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Jurisprudência


TRF3 0002053-96.2013.4.03.6104 00020539620134036104

Ementa
PENAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. ART. 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO CRIME DE ESTELIONATO POR AFRONTA AO PRINCÍPIO DA ULTIMA RATIO / INTERVENÇÃO MÍNIMA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO DA IMPUTAÇÃO POR MEIO DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PLEITO DE CORREÇÃO DA 2ª FASE DA DOSIMETRIA DA PENA - PENA BASE ABAIXO DO MÍNIMO LEGAL EM RAZÃO DA INCIDÊNCIA DA ATENUANTE OBRIGATÓRIA DA CONFISSÃO. PLEITO DE REDUÇÃO DO VALOR DA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. PLEITO DE DEFERIMENTO DOS BENEFÍCIOS DE JUSTIÇA GRATUITA. - O princípio da intervenção mínima do Direito Penal deve ser aplicado ao lado do postulado da ultima ratio no sentido de que o Direito Penal não pode ser a primeira opção prevista no ordenamento jurídico como forma de debelar uma situação concreta (daí porque sua necessidade de intervenção mínima e no contexto da última fronteira para restabelecer a paz social). Em outras palavras, o Direito Penal não deve interferir em demasia na vida do indivíduo para tolher sua autonomia ou sua liberdade na justa medida em que determinados fatos ou determinada situação ensejam a incidência de outros ramos do Direito (que se mostram aptos a afastar a crise que se instaurou) - na falta de solução adequada à lide instaurada na sociedade (não resolvida, portanto, pela atuação dos demais segmentos do Direito), tem cabimento ser chamado à baila o legislador a fim de que a conduta não pacificada seja tipificada como delito por meio da edição de uma lei penal incriminadora. - O Estado Democrático de Direito necessariamente exige a presença de um Direito Penal fragmentário, ou seja, mínimo no sentido de que não incrimine qualquer conduta no plano dos fatos e dos acontecimentos da vida (princípio da intervenção mínima), sob o pálio do conceito de que a tipificação de ações / omissões deve ocorrer quando os demais ramos da Ciência Jurídica não foram o bastante para restabelecer a harmonia social (postulado da ultima ratio). Entendimento sufragado tanto pelo C. Supremo Tribunal Federal como pelo E. Superior Tribunal de Justiça. - O tipo penal colacionado no art. 171 do Código Penal, o que abarca a causa de aumento de pena prevista no § 3º de indicada norma, não padece de qualquer vício que o torne contrário ao Texto Constitucional de 1988. Isso porque tal preceito tem como escopo tutelar bem jurídico consistente no patrimônio que, a teor do disposto no § 3º do art. 171 do Código Penal, acaba por pertencer a toda a sociedade (na justa medida em que o ardil empregado com o escopo de obter vantagem indevida em prejuízo alheio acaba por ferir entidade de direito público ou instituto de economia popular, de assistência social ou de beneficência). - Mostra-se extremamente relevante e necessária a intervenção do Direito Penal a incriminar condutas que tenham como alvedrio a obtenção de vantagem ilícita, em prejuízo alheio, por meio da perpetração de ardil, não apenas porque há um desfalque patrimonial, mas, principalmente, a fim de manter a higidez do sistema que cerca entidade de direito público ou instituto de economia popular, de assistência social ou de beneficência. Ressalte-se ser de extrema importância combater fraudes perpetradas contra o já combalido e sacrificado sistema de Previdência Social brasileiro, que tem por objetivo financiar o futuro recebimento de aposentadoria e de pensões a ser pagas aos cidadãos que contribuíram para a formação de reserva financeira estatal suficiente a tal desiderato (inclusive sofrendo a incidência de sucessivas reformas a dificultar cada vez mais a obtenção de prestações previdenciárias). O patrimônio titularizado pela Previdência Social é responsável, também, pelo adimplemento de benefícios assistenciais a inúmeras pessoas que se enquadram no conceito de baixa renda, o que denota sua importância e a imperiosa aplicação do Direito Penal em face de condutas que buscam dilapidá-lo. - Não há que se falar, ademais, no reconhecimento da existência de inconstitucionalidade formal por desrespeito ao devido processo legislativo (como, por exemplo, vício de iniciativa da lei ou desrespeito ao rito constitucional de elaboração da espécie normativa) quando da edição da norma em comento. - O princípio da insignificância (ou da bagatela) demanda ser interpretado à luz dos postulados da mínima intervenção do Direito Penal e da ultima ratio como forma de afastar a aplicação do Direito Penal a fatos de somenos importância (e que, portanto, podem ser debelados com supedâneo nos demais ramos da Ciência Jurídica - fragmentariedade do Direito Penal). A insignificância tem o condão de afastar a tipicidade da conduta sob o aspecto material ao reconhecer que ela possui um reduzido grau de reprovabilidade e que houve pequena ofensa ao bem jurídico tutelado. - O crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, em especial o estelionato levado a efeito contra a Previdência Social, macula bem jurídico pertencente à coletividade consistente no patrimônio do nosso sistema de Previdência (e a própria subsistência do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS como órgão responsável pelo adimplemento de aposentadorias e de pensões aos segurados que dele são filiados), o que, por si só, já faz com que seja incabível o pleito de aplicação do postulado em comento ao caso dos autos, ainda que o ardil tenha causado prejuízo abaixo do valor necessário para que a União Federal tenha interesse em cobrar judicialmente seu crédito por meio do ajuizamento de ação de execução fiscal. Ademais, há que ser consignado que a conduta perpetrada pelo estelionatário também malfere os bens jurídicos da moralidade administrativa e da fé pública (culminando, assim, no mau trato da coisa pública), sem se olvidar da consequente ampliação do déficit que nossa Previdência Social suporta. Precedentes do C. Supremo Tribunal Federal, do E. Superior Tribunal de Justiça e do C. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. - Não se mostra lícito ao juiz, quando da aplicação do critério trifásico de individualização da pena, extrapolar os marcos mínimo e máximo abstratamente cominados para a sanção penal daquele tipo que o agente encontra-se incorrido, não havendo que se falar na possibilidade de que uma atenuante abaixe a pena base para aquém do mínimo legal (ainda que a dicção do Código Penal sustente que sua aplicação é obrigatória: São circunstâncias que sempre atenuam a pena: ...), uma vez que sua atividade judicante encontra baliza nos limites constantes do preceito secundário do tipo penal sem que se possa cogitar em ofensa aos postulados da legalidade e da individualização da pena. - Tema decidido pelo C. Supremo Tribunal Federal por meio do reconhecendo a repercussão geral da questão constitucional (de observância obrigatória para as demais instâncias judiciárias a teor do art. 927, III, do Código de Processo Civil), firmando sua jurisprudência no sentido de que atenuante genérica não pode reduzir a pena abaixo do mínimo legal. Tema também pacificado no âmbito do E. Superior Tribunal de Justiça por meio do entendimento contido na Súm. 231 e do julgamento de recurso repetitivo (a implicar, outrossim, a aplicação do art. 927, III, do Código de Processo Civil). - Diante das peculiaridades do caso concreto, em especial, dos rendimentos declarados pelo recorrente e de seu grau de escolaridade, a pena restritiva de direito consistente em prestação pecuniária (fixada pelo Magistrado sentenciante na casa de 05 salários mínimos) deve ser reduzida para a cifra de 02 salários mínimos em respeito aos princípios da proporcionalidade e da individualização das penas. Pertinente deferir, também, o pleito de Justiça Gratuita sob o pálio do disposto no art. 98 do Código de Processo Civil, em especial da norma inserta no § 3º de indicado preceito. - Dado parcial provimento ao recurso de apelação interposto pelo réu (apenas para reduzir a pena restritiva de direito consistente em prestação pecuniária para a cifra de 02 salários mínimos e para deferir os benefícios de Justiça Gratuita).
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto pelo réu (apenas para reduzir a pena restritiva de direito consistente em prestação pecuniária para a cifra de 02 salários mínimos e para deferir os benefícios de Justiça Gratuita), nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 28/11/2017
Data da Publicação : 13/12/2017
Classe/Assunto : Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 59890
Órgão Julgador : DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940 LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-171 PAR-3 ***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015 LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-927 INC-3 ART-98 PAR-3 ***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA LEG-FED SUM-231
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/12/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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