TRF3 0002277-24.2011.4.03.6130 00022772420114036130
CIVIL E PROCESSO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE
CONTAS. CONTA-CORRENTE. PEDIDO GENÉRICO. AUSÊNCIA DE ESPECIFICAÇÃO DE
PERÍODO OU MOVIMENTAÇÕES. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. APELAÇÃO PROVIDA.
1. Acerca do tema da ação de prestação de contas referente à conta
bancária, é preciso destacar que o C. Superior Tribunal de Justiça, em
julgamento recente, conforme a sistemática dos recursos representativos
de controvérsia (repetitivos), pacificou que o titular da conta-corrente
bancária tem interesse processual para propor ação de prestação
de contas, a fim de exigir do banco que esclareça qual o destino do
dinheiro que depositou, a natureza e o valor dos créditos e débitos
efetivamente ocorridos em sua conta, apurando-se, ao final, o saldo credor
ou devedor. Todavia, o rito especial da ação de prestação de contas não
comporta a pretensão de alterar ou revisar cláusula contratual, em razão
das limitações ao contraditório e à ampla defesa. Cumpre frisar que, nos
termos do repetitivos, nem mesmo na segunda fase da ação de prestação de
contas é possível a revisão das cláusulas dos contratos que deram origem
ao saldo devedor. No caso dos autos, a parte autora não pretende a revisão
de contratos, sequer alegou ilegalidades ou abusividades neles, mas apenas
que a ré preste contas a fim de informar o valor exato do saldo devedor,
bem como a que título os seus competentes foram cobrados, de modo que a tese
fixada neste repetitivo não afasta o interesse processual da parte autora.
2. Também se depreende do voto vencedor da Exma. Ministra Maria
Isabel Gallottti, proferido no julgamento do citado repetitivo, que é
imprescindível/necessário a indicação na inicial da prestação de
contas, ao menos, de um período determinado em relação ao qual busca
esclarecimentos, com exposição de motivos consistentes, ocorrências
duvidosas em sua conta-corrente, que justifiquem a provocação do Poder
Judiciário mediante ação de prestação de contas. Assim, se conclui que,
além da inexistência de pretensão de revisar cláusulas contratuais,
há outro requisito para que haja interesse processual do autor da ação de
prestação de contas: a indicação na inicial da prestação de contas, ao
menos, de um período determinado em relação ao qual busca esclarecimentos,
com exposição de motivos consistentes, ocorrências duvidosas em sua
conta-corrente.
3. Com o desenvolvimento do sistema bancário e o aumento do volume
de movimentações nas contas correntes, surgiu uma polêmica em torno
da possibilidade de se manejar a ação de prestação de contas a fim
de esclarecer as movimentações havidas em contas-correntes bancárias,
independentemente do fornecimento periódico de extratos pelo banco. A questão
chegou à análise do C. Superior Tribunal de Justiça, que, em 28/11/2001,
a edição da súmula nº 259, que admitiu a ação de prestação de contas
pelo titular de conta-corrente bancária, sem impor qualquer restrição. Por
conseguinte, o Poder Judiciário foi inundado por ações de prestação de
contas, movidas por correntistas contra instituições bancárias, visando
compelir a ré a prestar contas de toda a relação jurídica, isto é, de todo
o período em que a conta foi mantida, desde a sua abertura da conta até o seu
encerramento. Essa situação trouxe complicações, tanto práticas quanto
jurídicas. Primeiro porque o banco se via obrigado a explicar o fundamento
fático e jurídico de cada uma das diversas movimentações ocorridas em
cada dia, ao longo de um período extenso, que pode abranger décadas. Esta
obrigação, em muitos casos, mostrava-se impossível de ser cumprida. E,
como se sabe, se o banco não presta as contas na segunda fase, não pode
impugnar as que o autor prestar e, ao final da segunda fase, forma-se um
título executivo judicial em favor de quem for o credor. Segundo porque,
conforme bem apontado pela Desembargadora Estadual Lígia Araújo Bisogni,
no voto proferido no julgamento do Incidente de Resolução de Demandas
Repetitivas nº 2121567-08.2016.8.26.0000 pela Turma Especial da Seção
de Direito Privado 2 do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,
que pacificou no âmbito da justiça estadual paulista o entendimento pela
necessidade de especificação, entendimento contrário importaria, em última
instância, em ofensa ao contraditório e à ampla defesa, já que o banco
teria que prestar contas sem saber qual é o equívoco (que o autor acredita
existir nos extratos) que deve esclarecer. Ao fim, este entendimento foi
positivado pelo Código de Processo Civil de 2015, que inseriu no art. 550
(correspondente ao art. 914 do Código de Processo Civil de 1973) o parágrafo
primeiro, que exige, expressamente, a especificação das razões pelas quais
o autor exige as contas, instruindo a ação com documentos que comprovem
a necessidade. Isto é, o autor tem que apontar os equívocos que entende
haver nos extratos da conta-corrente emitidos pelo banco.
4. São por estas razões que, apesar de persistir certa polêmica no
âmbito jurisprudencial, filio-me ao recente entendimento do C. Superior
Tribunal de Justiça, segundo o qual, tratando-se de ação de prestação de
contas relativa à conta bancária, é imprescindível a especificação do
período que pretende sejam esclarecidas as movimentações ou a indicação
as movimentações que entende equivocadas, sob pena de o autor não ter
demonstrado seu interesse processual.
5. No caso dos autos, a parte autora formulou pedido absolutamente genérico,
sem indicar quais os contratos de abertura de crédito vinculados à conta de
sua titularidade, tampouco quais os "débitos" havidos em sua conta que entende
como não esclarecidos. Portanto, é caso de extinção sem resolução do
mérito, nos termos do art. 485, VI, do Código de Processo Civil de 2015,
por ausência de interesse processual.
6. Em decorrência, no tocante ao ônus de sucumbência, a parte autora há
de ser condenada ao pagamento de honorários advocatícios. Isso porque,
nos casos de extinção do feito, sem resolução do mérito, há que se
observar, na fixação dos honorários, o princípio da causalidade, segundo
o qual responde pelas despesas decorrentes do processo aquele que deu causa
à sua instauração. Na hipótese dos autos, foi a parte autora quem deu
causa à extinção do feito, ao ajuizar ação sem preencher as condições
da ação, nos termos do art. 267, VI, do Código de Processo Civil de 1973
(correspondente ao art. 485, VI, do Código de Processo Civil de 2015). Logo,
cabe a ela arcar com os honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o
valor da causa.
7. Resta prejudicado o apelo do autor.
8. Recurso de apelação da CEF provido para extinguir o processo, sem
resolução do mérito, com fulcro no art. 485, VI, do Código de Processo
Civil de 2015, por ausência de interesse processual, e julgo prejudicado
este recurso de apelação da parte autora, condenando a parte autora ao
pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa.
Ementa
CIVIL E PROCESSO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE
CONTAS. CONTA-CORRENTE. PEDIDO GENÉRICO. AUSÊNCIA DE ESPECIFICAÇÃO DE
PERÍODO OU MOVIMENTAÇÕES. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. APELAÇÃO PROVIDA.
1. Acerca do tema da ação de prestação de contas referente à conta
bancária, é preciso destacar que o C. Superior Tribunal de Justiça, em
julgamento recente, conforme a sistemática dos recursos representativos
de controvérsia (repetitivos), pacificou que o titular da conta-corrente
bancária tem interesse processual para propor ação de prestação
de contas, a fim de exigir do banco que esclareça qual o destino do
dinheiro que depositou, a natureza e o valor dos créditos e débitos
efetivamente ocorridos em sua conta, apurando-se, ao final, o saldo credor
ou devedor. Todavia, o rito especial da ação de prestação de contas não
comporta a pretensão de alterar ou revisar cláusula contratual, em razão
das limitações ao contraditório e à ampla defesa. Cumpre frisar que, nos
termos do repetitivos, nem mesmo na segunda fase da ação de prestação de
contas é possível a revisão das cláusulas dos contratos que deram origem
ao saldo devedor. No caso dos autos, a parte autora não pretende a revisão
de contratos, sequer alegou ilegalidades ou abusividades neles, mas apenas
que a ré preste contas a fim de informar o valor exato do saldo devedor,
bem como a que título os seus competentes foram cobrados, de modo que a tese
fixada neste repetitivo não afasta o interesse processual da parte autora.
2. Também se depreende do voto vencedor da Exma. Ministra Maria
Isabel Gallottti, proferido no julgamento do citado repetitivo, que é
imprescindível/necessário a indicação na inicial da prestação de
contas, ao menos, de um período determinado em relação ao qual busca
esclarecimentos, com exposição de motivos consistentes, ocorrências
duvidosas em sua conta-corrente, que justifiquem a provocação do Poder
Judiciário mediante ação de prestação de contas. Assim, se conclui que,
além da inexistência de pretensão de revisar cláusulas contratuais,
há outro requisito para que haja interesse processual do autor da ação de
prestação de contas: a indicação na inicial da prestação de contas, ao
menos, de um período determinado em relação ao qual busca esclarecimentos,
com exposição de motivos consistentes, ocorrências duvidosas em sua
conta-corrente.
3. Com o desenvolvimento do sistema bancário e o aumento do volume
de movimentações nas contas correntes, surgiu uma polêmica em torno
da possibilidade de se manejar a ação de prestação de contas a fim
de esclarecer as movimentações havidas em contas-correntes bancárias,
independentemente do fornecimento periódico de extratos pelo banco. A questão
chegou à análise do C. Superior Tribunal de Justiça, que, em 28/11/2001,
a edição da súmula nº 259, que admitiu a ação de prestação de contas
pelo titular de conta-corrente bancária, sem impor qualquer restrição. Por
conseguinte, o Poder Judiciário foi inundado por ações de prestação de
contas, movidas por correntistas contra instituições bancárias, visando
compelir a ré a prestar contas de toda a relação jurídica, isto é, de todo
o período em que a conta foi mantida, desde a sua abertura da conta até o seu
encerramento. Essa situação trouxe complicações, tanto práticas quanto
jurídicas. Primeiro porque o banco se via obrigado a explicar o fundamento
fático e jurídico de cada uma das diversas movimentações ocorridas em
cada dia, ao longo de um período extenso, que pode abranger décadas. Esta
obrigação, em muitos casos, mostrava-se impossível de ser cumprida. E,
como se sabe, se o banco não presta as contas na segunda fase, não pode
impugnar as que o autor prestar e, ao final da segunda fase, forma-se um
título executivo judicial em favor de quem for o credor. Segundo porque,
conforme bem apontado pela Desembargadora Estadual Lígia Araújo Bisogni,
no voto proferido no julgamento do Incidente de Resolução de Demandas
Repetitivas nº 2121567-08.2016.8.26.0000 pela Turma Especial da Seção
de Direito Privado 2 do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,
que pacificou no âmbito da justiça estadual paulista o entendimento pela
necessidade de especificação, entendimento contrário importaria, em última
instância, em ofensa ao contraditório e à ampla defesa, já que o banco
teria que prestar contas sem saber qual é o equívoco (que o autor acredita
existir nos extratos) que deve esclarecer. Ao fim, este entendimento foi
positivado pelo Código de Processo Civil de 2015, que inseriu no art. 550
(correspondente ao art. 914 do Código de Processo Civil de 1973) o parágrafo
primeiro, que exige, expressamente, a especificação das razões pelas quais
o autor exige as contas, instruindo a ação com documentos que comprovem
a necessidade. Isto é, o autor tem que apontar os equívocos que entende
haver nos extratos da conta-corrente emitidos pelo banco.
4. São por estas razões que, apesar de persistir certa polêmica no
âmbito jurisprudencial, filio-me ao recente entendimento do C. Superior
Tribunal de Justiça, segundo o qual, tratando-se de ação de prestação de
contas relativa à conta bancária, é imprescindível a especificação do
período que pretende sejam esclarecidas as movimentações ou a indicação
as movimentações que entende equivocadas, sob pena de o autor não ter
demonstrado seu interesse processual.
5. No caso dos autos, a parte autora formulou pedido absolutamente genérico,
sem indicar quais os contratos de abertura de crédito vinculados à conta de
sua titularidade, tampouco quais os "débitos" havidos em sua conta que entende
como não esclarecidos. Portanto, é caso de extinção sem resolução do
mérito, nos termos do art. 485, VI, do Código de Processo Civil de 2015,
por ausência de interesse processual.
6. Em decorrência, no tocante ao ônus de sucumbência, a parte autora há
de ser condenada ao pagamento de honorários advocatícios. Isso porque,
nos casos de extinção do feito, sem resolução do mérito, há que se
observar, na fixação dos honorários, o princípio da causalidade, segundo
o qual responde pelas despesas decorrentes do processo aquele que deu causa
à sua instauração. Na hipótese dos autos, foi a parte autora quem deu
causa à extinção do feito, ao ajuizar ação sem preencher as condições
da ação, nos termos do art. 267, VI, do Código de Processo Civil de 1973
(correspondente ao art. 485, VI, do Código de Processo Civil de 2015). Logo,
cabe a ela arcar com os honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o
valor da causa.
7. Resta prejudicado o apelo do autor.
8. Recurso de apelação da CEF provido para extinguir o processo, sem
resolução do mérito, com fulcro no art. 485, VI, do Código de Processo
Civil de 2015, por ausência de interesse processual, e julgo prejudicado
este recurso de apelação da parte autora, condenando a parte autora ao
pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, dar provimento ao recurso de apelação da CEF para extinguir
o processo, sem resolução do mérito, com fulcro no art. 485, VI, do
Código de Processo Civil de 2015, por ausência de interesse processual,
e julgar prejudicado este recurso de apelação da parte autora, condenando
a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10%
sobre o valor da causa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
21/05/2018
Data da Publicação
:
25/05/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1772418
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/05/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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