TRF3 0001983-56.2011.4.03.6102 00019835620114036102
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA CUMULADA
COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA
AFASTADA. PRIMAZIA DA DECISÃO DE MÉRITO. CRIAÇÃO FRAUDULENTA DE PESSOA
JURÍDICA. PORTAL DO EMPREENDEDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA UNIÃO
FEDERAL. RISCO ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. REDUÇÃO DO
QUANTUM INDENIZATÓRIO ARBITRADO EM PRIMEIRO GRAU. PRECEDENTES STJ.
1. Nulidades suscitadas pela União. O magistrado deve obediência
ao princípio da primazia da decisão de mérito - norteador do sistema
processual civil desde o Código de 1973, e previsto de modo expresso no
novel Codex de 2015 por meio de variados dispositivos (exemplificativamente,
arts. 4º, 6º e 282, § 2º).
2. Diante de tal princípio, nulidades processuais só devem ser pronunciadas
caso comprometam de modo indelével o regular andamento do feito, o que não
ocorre no caso.
3. Nos termos do que dispõe o art. 330, inciso I, do CPC/73 (correspondente
ao art. 355 do CPC/15), o juiz não está obrigado a realizar instrução
probatória, devendo proceder ao julgamento antecipado do mérito caso
entenda serem suficientes as provas documentais constantes dos autos.
4. A linha argumentativa usada pelo magistrado em sentença - que expôs
minúcias a respeito de determinadas características do "Portal do
Empreendedor" - não está sujeita a contraditório prévio. Os fundamentos da
decisão, as razões de decidir utilizadas pelo julgador, devem ser impugnadas
por meio de recurso de apelação - instrumento processual adequado, previsto
pela legislação - não havendo que se falar em submissão dos motivos de
decidir ao escrutínio das partes preliminarmente à prolação da decisão,
uma vez que isso configuraria inadmissível inversão da ordem processual.
5. A Constituição Federal, em seu artigo 37, § 6º, estipula
a responsabilidade civil objetiva do Estado pelos danos causados a
terceiros. Sendo objetiva a responsabilidade civil do Estado, para sua
caracterização são necessários os seguintes requisitos: fato lesivo,
dano e nexo de causalidade.
6. O conjunto probatório coligido aos autos permite concluir que a União
Federal é responsável pelos danos causados à autora.
7. Documentos comprovam a abertura de empresa individual no nome da autora -
o que foi realizado, segundo o ofício da própria SRF, por meio do Portal
do Empreendedor, sem a verificação de quaisquer documentos ou da verdadeira
identidade do requerente.
8. Os dados da pessoa jurídica foram utilizados para firmar contrato
de financiamento junto à CEF. Necessidade de ajuizamento, pela autora,
de outras três ações, em trâmite perante a Justiça Estadual, nas
quais houve deferimento de tutela antecipada para os fins de suspensão de
efeitos de protesto e exclusão de seu nome dos cadastros do SPC/SERASA -
cuja inclusão foi feita em razão de dívidas contraídas fraudulentamente
junto a diversas instituições financeiras.
9. A fraude só foi possível porque o denominado Portal do Empreendedor, não
obstante facilitar a abertura de pessoas jurídicas por microempresários,
deixou de promover a segurança necessária a esse tipo de operação,
dando ensejo ao cometimento de diversos tipos de fraudes.
10. A União Federal, responsável pelo Portal do Empreendedor, não solicita
quaisquer documentos, ou mesmo o prévio cadastro (mediante senha de uso
pessoal ou certificação digital) para fins de constituição da empresa, o
que impede a checagem da idoneidade da solicitação realizada e a verdadeira
identidade do requerente.
11. Pela teoria do risco administrativo, que baliza a responsabilidade
objetiva, cabe ao ente estatal arcar com os riscos decorrentes do
desenvolvimento de suas atividades.
12. Dano moral é a lesão a direito da personalidade. Corresponde a toda
violação ao patrimônio imaterial da pessoa no âmbito das suas relações
de direito privado.
13. A autora demonstrou cabalmente a ocorrência de lesão a seus diretos
de personalidade, uma vez que teve sua honra e seu nome maculados com a
criação de uma empresa individual em seu nome, de modo fraudulento, que
deram ensejo a fraudes posteriores.
14. Montante de R$ 100.000,00 (cem mil reais) a título de danos morais deve
ser reduzido, em atenção aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade,
pois discrepa da jurisprudência do C. STJ para casos análogos ao presente.
15. Remessa oficial e recurso de apelação da União Federal parcialmente
providos.
Ementa
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA CUMULADA
COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA
AFASTADA. PRIMAZIA DA DECISÃO DE MÉRITO. CRIAÇÃO FRAUDULENTA DE PESSOA
JURÍDICA. PORTAL DO EMPREENDEDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA UNIÃO
FEDERAL. RISCO ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. REDUÇÃO DO
QUANTUM INDENIZATÓRIO ARBITRADO EM PRIMEIRO GRAU. PRECEDENTES STJ.
1. Nulidades suscitadas pela União. O magistrado deve obediência
ao princípio da primazia da decisão de mérito - norteador do sistema
processual civil desde o Código de 1973, e previsto de modo expresso no
novel Codex de 2015 por meio de variados dispositivos (exemplificativamente,
arts. 4º, 6º e 282, § 2º).
2. Diante de tal princípio, nulidades processuais só devem ser pronunciadas
caso comprometam de modo indelével o regular andamento do feito, o que não
ocorre no caso.
3. Nos termos do que dispõe o art. 330, inciso I, do CPC/73 (correspondente
ao art. 355 do CPC/15), o juiz não está obrigado a realizar instrução
probatória, devendo proceder ao julgamento antecipado do mérito caso
entenda serem suficientes as provas documentais constantes dos autos.
4. A linha argumentativa usada pelo magistrado em sentença - que expôs
minúcias a respeito de determinadas características do "Portal do
Empreendedor" - não está sujeita a contraditório prévio. Os fundamentos da
decisão, as razões de decidir utilizadas pelo julgador, devem ser impugnadas
por meio de recurso de apelação - instrumento processual adequado, previsto
pela legislação - não havendo que se falar em submissão dos motivos de
decidir ao escrutínio das partes preliminarmente à prolação da decisão,
uma vez que isso configuraria inadmissível inversão da ordem processual.
5. A Constituição Federal, em seu artigo 37, § 6º, estipula
a responsabilidade civil objetiva do Estado pelos danos causados a
terceiros. Sendo objetiva a responsabilidade civil do Estado, para sua
caracterização são necessários os seguintes requisitos: fato lesivo,
dano e nexo de causalidade.
6. O conjunto probatório coligido aos autos permite concluir que a União
Federal é responsável pelos danos causados à autora.
7. Documentos comprovam a abertura de empresa individual no nome da autora -
o que foi realizado, segundo o ofício da própria SRF, por meio do Portal
do Empreendedor, sem a verificação de quaisquer documentos ou da verdadeira
identidade do requerente.
8. Os dados da pessoa jurídica foram utilizados para firmar contrato
de financiamento junto à CEF. Necessidade de ajuizamento, pela autora,
de outras três ações, em trâmite perante a Justiça Estadual, nas
quais houve deferimento de tutela antecipada para os fins de suspensão de
efeitos de protesto e exclusão de seu nome dos cadastros do SPC/SERASA -
cuja inclusão foi feita em razão de dívidas contraídas fraudulentamente
junto a diversas instituições financeiras.
9. A fraude só foi possível porque o denominado Portal do Empreendedor, não
obstante facilitar a abertura de pessoas jurídicas por microempresários,
deixou de promover a segurança necessária a esse tipo de operação,
dando ensejo ao cometimento de diversos tipos de fraudes.
10. A União Federal, responsável pelo Portal do Empreendedor, não solicita
quaisquer documentos, ou mesmo o prévio cadastro (mediante senha de uso
pessoal ou certificação digital) para fins de constituição da empresa, o
que impede a checagem da idoneidade da solicitação realizada e a verdadeira
identidade do requerente.
11. Pela teoria do risco administrativo, que baliza a responsabilidade
objetiva, cabe ao ente estatal arcar com os riscos decorrentes do
desenvolvimento de suas atividades.
12. Dano moral é a lesão a direito da personalidade. Corresponde a toda
violação ao patrimônio imaterial da pessoa no âmbito das suas relações
de direito privado.
13. A autora demonstrou cabalmente a ocorrência de lesão a seus diretos
de personalidade, uma vez que teve sua honra e seu nome maculados com a
criação de uma empresa individual em seu nome, de modo fraudulento, que
deram ensejo a fraudes posteriores.
14. Montante de R$ 100.000,00 (cem mil reais) a título de danos morais deve
ser reduzido, em atenção aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade,
pois discrepa da jurisprudência do C. STJ para casos análogos ao presente.
15. Remessa oficial e recurso de apelação da União Federal parcialmente
providos.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial e ao recurso
de apelação da União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
12/02/2019
Data da Publicação
:
19/02/2019
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1863871
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/02/2019
..FONTE_REPUBLICACAO:
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