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Jurisprudência


TRF3 0002726-51.2011.4.03.6107 00027265120114036107

Ementa
APELAÇÕES EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL OBJETIVANDO A OBRIGATORIEDADE DE PRÉVIO EIA/RIMA PARA A CONCESSÃO DE LICENÇA DE QUEIMA CONTROLADA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR. PRESENÇA DE DANO OBJETIVO E CONSUMADO. A QUEIMA DA PALHA DE CANAVIAIS CAUSA A DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE, DA SAÚDE HUMANA E DE OUTRAS ATIVIDADES ECONÔMICAS. NECESSIDADE DE CAUTELAS DESTINADAS À MINORAÇÃO DOS SEUS MALEFÍCIOS. COMPETENCIA SUPLETIVA DO IBAMA SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDENCIA MANTIDA. RECURSOS DESPROVIDOS. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA DESPROVIDA. 1. Apelações contra a sentença de parcial procedência de ação civil pública ambiental interposta pelo Ministério Público Federal, objetivando a obrigatoriedade de realização de prévio Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (EIA/RIMA) para a concessão de licença de queima controlada de palha de cana-de-açúcar na área compreendida pela 7ª Subseção Judiciária do Estado de São Paulo. 2. O IBAMA possui competência supletiva, nos termos da Lei nº 6.938/81 e da Resolução CONAMA n.º 237/97, na medida em que a legislação estadual paulista acerca da matéria, com especial destaque às Leis Estaduais nº 10.547/2000 e nº 11.241/2002, não prevê a exigência de EIA/RIMA no procedimento de licenciamento de queima controlada de palha de cana-de-açúcar. 3. No exame do mérito, observa-se que esta Corte já se pronunciou em caso semelhante, assegurando que a falta de EIA/RIMA no procedimento de licenciamento de queima controlada em canavial, em princípio, não é inconstitucional. Também, que a legislação estadual paulista vem se desenvolvendo no sentido da gradativa eliminação do uso do fogo como método facilitador do corte da cana-de-açúcar, numa tentativa de contrabalancear os impactos ambientais e socioeconômicos que envolvem a questão (AI 00272884920104030000, Desembargador Federal CARLOS MUTA, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 5/7/2012). 4. No entanto, não merecem descuido as graves consequências do uso do fogo nas plantações de cana-de-açúcar, prática que remonta à época das capitanias hereditárias e que de há muito já deveria ter sido abolida em favor da moderna tecnologia agrícola. Deveras, qualquer pessoa que percorra a extensa zona canavieira no interior do Estado de São Paulo, facilmente constata - pela visão e olfato - os danos infligidos ao meio ambiente e, também, à saúde humana, sendo as crianças e os idosos as maiores vítimas das moléstias respiratórias que lotam os serviços de pronto-socorro da região, causadas pela fumaça negra e particulada oriunda das queimadas. 5. Os supostos prejuízos econômicos dos produtores de cana - que, aliás, são questionáveis - não podem se sobrepor ao bem estar de um número indeterminável de paulistas e tampouco justificar o sacrifício de animais inocentes que habitam as áreas lindeiras dos canaviais e, menos ainda, o malefício ao meio ambiente como um todo. A liturgia devida ao "bezerro de ouro" há de ter limites, e a Constituição Federal não pode ser o escudo dos que defendem o lucro a qualquer custo. 6. Embora o artigo 225, § 1º, IV, da Constituição Federal, em tese, sirva para condicionar a exigência legal de prévio estudo de impacto ambiental, depreende-se da sua correta interpretação que essa exigência legal está intrinsecamente ligada à ...instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente... Evidentemente, a queima da palha da cana-de-açúcar causa a degradação do meio ambiente, da saúde humana e de outras atividades econômicas. Não se trata de mero risco, mas de dano objetivo e consumado. 7. Com efeito, têm-se duas situações diametralmente opostas. De um lado está a atividade que ostenta na sua essência a possibilidade de ofensa ao meio ambiente. Nesse caso, a exigência de prévio estudo de impacto ambiental deve ser condicionada à lei, porque a atividade não pode ser vista, a priori, como degradadora. Tome-se, por exemplo, a instalação de uma nova unidade portuária no estuário de Santos/SP, que pode ou não piorar a degradação local. De outro lado está atividade que ostenta na sua essência a efetiva ofensa ao meio ambiente, que é o que ocorre na queimada de canavial. Ou seja, cuida-se de atividade essencialmente degradadora, motivo pelo qual seu desempenho deve ser cercado de cautelas destinadas à minoração dos malefícios. Essa distinção deve ser feita à luz da dicção constitucional, sob a pena de se igualar atividades desiguais. 8. Nesse cenário não é absurdo que o Judiciário seja compelido a ditar - ainda que excepcionalmente - uma política pública de salvaguarda do meio ambiente, com manifesto reflexo na proteção do direito social à saúde, nos termos do artigo 6º da Constituição Federal. 9. Correta a condenação do Estado de São Paulo, por intermédio da Secretaria de Estado do Meio Ambiente, a abster-se de conceder novas licenças de queima controlada da palha de cana-de-açúcar, na área compreendida pela 7ª Subseção Judiciária do Estado de São Paulo, sem prévio EIA/RIMA. 10. Sem reparo, também, a condenação do IBAMA a fiscalizar a exigência de licenciamento e prévio EIA/RIMA. O dever fiscalizatório que emana da competência supletiva não implica em violação do pacto federativo e que a alegada falta de estrutura física não exime o IBAMA da obrigação imposta. 11. Legítimo o arbitramento de multa diária em caso de descumprimento da medida judicial, com fulcro no artigo 461, §4º, do Código de Processo Civil. Não se cuida de meio de coação, mas de garantia do cumprimento das obrigações impostas. Precedentes do C. STJ (REsp 1360305/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, Segunda Turma, julgado em 28/5/2013, DJe 13/6/2013; AgRg no Ag 1247323/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, julgado em 8/6/2010, DJe 1/7/2010). 12. Recursos das defesas desprovidos. Remessa oficial tida por interposta desprovida.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimentos às APELAÇÕES e ao REEXAME NECESSÁRIO tido por interposto, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Data do Julgamento : 18/02/2016
Data da Publicação : 02/03/2016
Classe/Assunto : AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1880704
Órgão Julgador : SEXTA TURMA
Relator(a) : DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/03/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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