TRF3 0002148-41.2013.4.03.6100 00021484120134036100
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO
CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO
PÚBLICO. CABIMENTO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. ILEGITIMIDADE
PASSIVA DA UNIÃO FEDERAL. EXCLUSÃO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO
PEDIDO. QUESTÃO QUE SE CONFUNDE COM O MÉRITO DA QUAESTIO. SERVIDOR
PÚBLICO. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. REGIME JURÍDICO DE
TRABALHO. CELETISTA. ESTATUTÁRIO. ART. 39 CF. EC 19/1998. ADI N.º
2.135/DF. ADIN Nº 1.717. DECRETO-LEI Nº 968/1969. RECEPÇÃO PELA
CF/88. LEI Nº 8.112/1990. INAFASTABILIDADE DO § 3º, ART.58 DA LEI Nº
9.649/1998. APELAÇÕES PROVIDAS.
1. A União Federal pontifica em seu recurso de apelação que o órgão
ministerial não poderia ter se valido da via da ação civil pública para
tutelar os direitos dos futuros contratados pelo conselho de fiscalização
profissional, tendo em vista que, no seu entender, se está diante de
interesses individuais disponíveis. Compete ao Parquet zelar pelo efeito
cumprimento das disposições da ordem jurídica, em especial aquelas de
patamar constitucional (arts. 127 e 129 da CF/88).
2. O caso em comento está subsumido a esta hipótese. É que com a propositura
da ação civil pública, o MPF pretende tutelar o pretenso direito dos futuros
agentes públicos do conselho profissional de estarem regidos pelas normas
estatutárias da Lei n. 8.112/1990, e não da CLT. Por outras palavras,
o órgão ministerial atua naquilo que compreende ser a melhor forma de
se atender aos imperativos constitucionais, missão essa que claramente se
situa entre as suas finalidades institucionais.
3. A União salienta que o assunto debatido nestes autos depende de uma
regulamentação, e que a ação civil pública não é o instrumento adequado
para se compelir o Poder Público a normatizar qualquer questão. Razão mais
uma vez não assiste ao ente federal. Ao contrário do que alega por esta
preliminar recursal, o objetivo do MPF com a ação civil pública nunca
foi o de obter o saneamento de qualquer omissão legislativa, mas apenas
o de resguardar a situação jurídica de futuros contratados da autarquia
profissional, inserindo-os no regime jurídico único de que cuida o art. 39,
caput, da CF/88. Sendo assim, a utilização da presente via processual se
revela completamente adequada ao fim perseguido.
4. Pela derradeira preliminar recursal movimentada pela União Federal,
o ente sustenta a sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da ação
civil pública. Neste particular, a sua pretensão comporta guarida. Como se
averbou acima, a ação civil pública foi proposta com a finalidade de se
preservar futuros agentes públicos do conselho de fiscalização profissional,
submetendo-os ao regime jurídico único dos servidores. Por evidente, então,
que a condenação almejada em juízo tem por mira obrigar a autarquia a
observar as normas constitucionais, e não o ente federal a fazê-lo, mesmo
porque a União não se confunde com o conselho de fiscalização profissional,
na medida em que ambos mantêm personalidades jurídicas distintas entre si.
5. O CRECI/SP defende a inépcia da petição inicial, afirmando que as
providências que pretende adotar quanto à contratação de funcionários
públicos está expressamente albergada pelo ordenamento jurídico, com o
que, então, faltaria ao caso em comento uma das condições da ação:
a possibilidade jurídica do pedido. O recorrente, contudo, apresenta o
argumento em tela de forma genérica, aduzindo que a pretensão da parte
autora não pode ser conhecida porque seu agir está em conformidade com a
lei. Ora, a análise de tal temática claramente se confunde com o mérito
da quaestio, razão pela qual se ingressará nessa seara quando se adentrar
ao cerne da controvérsia posta.
6. A controvérsia ora posta em deslinde cinge-se na possibilidade de
alteração do regime contratual trabalhista (CLT), para regime estatutário
instituído pela Lei nº 8.112/1990, aos empregados dos conselhos de
fiscalização profissionais.
7. Como regra, os servidores dos Conselhos de Fiscalização Profissional,
salvo exceções estabelecidas em lei, eram regidos pelo regime celetista,
nos termos do art. 1º do Decreto-Lei nº 968, de 13.10.1969. A Lei nº 8.112,
de 11.12.1990, ao regulamentar o art. 39, caput da Constituição Federal
(em sua redação original, antes da alteração promovida pela EC 19/98),
através do art. 243, instituiu o regime jurídico único para os servidores
públicos da União, o qual passou a disciplinar as relações de trabalho dos
servidores públicos civis da União, incluindo os servidores dos Conselhos
de Fiscalização.
8. Posteriormente, a Lei nº 9.649, de 27.05.1998, no art. 58 estabeleceu
que os conselhos de fiscalização profissionais, até então considerados
autarquias, são pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço
público, sem qualquer vínculo funcional ou hierárquico com os órgãos
da Administração Pública.
Este dispositivo, igualmente, estabeleceu que os empregados dos conselhos de
fiscalização seriam regidos pelo regime celetista. No mesmo ano, sobreveio
a EC nº 19, de 04.06.1998, que deu nova redação ao art. 39 da Carta de
1988, extinguindo a obrigatoriedade de adoção do regime jurídico único
aos servidores públicos.
9. Todavia, em 02.08.2007, o STF em apreciação de medida liminar na ADI
2.135, suspendeu a eficácia do art. 39, com a nova redação dada pela EC
19/98, ao fundamento de vício no processo legislativo. Ressalvou, contudo,
a subsistência, até o julgamento definitivo da ação, "da validade dos
atos anteriormente praticados com base em legislações eventualmente editadas
durante a vigência do dispositivo ora suspenso".
13. Portanto, in casu, o regime jurídico a ser observado é o estatutário,
previsto na Lei nº 8.112/1990.
14. Apelação da União provida para acolher preliminar de ilegitimidade
passiva do ente federal.
15. Improvida a apelação do Conselho Regional de Corretores de Imóveis
da 2ª Região em São Paulo/SP.
Ementa
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO
CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO
PÚBLICO. CABIMENTO DA VIA PROCESSUAL ELEITA. ILEGITIMIDADE
PASSIVA DA UNIÃO FEDERAL. EXCLUSÃO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO
PEDIDO. QUESTÃO QUE SE CONFUNDE COM O MÉRITO DA QUAESTIO. SERVIDOR
PÚBLICO. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. REGIME JURÍDICO DE
TRABALHO. CELETISTA. ESTATUTÁRIO. ART. 39 CF. EC 19/1998. ADI N.º
2.135/DF. ADIN Nº 1.717. DECRETO-LEI Nº 968/1969. RECEPÇÃO PELA
CF/88. LEI Nº 8.112/1990. INAFASTABILIDADE DO § 3º, ART.58 DA LEI Nº
9.649/1998. APELAÇÕES PROVIDAS.
1. A União Federal pontifica em seu recurso de apelação que o órgão
ministerial não poderia ter se valido da via da ação civil pública para
tutelar os direitos dos futuros contratados pelo conselho de fiscalização
profissional, tendo em vista que, no seu entender, se está diante de
interesses individuais disponíveis. Compete ao Parquet zelar pelo efeito
cumprimento das disposições da ordem jurídica, em especial aquelas de
patamar constitucional (arts. 127 e 129 da CF/88).
2. O caso em comento está subsumido a esta hipótese. É que com a propositura
da ação civil pública, o MPF pretende tutelar o pretenso direito dos futuros
agentes públicos do conselho profissional de estarem regidos pelas normas
estatutárias da Lei n. 8.112/1990, e não da CLT. Por outras palavras,
o órgão ministerial atua naquilo que compreende ser a melhor forma de
se atender aos imperativos constitucionais, missão essa que claramente se
situa entre as suas finalidades institucionais.
3. A União salienta que o assunto debatido nestes autos depende de uma
regulamentação, e que a ação civil pública não é o instrumento adequado
para se compelir o Poder Público a normatizar qualquer questão. Razão mais
uma vez não assiste ao ente federal. Ao contrário do que alega por esta
preliminar recursal, o objetivo do MPF com a ação civil pública nunca
foi o de obter o saneamento de qualquer omissão legislativa, mas apenas
o de resguardar a situação jurídica de futuros contratados da autarquia
profissional, inserindo-os no regime jurídico único de que cuida o art. 39,
caput, da CF/88. Sendo assim, a utilização da presente via processual se
revela completamente adequada ao fim perseguido.
4. Pela derradeira preliminar recursal movimentada pela União Federal,
o ente sustenta a sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da ação
civil pública. Neste particular, a sua pretensão comporta guarida. Como se
averbou acima, a ação civil pública foi proposta com a finalidade de se
preservar futuros agentes públicos do conselho de fiscalização profissional,
submetendo-os ao regime jurídico único dos servidores. Por evidente, então,
que a condenação almejada em juízo tem por mira obrigar a autarquia a
observar as normas constitucionais, e não o ente federal a fazê-lo, mesmo
porque a União não se confunde com o conselho de fiscalização profissional,
na medida em que ambos mantêm personalidades jurídicas distintas entre si.
5. O CRECI/SP defende a inépcia da petição inicial, afirmando que as
providências que pretende adotar quanto à contratação de funcionários
públicos está expressamente albergada pelo ordenamento jurídico, com o
que, então, faltaria ao caso em comento uma das condições da ação:
a possibilidade jurídica do pedido. O recorrente, contudo, apresenta o
argumento em tela de forma genérica, aduzindo que a pretensão da parte
autora não pode ser conhecida porque seu agir está em conformidade com a
lei. Ora, a análise de tal temática claramente se confunde com o mérito
da quaestio, razão pela qual se ingressará nessa seara quando se adentrar
ao cerne da controvérsia posta.
6. A controvérsia ora posta em deslinde cinge-se na possibilidade de
alteração do regime contratual trabalhista (CLT), para regime estatutário
instituído pela Lei nº 8.112/1990, aos empregados dos conselhos de
fiscalização profissionais.
7. Como regra, os servidores dos Conselhos de Fiscalização Profissional,
salvo exceções estabelecidas em lei, eram regidos pelo regime celetista,
nos termos do art. 1º do Decreto-Lei nº 968, de 13.10.1969. A Lei nº 8.112,
de 11.12.1990, ao regulamentar o art. 39, caput da Constituição Federal
(em sua redação original, antes da alteração promovida pela EC 19/98),
através do art. 243, instituiu o regime jurídico único para os servidores
públicos da União, o qual passou a disciplinar as relações de trabalho dos
servidores públicos civis da União, incluindo os servidores dos Conselhos
de Fiscalização.
8. Posteriormente, a Lei nº 9.649, de 27.05.1998, no art. 58 estabeleceu
que os conselhos de fiscalização profissionais, até então considerados
autarquias, são pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço
público, sem qualquer vínculo funcional ou hierárquico com os órgãos
da Administração Pública.
Este dispositivo, igualmente, estabeleceu que os empregados dos conselhos de
fiscalização seriam regidos pelo regime celetista. No mesmo ano, sobreveio
a EC nº 19, de 04.06.1998, que deu nova redação ao art. 39 da Carta de
1988, extinguindo a obrigatoriedade de adoção do regime jurídico único
aos servidores públicos.
9. Todavia, em 02.08.2007, o STF em apreciação de medida liminar na ADI
2.135, suspendeu a eficácia do art. 39, com a nova redação dada pela EC
19/98, ao fundamento de vício no processo legislativo. Ressalvou, contudo,
a subsistência, até o julgamento definitivo da ação, "da validade dos
atos anteriormente praticados com base em legislações eventualmente editadas
durante a vigência do dispositivo ora suspenso".
13. Portanto, in casu, o regime jurídico a ser observado é o estatutário,
previsto na Lei nº 8.112/1990.
14. Apelação da União provida para acolher preliminar de ilegitimidade
passiva do ente federal.
15. Improvida a apelação do Conselho Regional de Corretores de Imóveis
da 2ª Região em São Paulo/SP.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, (i) dar provimento ao recurso de apelação interposto pela União
Federal, para o fim de reconhecer a ilegitimidade do ente federal para figurar
no polo passivo da ação civil pública; e, por maioria, (ii) negar provimento
ao recurso de apelação interposto pelo CRECI/SP, nos termos do relatório,
voto e voto vista que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
07/03/2019
Data da Publicação
:
02/04/2019
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2093554
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Relator para
acórdão
:
DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/04/2019
..FONTE_REPUBLICACAO:
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