TRF3 0002007-67.2005.4.03.6111 00020076720054036111
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. SUFICIÊNCIA
DE RECURSOS. INDEFERIMENTO. PENHOR. ROUBO DE JOIAS DADAS EM
GARANTIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INDENIZAÇÃO QUE
SE MEDE PELA EXTENSÃO DO DANO. DANOS MORAIS NÃO VERIFICADOS. RESPONSABILIDADE
CONTRATUAL. JUROS DE MORA A PARTIR DA CITAÇÃO. LAUDO PERICIAL QUE LEVA EM
CONTA ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA ATÉ AQUELA DATA. INCIDÊNCIA DE CORREÇÃO
MONETÁRIA A PARTIR DA DATA DO LAUDO. POSSIBILIDADE. APELAÇÕES NÃO
PROVIDAS. AGRAVO RETIDO NÃO PROVIDO.
1. A matéria devolvida a este Tribunal diz respeito às preliminares de
ilegitimidade passiva e de ausência de interesse de agir à parte autora
arguidas pela instituição financeira e, como preliminar de mérito,
à ocorrência de prescrição. No mérito propriamente dito, refere-se
ao valor da indenização por danos materiais devida pela instituição
financeira ré em razão do roubo de joias dadas em garantia pignoratícia
pela autora, ao termo inicial de incidência de correção monetária sobre
o valor indenizatório e à ocorrência de dano moral em razão do evento.
2. A parte autora alega que as joias em discussão teriam como real valor o
montante de mais de 700 mil reais, sendo que apenas uma delas, um relógio,
valeria cerca de 60 mil reais; ainda, há testemunho nos autos no sentido
de que teria ela "um absurdo de joias", de que "usava muitas joias, muito
pesadas", assim como suas filhas, e se nota, ainda, que ela não pôde
comparecer à audiência de instrução originariamente designada para
25/03/2008 porque tinha uma viagem de quinze dias marcada para os Estados
Unidos da América, tudo a denotar a suficiência de recursos da autora
para arcar com as custas, despesas processuais e honorários de advogado,
de sorte que resta indeferido o requerimento de gratuidade da justiça.
3. Evidente a legitimidade passiva da CEF para o feito, uma vez que a autora
formulou pedido de sua condenação ao pagamento de danos materiais e morais
decorrentes do roubo de joias dadas à ré como garantia pignoratícia,
o que não transborda os limites da razoabilidade que devem ser observados
pelo autor quando do exercício do seu direito de postular ação em face de
quem entende devido (STJ, AgRg no REsp nº 1.095.276/MG. Rel. Min. Humberto
Martins. Segunda Turma, DJe: 11/06/2010).
4. A subtração das joias e a aceitação do recebimento da indenização
contratual pela autora (20/03/2000) se deram sob a égide do Código Civil
de 1916, segundo o qual a prescrição se daria em vinte anos, contados da
data em que a ação poderia ter sido proposta (art. 177). Com a entrada em
vigor do Código Civil de 2002, em 12/01/2003, tal prazo foi reduzido para
três anos (art. 206, § 3º, V). Não obstante, como não havia transcorrido
mais da metade do prazo prescricional, aplica-se o novo prazo com fluência a
partir da entrada em vigor do CC/02, conforme a regra de transição prevista
em seu art. 2.028.
5. Assim, tendo a ação sido proposta em 25/05/2005, não se verifica a
ocorrência de prescrição, conforme bem consignado em sentença.
6. Não assiste razão à parte ré quando diz que falta interesse de agir à
autora porque ela teria recebido a indenização integral pelas joias furtadas,
nos termos em que prevista no contrato, porque a questão posta nos autos diz,
justamente, com o alegado direito de a parte ser indenizada pelo valor de
mercado de tais bens, que entende ser superior ao quanto efetivamente pago
pela recorrente. Assim, a discussão sobre o valor devido à autora a este
título diz com o mérito da causa.
7. "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados
por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no
âmbito de operações bancárias." Súmula n° 479 do C. Superior Tribunal
de Justiça.
8. Portanto, se a má prestação do serviço bancário - no caso, a
subtração de bens confiados à instituição financeira por força de
contrato de mútuo com garantia pignoratícia - restou demonstrada, e daí
decorreu a lesão de direito a terceiro, por certo que essa lesão há de
ser indenizada.
9. A indenização se mede pela extensão do dano (Código Civil, art. 944),
de modo que a validade da cláusula contratual que fixa a indenização a uma
vez e meia o valor da avaliação efetuada pelo credor pignoratício perde
relevância diante da verdadeira questão essencial ao deslinde da causa,
que é saber qual o efetivo valor das joias subtraídas para se determinar,
então, qual o montante devido pelo banco apelante a título de indenização
por dano material.
10. O perito chegou ao valor de mercado das joias valendo-se de uma metodologia
específica, consistente em "tomada de preços para peças semelhantes
às descritas no processo", efetuada mediante consulta em lojas, feiras de
antiguidades, catálogos e páginas da Internet, método que utilizou para
fixar o valor médio do ouro e da prata, por grama, de sorte que não merece
acolhimento a alegação da parte autora no sentido de que o profissional
teria estimado o valor das joias em aproximadamente cinco vezes o valor da
avaliação da CEF, tampouco se demonstrou que "a praxe é a avaliação de
dez vezes o valor da avaliação das peças".
11. Correta a sentença ao condenar a CEF ao pagamento de indenização
por danos materiais no valor de R$ 192.380,00, com abatimento das quantias
anteriormente pagas em razão do evento, devendo ser mantida neste ponto.
12. Em se tratando de dever contratual de indenização por perda de bem dado
em garantia pignoratícia, sendo certo que a declaração de abusividade
da cláusula em comento só se deu no que toca ao valor a ser pago a este
título, e não quanto ao dever de indenização em si, resta evidente a
natureza contratual da responsabilidade civil do banco réu, de sorte que os
juros de mora devem incidir a partir da data da citação, como bem decidido
em sentença (art. 405 do Código Civil de 2002).
13. Da mesma forma, deve incidir, como regra, correção monetária a partir da
data da citação. Não obstante, no caso concreto, vê-se que o laudo pericial
logrou determinar o valor de mercado das joias em comento já atualizado para
a data em que foi elaborado, 20/03/2007, razão pela qual a atualização
monetária deve incidir sobre o valor indenizatório a partir desta data,
sob pena de se aplicar duas vezes a correção no período entre a data
da citação e a data do laudo pericial, com o consequente enriquecimento
indevido da parte autora.
14. O caso dos autos não comporta a condenação do banco réu ao pagamento
de indenização por danos morais, eis que, ao entregar as joias ao banco em
garantia de dívida, a autora assume o risco de vir a perdê-las na hipótese
de não pagamento do débito, o que poderia acontecer pela superveniência
de motivos que, alheios à sua vontade, tornassem inviável o adimplemento.
15. A prova oral produzida nos autos é frágil e insuficiente para que se
modifique tal entendimento, mormente porque, embora as testemunhas arroladas
pela autora - amigas suas, ao que parece - façam alusão a um suposto
estado de prostração da requerente e o atribuam à subtração de suas
joias, o exame dos autos revela não ser possível concluir que a requerente
tenha experimentado um estado de "depressão profunda", como asseverou em
seu depoimento pessoal, mormente porque não consta dos autos que tenha
a requerente procurado auxílio médico especializado para tratamento do
suposto quadro de depressão, muito menos que tal doença - se acometeu a
autora - tenha tido como causa a subtração das joias empenhadas.
16. Apelação da parte autora não provida.
17. Apelação da parte ré não provida.
18. Agravo retido da parte ré não provido.
Ementa
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. SUFICIÊNCIA
DE RECURSOS. INDEFERIMENTO. PENHOR. ROUBO DE JOIAS DADAS EM
GARANTIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INDENIZAÇÃO QUE
SE MEDE PELA EXTENSÃO DO DANO. DANOS MORAIS NÃO VERIFICADOS. RESPONSABILIDADE
CONTRATUAL. JUROS DE MORA A PARTIR DA CITAÇÃO. LAUDO PERICIAL QUE LEVA EM
CONTA ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA ATÉ AQUELA DATA. INCIDÊNCIA DE CORREÇÃO
MONETÁRIA A PARTIR DA DATA DO LAUDO. POSSIBILIDADE. APELAÇÕES NÃO
PROVIDAS. AGRAVO RETIDO NÃO PROVIDO.
1. A matéria devolvida a este Tribunal diz respeito às preliminares de
ilegitimidade passiva e de ausência de interesse de agir à parte autora
arguidas pela instituição financeira e, como preliminar de mérito,
à ocorrência de prescrição. No mérito propriamente dito, refere-se
ao valor da indenização por danos materiais devida pela instituição
financeira ré em razão do roubo de joias dadas em garantia pignoratícia
pela autora, ao termo inicial de incidência de correção monetária sobre
o valor indenizatório e à ocorrência de dano moral em razão do evento.
2. A parte autora alega que as joias em discussão teriam como real valor o
montante de mais de 700 mil reais, sendo que apenas uma delas, um relógio,
valeria cerca de 60 mil reais; ainda, há testemunho nos autos no sentido
de que teria ela "um absurdo de joias", de que "usava muitas joias, muito
pesadas", assim como suas filhas, e se nota, ainda, que ela não pôde
comparecer à audiência de instrução originariamente designada para
25/03/2008 porque tinha uma viagem de quinze dias marcada para os Estados
Unidos da América, tudo a denotar a suficiência de recursos da autora
para arcar com as custas, despesas processuais e honorários de advogado,
de sorte que resta indeferido o requerimento de gratuidade da justiça.
3. Evidente a legitimidade passiva da CEF para o feito, uma vez que a autora
formulou pedido de sua condenação ao pagamento de danos materiais e morais
decorrentes do roubo de joias dadas à ré como garantia pignoratícia,
o que não transborda os limites da razoabilidade que devem ser observados
pelo autor quando do exercício do seu direito de postular ação em face de
quem entende devido (STJ, AgRg no REsp nº 1.095.276/MG. Rel. Min. Humberto
Martins. Segunda Turma, DJe: 11/06/2010).
4. A subtração das joias e a aceitação do recebimento da indenização
contratual pela autora (20/03/2000) se deram sob a égide do Código Civil
de 1916, segundo o qual a prescrição se daria em vinte anos, contados da
data em que a ação poderia ter sido proposta (art. 177). Com a entrada em
vigor do Código Civil de 2002, em 12/01/2003, tal prazo foi reduzido para
três anos (art. 206, § 3º, V). Não obstante, como não havia transcorrido
mais da metade do prazo prescricional, aplica-se o novo prazo com fluência a
partir da entrada em vigor do CC/02, conforme a regra de transição prevista
em seu art. 2.028.
5. Assim, tendo a ação sido proposta em 25/05/2005, não se verifica a
ocorrência de prescrição, conforme bem consignado em sentença.
6. Não assiste razão à parte ré quando diz que falta interesse de agir à
autora porque ela teria recebido a indenização integral pelas joias furtadas,
nos termos em que prevista no contrato, porque a questão posta nos autos diz,
justamente, com o alegado direito de a parte ser indenizada pelo valor de
mercado de tais bens, que entende ser superior ao quanto efetivamente pago
pela recorrente. Assim, a discussão sobre o valor devido à autora a este
título diz com o mérito da causa.
7. "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados
por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no
âmbito de operações bancárias." Súmula n° 479 do C. Superior Tribunal
de Justiça.
8. Portanto, se a má prestação do serviço bancário - no caso, a
subtração de bens confiados à instituição financeira por força de
contrato de mútuo com garantia pignoratícia - restou demonstrada, e daí
decorreu a lesão de direito a terceiro, por certo que essa lesão há de
ser indenizada.
9. A indenização se mede pela extensão do dano (Código Civil, art. 944),
de modo que a validade da cláusula contratual que fixa a indenização a uma
vez e meia o valor da avaliação efetuada pelo credor pignoratício perde
relevância diante da verdadeira questão essencial ao deslinde da causa,
que é saber qual o efetivo valor das joias subtraídas para se determinar,
então, qual o montante devido pelo banco apelante a título de indenização
por dano material.
10. O perito chegou ao valor de mercado das joias valendo-se de uma metodologia
específica, consistente em "tomada de preços para peças semelhantes
às descritas no processo", efetuada mediante consulta em lojas, feiras de
antiguidades, catálogos e páginas da Internet, método que utilizou para
fixar o valor médio do ouro e da prata, por grama, de sorte que não merece
acolhimento a alegação da parte autora no sentido de que o profissional
teria estimado o valor das joias em aproximadamente cinco vezes o valor da
avaliação da CEF, tampouco se demonstrou que "a praxe é a avaliação de
dez vezes o valor da avaliação das peças".
11. Correta a sentença ao condenar a CEF ao pagamento de indenização
por danos materiais no valor de R$ 192.380,00, com abatimento das quantias
anteriormente pagas em razão do evento, devendo ser mantida neste ponto.
12. Em se tratando de dever contratual de indenização por perda de bem dado
em garantia pignoratícia, sendo certo que a declaração de abusividade
da cláusula em comento só se deu no que toca ao valor a ser pago a este
título, e não quanto ao dever de indenização em si, resta evidente a
natureza contratual da responsabilidade civil do banco réu, de sorte que os
juros de mora devem incidir a partir da data da citação, como bem decidido
em sentença (art. 405 do Código Civil de 2002).
13. Da mesma forma, deve incidir, como regra, correção monetária a partir da
data da citação. Não obstante, no caso concreto, vê-se que o laudo pericial
logrou determinar o valor de mercado das joias em comento já atualizado para
a data em que foi elaborado, 20/03/2007, razão pela qual a atualização
monetária deve incidir sobre o valor indenizatório a partir desta data,
sob pena de se aplicar duas vezes a correção no período entre a data
da citação e a data do laudo pericial, com o consequente enriquecimento
indevido da parte autora.
14. O caso dos autos não comporta a condenação do banco réu ao pagamento
de indenização por danos morais, eis que, ao entregar as joias ao banco em
garantia de dívida, a autora assume o risco de vir a perdê-las na hipótese
de não pagamento do débito, o que poderia acontecer pela superveniência
de motivos que, alheios à sua vontade, tornassem inviável o adimplemento.
15. A prova oral produzida nos autos é frágil e insuficiente para que se
modifique tal entendimento, mormente porque, embora as testemunhas arroladas
pela autora - amigas suas, ao que parece - façam alusão a um suposto
estado de prostração da requerente e o atribuam à subtração de suas
joias, o exame dos autos revela não ser possível concluir que a requerente
tenha experimentado um estado de "depressão profunda", como asseverou em
seu depoimento pessoal, mormente porque não consta dos autos que tenha
a requerente procurado auxílio médico especializado para tratamento do
suposto quadro de depressão, muito menos que tal doença - se acometeu a
autora - tenha tido como causa a subtração das joias empenhadas.
16. Apelação da parte autora não provida.
17. Apelação da parte ré não provida.
18. Agravo retido da parte ré não provido.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, negar provimento às apelações e ao agravo retido da CEF, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Data do Julgamento
:
26/03/2019
Data da Publicação
:
04/04/2019
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1443102
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/04/2019
..FONTE_REPUBLICACAO:
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