TRF3 0002194-41.2011.4.03.6119 00021944120114036119
PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME DE SONEGAÇÃO FISCAL. ARTIGO 1º, I E II,
DA LEI 8137/90. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. CERCEAMENTO
DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS
COMPROVADAS. REDUÇÃO DA PENA DE MULTA. POSSIBILIDADE. SUBSTITUIÇÃO DA PENA
PRIVATIVA DE LIBERDADE POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITO. RECURSO PARCIALMENTE
PROVIDO.
1. Preliminar de inépcia da denúncia rejeitada. Compulsando os presentes
autos, verifica-se que a denúncia foi oferecida em consonância com
os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, expondo o fato
criminoso, com suas circunstâncias, a qualificação do acusado e a
classificação dos crimes adequada à descrição dos fatos. Ademais,
a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça sedimentou-se no
sentido de ser dispensável a descrição minuciosa da conduta do acusado,
bastando que a denúncia narre os fatos de forma a possibilitar o exercício
do contraditório e da ampla defesa.
2. Preliminar de cerceamento de defesa rejeitada. O indeferimento do pedido
de produção de perícia contábil foi devidamente fundamentado pelo Juízo
a quo. Sob outro prisma, o crime de sonegação fiscal não exige corpo
de delito, uma vez que a materialidade delitiva exsurge do procedimento
administrativo fiscal. Desta feita, a perícia pleiteada é dispensável,
porquanto a prova carreada aos autos no transcorrer da instrução criminal
comprova a materialidade do delito, e a denúncia encontra-se amparada por
inquérito policial instaurado em decorrência do procedimento-administrativo
fiscal que goza de presunção de veracidade, não se afigurando cerceamento
de defesa o indeferimento da produção da prova pericial.
3. A materialidade delitiva restou devidamente demonstrada pelo Processo
Administrativo n.º 13864.000143/2010-83, destacando-se o Auto de Infração, o
Demonstrativo de Apuração, o Termo de Encerramento e o Termo de Verificação
Fiscal, no qual se apurou a existência de fraudes na documentação fiscal
do 2º Tabelionato de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca
de Mogi das Cruzes - SP, onde o acusado José Porcelli Júnior exercia a
função de Tabelião, nos anos-calendário de 2006 e 2007, para o fim de
reduzir ou suprimir tributo devido a título de IRPF - imposto de renda
de pessoa física, no montante de R$ 2.148.738,99 (dois milhões, cento
e quarenta e oito mil, setecentos e trinta e oito reais e noventa e nove
centavos), sendo R$ 1.779.929,86 (um milhão, setecentos e setenta e nove
mil, novecentos e vinte e nove reais e oitenta e seis reais) referentes ao
imposto e R$ 368.809,13 (trezentos e sessenta e oito mil, oitocentos e nove
reais e treze centavos), à multa.
4. A autoria delitiva é inconteste. Com efeito, em seu interrogatório
judicial (mídia digital), o acusado José Porcelli Júnior confirmou a sua
responsabilidade pelas informações constantes do livro caixa, cabendo ao
acusado zelar pela correta escrituração. O depoimento do acusado, além de
não afastar a sua responsabilidade quanto às declarações prestadas perante
o Fisco, não se encontra amparado por qualquer elemento probatório, não
tendo a defesa do acusado arrolado qualquer testemunha que pudesse corroborar
a sua narrativa, não obstante a alegação de que vários funcionários
escrituravam o Livro caixa do cartório. Ademais, a circunstância de que
"na época dos fatos, o denunciado dispunha de um sistema eletrônico de
controle dos dados referentes às receitas, o Livro Auxiliar Analítico; e,
a despeito disso, optou por escriturar de forma manual o Livro Caixa" milita
contra o réu, evidenciando que este agiu de forma livre e consciente ao
praticar o delito narrado na denúncia, sendo notório, ainda, o comportamento
do denunciado que, tão logo se iniciou o procedimento fiscal, em 08/08/2008,
procedeu a alienação de seus bens, em nova tentativa de ludibriar o Fisco.
5. Dosimetria da pena. O Juízo a quo fixou a pena-base em 02 (dois)
anos e 06 (seis) meses de reclusão e 52 (cinquenta e dois) dias-multa,
considerando a culpabilidade exacerbada do agente. Ausentes agravantes ou
atenuantes. Aplicação da causa de aumento prevista no artigo 12, I, da Lei
8.137/90, elevando a pena em 1/3, passando a 3 anos e 4 meses de reclusão e
69 dias-multa. Elevação da pena em 1/6 pela continuidade delitiva entre os
dois crimes contra a ordem tributária, ambos da mesma espécie, restando
definitiva a pena em 3 anos e 10 meses de reclusão e 138 dias-multa,
no valor unitário de 02 (dois) salários mínimos vigentes à época dos
fatos. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas
de direito, sendo uma de prestação de serviços à comunidade ou a entidade
pública e uma prestação pecuniária de vinte salários mínimos, em favor
de entidade ou programa com destinação social, a ser designada pelo Juízo
das Execuções Penais.
6. Deve ser mantida a incidência do artigo 71 em detrimento do artigo
69, ambos do Código Penal, tendo em vista a identidade das condutas que
implicaram na redução do pagamento de tributo nos anos-calendário de
2006 e de 2007, perpetradas pelo mesmo agente, nas mesmas circunstâncias e
mesmo modus operandi, tratando-se de crime continuado, inexistindo, no mais,
recurso ministerial impugnando a questão.
7. A pena de multa estabelecida na r. sentença deixou de guardar
proporcionalidade com a pena privativa de liberdade. A fixação do quantum de
dias-multa, tal qual a fixação da pena privativa de liberdade, deve observar
o critério trifásico disposto no artigo 68 do Código Penal. Sendo assim,
observados os critérios de fixação da pena privativa de liberdade, a pena
de multa deve ser fixada em 18 (dezoito) dias-multa, mantendo-se, outrossim,
o valor do dia-multa em 02 (dois) salários mínimos.
8. Não obstante o entendimento desta Turma no sentido de que a existência de
circunstância judicial desfavorável, na forma do artigo 59 do Código Penal,
obsta a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva
de direitos, não houve impugnação neste ponto, razão pela qual deve ser
mantido o decisum.
9. Não prospera o pedido de afastamento da prestação de serviço à
comunidade ou a entidade pública, mantendo-se a substituição da pena
privativa de liberdade por duas restritivas de direito, nos termos do artigo
44, § 2º, do Código Penal, posto que a condenação foi superior a 01
(um) ano de reclusão.
10. A sentença comporta reparo, de ofício, com relação à destinação da
prestação pecuniária imposta ao réu, posto que, sendo a União Federal a
entidade lesada com a ação delituosa, tais valores deverão ser revertidos
aos seus cofres, em conformidade com o disposto no artigo 45, § 1º, do
Código Penal.
11. Matéria preliminar rejeitada. Apelação a que se dá parcial
provimento. Alterada, de ofício, a destinação da prestação pecuniária.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME DE SONEGAÇÃO FISCAL. ARTIGO 1º, I E II,
DA LEI 8137/90. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. CERCEAMENTO
DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS
COMPROVADAS. REDUÇÃO DA PENA DE MULTA. POSSIBILIDADE. SUBSTITUIÇÃO DA PENA
PRIVATIVA DE LIBERDADE POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITO. RECURSO PARCIALMENTE
PROVIDO.
1. Preliminar de inépcia da denúncia rejeitada. Compulsando os presentes
autos, verifica-se que a denúncia foi oferecida em consonância com
os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal, expondo o fato
criminoso, com suas circunstâncias, a qualificação do acusado e a
classificação dos crimes adequada à descrição dos fatos. Ademais,
a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça sedimentou-se no
sentido de ser dispensável a descrição minuciosa da conduta do acusado,
bastando que a denúncia narre os fatos de forma a possibilitar o exercício
do contraditório e da ampla defesa.
2. Preliminar de cerceamento de defesa rejeitada. O indeferimento do pedido
de produção de perícia contábil foi devidamente fundamentado pelo Juízo
a quo. Sob outro prisma, o crime de sonegação fiscal não exige corpo
de delito, uma vez que a materialidade delitiva exsurge do procedimento
administrativo fiscal. Desta feita, a perícia pleiteada é dispensável,
porquanto a prova carreada aos autos no transcorrer da instrução criminal
comprova a materialidade do delito, e a denúncia encontra-se amparada por
inquérito policial instaurado em decorrência do procedimento-administrativo
fiscal que goza de presunção de veracidade, não se afigurando cerceamento
de defesa o indeferimento da produção da prova pericial.
3. A materialidade delitiva restou devidamente demonstrada pelo Processo
Administrativo n.º 13864.000143/2010-83, destacando-se o Auto de Infração, o
Demonstrativo de Apuração, o Termo de Encerramento e o Termo de Verificação
Fiscal, no qual se apurou a existência de fraudes na documentação fiscal
do 2º Tabelionato de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca
de Mogi das Cruzes - SP, onde o acusado José Porcelli Júnior exercia a
função de Tabelião, nos anos-calendário de 2006 e 2007, para o fim de
reduzir ou suprimir tributo devido a título de IRPF - imposto de renda
de pessoa física, no montante de R$ 2.148.738,99 (dois milhões, cento
e quarenta e oito mil, setecentos e trinta e oito reais e noventa e nove
centavos), sendo R$ 1.779.929,86 (um milhão, setecentos e setenta e nove
mil, novecentos e vinte e nove reais e oitenta e seis reais) referentes ao
imposto e R$ 368.809,13 (trezentos e sessenta e oito mil, oitocentos e nove
reais e treze centavos), à multa.
4. A autoria delitiva é inconteste. Com efeito, em seu interrogatório
judicial (mídia digital), o acusado José Porcelli Júnior confirmou a sua
responsabilidade pelas informações constantes do livro caixa, cabendo ao
acusado zelar pela correta escrituração. O depoimento do acusado, além de
não afastar a sua responsabilidade quanto às declarações prestadas perante
o Fisco, não se encontra amparado por qualquer elemento probatório, não
tendo a defesa do acusado arrolado qualquer testemunha que pudesse corroborar
a sua narrativa, não obstante a alegação de que vários funcionários
escrituravam o Livro caixa do cartório. Ademais, a circunstância de que
"na época dos fatos, o denunciado dispunha de um sistema eletrônico de
controle dos dados referentes às receitas, o Livro Auxiliar Analítico; e,
a despeito disso, optou por escriturar de forma manual o Livro Caixa" milita
contra o réu, evidenciando que este agiu de forma livre e consciente ao
praticar o delito narrado na denúncia, sendo notório, ainda, o comportamento
do denunciado que, tão logo se iniciou o procedimento fiscal, em 08/08/2008,
procedeu a alienação de seus bens, em nova tentativa de ludibriar o Fisco.
5. Dosimetria da pena. O Juízo a quo fixou a pena-base em 02 (dois)
anos e 06 (seis) meses de reclusão e 52 (cinquenta e dois) dias-multa,
considerando a culpabilidade exacerbada do agente. Ausentes agravantes ou
atenuantes. Aplicação da causa de aumento prevista no artigo 12, I, da Lei
8.137/90, elevando a pena em 1/3, passando a 3 anos e 4 meses de reclusão e
69 dias-multa. Elevação da pena em 1/6 pela continuidade delitiva entre os
dois crimes contra a ordem tributária, ambos da mesma espécie, restando
definitiva a pena em 3 anos e 10 meses de reclusão e 138 dias-multa,
no valor unitário de 02 (dois) salários mínimos vigentes à época dos
fatos. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas
de direito, sendo uma de prestação de serviços à comunidade ou a entidade
pública e uma prestação pecuniária de vinte salários mínimos, em favor
de entidade ou programa com destinação social, a ser designada pelo Juízo
das Execuções Penais.
6. Deve ser mantida a incidência do artigo 71 em detrimento do artigo
69, ambos do Código Penal, tendo em vista a identidade das condutas que
implicaram na redução do pagamento de tributo nos anos-calendário de
2006 e de 2007, perpetradas pelo mesmo agente, nas mesmas circunstâncias e
mesmo modus operandi, tratando-se de crime continuado, inexistindo, no mais,
recurso ministerial impugnando a questão.
7. A pena de multa estabelecida na r. sentença deixou de guardar
proporcionalidade com a pena privativa de liberdade. A fixação do quantum de
dias-multa, tal qual a fixação da pena privativa de liberdade, deve observar
o critério trifásico disposto no artigo 68 do Código Penal. Sendo assim,
observados os critérios de fixação da pena privativa de liberdade, a pena
de multa deve ser fixada em 18 (dezoito) dias-multa, mantendo-se, outrossim,
o valor do dia-multa em 02 (dois) salários mínimos.
8. Não obstante o entendimento desta Turma no sentido de que a existência de
circunstância judicial desfavorável, na forma do artigo 59 do Código Penal,
obsta a substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva
de direitos, não houve impugnação neste ponto, razão pela qual deve ser
mantido o decisum.
9. Não prospera o pedido de afastamento da prestação de serviço à
comunidade ou a entidade pública, mantendo-se a substituição da pena
privativa de liberdade por duas restritivas de direito, nos termos do artigo
44, § 2º, do Código Penal, posto que a condenação foi superior a 01
(um) ano de reclusão.
10. A sentença comporta reparo, de ofício, com relação à destinação da
prestação pecuniária imposta ao réu, posto que, sendo a União Federal a
entidade lesada com a ação delituosa, tais valores deverão ser revertidos
aos seus cofres, em conformidade com o disposto no artigo 45, § 1º, do
Código Penal.
11. Matéria preliminar rejeitada. Apelação a que se dá parcial
provimento. Alterada, de ofício, a destinação da prestação pecuniária.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, após a ratificação do relatório pelo Juiz Federal
Convocado Carlos Francisco, dar parcial provimento à apelação, para,
mantendo a condenação pela prática do delito previsto no artigo 1º,
incisos I e II, da Lei n.º 8.137/90, c.c. artigo 71 do Código Penal,
reduzir a pena de multa para 18 (dezoito) dias-multa, mantido o valor
do dia-multa em 02 (dois) salários mínimos, e, de ofício, alterar a
destinação da prestação pecuniária em favor da União Federal. Por
maioria, determinar a imediata expedição de guia de execução, nos termos
do voto do Desembargador Federal Valdeci dos Santos, acompanhado pelo Juiz
Federal Convocado Carlos Francisco, vencido o Desembargador Federal Wilson
Zauhy que entende não deva ser expedida a guia de execução.
Data do Julgamento
:
03/10/2017
Data da Publicação
:
17/10/2017
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 53293
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED LEI-8137 ANO-1990 ART-1 INC-1 INC-2 ART-12 INC-1
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-41
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-69 ART-68 ART-59 ART-44 PAR-2 ART-45 PAR-1
ART-71
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/10/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão