TRF3 0002314-33.2014.4.03.6005 00023143320144036005
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. EMENDATIO
LIBELLI. DESOBEDIÊNCIA NÃO CONFIGURADA. TRÁFICO INTERNACIONAL DE
DROGAS. TRANSNACIONALIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO
DEMONSTRADOS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. CULPABILIDADE. NATUREZA E
QUANTIDADE DA SUBSTÂNCIA. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA EM 1/6. CAUSA
DE AUMENTO DECORRENTE DA TRANSNACIONALIDADE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. REGIME
INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA FECHADO. APELAÇÃO DA DEFESA PARCIALMENTE
PROVIDA. APELAÇÃO DA ACUSAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. É possível a aplicação da "emendatio libelli" no segundo grau de
jurisdição, nos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal, pois
o réu se defende de fatos e não da definição jurídica e estes foram
descritos na denúncia.
2. Com efeito, o desrespeito à ordem de parada emanada por policial não
constitui crime, vez que tal infração encontra-se consagrada no art. 195,
da Lei n.º 9.503/97, sendo, portanto, de natureza administrativa.
3. Não houve impugnação quanto à materialidade e autoria do delito,
as quais se encontram amplamente demonstradas nos autos.
4. Primeira fase da dosimetria. A fundamentação aplicada, qual seja,
a de que "Culpabilidade, circunstância desfavorável, necessidade de
maior reprimenda, o réu de forma livre e consciente praticou o delito sem
qualquer justificativa que atenue seu dolo intenso" nada mais representa
do que o próprio dolo exigido para a subsunção do fato praticado
pelo agente à norma penal incriminadora, sendo tais aspectos, portanto,
inerentes ao tipo penal violado, pelo que deve ser afastada. A ganância ,
o lucro fácil são motivos inerentes ao delito de tráfico e não podem ser
valorados negativamente. O réu foi condenado por roubo, conforme folha de
antecedentes acostada à fl. 13 do apenso, a 05 (cinco) anos e 04 (quatro)
meses de reclusão, em regime fechado, em período não atingido pela
reincidência, pois que a extinção da punibilidade pelo cumprimento de
pena ocorreu em 10/01/2005 e crime objeto desta ação se deu em 12/11/2014.
5. Afastada a valoração negativa da culpabilidade e da ganância, o que
acarreta a redução da pena-base, já que ausente apelação da acusação
nesse sentido e sopesando o entendimento fixado pela 11ª Turma desta
Corte, bem como a quantidade da droga apreendida, 14.400 g (quatorze mil e
quatrocentos gramas) de cocaína e 494.800 g (quatrocentos e noventa e quatro
mil e oitocentos gramas) de maconha, reduzida a pena-base para 8 (oito) anos,
9 (nove) meses de reclusão e 875 (oitocentos e setenta e cinco) dias-multa.
6. Segunda fase da dosimetria. De rigor o reconhecimento da atenuante da
confissão espontânea.Quanto à fração a ser aplicada, cada atenuante
ou agravante deve ser equivalente a 1/6, para assegurar fiel cumprimento
à elevação efetiva ou à redução eficaz da pena, na segunda fase de
individualização, de modo que a pena resta fixada nesta fase em 07 (sete)
anos, 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 729 (setecentos e
vinte e nove) dias-multa.
7. Terceira fase da dosimetria. Mantida a majoração da pena em decorrência
da causa de aumento prevista no art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06
(transnacionalidade do delito), no percentual mínimo de 1/6 (um sexto),
pois presente uma única causa de aumento do referido dispositivo. Consoante o
artigo 40, I, da Lei n° 11.343/2006, é necessário somente que "a natureza,
a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias
do fato evidenciem a transnacionalidade do delito", e não que haja a efetiva
transposição de fronteira s entre os países.
8. Inaplicável a causa de diminuição prevista no artigo 33, §4º,
da Lei n.º 11.343/06, que prevê a redução de 1/6 a 2/3 para o agente
que seja primário, possua bons antecedentes e não se dedique a atividades
criminosas nem integre organização criminosa. Tratando-se de requisitos que
devem ser preenchidos cumulativamente, ausente um deles, deve ser afastada
a causa de diminuição. Consoante já restou salientado, não se trata de
réu primário, pelo que correta a não incidência da benesse legal.
9. A pena de multa deve acompanhar a proporcionalidade de pena de reclusão
consideradas as três fases da dosimetria. Todavia, apesar de ter fixado
a pena de reclusão em 09 (nove) anos e 04 (quatro) meses, o magistrado a
estabeleceu em 600 (seiscentos dias) multa, abaixo, portanto, do que seria
o correto. No caso, mesmo com a redução da pena de reclusão nesta Corte,
para 8 (oito) anos, 06 (seis) meses e 02 (dois) dias de reclusão, ainda
assim a pena de multa restaria estabelecida em 850 (oitocentos e cinquenta)
dias-multa. Todavia, à míngua de apelação da acusação neste sentido,
resta mantida como arbitrada em primeiro grau de jurisdição, em 600
(seiscentos dias) multa. Rejeitada a apelação da defesa quanto a este
ponto pelos mesmos fundamentos aqui expostos.
10. Pena definitiva fixada em 8 (oito) anos, 06 (seis) meses e 02 (dois)
dias de reclusão e 600 (seiscentos dias) multa, no valor unitário de 1/30
(um trigésimo) do salário mínimo, vigente na data dos fatos.
11. Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos, tendo em vista que a pena definitiva aplicada supera
quatro anos de reclusão, não se encontrando preenchidos os requisitos do
art. 44 do Código Penal.
12. Sendo a pena de reclusão fixada em lapso superior a oito anos, deve ser
mantido o regime inicial fechado, nos termos do artigo 33, § 2°, a e b do
CP.
13. Exauridos os recursos nesta Corte e interpostos recursos dirigidos às
Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), expeça-se
Carta de Sentença, bem como comunique-se ao Juízo de Origem para o início
da execução da pena imposta à ré, sendo dispensadas tais providências
em caso de trânsito em julgado, hipótese em que terá início a execução
definitiva da pena.
14. Apelação da defesa parcialmente provida. Apelação da acusação a
que se nega provimento.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. EMENDATIO
LIBELLI. DESOBEDIÊNCIA NÃO CONFIGURADA. TRÁFICO INTERNACIONAL DE
DROGAS. TRANSNACIONALIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. AUTORIA E DOLO
DEMONSTRADOS. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. CULPABILIDADE. NATUREZA E
QUANTIDADE DA SUBSTÂNCIA. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA EM 1/6. CAUSA
DE AUMENTO DECORRENTE DA TRANSNACIONALIDADE FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. REGIME
INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA FECHADO. APELAÇÃO DA DEFESA PARCIALMENTE
PROVIDA. APELAÇÃO DA ACUSAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. É possível a aplicação da "emendatio libelli" no segundo grau de
jurisdição, nos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal, pois
o réu se defende de fatos e não da definição jurídica e estes foram
descritos na denúncia.
2. Com efeito, o desrespeito à ordem de parada emanada por policial não
constitui crime, vez que tal infração encontra-se consagrada no art. 195,
da Lei n.º 9.503/97, sendo, portanto, de natureza administrativa.
3. Não houve impugnação quanto à materialidade e autoria do delito,
as quais se encontram amplamente demonstradas nos autos.
4. Primeira fase da dosimetria. A fundamentação aplicada, qual seja,
a de que "Culpabilidade, circunstância desfavorável, necessidade de
maior reprimenda, o réu de forma livre e consciente praticou o delito sem
qualquer justificativa que atenue seu dolo intenso" nada mais representa
do que o próprio dolo exigido para a subsunção do fato praticado
pelo agente à norma penal incriminadora, sendo tais aspectos, portanto,
inerentes ao tipo penal violado, pelo que deve ser afastada. A ganância ,
o lucro fácil são motivos inerentes ao delito de tráfico e não podem ser
valorados negativamente. O réu foi condenado por roubo, conforme folha de
antecedentes acostada à fl. 13 do apenso, a 05 (cinco) anos e 04 (quatro)
meses de reclusão, em regime fechado, em período não atingido pela
reincidência, pois que a extinção da punibilidade pelo cumprimento de
pena ocorreu em 10/01/2005 e crime objeto desta ação se deu em 12/11/2014.
5. Afastada a valoração negativa da culpabilidade e da ganância, o que
acarreta a redução da pena-base, já que ausente apelação da acusação
nesse sentido e sopesando o entendimento fixado pela 11ª Turma desta
Corte, bem como a quantidade da droga apreendida, 14.400 g (quatorze mil e
quatrocentos gramas) de cocaína e 494.800 g (quatrocentos e noventa e quatro
mil e oitocentos gramas) de maconha, reduzida a pena-base para 8 (oito) anos,
9 (nove) meses de reclusão e 875 (oitocentos e setenta e cinco) dias-multa.
6. Segunda fase da dosimetria. De rigor o reconhecimento da atenuante da
confissão espontânea.Quanto à fração a ser aplicada, cada atenuante
ou agravante deve ser equivalente a 1/6, para assegurar fiel cumprimento
à elevação efetiva ou à redução eficaz da pena, na segunda fase de
individualização, de modo que a pena resta fixada nesta fase em 07 (sete)
anos, 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 729 (setecentos e
vinte e nove) dias-multa.
7. Terceira fase da dosimetria. Mantida a majoração da pena em decorrência
da causa de aumento prevista no art. 40, inciso I, da Lei n.º 11.343/06
(transnacionalidade do delito), no percentual mínimo de 1/6 (um sexto),
pois presente uma única causa de aumento do referido dispositivo. Consoante o
artigo 40, I, da Lei n° 11.343/2006, é necessário somente que "a natureza,
a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias
do fato evidenciem a transnacionalidade do delito", e não que haja a efetiva
transposição de fronteira s entre os países.
8. Inaplicável a causa de diminuição prevista no artigo 33, §4º,
da Lei n.º 11.343/06, que prevê a redução de 1/6 a 2/3 para o agente
que seja primário, possua bons antecedentes e não se dedique a atividades
criminosas nem integre organização criminosa. Tratando-se de requisitos que
devem ser preenchidos cumulativamente, ausente um deles, deve ser afastada
a causa de diminuição. Consoante já restou salientado, não se trata de
réu primário, pelo que correta a não incidência da benesse legal.
9. A pena de multa deve acompanhar a proporcionalidade de pena de reclusão
consideradas as três fases da dosimetria. Todavia, apesar de ter fixado
a pena de reclusão em 09 (nove) anos e 04 (quatro) meses, o magistrado a
estabeleceu em 600 (seiscentos dias) multa, abaixo, portanto, do que seria
o correto. No caso, mesmo com a redução da pena de reclusão nesta Corte,
para 8 (oito) anos, 06 (seis) meses e 02 (dois) dias de reclusão, ainda
assim a pena de multa restaria estabelecida em 850 (oitocentos e cinquenta)
dias-multa. Todavia, à míngua de apelação da acusação neste sentido,
resta mantida como arbitrada em primeiro grau de jurisdição, em 600
(seiscentos dias) multa. Rejeitada a apelação da defesa quanto a este
ponto pelos mesmos fundamentos aqui expostos.
10. Pena definitiva fixada em 8 (oito) anos, 06 (seis) meses e 02 (dois)
dias de reclusão e 600 (seiscentos dias) multa, no valor unitário de 1/30
(um trigésimo) do salário mínimo, vigente na data dos fatos.
11. Não há que se falar em substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos, tendo em vista que a pena definitiva aplicada supera
quatro anos de reclusão, não se encontrando preenchidos os requisitos do
art. 44 do Código Penal.
12. Sendo a pena de reclusão fixada em lapso superior a oito anos, deve ser
mantido o regime inicial fechado, nos termos do artigo 33, § 2°, a e b do
CP.
13. Exauridos os recursos nesta Corte e interpostos recursos dirigidos às
Cortes Superiores (Recurso Extraordinário e Recurso Especial), expeça-se
Carta de Sentença, bem como comunique-se ao Juízo de Origem para o início
da execução da pena imposta à ré, sendo dispensadas tais providências
em caso de trânsito em julgado, hipótese em que terá início a execução
definitiva da pena.
14. Apelação da defesa parcialmente provida. Apelação da acusação a
que se nega provimento.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, de ofício, fixar em 1/6 a fração relativa à atenuante da
confissão espontânea, dar parcial provimento à apelação da defesa, para
reduzir a pena-base e negar provimento à apelação da acusação, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
14/02/2017
Data da Publicação
:
21/02/2017
Classe/Assunto
:
ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 69355
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Observações
:
OBJETO DO CRIME: APREENDIDA 14.400G DE COCAINA E 494.800G DE
MACONHA.
Referência
legislativa
:
***** CPP-41 CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-383
***** CTB-97 CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO DE 1997
LEG-FED LEI-9503 ANO-1997 ART-195
***** LDR-06 LEI DE DROGAS
LEG-FED LEI-11343 ANO-2006 ART-40 INC-1 ART-33 PAR-4
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-44 ART-33 PAR-2 LET-A LET-B
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/02/2017
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