TRF3 0002279-26.2007.4.03.6100 00022792620074036100
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO. AÇÃO
DE RITO ORDINÁRIO INTENTADA CONTRA A OAB/SP. INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. MAGISTRADO INSERIDO EM "LISTA NEGRA" DA ORDEM DOS ADVOGADOS
DO BRASIL - SECÇÃO SÃO PAULO. DESCABIMENTO. OFENSA A DIREITOS DA
PERSONALIDADE ASSEGURADOS PELA CARTA MAGNA. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR
DA INDENIZAÇÃO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA
- O exame do pedido posto na peça inicial está delimitado ao pagamento
de indenização por danos morais decorrentes de "indevida inserção do
nome do requerente na lista negra da OAB", descabido, portanto, apreciar o
mérito da decisão administrativa tomada pela instituição requerida.
- Imperioso destacar o caráter público da função exercida pela OAB,
reconhecido no âmbito do STF, que passou inclusive a ser intitulada autarquia
sui generis (ADI 3026, Rel. Min. Eros Grau, Plenário, j. 08/06/2006).
- Considerada não integrante da administração pública, mas reconhecido
exercer função pública indispensável à administração da justiça,
são aplicáveis à instituição os primados do artigo 37 da CF/1988,
realçado, para o presente caso, o preceito contido em seu § 6º: "as
pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras
de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa
qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o
responsável nos casos de dolo ou culpa".
- Anote-se, ainda, o teor prescrito pelo Estatuto da Advocacia e Regulamento
Interno da OAB, a Lei nº 8.906/1994, artigos 6º, 7º e 44, bem como os
termos insculpidos em seu Regimento Interno, artigo 77 e seguintes, no sentido
de que é conferido ao advogado o direito de ser tratado, em igualdade,
como membro da magistratura e do Ministério Público, bem como deferido o
desagravo público, caso comprovadamente ofendido no exercício profissional.
- O tema sub judice encontra regulamentação, também, na Lei Orgânica da
Magistratura, Lei Complementar nº 35/1979, que prescreve em seu artigo 35 ser
dever do magistrado "tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério
Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da
Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quanto se
trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência".
- A Lei Orgânica da Magistratura prescreve, em seu artigo 41: "salvo os casos
de impropriedade ou excesso de linguagem o magistrado não pode ser punido
ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões
que proferir."
- Nos termos do artigo 5º, inciso X, da CF/1988, c.c. o artigo 186 do CC, a
violação dos direitos à intimidade, vida privada, honra e imagem assegura
indenização por danos materiais e morais, motivo pelo qual foi intentada a
presente demanda indenizatória com o escopo de ser a autarquia condenada ao
pagamento de valor equivalente a três vezes o vencimento de um magistrado
estadual, vigente na ocasião do pagamento.
- A Ordem dos Advogados do Brasil presta relevante serviço público e é
instituição que integra a administração da justiça, com personalidade
jurídica de caráter "ímpar". O reconhecimento de sua natureza jurídica
sui generis pelo STF, contudo, não significa que possa escapar aos ditames
legais e deixar de observar o ordenamento pátrio. Ao revés, deve-lhe maior
cumprimento ainda, porquanto desempenha atividade própria de Estado, atrelada
à defesa da Constituição, da ordem jurídica, do Estado Democrático de
Direito, dos direitos humanos, da justiça social e, também essência de sua
criação, à fiscalização do regular exercício da advocacia (RE 259976,
Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, j. 23/03/2010).
- A publicidade dos julgamentos proferidos nos processos de desagravo ou
moção de repúdio (artigo 7º, XII, da Lei nº 8.906/1994) pela OAB revela-se
medida de salvaguarda do livre exercício profissional. A divulgação ora
combatida, entretanto, não se amolda à mens legis - configura instrumento
que ofende a imagem pessoal e profissional das autoridades e particulares
ali listados por extrapolar os limites legalmente preceituados, uma vez
que vai além da proteção do exercício digno da advocacia prevista no
ordenamento nacional.
- Indiferente se foi ou não a autarquia que alcunhou as listas com os
mencionados títulos, pois a eles deu causa, na medida em que as criou,
atuação que extrapola os limites da razoabilidade na divulgação dos
julgamentos proferidos.
- Ponderado o todo consignado - elementos probatórios dos autos apontados,
legislação norteadora do tema e entendimento jurisprudencial -, verifica-se
comprovada a atuação ilegal da requerida, consistente na utilização de
forma indevida de divulgação do resultado do procedimento de desagravo
(moção de repúdio) relativo ao requerente, com inserção de seu nome em
"lista de inimigos da advocacia", possibilitada a instituição de penalidade
não contemplada na legislação, qual seja, evitar sua futura inscrição
nos quadros da autarquia. Presente, da mesma forma, o liame entre tal conduta
e o dano moral experimentado pelo autor, violação aos seus direitos de
personalidade (em especial imagem e honra) de sorte que se torna imperiosa a
responsabilização da OAB/SP pelo prejuízo sofrido, nos termos dos artigos
5º, V e 37, § 6º, da CF/1988, artigo 186 do CC e dos demais regramentos
norteadores da quaestio, nos exatos termos da sentença recorrida.
- O pedido de pagamento do valor da publicação da sentença no jornal "Folha
de São Paulo" não merece prosperar. O direito de resposta previsto no artigo
5º, inciso V, da Constituição Federal não se confunde com o pleito da
recorrida. Até mesmo na malsinada Lei de Imprensa (Lei nº 5.250/67), não
recepcionada pela Constituição de 1988 (ADPF nº 130/DF-STF), o instituto
não tinha feição que se lhe quer dar. De qualquer forma, deve-se atentar
para o princípio da simetria e proporcionalidade. Não há notícia de que
a lista com nome da autora tenha sido publicada no referido periódico ou
que os efeitos de uma tal publicação equivalham à ofensa perpetrada.
- Há de se considerar, para a fixação do importe indenizatório,
os contornos fáticos da lide em sua integralidade. Significa dizer
que o julgador não fica adstrito ao fato originador dos danos, pois
imperioso ponderar a realidade e o perfil das partes envolvidas, como
a situação financeira de quem sofreu o malefício e de quem o causou,
amoldada a condenação à situação econômica das partes, de modo que
seja fixado montante apto a reparar o prejuízo moral e, de igual modo,
desestimular o agente que o causou de repetir o comportamento combatido,
sem que se verifique enriquecimento indevido à custa de imposição
excessiva àquele que ocasionou a lesão. O valor de R$ 50.000,00 atende
aos parâmetros mencionados e se revela proporcional e razoável. A OAB sem
dúvida tem capacidade econômica para arcar com o montante, o qual de forma
alguma gerará indevido enriquecimento do autor, ou seja, não transborda seu
caráter educativo, tampouco implica locupletamento sem causa do apelado. Ao
revés, revela valor que repara minimamente o abalo psíquico sofrido.
- Sobre tal montante deverá incidir correção monetária a partir da
condenação conforme índices da tabela contemplada pelos provimentos da
Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª Região e juros de 1% ao mês a
partir do evento danoso, a divulgação do nome da autora na lista sub judice
(artigos 398 e 406 do Código Civil).
- A verba honorária deve ser fixada em 10% do valor da causa, à vista
do zelo do profissional, da natureza e importância da causa e do trabalho
realizado pelo advogado, conforme o disposto no artigo 20, § 3º, do CPC/73.
- Apelação parcialmente provida.
Ementa
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO. AÇÃO
DE RITO ORDINÁRIO INTENTADA CONTRA A OAB/SP. INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. MAGISTRADO INSERIDO EM "LISTA NEGRA" DA ORDEM DOS ADVOGADOS
DO BRASIL - SECÇÃO SÃO PAULO. DESCABIMENTO. OFENSA A DIREITOS DA
PERSONALIDADE ASSEGURADOS PELA CARTA MAGNA. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR
DA INDENIZAÇÃO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA
- O exame do pedido posto na peça inicial está delimitado ao pagamento
de indenização por danos morais decorrentes de "indevida inserção do
nome do requerente na lista negra da OAB", descabido, portanto, apreciar o
mérito da decisão administrativa tomada pela instituição requerida.
- Imperioso destacar o caráter público da função exercida pela OAB,
reconhecido no âmbito do STF, que passou inclusive a ser intitulada autarquia
sui generis (ADI 3026, Rel. Min. Eros Grau, Plenário, j. 08/06/2006).
- Considerada não integrante da administração pública, mas reconhecido
exercer função pública indispensável à administração da justiça,
são aplicáveis à instituição os primados do artigo 37 da CF/1988,
realçado, para o presente caso, o preceito contido em seu § 6º: "as
pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras
de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa
qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o
responsável nos casos de dolo ou culpa".
- Anote-se, ainda, o teor prescrito pelo Estatuto da Advocacia e Regulamento
Interno da OAB, a Lei nº 8.906/1994, artigos 6º, 7º e 44, bem como os
termos insculpidos em seu Regimento Interno, artigo 77 e seguintes, no sentido
de que é conferido ao advogado o direito de ser tratado, em igualdade,
como membro da magistratura e do Ministério Público, bem como deferido o
desagravo público, caso comprovadamente ofendido no exercício profissional.
- O tema sub judice encontra regulamentação, também, na Lei Orgânica da
Magistratura, Lei Complementar nº 35/1979, que prescreve em seu artigo 35 ser
dever do magistrado "tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério
Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da
Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quanto se
trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência".
- A Lei Orgânica da Magistratura prescreve, em seu artigo 41: "salvo os casos
de impropriedade ou excesso de linguagem o magistrado não pode ser punido
ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões
que proferir."
- Nos termos do artigo 5º, inciso X, da CF/1988, c.c. o artigo 186 do CC, a
violação dos direitos à intimidade, vida privada, honra e imagem assegura
indenização por danos materiais e morais, motivo pelo qual foi intentada a
presente demanda indenizatória com o escopo de ser a autarquia condenada ao
pagamento de valor equivalente a três vezes o vencimento de um magistrado
estadual, vigente na ocasião do pagamento.
- A Ordem dos Advogados do Brasil presta relevante serviço público e é
instituição que integra a administração da justiça, com personalidade
jurídica de caráter "ímpar". O reconhecimento de sua natureza jurídica
sui generis pelo STF, contudo, não significa que possa escapar aos ditames
legais e deixar de observar o ordenamento pátrio. Ao revés, deve-lhe maior
cumprimento ainda, porquanto desempenha atividade própria de Estado, atrelada
à defesa da Constituição, da ordem jurídica, do Estado Democrático de
Direito, dos direitos humanos, da justiça social e, também essência de sua
criação, à fiscalização do regular exercício da advocacia (RE 259976,
Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, j. 23/03/2010).
- A publicidade dos julgamentos proferidos nos processos de desagravo ou
moção de repúdio (artigo 7º, XII, da Lei nº 8.906/1994) pela OAB revela-se
medida de salvaguarda do livre exercício profissional. A divulgação ora
combatida, entretanto, não se amolda à mens legis - configura instrumento
que ofende a imagem pessoal e profissional das autoridades e particulares
ali listados por extrapolar os limites legalmente preceituados, uma vez
que vai além da proteção do exercício digno da advocacia prevista no
ordenamento nacional.
- Indiferente se foi ou não a autarquia que alcunhou as listas com os
mencionados títulos, pois a eles deu causa, na medida em que as criou,
atuação que extrapola os limites da razoabilidade na divulgação dos
julgamentos proferidos.
- Ponderado o todo consignado - elementos probatórios dos autos apontados,
legislação norteadora do tema e entendimento jurisprudencial -, verifica-se
comprovada a atuação ilegal da requerida, consistente na utilização de
forma indevida de divulgação do resultado do procedimento de desagravo
(moção de repúdio) relativo ao requerente, com inserção de seu nome em
"lista de inimigos da advocacia", possibilitada a instituição de penalidade
não contemplada na legislação, qual seja, evitar sua futura inscrição
nos quadros da autarquia. Presente, da mesma forma, o liame entre tal conduta
e o dano moral experimentado pelo autor, violação aos seus direitos de
personalidade (em especial imagem e honra) de sorte que se torna imperiosa a
responsabilização da OAB/SP pelo prejuízo sofrido, nos termos dos artigos
5º, V e 37, § 6º, da CF/1988, artigo 186 do CC e dos demais regramentos
norteadores da quaestio, nos exatos termos da sentença recorrida.
- O pedido de pagamento do valor da publicação da sentença no jornal "Folha
de São Paulo" não merece prosperar. O direito de resposta previsto no artigo
5º, inciso V, da Constituição Federal não se confunde com o pleito da
recorrida. Até mesmo na malsinada Lei de Imprensa (Lei nº 5.250/67), não
recepcionada pela Constituição de 1988 (ADPF nº 130/DF-STF), o instituto
não tinha feição que se lhe quer dar. De qualquer forma, deve-se atentar
para o princípio da simetria e proporcionalidade. Não há notícia de que
a lista com nome da autora tenha sido publicada no referido periódico ou
que os efeitos de uma tal publicação equivalham à ofensa perpetrada.
- Há de se considerar, para a fixação do importe indenizatório,
os contornos fáticos da lide em sua integralidade. Significa dizer
que o julgador não fica adstrito ao fato originador dos danos, pois
imperioso ponderar a realidade e o perfil das partes envolvidas, como
a situação financeira de quem sofreu o malefício e de quem o causou,
amoldada a condenação à situação econômica das partes, de modo que
seja fixado montante apto a reparar o prejuízo moral e, de igual modo,
desestimular o agente que o causou de repetir o comportamento combatido,
sem que se verifique enriquecimento indevido à custa de imposição
excessiva àquele que ocasionou a lesão. O valor de R$ 50.000,00 atende
aos parâmetros mencionados e se revela proporcional e razoável. A OAB sem
dúvida tem capacidade econômica para arcar com o montante, o qual de forma
alguma gerará indevido enriquecimento do autor, ou seja, não transborda seu
caráter educativo, tampouco implica locupletamento sem causa do apelado. Ao
revés, revela valor que repara minimamente o abalo psíquico sofrido.
- Sobre tal montante deverá incidir correção monetária a partir da
condenação conforme índices da tabela contemplada pelos provimentos da
Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª Região e juros de 1% ao mês a
partir do evento danoso, a divulgação do nome da autora na lista sub judice
(artigos 398 e 406 do Código Civil).
- A verba honorária deve ser fixada em 10% do valor da causa, à vista
do zelo do profissional, da natureza e importância da causa e do trabalho
realizado pelo advogado, conforme o disposto no artigo 20, § 3º, do CPC/73.
- Apelação parcialmente provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar parcial provimento à apelação a fim de reformar
a sentença e julgar procedente a ação para condenar a OAB a indenizar
a autora por danos morais no valor de R$ 50.000,00, acrescido de juros e
correção monetária conforme fundamentação, bem como aos honorários
advocatícios de 10% do valor da causa, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
18/07/2018
Data da Publicação
:
02/08/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1643500
Órgão Julgador
:
QUARTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRE NABARRETE
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/08/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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