, da Lei
n.º 11.343/06, que prevê a redução de 1/6 a 2/3 para o agente que seja
primário, possua bons antecedentes e não se dedique a atividades criminosas
nem integre organização criminosa. Toda a operação revela sofisticação,
envolvendo uma carreta e um cavalo, equipado com rádio transmissor, que
continham locais preparados previamente para ocultação de mais de 500 kg
de maconha e mais de 50 kg de cocaína, o que não seria entregue a qualquer
desavisado, senão a um dos integrantes da organização criminosa.
13. Não há prova nos autos sobre os rendimentos auferidos pelo réu, assim
os dias-multa devem ser fixados no valor unitário de 1/30 (um trigésimo)
do salário mínimo, vigente na data dos fatos.
14. Pena definitiva fixada em 7 (sete) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias,
e 777 (setecentos e setenta e sete) dias-multa, no valor unitário de 1/30
(um trigésimo) do salário mínimo, vigente na data dos fatos.
15. Incide a regra constante do art. 69 do Código Penal, posto que o réu
cometeu dois crimes diferentes por meio de condutas diversas. Reconhecido
o concurso material, deve haver o somatório de penas; no caso concreto,
estas devem ser aplicadas distintamente, devido à sua natureza diversa,
em obediência aos comandos insertos no art. 69, parte final, e no art. 76,
ambos do Código Penal. Ocorre, entretanto, que, neste ponto, o magistrado
de piso contrariou o expressamente disposto na norma legal ao, antes de
reconhecer o concurso material, substituir a pena privativa de liberdade
(2 anos de detenção) fixada para o crime previsto no artigo 183 da Lei
9.472/1997, por 2 (duas) restritivas de direitos. O §1°, do art. 69 do CP
é expresso ao vedar tal possibilidade, quando ao agente tiver sido aplicada
pena privativa de liberdade, não suspensa, por um dos crimes.
16. É o caso, pois o réu também foi condenado em primeiro grau de
jurisdição à pena privativa de liberdade de 12 (doze) anos e 3 (três)
meses de reclusão, pela prática do crime previsto na Lei 11.343/2006, artigo
33 c/c 40, I, pena esta ora reduzida para 7 (sete) anos, 9 (nove) meses e 10
(dez) dias, e 777 (setecentos e setenta e sete) dias-multa. Evidentemente,
o magistrado a quo não poderia ter realizado a substituição mencionada,
até porque o artigo 44, I do CP trata de pena privativa de liberdade, ou seja,
o gênero, da qual a reclusão e detenção são espécies, como preceitua o
artigo 33 do mesmo diploma legal. O magistrado o fez e a acusação não se
insurgiu contra tal decisão, aliás, a acusação não interpôs qualquer
recurso, sequer opôs embargos de declaração. Em decorrência, houve o
trânsito em julgado para ela. A consequência direta disto é que não
é possível, agora, piorar a situação do réu e não permitir a citada
substituição, ainda que esta tenha sido fixada de forma teratológica,
malferindo o artigo 617 do CPP.
17. Fica estabelecido o concurso material e para efeito do regime prisional
inicial deverá ser considerada somente a pena privativa de liberdade
estabelecida para o crime de tráfico de entorpecentes, esta em 7 (sete)
anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão.
18. Embora a sanção (desconsiderada a pena privativa de liberdade de 2 anos
de detenção fixada para o crime previsto no artigo 183 da Lei 9.472/1997,
pelas razões retro expostas) seja inferior a 8 (oito) anos, as circunstâncias
do caso (toda a operação revela sofisticação, envolvendo uma carreta e
um cavalo, equipado com rádio transmissor, que continham locais preparados
previamente para ocultação de mais de 500 kg de maconha e mais de 50 kg de
cocaína) indicam que o réu dedica-se à atividade criminosa, o que recomenda
a adoção do regime inicial fechado, tal como determinado na sentença.
19. Não há amparo normativo para o pleito de revogação da determinação
de perda dos veículos (Mercedes Benz LS1935, placas IBY-1973 - cavalo
trator - e Semirreboque Guerra, placas HQN-9012). Os bens foram utilizados
como instrumento para a prática do crime de tráfico de entorpecentes;
assim, há regra específica que comanda a decretação do perdimento,
independentemente de sua ilicitude, regra esta constante do art. 63 da Lei
11.343/06. Portanto, não cabe a restituição em tela.
20. Exauridos os recursos nesta Corte e interpostos recursos dirigidos às
Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), expeça-se
Carta de Sentença, bem como comunique-se ao Juízo de Origem para o início
da execução da pena imposta à ré, sendo dispensadas tais providências
em caso de trânsito em julgado, hipótese em que terá início a execução
definitiva da pena.
21. Apelação da defesa parcialmente provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da
3ª Região, por unanimidade, em dar parcial provimento à apelação da
defesa, para reduzir a pena-base e afastar a agravante do artigo 62, IV,
do CP (paga ou promessa de recompensa), de ofício, afasto a agravante do
artigo 61, II, "c" (à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação,
ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido)
e reduzo o valor do dia-multa, restando estabelecida as penas de 7 (sete)
anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias, e 777 (setecentos e setenta e sete)
dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo,
vigente na data dos fatos, pela prática do crime previsto na Lei 11.343/2006,
artigo 33 c/c 40, I, a ser cumprida em regime prisional inicial fechado e
reduzo o valor da multa, pela prática do crime previsto na Lei 9.472/1997,
artigo 183, a 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo)
do salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente
e, ante a ausência de apelação da acusação, mantida a pena de 2 (dois)
anos de detenção, substituída por duas penas restritivas de direitos por
igual tempo, pela prática do crime previsto na Lei 9.472/1997, artigo 183,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Data do Julgamento
:
22/08/2017
Data da Publicação
:
30/08/2017
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 71244
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED LEI-9472 ANO-1997 ART-183
***** CBT-62 CÓDIGO BRASILEIRO DE TELECOMUNICAÇÕES
LEG-FED LEI-4117 ANO-1962 ART-70
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-61 INC-2 LET-C ART-62 INC-4 ART-69 PAR-1
ART-76 ART-44 INC-1 ART-33
***** LDR-06 LEI DE DROGAS
LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-33 PAR-4 ART-40 INC-1 ART-63
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-5 INC-46
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-617
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:30/08/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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