TRF3 0002697-62.2015.4.03.6106 00026976220154036106
PENAL. PROCESSUAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. PÁSSAROS SILVESTRES IRREGULARMENTE
MANTIDOS EM CATIVEIRO DOMICILIAR PELO ACUSADO, INCLUSIVE ESPÉCIE AMEAÇADA
DE EXTINÇÃO, PORTANDO RELAÇÃO NÃO ATUALIZADA DE PASSERIFORMES NO
ENDEREÇO DO PLANTEL. ANILHA ALARGADA, NÃO REGISTRADA NO SISPASS OU
AUSENTE, EM DESACORDO COM O ARTIGO 32, II e III, DA INSTRUÇÃO NORMATIVA
IBAMA N. 10/2011. USO INDEVIDO DE ANILHA DO IBAMA PELO RÉU, SABIDAMENTE,
ADULTERADA. DELITOS IMPUTADOS NA DENÚNCIA DEVIDAMENTE TIPIFICADOS NO
ARTIGO 29, § 1º, III, E § 4º, I, DA LEI 9.605/98, E NO ARTIGO 296,
§ 1º, III, DO CÓDIGO PENAL, EM CONCURSO MATERIAL. PRINCÍPIO DA
CONSUNÇÃO NÃO APLICÁVEL NO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA DE CONFLITO
APARENTE DE NORMAS. PRESCRIÇÃO INOCORRIDA. MATERIALIDADE E AUTORIA
DEMONSTRADAS. DOLO CONFIGURADO. DOSIMETRIA. ATENUANTES DO ARTIGO 65, I,
PARTE FINAL, DO CÓDIGO PENAL, E DO ARTIGO 14, I E IV, DA LEI 9.605/98,
RECONHECIDAS NA HIPÓTESE, INCLUSIVE DE OFÍCIO, NOS LIMITES DA SÚMULA 231
DO STJ (PENAS-BASE FIXADAS JÁ NO MÍNIMO PATAMAR LEGAL). CAUSA ESPECIAL DE
AUMENTO DE PENA DO ARTIGO 29, § 4º, I, DA LEI 9.605/98, DEVIDAMENTE MANTIDA
EM RELAÇÃO AO DELITO AMBIENTAL, EM DETRIMENTO DA AGRAVANTE DO ARTIGO 15, II,
"Q", DA LEI 9.605/98. SUBSTITUIÇÃO DA SOMA DAS PENAS CORPORAIS APLICADAS
AO RÉU POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. APELOS DA ACUSAÇÃO E DA DEFESA
PARCIALMENTE PROVIDOS.
1. Em suas razões recursais (fls. 132/135 e 149/152), o Ministério Público
Federal pleiteia a reforma parcial da r. sentença, para condenar SEBASTIÃO
FRANCISCO VISICATO, também, pela prática do delito previsto no artigo 296,
§ 1º, inciso I (sic, inciso III), do Código Penal, bem como para aplicar-lhe
a causa de aumento (sic, agravante) prevista no artigo 15, inciso II, "q",
da Lei 9.605/98, no tocante ao delito ambiental.
2. Já a defesa de SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO, em suas razões recursais
(fls. 162/166), pleiteia a reforma parcial da r. sentença, para que: (i) seja
o acusado absolvido, também, do crime previsto no artigo 29, § 1º, inciso
III, e § 4º, inciso I, da Lei 9.605/98, por estar, supostamente, provado que
não cometera os fatos delitivos tais como descritos na denúncia, ou ainda
por pretensa falta de provas de autoria e dolo, sob o argumento de que, em
tese, desconheceria as normas referentes ao anilhamento de aves silvestres,
devido à pouca instrução e idade avançada; (ii) subsidiariamente,
seja-lhe aplicada a atenuante do artigo 65, inciso I, do Código Penal,
em razão de ter mais de setenta anos de idade na data da sentença, e,
por conseguinte, seja reconhecida a prescrição de sua pretensão punitiva,
à luz do benefício etário e como medida de política criminal.
3. A despeito da posição adotada pelo magistrado sentenciante às
fls. 128/129 da r. sentença e em consonância com o apelo ministerial nesse
ponto, não há de se falar em conflito aparente de normas entre os tipos
penais descritos no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal (uso indevido
de anilha do IBAMA adulterada) e no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98
(guarda irregular de pássaros silvestres, sem a devida permissão, licença ou
autorização da autoridade competente), a resultar em equivocada absorção
do primeiro (suposto delito-meio) pelo segundo (pretenso delito-fim), sendo
de rigor o seu afastamento.
4. Cumpre observar que os tipos penais em epígrafe tutelam bens jurídicos
distintos (o primeiro, a fé pública; o segundo, o meio ambiente
ecologicamente equilibrado, destacadamente, a fauna silvestre), além de
decorrerem de condutas diversas e autônomas, razão pela qual não se
vislumbra, na presente hipótese, a incidência do princípio da consunção.
5. Diversamente do sustentado pela defesa, os elementos de cognição
demonstram que o criador amador SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO (CTF n. 1020319),
de forma livre e consciente, mantinha, irregularmente, em cativeiro domiciliar,
03 (três) pássaros silvestres, consistentes em 01 (um) canário-da-terra
(Sicalis flaveola brasiliensis), 01 (um) tempera-viola (Saltator maximus)
e 01 (um) azulão-verdadeiro (Passerina brissonii), espécie esta considerada
ameaçada de extinção, sem estarem devidamente anilhados (seja pela ausência
de qualquer anilha de identificação, seja pelo visível alargamento dos
diâmetros internos de suas anilhas "IBAMA 3,5 060827" e "SOSP 013 25 99 6"),
inclusive portando relação de passeriformes desatualizada no endereço
de seu plantel, em nítido desacordo com eventual licença, permissão ou
autorização obtida junto ao órgão ambiental competente, nos termos do
artigo 32, incisos II e III, da Instrução Normativa IBAMA n. 10/2011,
os quais vieram a ser apreendidos por policiais militares ambientais, em
10/05/2014, durante a operação "Jubileu de Prata", na própria residência
do acusado, no "Sítio Irmãos Visicato", no Município de Monte Aprazível/SP,
além de incorrer, também de maneira livre e consciente, no uso indevido de 01
(uma) anilha, em tese, originalmente cadastrada pelo IBAMA e posteriormente
adulterada/alargada (de diâmetro interno bastante superior ao normativamente
permitido), mantida aposta pelo acusado no tarso do aludido tempera-viola
("IBAMA 3,5 060827"), no mesmo local e ocasião.
6. Ouvidos em juízo (fls. 104-mídia/106), os policiais militares
ambientais e testemunhas comuns Jean Carlos Ambrosio e Rodrigo Victor
Devechi confirmaram a fiscalização realizada, em 10/05/2014, no Sítio
"Irmãos Visicato", onde foram recebidos pelo próprio acusado que lhes
franqueara a entrada no local e colaborara com a diligência, tendo lhes
apresentado, na ocasião, a sua relação de passeriformes, notadamente,
desatualizada. A propósito, destacaram que, antes mesmo da aferição das
bitolas das anilhas com o auxílio de um paquímetro, já haviam notado que
as anilhas do tempera-viola e do azulão-verdadeiro (este último ameaçado
de extinção), de tão alargadas (fl. 59), teriam saído, com facilidade,
de seus respectivos tarsos nas mãos dos próprios agentes de fiscalização
durante a vistoria, evidenciando, desde logo, sua possível adulteração por
alargamento, que, de fato, restou constatada às fl. 15 e 45/60. Além disso,
asseveraram que o "canário-da-terra" apreendido no mesmo local encontrava-se,
na data dos fatos, desprovido de qualquer anilha de identificação. No mais,
o policial militar ambiental Jean Carlos Ambrosio recordou-se ainda que,
anteriormente à vistoria de 10/05/2014 (uns cinco anos antes), em outra
fiscalização realizada na residência do réu, mas na ausência deste,
chegara a lavrar termo circunstanciado em nome de sua esposa, em razão de
lá haver apreendido outras aves também desprovidas de anilhas na ocasião.
7. Em seu interrogatório judicial (fls. 104-mídia e 107), o acusado veio a
alterar sua versão inicialmente prestada em sede policial à fl. 35, passando
a informar que, em verdade, teria "ganho" o "azulão" de sua própria filha,
ao passo que o "tempera-viola" teria sido "comprado" de um amigo seu de
Votuporanga/SP, cujo nome afirma igualmente não se recordar, ambos há mais
de dez anos. Na sequência, passa a declarar, contraditoriamente, que nunca
teria vendido ou comprado passeriformes, apenas os teria ganhado. Em relação
ao "canário-da-terra", o qual, segundo ele, teria entrado na gaiola "por
acidente" havia alguns dias (atrás de comida posta pelo acusado), admitiu,
todavia, estar ciente de que não poderia mantê-lo em cativeiro desprovido
de qualquer anilha (até mesmo em razão de outra apreensão anteriormente
realizada em sua residência há uns dez anos, também por ausência de anilha
em seus passeriformes), caindo, por terra, a frágil tese da defesa de que
o acusado, supostamente, desconheceria as normas referentes ao anilhamento
de aves silvestres, não obstante sua larga experiência enquanto criador
amador de passeriformes, admitidamente, há mais de quinze anos, inclusive
com cadastro no IBAMA.
8. Restaram incontestes a materialidade e autoria delitivas, assim como o
dolo do réu, em relação à prática dos delitos previstos no artigo 296,
§ 1º, III, do Código Penal, e no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da
Lei 9.605/98, em concurso material, não se olvidando da natureza diversa
dos bens jurídicos penalmente tutelados em cada um dos tipos penais em
comento, respectivamente, a fé pública e a proteção ao meio ambiente
(destacadamente, a fauna silvestre), nem havendo de cogitar, na hipótese,
eventual erro sobre a ilicitude do fato ou mesmo sobre os elementos do tipo.
9. Dosimetria e substituição da soma das penas corporais fixadas ao réu
por duas restritivas de direitos.
10. Atenuantes do artigo 65, I, parte final, do Código Penal, e do artigo
14, I e IV, da Lei 9.605/98, reconhecidas na hipótese, inclusive de ofício,
nos limites da Súmula 231 do STJ (penas-base fixadas já no mínimo patamar
legal).
11. Causa especial de aumento de pena do artigo 29, § 4º, i, da lei 9.605/98,
devidamente mantida em relação ao delito ambiental, em detrimento da
agravante do artigo 15, II, "q", da lei 9.605/98, ora pleiteada, sem razão,
pela acusação.
12. De resto, não há de se cogitar o reconhecimento de prescrição
antecipada ou virtual da pretensão punitiva, em consonância com a Súmula
438 do Superior Tribunal de Justiça, antes de eventual trânsito em julgado
do presente acórdão para acusação. Tampouco se verifica nos autos a
ocorrência de eventual prescrição de suas pretensões punitivas tendo em
conta o máximo das penas privativas de liberdade abstratamente cominadas
aos delitos previstos no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da Lei 9.605/98
(um ano e meio de detenção), e no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal
(seis anos de reclusão), assim como o benefício etário a que o réu,
de fato, faz jus em razão de dispor de mais de setenta anos de idade na
data da sentença (fls. 36, 131 e 147), na forma dos artigos 109, III e V,
115, parte final, 117, e 119, todos do Código Penal.
13. Recursos da acusação e da defesa parcialmente providos.
Ementa
PENAL. PROCESSUAL. APELAÇÕES CRIMINAIS. PÁSSAROS SILVESTRES IRREGULARMENTE
MANTIDOS EM CATIVEIRO DOMICILIAR PELO ACUSADO, INCLUSIVE ESPÉCIE AMEAÇADA
DE EXTINÇÃO, PORTANDO RELAÇÃO NÃO ATUALIZADA DE PASSERIFORMES NO
ENDEREÇO DO PLANTEL. ANILHA ALARGADA, NÃO REGISTRADA NO SISPASS OU
AUSENTE, EM DESACORDO COM O ARTIGO 32, II e III, DA INSTRUÇÃO NORMATIVA
IBAMA N. 10/2011. USO INDEVIDO DE ANILHA DO IBAMA PELO RÉU, SABIDAMENTE,
ADULTERADA. DELITOS IMPUTADOS NA DENÚNCIA DEVIDAMENTE TIPIFICADOS NO
ARTIGO 29, § 1º, III, E § 4º, I, DA LEI 9.605/98, E NO ARTIGO 296,
§ 1º, III, DO CÓDIGO PENAL, EM CONCURSO MATERIAL. PRINCÍPIO DA
CONSUNÇÃO NÃO APLICÁVEL NO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA DE CONFLITO
APARENTE DE NORMAS. PRESCRIÇÃO INOCORRIDA. MATERIALIDADE E AUTORIA
DEMONSTRADAS. DOLO CONFIGURADO. DOSIMETRIA. ATENUANTES DO ARTIGO 65, I,
PARTE FINAL, DO CÓDIGO PENAL, E DO ARTIGO 14, I E IV, DA LEI 9.605/98,
RECONHECIDAS NA HIPÓTESE, INCLUSIVE DE OFÍCIO, NOS LIMITES DA SÚMULA 231
DO STJ (PENAS-BASE FIXADAS JÁ NO MÍNIMO PATAMAR LEGAL). CAUSA ESPECIAL DE
AUMENTO DE PENA DO ARTIGO 29, § 4º, I, DA LEI 9.605/98, DEVIDAMENTE MANTIDA
EM RELAÇÃO AO DELITO AMBIENTAL, EM DETRIMENTO DA AGRAVANTE DO ARTIGO 15, II,
"Q", DA LEI 9.605/98. SUBSTITUIÇÃO DA SOMA DAS PENAS CORPORAIS APLICADAS
AO RÉU POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. APELOS DA ACUSAÇÃO E DA DEFESA
PARCIALMENTE PROVIDOS.
1. Em suas razões recursais (fls. 132/135 e 149/152), o Ministério Público
Federal pleiteia a reforma parcial da r. sentença, para condenar SEBASTIÃO
FRANCISCO VISICATO, também, pela prática do delito previsto no artigo 296,
§ 1º, inciso I (sic, inciso III), do Código Penal, bem como para aplicar-lhe
a causa de aumento (sic, agravante) prevista no artigo 15, inciso II, "q",
da Lei 9.605/98, no tocante ao delito ambiental.
2. Já a defesa de SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO, em suas razões recursais
(fls. 162/166), pleiteia a reforma parcial da r. sentença, para que: (i) seja
o acusado absolvido, também, do crime previsto no artigo 29, § 1º, inciso
III, e § 4º, inciso I, da Lei 9.605/98, por estar, supostamente, provado que
não cometera os fatos delitivos tais como descritos na denúncia, ou ainda
por pretensa falta de provas de autoria e dolo, sob o argumento de que, em
tese, desconheceria as normas referentes ao anilhamento de aves silvestres,
devido à pouca instrução e idade avançada; (ii) subsidiariamente,
seja-lhe aplicada a atenuante do artigo 65, inciso I, do Código Penal,
em razão de ter mais de setenta anos de idade na data da sentença, e,
por conseguinte, seja reconhecida a prescrição de sua pretensão punitiva,
à luz do benefício etário e como medida de política criminal.
3. A despeito da posição adotada pelo magistrado sentenciante às
fls. 128/129 da r. sentença e em consonância com o apelo ministerial nesse
ponto, não há de se falar em conflito aparente de normas entre os tipos
penais descritos no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal (uso indevido
de anilha do IBAMA adulterada) e no artigo 29, § 1º, III, da Lei 9.605/98
(guarda irregular de pássaros silvestres, sem a devida permissão, licença ou
autorização da autoridade competente), a resultar em equivocada absorção
do primeiro (suposto delito-meio) pelo segundo (pretenso delito-fim), sendo
de rigor o seu afastamento.
4. Cumpre observar que os tipos penais em epígrafe tutelam bens jurídicos
distintos (o primeiro, a fé pública; o segundo, o meio ambiente
ecologicamente equilibrado, destacadamente, a fauna silvestre), além de
decorrerem de condutas diversas e autônomas, razão pela qual não se
vislumbra, na presente hipótese, a incidência do princípio da consunção.
5. Diversamente do sustentado pela defesa, os elementos de cognição
demonstram que o criador amador SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO (CTF n. 1020319),
de forma livre e consciente, mantinha, irregularmente, em cativeiro domiciliar,
03 (três) pássaros silvestres, consistentes em 01 (um) canário-da-terra
(Sicalis flaveola brasiliensis), 01 (um) tempera-viola (Saltator maximus)
e 01 (um) azulão-verdadeiro (Passerina brissonii), espécie esta considerada
ameaçada de extinção, sem estarem devidamente anilhados (seja pela ausência
de qualquer anilha de identificação, seja pelo visível alargamento dos
diâmetros internos de suas anilhas "IBAMA 3,5 060827" e "SOSP 013 25 99 6"),
inclusive portando relação de passeriformes desatualizada no endereço
de seu plantel, em nítido desacordo com eventual licença, permissão ou
autorização obtida junto ao órgão ambiental competente, nos termos do
artigo 32, incisos II e III, da Instrução Normativa IBAMA n. 10/2011,
os quais vieram a ser apreendidos por policiais militares ambientais, em
10/05/2014, durante a operação "Jubileu de Prata", na própria residência
do acusado, no "Sítio Irmãos Visicato", no Município de Monte Aprazível/SP,
além de incorrer, também de maneira livre e consciente, no uso indevido de 01
(uma) anilha, em tese, originalmente cadastrada pelo IBAMA e posteriormente
adulterada/alargada (de diâmetro interno bastante superior ao normativamente
permitido), mantida aposta pelo acusado no tarso do aludido tempera-viola
("IBAMA 3,5 060827"), no mesmo local e ocasião.
6. Ouvidos em juízo (fls. 104-mídia/106), os policiais militares
ambientais e testemunhas comuns Jean Carlos Ambrosio e Rodrigo Victor
Devechi confirmaram a fiscalização realizada, em 10/05/2014, no Sítio
"Irmãos Visicato", onde foram recebidos pelo próprio acusado que lhes
franqueara a entrada no local e colaborara com a diligência, tendo lhes
apresentado, na ocasião, a sua relação de passeriformes, notadamente,
desatualizada. A propósito, destacaram que, antes mesmo da aferição das
bitolas das anilhas com o auxílio de um paquímetro, já haviam notado que
as anilhas do tempera-viola e do azulão-verdadeiro (este último ameaçado
de extinção), de tão alargadas (fl. 59), teriam saído, com facilidade,
de seus respectivos tarsos nas mãos dos próprios agentes de fiscalização
durante a vistoria, evidenciando, desde logo, sua possível adulteração por
alargamento, que, de fato, restou constatada às fl. 15 e 45/60. Além disso,
asseveraram que o "canário-da-terra" apreendido no mesmo local encontrava-se,
na data dos fatos, desprovido de qualquer anilha de identificação. No mais,
o policial militar ambiental Jean Carlos Ambrosio recordou-se ainda que,
anteriormente à vistoria de 10/05/2014 (uns cinco anos antes), em outra
fiscalização realizada na residência do réu, mas na ausência deste,
chegara a lavrar termo circunstanciado em nome de sua esposa, em razão de
lá haver apreendido outras aves também desprovidas de anilhas na ocasião.
7. Em seu interrogatório judicial (fls. 104-mídia e 107), o acusado veio a
alterar sua versão inicialmente prestada em sede policial à fl. 35, passando
a informar que, em verdade, teria "ganho" o "azulão" de sua própria filha,
ao passo que o "tempera-viola" teria sido "comprado" de um amigo seu de
Votuporanga/SP, cujo nome afirma igualmente não se recordar, ambos há mais
de dez anos. Na sequência, passa a declarar, contraditoriamente, que nunca
teria vendido ou comprado passeriformes, apenas os teria ganhado. Em relação
ao "canário-da-terra", o qual, segundo ele, teria entrado na gaiola "por
acidente" havia alguns dias (atrás de comida posta pelo acusado), admitiu,
todavia, estar ciente de que não poderia mantê-lo em cativeiro desprovido
de qualquer anilha (até mesmo em razão de outra apreensão anteriormente
realizada em sua residência há uns dez anos, também por ausência de anilha
em seus passeriformes), caindo, por terra, a frágil tese da defesa de que
o acusado, supostamente, desconheceria as normas referentes ao anilhamento
de aves silvestres, não obstante sua larga experiência enquanto criador
amador de passeriformes, admitidamente, há mais de quinze anos, inclusive
com cadastro no IBAMA.
8. Restaram incontestes a materialidade e autoria delitivas, assim como o
dolo do réu, em relação à prática dos delitos previstos no artigo 296,
§ 1º, III, do Código Penal, e no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da
Lei 9.605/98, em concurso material, não se olvidando da natureza diversa
dos bens jurídicos penalmente tutelados em cada um dos tipos penais em
comento, respectivamente, a fé pública e a proteção ao meio ambiente
(destacadamente, a fauna silvestre), nem havendo de cogitar, na hipótese,
eventual erro sobre a ilicitude do fato ou mesmo sobre os elementos do tipo.
9. Dosimetria e substituição da soma das penas corporais fixadas ao réu
por duas restritivas de direitos.
10. Atenuantes do artigo 65, I, parte final, do Código Penal, e do artigo
14, I e IV, da Lei 9.605/98, reconhecidas na hipótese, inclusive de ofício,
nos limites da Súmula 231 do STJ (penas-base fixadas já no mínimo patamar
legal).
11. Causa especial de aumento de pena do artigo 29, § 4º, i, da lei 9.605/98,
devidamente mantida em relação ao delito ambiental, em detrimento da
agravante do artigo 15, II, "q", da lei 9.605/98, ora pleiteada, sem razão,
pela acusação.
12. De resto, não há de se cogitar o reconhecimento de prescrição
antecipada ou virtual da pretensão punitiva, em consonância com a Súmula
438 do Superior Tribunal de Justiça, antes de eventual trânsito em julgado
do presente acórdão para acusação. Tampouco se verifica nos autos a
ocorrência de eventual prescrição de suas pretensões punitivas tendo em
conta o máximo das penas privativas de liberdade abstratamente cominadas
aos delitos previstos no artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da Lei 9.605/98
(um ano e meio de detenção), e no artigo 296, § 1º, III, do Código Penal
(seis anos de reclusão), assim como o benefício etário a que o réu,
de fato, faz jus em razão de dispor de mais de setenta anos de idade na
data da sentença (fls. 36, 131 e 147), na forma dos artigos 109, III e V,
115, parte final, 117, e 119, todos do Código Penal.
13. Recursos da acusação e da defesa parcialmente providos.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar parcial provimento aos apelos da acusação e da defesa,
apenas para (i) condenar SEBASTIÃO FRANCISCO VISICATO em 02 (dois) anos de
reclusão, e 10 (dez) dias-multa no valor unitário de 1/30 (um trigésimo)
do salário mínimo vigente à época dos fatos, também pela prática do
delito contra a fé pública capitulado no artigo 296, § 1º, III, do Código
Penal, nos moldes dos artigos 49, § 1º, e 68, do mesmo diploma legal,
afastando-se a incidência do princípio da consunção no caso concreto;
(ii) reconhecer ao réu as atenuantes previstas no artigo 65, I, parte final,
do Código Penal (relativamente a ambos os delitos imputados e atendendo
nesse ponto ao pleito subsidiário da defesa), assim como no artigo 14,
incisos I e IV, da Lei 9.605/98 (ora vislumbradas ex officio, no tocante
ao delito ambiental), em que pese suas respectivas penas-base já houvessem
sido fixadas no mínimo patamar legal, à míngua de quaisquer agravantes e
nos limites da Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça, sem prejuízo
da subsequente aplicação da causa especial de aumento de pena prevista no
artigo 29, § 4º, I, da Lei 9.605/98, no que se refere ao crime ambiental;
(iii) tendo em vista o concurso material entre os tipos penais descritos no
artigo 29, § 1º, III, e § 4º, I, da Lei 9.605/98, e no artigo 296, § 1º,
III, do Código Penal, calcular a soma de suas penas corporais em 02 (dois)
anos e 09 (nove) meses de reclusão/detenção, em regime inicial aberto,
que ficam substituídas por duas restritivas de direitos, consistentes em
prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo mesmo
prazo da soma das penas substituídas, e prestação pecuniária no valor
de 01 (um) salário-mínimo, destinada à União Federal, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
14/03/2017
Data da Publicação
:
30/03/2017
Classe/Assunto
:
ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 70004
Órgão Julgador
:
DÉCIMA PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED INT-10 ANO-2011 ART-32 INC-2 INC-3
IBAMA
LEG-FED LEI-9605 ANO-1998 ART-29 PAR-1 INC-3 PAR-4 INC-1 ART-15 INC-2
LET-Q ART-14 INC-1 INC-4
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-296 PAR-1 INC-3 ART-65 INC-1 ART-109 INC-3
INC-5 ART-115 ART-117 ART-119 ART-49 PAR-1 ART-68
***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-231
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:30/03/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
Mostrar discussão