TRF3 0002266-62.2010.4.03.9999 00022666220104039999
PROCESSUAL CIVIL. DESNECESSIDADE DA CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM
DILIGÊNCIA. PARECER DO MPF REJEITADO. REGULARIZAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO
PROCESSUAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. CUMPRIMENTO DA CARÊNCIA LEGAL. QUALIDADE DE SEGURADO
DEMONSTRADA. INCAPACIDADE ABSOLUTA E PERMANENTE CONFIGURADA. LAUDO
PERICIAL. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO
DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA
MERAMENTE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER
DO EXPERTO. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO
MAGISTRADO. PERMANÊNCIA NO TRABALHO APESAR DA INCAPACIDADE. ESTADO DE
NECESSIDADE. SOBREVIVÊNCIA. DESDOBRAMENTO DO DIREITO CONSTITUCIONAL
À VIDA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. PRECEDENTES DESTA
CORTE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA. DIB. DATA DA CESSAÇÃO DE
BENEFÍCIO PRECEDENTE. INOCORRÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 111
DO STJ. APLICABILIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO
DO INSS DESPROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA A QUE SE DÁ PARCIAL
PROVIMENTO. MODIFICAÇÃO DA DIB. ALTERAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO
DA CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA DE OFÍCIO. SENTENÇA REFORMADA
EM PARTE.
1 - De início, verifica-se a desnecessidade de conversão do julgamento
em diligência, para fins de esclarecimentos periciais acerca da capacidade
civil do demandante, eis que tal informação foi prestada à fl. 124 pelo
expert. Parecer do MPF rejeitado. Nessa senda, considerando que a conclusão
da perícia judicial é no sentido de o demandante estar incapacitado
para a prática dos atos da vida civil , bem como ante ao princípio do
aproveitamento dos atos processuais e o atual estágio em que se encontra a
demanda, de rigor a nomeação como curador à lide o advogado constituído
(fl. 10), nos termos do art. 9º, I, CPC/1973 (correspondente ao art. 72,
I, do CPC/2015).
2 - A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista
no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da
Constituição Federal.
3 - A Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, preconiza que o benefício
previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que
tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições
mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz
e insusceptível de reabilitação para exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
4 - Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência,
que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente
inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze)
dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
5 - O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre
que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência,
será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o
benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60
da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
6 - Independe de carência, entretanto, a concessão do benefício
nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença
profissional ou do trabalho, conforme art. 26, II, da Lei nº 8.213/91, bem
como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social
- RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 do
mesmo diploma legislativo.
7 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar
no Regime, não impede o deferimento do benefício se tiver decorrido a
inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
8 - Necessário para o implemento do beneplácito em tela, revestir-se
do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher
as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a
Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, o qual
pode ser prorrogado por 24 (vinte e quatro) meses aos que contribuíram por
mais de 120 (cento e vinte) meses, nos termos do art. 15 e §1º da Lei.
9 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 6
(seis) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência
Social, para efeitos de carência, para a concessão do benefício de
aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela
Lei nº 13.457/2017).
10 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo
juízo a quo, com base em exame pericial realizado em 17 de julho de
2008 (fls. 105/108), diagnosticou o autor como portador de "psicose não
especificada" e "epilepsia convulsiva generalizada". Relata que o demandante
"apresenta quadro há +- 10 (dez) anos, quando iniciou crises do tipo
convulsivas, momentos de agitação alternando com quadro de desânimo,
apatia, inquietude, alucinações e delírios. Em tratamento psiquiátrico
desde então em uso dos seguintes medicamentos, após várias internações
psiquiátricas anteriores: Carbamazepina 600 mg, Fenobarbital 200 mg,
Imiprimina 50 mg, sendo que os sintomas ainda persistem, limitando-o na
vida profissional e quanto a sociabilidade, sempre apresentando-se apático
e isolado ". Concluiu que "o autor é portador de quadro grave, limitante,
de caráter incurável, sem condições de desenvolvimento laborativo para
o seu sustento". Fixou a data de início da incapacidade por volta de meados
de 1998. Em sede de esclarecimentos complementares, à fl. 124, ainda atestou
que o autor "apresenta-se incapacitado para os atos da vida civil".
11 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial,
a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479
do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção
das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge
à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos
robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer
do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos
produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo
se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no
caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a
valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª
Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013;
AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
12 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional
inscrito no órgão competente, o qual respondeu aos quesitos elaborados e
forneceu diagnóstico com base na análise de histórico da parte e de exames
complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que
entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório,
referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
13 - Por sua vez, restou incontroversa a qualidade de segurado do autor, bem
como o cumprimento da carência legal, eis que a ação visa o restabelecimento
de benefício. Assim, o próprio ente autárquico reconheceu o preenchimento
de tais requisitos quando do deferimento do pedido administrativo.
14 - Para que não restem dúvidas acerca da qualidade de segurado e do
implemento da carência, informações extraídas da CTPS acostada de
fls. 14/21 e do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, que ora
seguem anexas aos autos, dão conta que, quando do início da incapacidade, em
1998, o autor mantinha vínculo empregatício junto à AGRÍCOLA ALMEIDA LTDA.
15 - Alie-se que o fato de o demandante continuar trabalhando, de forma
esporádica, intercalando períodos laborais com a percepção de benefícios
de auxílio-doença, não permite a desconsideração da conclusão do
perito judicial. Ao contrário, o fato de ter vínculos de trabalho de curta
duração corrobora a sua dificuldade de reinserção no mercado profissional
e o equívoco na cassação de benefício precedente.
16 - Não há dúvida que os benefícios por incapacidade servem justamente
para suprir a ausência da remuneração do segurado que tem sua força de
trabalho comprometida e não consegue exercer suas ocupações profissionais
habituais, em razão de incapacidade temporária ou definitiva. Assim como
não se questiona o fato de que o exercício de atividade remunerada, após
a implantação de tais benefícios, implica na sua imediata cessação e na
necessidade de devolução das parcelas recebidas durante o período que o
segurado auferiu renda. E os princípios que dão sustentação ao raciocínio
são justamente os da vedação ao enriquecimento ilícito e da coibição
de má-fé do segurado. É, inclusive, o que deixou expresso o legislador
no art. 46 da Lei nº 8.213/91, em relação à aposentadoria por invalidez.
17 - Completamente diferente, entretanto, é a situação do segurado que se
vê compelido a ter de ingressar em juízo, diante da negativa da autarquia
previdenciária de lhe conceder o benefício vindicado, por considerar ausente
algum dos requisitos necessários. Ora, havendo pretensão resistida e enquanto
não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra alternativa
não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de
agravamento da situação incapacitante, como única maneira de prover o
próprio sustento. Isto não configura má-fé e, muito menos, enriquecimento
ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada mais é
do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do
ser humano. Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo
indica, pretende que o sustento do segurado fosse provido de forma divina,
transferindo responsabilidade sua para o incapacitado ou, então, para alguma
entidade que deve reputar sacra. Pugna pela responsabilização patrimonial
daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela jurisdicional
para tê-lo reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até o fim
e teve de suportar o calvário processual.
18 - Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de
sobrevivência, com recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização
do segurado com o desconto dos valores do benefício devido no período em
que perdurou o contrato de trabalho. Até porque, nessas circunstâncias,
tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho,
absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis
que completamente à margem da fiscalização estatal, o que implicaria,
inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do regime.
19 - Em suma, configurado o início da incapacidade total e permanente quando
o autor era segurado da Previdência Social e tendo cumprido a carência
estabelecida em Lei, de rigor a concessão da aposentadoria por invalidez,
não podendo esta ser indeferida em razão de trabalho esporádico desenvolvido
por ele, após a data de início da incapacidade (DII).
20 - Acerca da data de início do benefício (DIB), o entendimento consolidado
do E. STJ é de que, "ausente requerimento administrativo no INSS, o
termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida
judicialmente será a data da citação válida" (Súmula 576). Tendo em vista
a permanência da incapacidade, quando da cessação de benefício objeto dos
autos (NB: 560.648.629-2), a DIB deve ser fixada no momento do seu cancelamento
indevido. Portanto, de rigor a fixação da DIB da aposentadoria por invalidez
na data da cessação de auxílio-doença precedente (NB: 560.648.629-2)
em 20/11/2007 (fl. 27), prosperando, em parte, as alegações do requerente.
21 - Relativamente aos honorários advocatícios, inegável que as
condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por
toda a sociedade, razão pela qual a verba honorária deve, por imposição
legal, ser fixada moderadamente, o que restou atendido com o percentual de 10%
(dez por cento) sobre os valores devidos até a sentença (Súmula 111, STJ).
22 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada,
conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão
geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do
IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
23 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório,
fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a
jurisprudência dominante.
24 - Apelação do INSS desprovida. Apelação da parte autora a que se
dá parcial provimento. Modificação da DIB. Alteração dos critérios de
aplicação da correção monetária e dos juros de mora de ofício. Sentença
reformada em parte.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. DESNECESSIDADE DA CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM
DILIGÊNCIA. PARECER DO MPF REJEITADO. REGULARIZAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO
PROCESSUAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. CUMPRIMENTO DA CARÊNCIA LEGAL. QUALIDADE DE SEGURADO
DEMONSTRADA. INCAPACIDADE ABSOLUTA E PERMANENTE CONFIGURADA. LAUDO
PERICIAL. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO
DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA
MERAMENTE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER
DO EXPERTO. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO
MAGISTRADO. PERMANÊNCIA NO TRABALHO APESAR DA INCAPACIDADE. ESTADO DE
NECESSIDADE. SOBREVIVÊNCIA. DESDOBRAMENTO DO DIREITO CONSTITUCIONAL
À VIDA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. PRECEDENTES DESTA
CORTE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA. DIB. DATA DA CESSAÇÃO DE
BENEFÍCIO PRECEDENTE. INOCORRÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 111
DO STJ. APLICABILIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO
DO INSS DESPROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA A QUE SE DÁ PARCIAL
PROVIMENTO. MODIFICAÇÃO DA DIB. ALTERAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO
DA CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA DE OFÍCIO. SENTENÇA REFORMADA
EM PARTE.
1 - De início, verifica-se a desnecessidade de conversão do julgamento
em diligência, para fins de esclarecimentos periciais acerca da capacidade
civil do demandante, eis que tal informação foi prestada à fl. 124 pelo
expert. Parecer do MPF rejeitado. Nessa senda, considerando que a conclusão
da perícia judicial é no sentido de o demandante estar incapacitado
para a prática dos atos da vida civil , bem como ante ao princípio do
aproveitamento dos atos processuais e o atual estágio em que se encontra a
demanda, de rigor a nomeação como curador à lide o advogado constituído
(fl. 10), nos termos do art. 9º, I, CPC/1973 (correspondente ao art. 72,
I, do CPC/2015).
2 - A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista
no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da
Constituição Federal.
3 - A Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, preconiza que o benefício
previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que
tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições
mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz
e insusceptível de reabilitação para exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
4 - Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência,
que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente
inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze)
dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
5 - O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre
que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência,
será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o
benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60
da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
6 - Independe de carência, entretanto, a concessão do benefício
nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença
profissional ou do trabalho, conforme art. 26, II, da Lei nº 8.213/91, bem
como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social
- RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 do
mesmo diploma legislativo.
7 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar
no Regime, não impede o deferimento do benefício se tiver decorrido a
inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
8 - Necessário para o implemento do beneplácito em tela, revestir-se
do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher
as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a
Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, o qual
pode ser prorrogado por 24 (vinte e quatro) meses aos que contribuíram por
mais de 120 (cento e vinte) meses, nos termos do art. 15 e §1º da Lei.
9 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 6
(seis) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência
Social, para efeitos de carência, para a concessão do benefício de
aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela
Lei nº 13.457/2017).
10 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo
juízo a quo, com base em exame pericial realizado em 17 de julho de
2008 (fls. 105/108), diagnosticou o autor como portador de "psicose não
especificada" e "epilepsia convulsiva generalizada". Relata que o demandante
"apresenta quadro há +- 10 (dez) anos, quando iniciou crises do tipo
convulsivas, momentos de agitação alternando com quadro de desânimo,
apatia, inquietude, alucinações e delírios. Em tratamento psiquiátrico
desde então em uso dos seguintes medicamentos, após várias internações
psiquiátricas anteriores: Carbamazepina 600 mg, Fenobarbital 200 mg,
Imiprimina 50 mg, sendo que os sintomas ainda persistem, limitando-o na
vida profissional e quanto a sociabilidade, sempre apresentando-se apático
e isolado ". Concluiu que "o autor é portador de quadro grave, limitante,
de caráter incurável, sem condições de desenvolvimento laborativo para
o seu sustento". Fixou a data de início da incapacidade por volta de meados
de 1998. Em sede de esclarecimentos complementares, à fl. 124, ainda atestou
que o autor "apresenta-se incapacitado para os atos da vida civil".
11 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial,
a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479
do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção
das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge
à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos
robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer
do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos
produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo
se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no
caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a
valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª
Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013;
AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
12 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional
inscrito no órgão competente, o qual respondeu aos quesitos elaborados e
forneceu diagnóstico com base na análise de histórico da parte e de exames
complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que
entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório,
referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
13 - Por sua vez, restou incontroversa a qualidade de segurado do autor, bem
como o cumprimento da carência legal, eis que a ação visa o restabelecimento
de benefício. Assim, o próprio ente autárquico reconheceu o preenchimento
de tais requisitos quando do deferimento do pedido administrativo.
14 - Para que não restem dúvidas acerca da qualidade de segurado e do
implemento da carência, informações extraídas da CTPS acostada de
fls. 14/21 e do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, que ora
seguem anexas aos autos, dão conta que, quando do início da incapacidade, em
1998, o autor mantinha vínculo empregatício junto à AGRÍCOLA ALMEIDA LTDA.
15 - Alie-se que o fato de o demandante continuar trabalhando, de forma
esporádica, intercalando períodos laborais com a percepção de benefícios
de auxílio-doença, não permite a desconsideração da conclusão do
perito judicial. Ao contrário, o fato de ter vínculos de trabalho de curta
duração corrobora a sua dificuldade de reinserção no mercado profissional
e o equívoco na cassação de benefício precedente.
16 - Não há dúvida que os benefícios por incapacidade servem justamente
para suprir a ausência da remuneração do segurado que tem sua força de
trabalho comprometida e não consegue exercer suas ocupações profissionais
habituais, em razão de incapacidade temporária ou definitiva. Assim como
não se questiona o fato de que o exercício de atividade remunerada, após
a implantação de tais benefícios, implica na sua imediata cessação e na
necessidade de devolução das parcelas recebidas durante o período que o
segurado auferiu renda. E os princípios que dão sustentação ao raciocínio
são justamente os da vedação ao enriquecimento ilícito e da coibição
de má-fé do segurado. É, inclusive, o que deixou expresso o legislador
no art. 46 da Lei nº 8.213/91, em relação à aposentadoria por invalidez.
17 - Completamente diferente, entretanto, é a situação do segurado que se
vê compelido a ter de ingressar em juízo, diante da negativa da autarquia
previdenciária de lhe conceder o benefício vindicado, por considerar ausente
algum dos requisitos necessários. Ora, havendo pretensão resistida e enquanto
não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra alternativa
não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de
agravamento da situação incapacitante, como única maneira de prover o
próprio sustento. Isto não configura má-fé e, muito menos, enriquecimento
ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada mais é
do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do
ser humano. Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo
indica, pretende que o sustento do segurado fosse provido de forma divina,
transferindo responsabilidade sua para o incapacitado ou, então, para alguma
entidade que deve reputar sacra. Pugna pela responsabilização patrimonial
daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela jurisdicional
para tê-lo reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até o fim
e teve de suportar o calvário processual.
18 - Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de
sobrevivência, com recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização
do segurado com o desconto dos valores do benefício devido no período em
que perdurou o contrato de trabalho. Até porque, nessas circunstâncias,
tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho,
absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis
que completamente à margem da fiscalização estatal, o que implicaria,
inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do regime.
19 - Em suma, configurado o início da incapacidade total e permanente quando
o autor era segurado da Previdência Social e tendo cumprido a carência
estabelecida em Lei, de rigor a concessão da aposentadoria por invalidez,
não podendo esta ser indeferida em razão de trabalho esporádico desenvolvido
por ele, após a data de início da incapacidade (DII).
20 - Acerca da data de início do benefício (DIB), o entendimento consolidado
do E. STJ é de que, "ausente requerimento administrativo no INSS, o
termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida
judicialmente será a data da citação válida" (Súmula 576). Tendo em vista
a permanência da incapacidade, quando da cessação de benefício objeto dos
autos (NB: 560.648.629-2), a DIB deve ser fixada no momento do seu cancelamento
indevido. Portanto, de rigor a fixação da DIB da aposentadoria por invalidez
na data da cessação de auxílio-doença precedente (NB: 560.648.629-2)
em 20/11/2007 (fl. 27), prosperando, em parte, as alegações do requerente.
21 - Relativamente aos honorários advocatícios, inegável que as
condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por
toda a sociedade, razão pela qual a verba honorária deve, por imposição
legal, ser fixada moderadamente, o que restou atendido com o percentual de 10%
(dez por cento) sobre os valores devidos até a sentença (Súmula 111, STJ).
22 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal
até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada,
conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão
geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do
IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
23 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório,
fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a
jurisprudência dominante.
24 - Apelação do INSS desprovida. Apelação da parte autora a que se
dá parcial provimento. Modificação da DIB. Alteração dos critérios de
aplicação da correção monetária e dos juros de mora de ofício. Sentença
reformada em parte.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, rejeitar o parecer do Ministério Público Federal, negar
provimento à apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação
da parte autora para fixar a DIB na data da cessação de benefício de
auxílio-doença precedente (NB: 560.648.629-2), em 20/11/2007 (fl. 27); e, de
ofício, estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá
ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para
os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09,
a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e
que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório,
serão fixados de acordo com o mesmo Manual, e nomear o Dr. RODRIGO TREVIZANO
como curador à lide, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
26/02/2018
Data da Publicação
:
07/03/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1481827
Órgão Julgador
:
SÉTIMA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/03/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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