main-banner

Jurisprudência


TRF3 0002266-62.2010.4.03.9999 00022666220104039999

Ementa
PROCESSUAL CIVIL. DESNECESSIDADE DA CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA. PARECER DO MPF REJEITADO. REGULARIZAÇÃO DA REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CUMPRIMENTO DA CARÊNCIA LEGAL. QUALIDADE DE SEGURADO DEMONSTRADA. INCAPACIDADE ABSOLUTA E PERMANENTE CONFIGURADA. LAUDO PERICIAL. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER DO EXPERTO. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO. PERMANÊNCIA NO TRABALHO APESAR DA INCAPACIDADE. ESTADO DE NECESSIDADE. SOBREVIVÊNCIA. DESDOBRAMENTO DO DIREITO CONSTITUCIONAL À VIDA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. PRECEDENTES DESTA CORTE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA. DIB. DATA DA CESSAÇÃO DE BENEFÍCIO PRECEDENTE. INOCORRÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 111 DO STJ. APLICABILIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO. MODIFICAÇÃO DA DIB. ALTERAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO DA CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA DE OFÍCIO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. 1 - De início, verifica-se a desnecessidade de conversão do julgamento em diligência, para fins de esclarecimentos periciais acerca da capacidade civil do demandante, eis que tal informação foi prestada à fl. 124 pelo expert. Parecer do MPF rejeitado. Nessa senda, considerando que a conclusão da perícia judicial é no sentido de o demandante estar incapacitado para a prática dos atos da vida civil , bem como ante ao princípio do aproveitamento dos atos processuais e o atual estágio em que se encontra a demanda, de rigor a nomeação como curador à lide o advogado constituído (fl. 10), nos termos do art. 9º, I, CPC/1973 (correspondente ao art. 72, I, do CPC/2015). 2 - A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal. 3 - A Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, preconiza que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para exercício da atividade que lhe garanta a subsistência. 4 - Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis). 5 - O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017). 6 - Independe de carência, entretanto, a concessão do benefício nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, conforme art. 26, II, da Lei nº 8.213/91, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 do mesmo diploma legislativo. 7 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento do benefício se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia. 8 - Necessário para o implemento do beneplácito em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, o qual pode ser prorrogado por 24 (vinte e quatro) meses aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, nos termos do art. 15 e §1º da Lei. 9 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 6 (seis) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Lei nº 13.457/2017). 10 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo juízo a quo, com base em exame pericial realizado em 17 de julho de 2008 (fls. 105/108), diagnosticou o autor como portador de "psicose não especificada" e "epilepsia convulsiva generalizada". Relata que o demandante "apresenta quadro há +- 10 (dez) anos, quando iniciou crises do tipo convulsivas, momentos de agitação alternando com quadro de desânimo, apatia, inquietude, alucinações e delírios. Em tratamento psiquiátrico desde então em uso dos seguintes medicamentos, após várias internações psiquiátricas anteriores: Carbamazepina 600 mg, Fenobarbital 200 mg, Imiprimina 50 mg, sendo que os sintomas ainda persistem, limitando-o na vida profissional e quanto a sociabilidade, sempre apresentando-se apático e isolado ". Concluiu que "o autor é portador de quadro grave, limitante, de caráter incurável, sem condições de desenvolvimento laborativo para o seu sustento". Fixou a data de início da incapacidade por volta de meados de 1998. Em sede de esclarecimentos complementares, à fl. 124, ainda atestou que o autor "apresenta-se incapacitado para os atos da vida civil". 11 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010. 12 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório, referida prova técnica merece confiança e credibilidade. 13 - Por sua vez, restou incontroversa a qualidade de segurado do autor, bem como o cumprimento da carência legal, eis que a ação visa o restabelecimento de benefício. Assim, o próprio ente autárquico reconheceu o preenchimento de tais requisitos quando do deferimento do pedido administrativo. 14 - Para que não restem dúvidas acerca da qualidade de segurado e do implemento da carência, informações extraídas da CTPS acostada de fls. 14/21 e do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, que ora seguem anexas aos autos, dão conta que, quando do início da incapacidade, em 1998, o autor mantinha vínculo empregatício junto à AGRÍCOLA ALMEIDA LTDA. 15 - Alie-se que o fato de o demandante continuar trabalhando, de forma esporádica, intercalando períodos laborais com a percepção de benefícios de auxílio-doença, não permite a desconsideração da conclusão do perito judicial. Ao contrário, o fato de ter vínculos de trabalho de curta duração corrobora a sua dificuldade de reinserção no mercado profissional e o equívoco na cassação de benefício precedente. 16 - Não há dúvida que os benefícios por incapacidade servem justamente para suprir a ausência da remuneração do segurado que tem sua força de trabalho comprometida e não consegue exercer suas ocupações profissionais habituais, em razão de incapacidade temporária ou definitiva. Assim como não se questiona o fato de que o exercício de atividade remunerada, após a implantação de tais benefícios, implica na sua imediata cessação e na necessidade de devolução das parcelas recebidas durante o período que o segurado auferiu renda. E os princípios que dão sustentação ao raciocínio são justamente os da vedação ao enriquecimento ilícito e da coibição de má-fé do segurado. É, inclusive, o que deixou expresso o legislador no art. 46 da Lei nº 8.213/91, em relação à aposentadoria por invalidez. 17 - Completamente diferente, entretanto, é a situação do segurado que se vê compelido a ter de ingressar em juízo, diante da negativa da autarquia previdenciária de lhe conceder o benefício vindicado, por considerar ausente algum dos requisitos necessários. Ora, havendo pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento da situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura má-fé e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser humano. Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo indica, pretende que o sustento do segurado fosse provido de forma divina, transferindo responsabilidade sua para o incapacitado ou, então, para alguma entidade que deve reputar sacra. Pugna pela responsabilização patrimonial daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela jurisdicional para tê-lo reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até o fim e teve de suportar o calvário processual. 18 - Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado com o desconto dos valores do benefício devido no período em que perdurou o contrato de trabalho. Até porque, nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho, absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do regime. 19 - Em suma, configurado o início da incapacidade total e permanente quando o autor era segurado da Previdência Social e tendo cumprido a carência estabelecida em Lei, de rigor a concessão da aposentadoria por invalidez, não podendo esta ser indeferida em razão de trabalho esporádico desenvolvido por ele, após a data de início da incapacidade (DII). 20 - Acerca da data de início do benefício (DIB), o entendimento consolidado do E. STJ é de que, "ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida" (Súmula 576). Tendo em vista a permanência da incapacidade, quando da cessação de benefício objeto dos autos (NB: 560.648.629-2), a DIB deve ser fixada no momento do seu cancelamento indevido. Portanto, de rigor a fixação da DIB da aposentadoria por invalidez na data da cessação de auxílio-doença precedente (NB: 560.648.629-2) em 20/11/2007 (fl. 27), prosperando, em parte, as alegações do requerente. 21 - Relativamente aos honorários advocatícios, inegável que as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a verba honorária deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente, o que restou atendido com o percentual de 10% (dez por cento) sobre os valores devidos até a sentença (Súmula 111, STJ). 22 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento. 23 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante. 24 - Apelação do INSS desprovida. Apelação da parte autora a que se dá parcial provimento. Modificação da DIB. Alteração dos critérios de aplicação da correção monetária e dos juros de mora de ofício. Sentença reformada em parte.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar o parecer do Ministério Público Federal, negar provimento à apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação da parte autora para fixar a DIB na data da cessação de benefício de auxílio-doença precedente (NB: 560.648.629-2), em 20/11/2007 (fl. 27); e, de ofício, estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, e nomear o Dr. RODRIGO TREVIZANO como curador à lide, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 26/02/2018
Data da Publicação : 07/03/2018
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1481827
Órgão Julgador : SÉTIMA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/03/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão