TRF3 0002896-87.2010.4.03.6000 00028968720104036000
ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. MILITAR DAS FILEIRAS DO EXÉRCITO
BRASILEIRO. PRESCRIÇÃO AFASTADA. CONDIÇÃO DE ANISTIADO POLÍTICO. ARTIGO
8º DO ADCT DA CF/88. LEI Nº 10.559. PORTARIA Nº 1.104/64. INGRESSO
NAS FORÇAS ARMADAS POSTERIOR À REFERIDA PORTARIA. NECESSIDADE DE PROVA
INEQUÍVOCA DO CARÁTER ESCLUSIVAMENTE POLÍTICO DO ATO DE EXCEÇÃO. NÃO
COMPROVAÇÃO. AFASTAMENTO SOB O FUNDAMENTO DA PORTARIA 1.104/64. NÃO
VERIFICAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REDUÇÃO. APELAÇÃO DA UNIÃO
PROVIDA. APELAÇÕES NÃO PROVIDAS.
1. Cumpre observar preliminarmente que não há que se falar na prescrição
de fundo do direito, no concernente aos direitos advindos do art. 8º,
da ADCT da CF/88, regulamentada pela Lei nº 10.559/02.
2. A anistia concedida pelo referido dispositivo não é atingida pelo
fenômeno da prescrição porquanto o ordenamento não estabelece prazo algum
para o exercício de tal direito, assim, não cabe ao intérprete limitar seu
alcance. Precedentes (TRF2-6ª Turma Especializada, AC 2006.51.01.004180-1/RJ,
Rel. Des. Fed. FERNANDO MARQUES, unânime, DJU de 27.02.2007), (TRF2-3ª
Turma, AC 2001.51.01.002147-6/RJ, Rel. Des. Fed. TANIA HEINE, unânime, DJU
de 20.02.2004), (TRF2-5ª Turma Especializada, AC 2002.51.01.022497-5/RJ,
Rel. Des. Fed. VERA LÚCIA, unânime, DJU de 11.10.2007), (APELREEX
00455787319954036100, JUÍZA CONVOCADA GISELLE FRANÇA, TRF3 - PRIMEIRA TURMA,
e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/07/2012).
3. Porém, prescritas estão as parcelas anteriores ao quinquênio que
antecedem a propositura da ação, conforme já decidiu o STJ: "em se tratando
de relação de trato sucessivo, não havendo negativa ao próprio direito
reclamado, só há prescrição para as parcelas vencidas antes dos cinco
anos anteriores à propositura da ação" (Súmula 85/STJ).
4. De início, cumpre observar que com o advento da CF/88, o art. 8º
do ADCT, este posteriormente regulamentado pela Lei nº 10.559/02, ficou
abarcada a condição de anistiado político e seus efeitos, à necessária
comprovação de que o afastamento tenha se dado por exclusiva motivação
política. Como se pode notar, o reconhecimento do ex-militar como anistiado
político depende da comprovação de que o ato que ensejou o afastamento
tenha efetivamente decorrido de motivação política.
5. É certo que a Portaria 1.104-GM3/64 disciplinou, dentre outros assuntos,
as hipóteses de licenciamento do militar temporário, estabelecendo as regras
de engajamento e reengajamento, condições e requisitos para a prorrogação,
condicionada à necessidade de serviço, até o término do tempo de serviço.
6. Em que pese a Portaria nº 1.104/64-GM3 de 1964, tenha sido reconhecida
pela Administração Pública como ato de exceção de natureza exclusivamente
política, o simples fato de o licenciamento ter sido fundamentado em referido
ato, por si só, não garante a condição aos ex-militares licenciados de
serem considerados perseguidos políticos, há a necessidade de comprovação
de efetiva motivação política.
7. O STJ tem jurisprudência firmada de que, "para o reconhecimento da
condição de anistiado, deve o cabo incluído no serviço ativo da Força
Aérea posteriormente à edição da Portaria nº 1.104-GM3/64 comprovar
a configuração da perseguição política, não havendo como atribuir
conteúdo político ao ato que determinou o licenciamento por conclusão
do tempo de serviço, permitido na forma da legislação então vigente"
(AGREsp 201000886609, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Primeira Turma do STJ,
DJ de 02/02/2011).
8. Do compulsar dos autos, nota-se que o autor foi convocado para o serviço
militar para prestação de serviços nas fileiras do Exército Brasileiro em
24/01/1967 (fls. 43), e foi desincorporado do serviço militar em 05/07/1967
(fls. 44).
9. Desta feita, inconteste que o autor ingressou no serviço militar
posteriormente à edição da Portaria nº 1.104-GM3 de 1964. Ressalte-se que
o autor não pertencia aos quadros das Forças Armadas, tanto no Exercito
ou na Aeronáutica, em 1964, ano em que ocorreram diversas manifestações
políticas em face do regime e que participaram muitos militares, ensejando
as edições de medidas administrativas tidas como punitivas.
10. Neste aspecto, em relação ao autor, a Portaria n 1.104/64 não pode ser
aplicada como ato de exceção, eis que na ocasião do ingresso do militar
nas Forças Armadas - neste caso no Exército - referida portaria era norma
preexistente, geral e abstrata.
11. Em tese, não se nega a possibilidade de reconhecimento de ex-militares
como anistiados políticos após a edição da Portaria nº 1.104/64,
desde que seja comprovado que o afastamento tenha se dado por evidente
perseguição política. Como se pode notar, infere-se dos autos que o autor
foi desincorporado das fileiras do Exército Ativo e excluído do estado
efetivo, de acordo com o artigo 140, nº 5, §5º do Decreto nº 57.654, de 20
de janeiro de 1966, o qual regulamentava a Lei do Serviço Militar. (fls. 44)
12. Diferentemente dos argumentos desenvolvidos na exordial, o autor não
foi excluído em razão da Portaria nº 1.104 de 1964, sendo que esta nem
constou das folhas de seus assentamentos (fls. 43/44). Ao invés disto,
a desincorporação foi motivada pelo artigo 140, n.5, §5º, n.2, da Lei
do Serviço Militar (Decreto nº 57.654/66), que determina os requisitos,
as condições e hipóteses em que se dará a desincorporação dos militares
das Forças do Exército Brasileiro.
13. Em última análise, de se verificar que o ex-militar foi anistiado -
perdoado - do crime de insubmissão em 15 de junho de 1967, conforme consta
às fls. 43. Sendo que tal "anistia" deve ser interpretada de forma genérica
no sentido de "perdão" e não na forma jurídica, no sentido constitucional
da anistia política concedida pela CF/88.
14. Como se observa, o autor não logrou êxito em comprovar que o ato
administrativo que determinou seu afastamento do serviço ativo tenha se
dado efetiva e exclusivamente por perseguição política ou, ainda, que
tenha participado de algum movimento político contrário ao regime vigente
à época.
15. Importante assinalar que resta notório da documentação acostada aos
autos, que o autor foi perdoado (anistiado) do crime de insubmissão e,
em seguida, atingiu o limite de 30 anos de idade para a desincorporação,
e, tendo sido absolvido em processo disciplinar, fez jus ao Certificado de
Dispensa de Incorporação ou de Reservista, nos termos dos requisitos do
citado Decreto.
16. Convém notar, igualmente, que o ato de desincorporação não se deu de
forma repentina e inesperada, na medida em que, na ocasião da incorporação
do autor aos quadros do Exército Brasileiro, já se encontravam vigentes as
disposições contidas na Portaria nº 1.104/64, bem como, especificamente as
regras inerentes à desincorporação dos militares do Decreto nº 57.654/66
(Lei do Serviço Militar). Precedentes.
17. Por conseguinte, diante jurisprudência firmada pelo STJ e das Cortes
regionais pátrias, nos casos de militares que ingressaram no serviço ativo
das Forças Armadas posteriormente à edição da Portaria n. 1.104-GM3/64,
a anistia está condicionada à comprovação efetiva da ocorrência de
perseguição política, não havendo como atribuir caráter exclusivamente
político ao ato que determinou a desincorporação do autor, com fundamento
no artigo 140, n.5, §5º, n.2, do Decreto nº 57.654/66 (Lei do Serviço
Militar), permitida na forma da legislação então vigente.
18. Apelação da União provida e apelações do autor não providas.
Ementa
ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. MILITAR DAS FILEIRAS DO EXÉRCITO
BRASILEIRO. PRESCRIÇÃO AFASTADA. CONDIÇÃO DE ANISTIADO POLÍTICO. ARTIGO
8º DO ADCT DA CF/88. LEI Nº 10.559. PORTARIA Nº 1.104/64. INGRESSO
NAS FORÇAS ARMADAS POSTERIOR À REFERIDA PORTARIA. NECESSIDADE DE PROVA
INEQUÍVOCA DO CARÁTER ESCLUSIVAMENTE POLÍTICO DO ATO DE EXCEÇÃO. NÃO
COMPROVAÇÃO. AFASTAMENTO SOB O FUNDAMENTO DA PORTARIA 1.104/64. NÃO
VERIFICAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REDUÇÃO. APELAÇÃO DA UNIÃO
PROVIDA. APELAÇÕES NÃO PROVIDAS.
1. Cumpre observar preliminarmente que não há que se falar na prescrição
de fundo do direito, no concernente aos direitos advindos do art. 8º,
da ADCT da CF/88, regulamentada pela Lei nº 10.559/02.
2. A anistia concedida pelo referido dispositivo não é atingida pelo
fenômeno da prescrição porquanto o ordenamento não estabelece prazo algum
para o exercício de tal direito, assim, não cabe ao intérprete limitar seu
alcance. Precedentes (TRF2-6ª Turma Especializada, AC 2006.51.01.004180-1/RJ,
Rel. Des. Fed. FERNANDO MARQUES, unânime, DJU de 27.02.2007), (TRF2-3ª
Turma, AC 2001.51.01.002147-6/RJ, Rel. Des. Fed. TANIA HEINE, unânime, DJU
de 20.02.2004), (TRF2-5ª Turma Especializada, AC 2002.51.01.022497-5/RJ,
Rel. Des. Fed. VERA LÚCIA, unânime, DJU de 11.10.2007), (APELREEX
00455787319954036100, JUÍZA CONVOCADA GISELLE FRANÇA, TRF3 - PRIMEIRA TURMA,
e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/07/2012).
3. Porém, prescritas estão as parcelas anteriores ao quinquênio que
antecedem a propositura da ação, conforme já decidiu o STJ: "em se tratando
de relação de trato sucessivo, não havendo negativa ao próprio direito
reclamado, só há prescrição para as parcelas vencidas antes dos cinco
anos anteriores à propositura da ação" (Súmula 85/STJ).
4. De início, cumpre observar que com o advento da CF/88, o art. 8º
do ADCT, este posteriormente regulamentado pela Lei nº 10.559/02, ficou
abarcada a condição de anistiado político e seus efeitos, à necessária
comprovação de que o afastamento tenha se dado por exclusiva motivação
política. Como se pode notar, o reconhecimento do ex-militar como anistiado
político depende da comprovação de que o ato que ensejou o afastamento
tenha efetivamente decorrido de motivação política.
5. É certo que a Portaria 1.104-GM3/64 disciplinou, dentre outros assuntos,
as hipóteses de licenciamento do militar temporário, estabelecendo as regras
de engajamento e reengajamento, condições e requisitos para a prorrogação,
condicionada à necessidade de serviço, até o término do tempo de serviço.
6. Em que pese a Portaria nº 1.104/64-GM3 de 1964, tenha sido reconhecida
pela Administração Pública como ato de exceção de natureza exclusivamente
política, o simples fato de o licenciamento ter sido fundamentado em referido
ato, por si só, não garante a condição aos ex-militares licenciados de
serem considerados perseguidos políticos, há a necessidade de comprovação
de efetiva motivação política.
7. O STJ tem jurisprudência firmada de que, "para o reconhecimento da
condição de anistiado, deve o cabo incluído no serviço ativo da Força
Aérea posteriormente à edição da Portaria nº 1.104-GM3/64 comprovar
a configuração da perseguição política, não havendo como atribuir
conteúdo político ao ato que determinou o licenciamento por conclusão
do tempo de serviço, permitido na forma da legislação então vigente"
(AGREsp 201000886609, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Primeira Turma do STJ,
DJ de 02/02/2011).
8. Do compulsar dos autos, nota-se que o autor foi convocado para o serviço
militar para prestação de serviços nas fileiras do Exército Brasileiro em
24/01/1967 (fls. 43), e foi desincorporado do serviço militar em 05/07/1967
(fls. 44).
9. Desta feita, inconteste que o autor ingressou no serviço militar
posteriormente à edição da Portaria nº 1.104-GM3 de 1964. Ressalte-se que
o autor não pertencia aos quadros das Forças Armadas, tanto no Exercito
ou na Aeronáutica, em 1964, ano em que ocorreram diversas manifestações
políticas em face do regime e que participaram muitos militares, ensejando
as edições de medidas administrativas tidas como punitivas.
10. Neste aspecto, em relação ao autor, a Portaria n 1.104/64 não pode ser
aplicada como ato de exceção, eis que na ocasião do ingresso do militar
nas Forças Armadas - neste caso no Exército - referida portaria era norma
preexistente, geral e abstrata.
11. Em tese, não se nega a possibilidade de reconhecimento de ex-militares
como anistiados políticos após a edição da Portaria nº 1.104/64,
desde que seja comprovado que o afastamento tenha se dado por evidente
perseguição política. Como se pode notar, infere-se dos autos que o autor
foi desincorporado das fileiras do Exército Ativo e excluído do estado
efetivo, de acordo com o artigo 140, nº 5, §5º do Decreto nº 57.654, de 20
de janeiro de 1966, o qual regulamentava a Lei do Serviço Militar. (fls. 44)
12. Diferentemente dos argumentos desenvolvidos na exordial, o autor não
foi excluído em razão da Portaria nº 1.104 de 1964, sendo que esta nem
constou das folhas de seus assentamentos (fls. 43/44). Ao invés disto,
a desincorporação foi motivada pelo artigo 140, n.5, §5º, n.2, da Lei
do Serviço Militar (Decreto nº 57.654/66), que determina os requisitos,
as condições e hipóteses em que se dará a desincorporação dos militares
das Forças do Exército Brasileiro.
13. Em última análise, de se verificar que o ex-militar foi anistiado -
perdoado - do crime de insubmissão em 15 de junho de 1967, conforme consta
às fls. 43. Sendo que tal "anistia" deve ser interpretada de forma genérica
no sentido de "perdão" e não na forma jurídica, no sentido constitucional
da anistia política concedida pela CF/88.
14. Como se observa, o autor não logrou êxito em comprovar que o ato
administrativo que determinou seu afastamento do serviço ativo tenha se
dado efetiva e exclusivamente por perseguição política ou, ainda, que
tenha participado de algum movimento político contrário ao regime vigente
à época.
15. Importante assinalar que resta notório da documentação acostada aos
autos, que o autor foi perdoado (anistiado) do crime de insubmissão e,
em seguida, atingiu o limite de 30 anos de idade para a desincorporação,
e, tendo sido absolvido em processo disciplinar, fez jus ao Certificado de
Dispensa de Incorporação ou de Reservista, nos termos dos requisitos do
citado Decreto.
16. Convém notar, igualmente, que o ato de desincorporação não se deu de
forma repentina e inesperada, na medida em que, na ocasião da incorporação
do autor aos quadros do Exército Brasileiro, já se encontravam vigentes as
disposições contidas na Portaria nº 1.104/64, bem como, especificamente as
regras inerentes à desincorporação dos militares do Decreto nº 57.654/66
(Lei do Serviço Militar). Precedentes.
17. Por conseguinte, diante jurisprudência firmada pelo STJ e das Cortes
regionais pátrias, nos casos de militares que ingressaram no serviço ativo
das Forças Armadas posteriormente à edição da Portaria n. 1.104-GM3/64,
a anistia está condicionada à comprovação efetiva da ocorrência de
perseguição política, não havendo como atribuir caráter exclusivamente
político ao ato que determinou a desincorporação do autor, com fundamento
no artigo 140, n.5, §5º, n.2, do Decreto nº 57.654/66 (Lei do Serviço
Militar), permitida na forma da legislação então vigente.
18. Apelação da União provida e apelações do autor não providas.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, dar provimento à apelação da União e negar provimento
às apelações do autor, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
13/06/2017
Data da Publicação
:
29/06/2017
Classe/Assunto
:
ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2158365
Órgão Julgador
:
PRIMEIRA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/06/2017
..FONTE_REPUBLICACAO:
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