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Jurisprudência


TRF3 0002607-22.2004.4.03.6112 00026072220044036112

Ementa
PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. ART. 168-A DO CÓDIGO PENAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA AFASTADA. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS INCONTROVERSAS. AFASTADA A ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA EXAÇÃO. CONTINUIDADE DELITIVA. DOLO GENÉRICO DEMONSTRADO. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE NÃO VERIFICADA. DOSIMETRIA. CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. AUMENTO DO VALOR DA PENA DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. REVERSÃO PARA A VÍTIMA. APELOS PARCIALMENTE PROVIDOS. 1- Em razão da interposição de recurso ministerial pugnando pela exasperação da pena fixada aos réus, descabe reconhecer a prescrição da pretensão punitiva estatal com base na pena concretamente fixada na sentença, à míngua de definitividade da reprimenda. 2- Materialidade objetiva do delito demonstrada especialmente pela prova documental produzida. 3- Afastada a alegação de inconstitucionalidade da exação. São devidas as contribuições sociais incidentes sobre a receita bruta da comercialização de produtos pelo empregador rural pessoa física, a partir da entrada em vigor da Lei nº 10.256/01. Hipótese em que as apropriações indébitas previdenciárias ocorreram no período de outubro/2002 a agosto/2003, inexistindo, portanto, a inconstitucionalidade apontada. 4- O objeto material do delito de apropriação indébita previdenciária é o valor recolhido e não repassado aos cofres da Previdência e não o valor do débito tributário inscrito, já incluídos os juros de mora e a multa. 5- Reconhecida a continuidade delitiva, pois os crimes foram praticados em semelhantes condições de tempo, lugar e modo de execução. 6 - Autoria, que ademais não foi objeto de impugnação pela defesa, suficientemente delineada nos autos pela prova produzida pela acusação, especialmente a prova oral. 7- O tipo penal da apropriação indébita previdenciária exige apenas o dolo genérico consistente na conduta omissiva de deixar de recolher, no prazo legal, contribuição destinada à Previdência Social que tenha sido descontada de pagamentos efetuados aos empregados. Não se exige do agente o animus rem sibi habendi dos valores descontados e não repassados, consoante entendimento jurisprudencial consolidado. 8- A existência de dificuldades financeiras enfrentadas pela pessoa jurídica pode, em determinados casos, configurar causa de exclusão da ilicitude, por estado de necessidade, como entendem alguns, ou em causa de exclusão da culpabilidade, por inexigibilidade de conduta diversa, como entendem outros. Para que caracterizem a excludente, as adversidades devem ser de tal ordem que coloquem em risco a própria existência do negócio, sendo certo que apenas a absoluta impossibilidade financeira devidamente comprovada nos autos poderia justificar a omissão nos recolhimentos. 9 - A excludente de culpabilidade da inexigibilidade de conduta diversa, além de demandar robusta prova no sentido da intransponibilidade das dificuldades financeiras enfrentadas pela pessoa jurídica contribuinte, não pode dispensar a concomitante demonstração da excepcionalidade da situação. É dizer, não basta a prova de que a sociedade empresária passava por grave crise financeira, é preciso, ainda, que se verifique da prova produzida que a conduta criminosa foi praticada como medida extrema e excepcional, em um momento de intransponível dificuldade de caixa, não superada sequer com alterações de modo de produção, redução de custos e alienação de patrimônio. 10 - Não se admite que, ante as dificuldades financeiras experimentadas por longo período, os administradores da pessoa jurídica se beneficiem da excludente de culpabilidade em tela de maneira reiterada, permanecendo na prática criminosa e financiando sua atividade empresarial às custas da Previdência Social e em prejuízo de toda sociedade. 11- Afastada a excludente de culpabilidade deduzida pela defesa. 12- Dosimetria. Exasperação da pena-base em função das consequências do delito (art. 59 do Código Penal), considerando que o dano causado aos cofres públicos superava trezentos mil reais ao tempo dos fatos (2002 e 2003). 13 - A confissão do réu, porque espontânea, ou seja, sem a intervenção de fatores externos, autoriza o reconhecimento da atenuante genérica, inclusive porque foi utilizada como um dos fundamentos da condenação. 14- Não se verifica o "motivo de relevante valor social ou moral", nem o arrependimento posterior ou reparação de dano. 15- Presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal e considerando que, em concreto, as circunstâncias judiciais desfavoráveis não apontam para a necessidade de restrição à liberdade dos réus, mantida a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em uma pena de prestação de serviços à comunidade ou entidade pública, com fundamento no art. 44, §2º, do Estatuto Repressivo, e uma pena de prestação pecuniária. 16- A pena pecuniária substitutiva da pena privativa de liberdade deve ser fixada de maneira a garantir a proporcionalidade entre a reprimenda substituída e as condições econômicas do condenado, além do dano a ser reparado. 17- Acolhidos parcialmente os recursos. 18- Destinada, de ofício, a pena pecuniária substitutiva para o INSS.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, (i). dar parcial provimento ao recurso ministerial para fixar a pena-base acima do mínimo legal, em função das consequências do crime, e aumentar o valor da pena de prestação pecuniária substitutiva da privativa de liberdade; (ii). dar parcial provimento ao recurso defensivo para aplicar a atenuante da confissão espontânea quanto ao réu João Gracindo da Costa; (iii). de ofício, destinar a pena de prestação pecuniária para o INSS; para, ao final, mantendo a condenação dos réus pela prática do crime do art. 168-A, §1º, II, do Código Penal, fixar a pena do réu João Gracindo da Costa em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e 11 (onze) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, e do réu Antônio José dos Santos, em 02 (dois) anos e 11 (onze) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e 14 (quatorze) dias-multa, no valor unitário de um trigésimo do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos, substituídas as penas privativas de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em uma pena de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, conforme definido pelo Juízo das Execuções Penais, pelo período da pena corporal substituída, e uma pena de prestação pecuniária no valor de dez salários mínimos para cada acusado, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 18/10/2016
Data da Publicação : 28/10/2016
Classe/Assunto : ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 67228
Órgão Julgador : DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Referência legislativa : ***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940 LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-168A PAR-1 INC-2 ART-59 ART-44 INC-2 LEG-FED LEI-10256 ANO-2001
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/10/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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