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Jurisprudência


TRF3 0002788-10.2014.4.03.6003 00027881020144036003

Ementa
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL POR EXTENSÃO DA CONDIÇÃO DO MARIDO CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. COMPROVACÃO DA ATIVIDADE RURAL QUANDO DO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO. BENEFÍCIO DEVIDO. SENTENÇA REFORMADA. - Os requisitos para concessão da aposentadoria por idade de trabalhador rural estão fixados nos arts. 142 e 143 da Lei 8213/1991, e, quando segurado especial em regime de economia familiar, nos arts. 39, I, e 142 da mesma lei. - A carência estatuída no art. 25, II, não tem aplicação integral imediata, devendo ser escalonada e progressiva, na forma estabelecida no art. 142, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou as condições necessárias à obtenção do benefício. Trata-se de regra de transição destinada àqueles que já estavam no sistema antes da modificação legislativa. - Embora o art. 2º da Lei 11.718/2008 tenha estabelecido que "para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 143 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010", mesmo a partir de 01.01.2011 é possível a concessão do benefício, contudo, com base em fundamento legal diverso. - A aposentadoria por idade continua sendo devida aos rurícolas, não mais nos termos do art. 143 do PBPS, mas, sim, com fulcro no art. 48 e parágrafos da Lei 8.213/91, com as modificações introduzidas pela Lei 11.718/2008. - Nos casos em que o(a) autor(a) completa a idade para a aposentadoria por idade rural após 31.12.2010, já não se submete às regras de transição dos arts. 142 e 143, e deve preencher os requisitos previstos no art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei n. 8.213/91, com a redação que lhe foi dada pela Lei n. 11.718/2008): 60 (sessenta) anos de idade, se homem, 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, tempo de efetiva atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período correspondente à carência exigida para o benefício, isto é, 180 (cento e oitenta) meses, e imediatamente anterior ao requerimento. - A inicial sustentou que a autora era trabalhadora rural, tendo exercido sua atividade como bóia-fria/diarista. - Comprovado o exercício da atividade rural, não há que se falar em perda da qualidade de segurado, uma vez o trabalhador rural deve apenas comprovar os requisitos idade e tempo de atividade. - O conceito de carência, para o diarista e para o segurado especial, tem sentido peculiar, que se satisfaz com o exercício da atividade, dispensando o pagamento das contribuições previdenciárias. - A autora completou 55 anos em 09.08.2011, portanto, fará jus ao benefício se comprovar sua condição de rurícola pelo período de 180 meses. - O art. 106 da Lei 8.213/1991 enumera os documentos aptos à comprovação da atividade, rol que não é taxativo, admitindo-se outras provas, na forma do entendimento jurisprudencial dominante. - Documentos expedidos por órgãos públicos, nos quais consta a qualificação do marido como lavrador, podem ser utilizados como início de prova material, como exige o art. 55, § 3º, da Lei 8213/91, para comprovar a condição de rurícola da autora, se confirmada por prova testemunhal. - A perda da condição de segurado que não impede a concessão do benefício àquele que cumpriu a carência também se aplica aos trabalhadores rurais. - Entretanto, essa norma, como todas as demais, não comporta leitura e interpretação isoladas. Deve ser analisada dentro do sistema que a alberga e, no caso, com vistas à proteção previdenciária dada aos trabalhadores rurais. - Daí que cabe investigar o real significado da exigência contida no art. 143 da Lei 8.213/91, o quê realmente deve ser exigido do trabalhador rural para que tenha direito à sua aposentadoria por idade. Deve estar trabalhando no dia imediatamente anterior ao requerimento? Um ano antes? Dois anos antes? Qual o período de interrupção do trabalho rural que pode ser considerado imediatamente anterior ao requerimento do benefício? - A resposta está no próprio art. 143, cuja infeliz redação, ensejadora de tantas discussões, tem em vista a proteção do trabalhador rural. - No regime anterior à Constituição de 1.988, os trabalhadores rurais estavam expressamente excluídos do Regime Geral de Previdência Social, e tinham algum amparo apenas dentro dos limites do Prorural. - A Constituição de 1988 estabelece que, para fins de seguridade social, trabalhadores urbanos e rurais devem ter tratamento uniforme e equivalente, o que impõe que os trabalhadores rurais tenham a mesma proteção previdenciária dada aos urbanos. - O novo Regime Geral de Previdência Social, conforme previsto na Constituição, foi implementado com as Leis 8.212 e 8.213/91. - Instituído o novo RGPS, era necessário dar proteção àqueles trabalhadores rurais que, antes da nova legislação, estavam expressamente excluídos da cobertura previdenciária, e essa proteção veio, justamente, na forma prevista no art. 143 da Lei 8.213/91: aposentadoria por idade, desde que comprovado o efetivo exercício da atividade rural pelo período correspondente à carência prevista no art. 143, e no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício. - A "mens legis" foi, sem dúvida, proteger aquele trabalhador rural que antes do novo regime previdenciário não tivera proteção previdenciária, ou seja, que fizera das lides rurais o seu meio de vida. É verdade que a lei tolera que a atividade rural tenha sido exercida de forma descontínua. Entretanto, não admite que tenha aquele trabalhador perdido a sua natureza rurícola. - A análise só pode ser feita no caso concreto. É a história laboral do interessado que pode levar à conclusão de que permaneceu, ou não, essencialmente, trabalhador rural. - Se das provas surgir a comprovação de que o trabalho rural não foi determinante para a sobrevivência do interessado, não se tratará de trabalhador rural com direito à proteção previdenciária prevista no art. 143 da Lei 8.213/91. - A prova material apresentada deve guardar a necessária correlação lógica e pertinente com a prova oral, devendo considerar, ainda, as situações peculiares do rurícola diarista, que não possui similaridade com a do rurícola em regime de economia familiar, pois o primeiro trabalha de forma avulsa, com vínculo não empregatício com o tomador do serviço, e mediante remuneração, e o segundo trabalha por conta própria, em regra, com a cooperação de familiares, sem qualquer vínculo de dependência financeira com terceiros, visando a subsistência ou o rendimento decorrente da venda da produção. - Evidente, portanto, que a prova material de cada modalidade de trabalho rural possui características próprias, principalmente quanto ao alcance e à possibilidade de seu aproveitamento por outrem. - O trabalho rural em regime de economia familiar permite o aproveitamento do início de prova material em reciprocidade entre os membros da entidade familiar, sendo permitida a comunicação da qualificação profissional de um membro para outro, como ocorre entre os cônjuges, entre pais e filhos, e em outras hipóteses, nas quais presente o parentesco. - No reconhecimento do trabalho rural do diarista não se permite, em regra, o aproveitamento da prova material, que não em nome próprio, em razão do caráter solitário e avulso do trabalho desempenhado. - Assim, o diarista só poderá aproveitar o início de prova material produzida em nome de outrem, mesmo que de algum familiar, se devidamente amparado pelas demais provas dos autos. - Ocorre que, se de um lado a jurisprudência alarga o conceito de início de prova material, por outro lado, o início de prova material, por si só, não serve para comprovar o trabalho rural, sendo indispensável a existência de prova testemunhal convincente. - Em recurso repetitivo (Resp 1352791-SP, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgamento em 27/11/2013), o STJ firmou posicionamento de que os períodos em que o rurícola trabalhou com registro em CTPS na atividade rural devem ser computados para efeito de carência, para efeitos de outra modalidade de aposentadoria. Isto porque o responsável pelo recolhimento para o Funrural era o empregador, não o empregado. - Para comprovar sua condição de rurícola, a autora juntou certidão de nascimento dos filhos lavradas em 06.09.1985, 28.01.1988, 28.07.1991, nas quais o marido está qualificado como lavrador; cópias da CTPS do marido, apontando vínculo de trabalho rural de 03.01.2000 a 30.04.2001, e vínculo de trabalho urbano de 01.10.1998 a 30.06.1999 e de 01.02.2002 sem data de saída. A autora trouxe ainda, às fls. 61/67, escritura pública lavrada em 16.06.2011 referente à aquisição de área rural de 6,21 ha, localizada em Três Lagos-MS. - A consulta ao CNIS não aponta vínculo de trabalho em nome da autora e, quanto ao marido, não confirma o vínculo de trabalho com início em 01.02.2002 e demonstra, ainda, vínculo rural de 02.10.2012 a 15.05.2013, sendo beneficiário de amparo social ao idoso, desde 08.03.2016. Os vínculos urbanos do marido da autora são insuficientes para afastar a presunção do efetivo trabalho rural da autora no período de carência, sobretudo na data do requerimento administrativo. - Com efeito, a jurisprudência consolidou-se no sentido de que "para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige que o início de prova material corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício" (Súmula nº 14 TNU) e ainda que o rol de documentos previsto no art. 106, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91 é meramente exemplificativo. - Quanto à contemporaneidade dos documentos, a prova material indiciária precisa ter sido formada em qualquer instante do período de atividade rural que se pretende comprovar. Dentro do intervalo que se pretende comprovar, o documento pode ter sido formado no início, no meio ou no fim do período. A prova material pode ser contemporânea ao início do período de carência e ter sua eficácia probatória estendida prospectivamente (para o futuro) se conjugada com prova testemunhal complementar convincente e harmônica. Igualmente, pode ser contemporânea ao final do período de carência e ter sua eficácia estendida retroativamente (para o passado) se conjugada com prova testemunhal complementar convincente e harmônica. A jurisprudência da TNU está pacificada no sentido de admitir a eficácia retrospectiva e prospectiva dos documentos indiciários do exercício de atividade rural. - A prova testemunhal, por sua vez, confirmou o trabalho rural da autora, inclusive quando completados os 55 anos de idade e na data do requerimento administrativo, em 15.05.2014, nos termos do exigido no REsp 1.354.908/SP, com o que é viável a concessão do benefício. - Comprovado o requerimento na via administrativa, o benefício é devido desde essa data. - As parcelas vencidas serão acrescidas de correção monetária a partir dos respectivos vencimentos e de juros moratórios a partir da citação. - A correção monetária será aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente, de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, observados os termos do julgamento final proferido na Repercussão Geral no RE 870.947, em 20/09/2017. - Os juros moratórios serão calculados de forma global para as parcelas vencidas antes da citação, e incidirão a partir dos respectivos vencimentos para as parcelas vencidas após a citação. E serão de 0,5% (meio por cento) ao mês, na forma dos arts. 1.062 do antigo CC e 219 do CPC/1973, até a vigência do CC/2002, a partir de quando serão de 1% (um por cento) ao mês, na forma dos arts. 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN. A partir de julho de 2.009, os juros moratórios serão de 0,5% (meio por cento) ao mês, observado o disposto no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, alterado pelo art. 5º da Lei n. 11.960/2009, pela MP n. 567, de 13.05.2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07.08.2012, e legislação superveniente. - Tratando-se de decisão ilíquida, o percentual da verba honorária será fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, ambos do CPC/2015, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data desta decisão (Súmula 111 do STJ). - Apelação provida. Sentença reformada.
Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Juiz Federal Convocado Otávio Port, que foi acompanhado pelo Desembargador Federal Gilberto Jordan e pela Desembargadora Federal Ana Pezarini (que votou nos termos do art. 942 "caput" e §1º do CPC). Vencido o Relator que lhe negava provimento. Julgamento nos termos do disposto no artigo 942 "caput" e § 1º do CPC.

Data do Julgamento : 11/12/2017
Data da Publicação : 07/03/2018
Classe/Assunto : Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2271641
Órgão Julgador : NONA TURMA
Relator(a) : JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS
Comarca : TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo : Acórdão
Relator para acórdão : JUIZ CONVOCADO OTAVIO PORT
Indexação : VIDE EMENTA.
Fonte da publicação : e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/03/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:
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