TRF3 0001970-68.2008.4.03.6100 00019706820084036100
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE
SERVIÇOS DE ADMINISTRAÇÃO DOS CARTÕES DE CRÉDITO DA CAIXA - PESSOA
FÍSICA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. ART. 206, §5º, I, DO CC. PROCESSO
EXTINTO. APELAÇÃO PREJUDICADA.
1. Com relação à prescrição, verifico que o MM. Magistrado a quo
aplicou ao caso o prazo prescricional trienal, previsto no art. 205, §3º,
IV, do CC/2002. Tal entendimento não merece prosperar, pois o mencionado
inciso refere-se às ações fundadas em pretensão de ressarcimento de
enriquecimento sem causa. Com efeito, o instituto do enriquecimento sem
causa relaciona-se a um enriquecimento indevido ou locupletamento, isto é,
grosso modo, todo aumento patrimonial que ocorre sem causa jurídica. Assim,
o art. 206, §3º, IV, do CC, ao mencionar "a pretensão de ressarcimento de
enriquecimento sem causa", refere-se à obrigação decorrente do art. 884 do
CC, segundo o qual todo aquele que se enriquece sem causa jurídica possui
o dever de indenizar a pessoa, a cuja custa ocorreu o enriquecimento. Este
não é o caso dos autos.
2. A pretensão vindicada na presente ação monitória é a obrigação
decorrente do inadimplemento do Contrato de Prestação de Serviço
de Administração de Cartões de Crédito. Trata-se, portanto, de
responsabilidade contratual.
3. Tratando-se de contratos que não são líquidos prima facie (como o
caso de contrato de administração de cartão de crédito ou contrato de
abertura de crédito rotativo), há a seguinte polêmica: deve ser aplicado o
art. 206, §5º, I, do CC ou o art. 205 do CC? Isso porque o art. 206, §5º,
I, do CC estipula que prescreve em cinco anos "a pretensão de cobrança
de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular". A
partir de uma interpretação literal, há quem conclua que o mero fato
de o contrato não apresentar liquidez por si só obsta a aplicação do
prazo previsto neste inciso. E, por conseguinte, aplicar-se-ia o prazo
geral do art. 205 do CC, por não haver previsão específica para esse
tipo de responsabilidade contratual. Todavia, parece-me mais coerente com
o ordenamento o entendimento defendido pelo Exmo. Ministro Sidnei Beneti,
no julgamento do Resp nº 1.327.786/RS, no sentido de que (i) apesar de não
se tratar de um contrato que possua liquidez por si só, quando acompanhado
de documentos suficiente para demonstrar o quantum debeatur, é suficiente
para a propositura da ação monitória, e; (ii) e, tendo em conta essa
peculiaridade (de ordem processual), é possível concluir que a ação
monitória fundada nesse tipo de contrato persegue, em verdade, uma dívida
líquida (demonstrada pelo conjunto: contrato acompanhado do demonstrativo
do débito), razão pela qual se submete ao prazo prescricional de cinco
anos previsto no artigo 206, § 5º, I, do Código Civil.
4. E, considerando que o inadimplemento iniciou-se em 13/10/1998, sob a
égide do Código Civil de 1916, é necessário aplicar a regra de transição
prevista no art. 2.028 do novo codex, porquanto houve redução do prazo: (i)
o art. 177 do Código de Civil de 1916 previa prazo prescricional vintenário
(20 anos) para as ações pessoais, e; (ii) o Código Civil de 2002, no
art. 206, §5º, I, reduziu para 5 (cinco) anos o prazo prescricional da
pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa. De acordo com a
regra de transição: (i) aplicam-se os prazos previstos no Código revogado,
quando, na data de sua entrada em vigor (11/01/2003), já houver transcorrido
mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada; (ii) todavia, se não
havia transcorrido mais da metade do prazo prescricional previsto no Código
revogado, aplica-se o prazo previsto no Código Civil de 2002, a contar da
entrada em vigor deste último diploma legal. Portanto, no caso dos autos,
como não havia decorrido mais da metade do prazo previsto no Código Civil
de 1916 até a data em que o Código Civil de 2002 entrou em vigor, deve
ser contado o prazo de 5 (cinco) anos previsto no novo Código Civil da data
em que ele entrou em vigor, de modo que o prazo prescricional findou-se em
11/01/2006. Ocorre que a presente ação somente foi ajuizada em 18/01/2008,
quando há muito a pretensão já se encontrava fulminada pela prescrição.
5. No tocante ao ônus sucumbencial, considerando que a presente ação
monitória foi extinta pela prescrição dos créditos, deve a CEF arcar com
as custas processuais e os honorários advocatícios. Contudo, o montante
fixado na sentença, em 10% sobre o valor atribuído à ação monitória,
devidamente atualizado (fl. 266), mostra-se excessivo e em dissonância com
os critérios do §§ 3º e 4º do art. 20 do Código do Processo Civil,
tendo em vista que a autora atribuiu à causa o valor de R$ 116.416,39 (para
janeiro/2008). Assim, considerando a simplicidade da causa e o pouco trabalho
demandado do advogado dos embargados - que se resume ao oferecimento dos
embargos, eis que sequer chegou a ser aberta a fase de instrução, reduzo
o valor arbitrado para os honorários advocatícios para o patamar de R$
2.000,00 (dois mil reais), com fundamento nos §§ 3º e 4º do art. 20 do
Código do Processo Civil.
6. Sentença de extinção do processo pela ocorrência da prescrição
mantida, porém com fundamento no art. 206, §5º, I, do CPC. Recurso de
apelação da CEF parcialmente provido apenas para reduzir a condenação ao
pagamento de honorários advocatícios para o patamar de R$ 2.000,00 (dois
mil reais), nos termo do voto. Recurso de apelação da parte embargante
desprovido.
Ementa
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE
SERVIÇOS DE ADMINISTRAÇÃO DOS CARTÕES DE CRÉDITO DA CAIXA - PESSOA
FÍSICA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. ART. 206, §5º, I, DO CC. PROCESSO
EXTINTO. APELAÇÃO PREJUDICADA.
1. Com relação à prescrição, verifico que o MM. Magistrado a quo
aplicou ao caso o prazo prescricional trienal, previsto no art. 205, §3º,
IV, do CC/2002. Tal entendimento não merece prosperar, pois o mencionado
inciso refere-se às ações fundadas em pretensão de ressarcimento de
enriquecimento sem causa. Com efeito, o instituto do enriquecimento sem
causa relaciona-se a um enriquecimento indevido ou locupletamento, isto é,
grosso modo, todo aumento patrimonial que ocorre sem causa jurídica. Assim,
o art. 206, §3º, IV, do CC, ao mencionar "a pretensão de ressarcimento de
enriquecimento sem causa", refere-se à obrigação decorrente do art. 884 do
CC, segundo o qual todo aquele que se enriquece sem causa jurídica possui
o dever de indenizar a pessoa, a cuja custa ocorreu o enriquecimento. Este
não é o caso dos autos.
2. A pretensão vindicada na presente ação monitória é a obrigação
decorrente do inadimplemento do Contrato de Prestação de Serviço
de Administração de Cartões de Crédito. Trata-se, portanto, de
responsabilidade contratual.
3. Tratando-se de contratos que não são líquidos prima facie (como o
caso de contrato de administração de cartão de crédito ou contrato de
abertura de crédito rotativo), há a seguinte polêmica: deve ser aplicado o
art. 206, §5º, I, do CC ou o art. 205 do CC? Isso porque o art. 206, §5º,
I, do CC estipula que prescreve em cinco anos "a pretensão de cobrança
de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular". A
partir de uma interpretação literal, há quem conclua que o mero fato
de o contrato não apresentar liquidez por si só obsta a aplicação do
prazo previsto neste inciso. E, por conseguinte, aplicar-se-ia o prazo
geral do art. 205 do CC, por não haver previsão específica para esse
tipo de responsabilidade contratual. Todavia, parece-me mais coerente com
o ordenamento o entendimento defendido pelo Exmo. Ministro Sidnei Beneti,
no julgamento do Resp nº 1.327.786/RS, no sentido de que (i) apesar de não
se tratar de um contrato que possua liquidez por si só, quando acompanhado
de documentos suficiente para demonstrar o quantum debeatur, é suficiente
para a propositura da ação monitória, e; (ii) e, tendo em conta essa
peculiaridade (de ordem processual), é possível concluir que a ação
monitória fundada nesse tipo de contrato persegue, em verdade, uma dívida
líquida (demonstrada pelo conjunto: contrato acompanhado do demonstrativo
do débito), razão pela qual se submete ao prazo prescricional de cinco
anos previsto no artigo 206, § 5º, I, do Código Civil.
4. E, considerando que o inadimplemento iniciou-se em 13/10/1998, sob a
égide do Código Civil de 1916, é necessário aplicar a regra de transição
prevista no art. 2.028 do novo codex, porquanto houve redução do prazo: (i)
o art. 177 do Código de Civil de 1916 previa prazo prescricional vintenário
(20 anos) para as ações pessoais, e; (ii) o Código Civil de 2002, no
art. 206, §5º, I, reduziu para 5 (cinco) anos o prazo prescricional da
pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa. De acordo com a
regra de transição: (i) aplicam-se os prazos previstos no Código revogado,
quando, na data de sua entrada em vigor (11/01/2003), já houver transcorrido
mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada; (ii) todavia, se não
havia transcorrido mais da metade do prazo prescricional previsto no Código
revogado, aplica-se o prazo previsto no Código Civil de 2002, a contar da
entrada em vigor deste último diploma legal. Portanto, no caso dos autos,
como não havia decorrido mais da metade do prazo previsto no Código Civil
de 1916 até a data em que o Código Civil de 2002 entrou em vigor, deve
ser contado o prazo de 5 (cinco) anos previsto no novo Código Civil da data
em que ele entrou em vigor, de modo que o prazo prescricional findou-se em
11/01/2006. Ocorre que a presente ação somente foi ajuizada em 18/01/2008,
quando há muito a pretensão já se encontrava fulminada pela prescrição.
5. No tocante ao ônus sucumbencial, considerando que a presente ação
monitória foi extinta pela prescrição dos créditos, deve a CEF arcar com
as custas processuais e os honorários advocatícios. Contudo, o montante
fixado na sentença, em 10% sobre o valor atribuído à ação monitória,
devidamente atualizado (fl. 266), mostra-se excessivo e em dissonância com
os critérios do §§ 3º e 4º do art. 20 do Código do Processo Civil,
tendo em vista que a autora atribuiu à causa o valor de R$ 116.416,39 (para
janeiro/2008). Assim, considerando a simplicidade da causa e o pouco trabalho
demandado do advogado dos embargados - que se resume ao oferecimento dos
embargos, eis que sequer chegou a ser aberta a fase de instrução, reduzo
o valor arbitrado para os honorários advocatícios para o patamar de R$
2.000,00 (dois mil reais), com fundamento nos §§ 3º e 4º do art. 20 do
Código do Processo Civil.
6. Sentença de extinção do processo pela ocorrência da prescrição
mantida, porém com fundamento no art. 206, §5º, I, do CPC. Recurso de
apelação da CEF parcialmente provido apenas para reduzir a condenação ao
pagamento de honorários advocatícios para o patamar de R$ 2.000,00 (dois
mil reais), nos termo do voto. Recurso de apelação da parte embargante
desprovido.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, dar parcial provimento ao recurso de apelação da CEF apenas
para reduzir a condenação ao pagamento de honorários advocatícios para o
patamar de R$ 2.000,00 (dois mil reais), mantendo a sentença de extinção
do processo pela ocorrência da prescrição, porém com fundamento no
art. 206, §5º, I, do CPC, e negar provimento ao recurso de apelação da
parte embargante, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
20/09/2017
Data da Publicação
:
28/09/2017
Classe/Assunto
:
AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1714820
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/09/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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