TRF3 0002934-95.2007.4.03.6100 00029349520074036100
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO. AÇÃO
DE RITO ORDINÁRIO INTENTADA CONTRA A OAB/SP. INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. MAGISTRADO INSERIDO EM "LISTA NEGRA" DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL
- SECÇÃO SÃO PAULO. DESCABIMENTO. OFENSA A DIREITOS DA PERSONALIDADE
ASSEGURADOS PELA CARTA MAGNA. DANO MORAL CONFIGURADO. APELAÇÃO DA
OAB/SP. VALOR DA INDENIZAÇÃO. CONHECIDA EM PARTE E PARCIALMENTE
PROVIDA. APELAÇÃO DA REQUERENTE PARCIALMENTE PROVIDA
- O exame do pedido posto na peça inicial está delimitado ao pagamento
de indenização por danos morais decorrentes de "indevida inserção do
nome do requerente na lista negra da OAB", descabido, portanto, apreciar o
mérito da decisão administrativa tomada pela instituição requerida.
- Imperioso destacar o caráter público da função exercida pela OAB,
reconhecido no âmbito do STF, que passou inclusive a ser intitulada autarquia
sui generis (ADI 3026, Rel. Min. Eros Grau, Plenário, j. 08/06/2006).
- Considerada não integrante da administração pública, mas reconhecido
exercer função pública indispensável à administração da justiça,
são aplicáveis à instituição os primados do artigo 37 da CF/1988,
realçado, para o presente caso, o preceito contido em seu § 6º: "as
pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras
de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa
qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o
responsável nos casos de dolo ou culpa".
- Anote-se, ainda, o teor prescrito pelo Estatuto da Advocacia e Regulamento
Interno da OAB, a Lei nº 8.906/1994, artigos 6º, 7º e 44, bem como os
termos insculpidos em seu Regimento Interno, artigo 77 e seguintes, no sentido
de que é conferido ao advogado o direito de ser tratado, em igualdade,
como membro da magistratura e do Ministério Público, bem como deferido o
desagravo público, caso comprovadamente ofendido no exercício profissional.
- O tema sub judice encontra regulamentação, também, na Lei Orgânica da
Magistratura, Lei Complementar nº 35/1979, que prescreve em seu artigo 35 ser
dever do magistrado "tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério
Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da
Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quanto se
trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência".
- A Lei Orgânica da Magistratura prescreve, em seu artigo 41: "salvo os casos
de impropriedade ou excesso de linguagem o magistrado não pode ser punido
ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões
que proferir."
- Nos termos do artigo 5º, inciso X, da CF/1988, c.c. o artigo 186 do CC, a
violação dos direitos à intimidade, vida privada, honra e imagem assegura
indenização por danos materiais e morais, motivo pelo qual foi intentada a
presente demanda indenizatória com o escopo de ser a autarquia condenada ao
pagamento de valor equivalente a três vezes o vencimento de um magistrado
estadual, vigente na ocasião do pagamento.
- A Ordem dos Advogados do Brasil presta relevante serviço público e é
instituição que integra a administração da justiça, com personalidade
jurídica de caráter "ímpar". O reconhecimento de sua natureza jurídica
sui generis pelo STF, contudo, não significa que possa escapar aos ditames
legais e deixar de observar o ordenamento pátrio. Ao revés, deve-lhe maior
cumprimento ainda, porquanto desempenha atividade própria de Estado, atrelada
à defesa da Constituição, da ordem jurídica, do Estado Democrático de
Direito, dos direitos humanos, da justiça social e, também essência de sua
criação, à fiscalização do regular exercício da advocacia (RE 259976,
Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, j. 23/03/2010).
- A publicidade dos julgamentos proferidos nos processos de desagravo ou
moção de repúdio (artigo 7º, XII, da Lei nº 8.906/1994) pela OAB revela-se
medida de salvaguarda do livre exercício profissional. A divulgação ora
combatida, entretanto, não se amolda à mens legis - configura instrumento
que ofende a imagem pessoal e profissional das autoridades e particulares
ali listados por extrapolar os limites legalmente preceituados, uma vez
que vai além da proteção do exercício digno da advocacia prevista no
ordenamento nacional.
- Indiferente se foi ou não a autarquia que alcunhou as listas com os
mencionados títulos, pois a eles deu causa, na medida em que as criou,
atuação que extrapola os limites da razoabilidade na divulgação dos
julgamentos proferidos.
- Ponderado o todo consignado - elementos probatórios dos autos apontados,
legislação norteadora do tema e entendimento jurisprudencial -, verifica-se
comprovada a atuação ilegal da requerida, consistente na utilização de
forma indevida de divulgação do resultado do procedimento de desagravo
(moção de repúdio) relativo ao requerente, com inserção de seu nome em
"lista de inimigos da advocacia", possibilitada a instituição de penalidade
não contemplada na legislação, qual seja, evitar sua futura inscrição
nos quadros da autarquia. Presente, da mesma forma, o liame entre tal conduta
e o dano moral experimentado pelo autor, violação aos seus direitos de
personalidade (em especial imagem e honra) de sorte que se torna imperiosa a
responsabilização da OAB/SP pelo prejuízo sofrido, nos termos dos artigos
5º, V e 37, § 6º, da CF/1988, artigo 186 do CC e dos demais regramentos
norteadores da quaestio, nos exatos termos da sentença recorrida.
- Quanto ao pedido de pagamento do valor da publicação da sentença no
jornal "Folha de São Paulo", que o decisum recorrido acolheu, entendo que
merece reforma. O direito de resposta previsto no artigo 5º, inciso V,
da Constituição Federal não se confunde com o pleito da recorrida. Até
mesmo na malsinada Lei de Imprensa (Lei nº 5.250/67), não recepcionada pela
Constituição de 1988 (ADPF nº 130/DF-STF), o instituto não tinha feição
que se lhe quer dar. De qualquer forma, deve-se atentar para o princípio
da simetria e proporcionalidade. Não há notícia de que a lista com nome
da autora tenha sido publicada no referido periódico ou que os efeitos de
uma tal publicação equivalham à ofensa perpetrada.
- Há de se considerar, para a fixação do importe indenizatório, os
contornos fáticos da lide em sua integralidade. Significa dizer que o julgador
não fica adstrito ao fato originador dos danos, pois imperioso ponderar
a realidade e o perfil das partes envolvidas, como a situação financeira
de quem sofreu o malefício e de quem o causou, amoldada a condenação à
situação econômica das partes, de modo que seja fixado montante apto a
reparar o prejuízo moral e, de igual modo, desestimular o agente que o causou
de repetir o comportamento combatido, sem que se verifique enriquecimento
indevido à custa de imposição excessiva àquele que ocasionou a lesão.
- Na situação dos autos, o valor fixado pela instância a qua não
se demonstra suficiente, eis que é inferior ao valor de um salário
da magistrada. De outro lado R$ 300.000,00 é exacerbado, à vista das
características do caso. Entendo que o valor de R$ 50.000,00 atende aos
parâmetros mencionados e se revela proporcional e razoável. A OAB sem
dúvida tem capacidade econômica para arcar com o montante, o qual de forma
alguma gerará indevido enriquecimento do autor, ou seja, não transborda seu
caráter educativo, tampouco implica locupletamento sem causa do apelado. Ao
revés, revela valor que repara minimamente o abalo psíquico sofrido.
- Apelação da OAB conhecida em parte e, na parte conhecida, parcialmente
provida. Apelação da autora parcialmente provida.
Ementa
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO. AÇÃO
DE RITO ORDINÁRIO INTENTADA CONTRA A OAB/SP. INDENIZAÇÃO POR DANOS
MORAIS. MAGISTRADO INSERIDO EM "LISTA NEGRA" DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL
- SECÇÃO SÃO PAULO. DESCABIMENTO. OFENSA A DIREITOS DA PERSONALIDADE
ASSEGURADOS PELA CARTA MAGNA. DANO MORAL CONFIGURADO. APELAÇÃO DA
OAB/SP. VALOR DA INDENIZAÇÃO. CONHECIDA EM PARTE E PARCIALMENTE
PROVIDA. APELAÇÃO DA REQUERENTE PARCIALMENTE PROVIDA
- O exame do pedido posto na peça inicial está delimitado ao pagamento
de indenização por danos morais decorrentes de "indevida inserção do
nome do requerente na lista negra da OAB", descabido, portanto, apreciar o
mérito da decisão administrativa tomada pela instituição requerida.
- Imperioso destacar o caráter público da função exercida pela OAB,
reconhecido no âmbito do STF, que passou inclusive a ser intitulada autarquia
sui generis (ADI 3026, Rel. Min. Eros Grau, Plenário, j. 08/06/2006).
- Considerada não integrante da administração pública, mas reconhecido
exercer função pública indispensável à administração da justiça,
são aplicáveis à instituição os primados do artigo 37 da CF/1988,
realçado, para o presente caso, o preceito contido em seu § 6º: "as
pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras
de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa
qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o
responsável nos casos de dolo ou culpa".
- Anote-se, ainda, o teor prescrito pelo Estatuto da Advocacia e Regulamento
Interno da OAB, a Lei nº 8.906/1994, artigos 6º, 7º e 44, bem como os
termos insculpidos em seu Regimento Interno, artigo 77 e seguintes, no sentido
de que é conferido ao advogado o direito de ser tratado, em igualdade,
como membro da magistratura e do Ministério Público, bem como deferido o
desagravo público, caso comprovadamente ofendido no exercício profissional.
- O tema sub judice encontra regulamentação, também, na Lei Orgânica da
Magistratura, Lei Complementar nº 35/1979, que prescreve em seu artigo 35 ser
dever do magistrado "tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério
Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da
Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quanto se
trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência".
- A Lei Orgânica da Magistratura prescreve, em seu artigo 41: "salvo os casos
de impropriedade ou excesso de linguagem o magistrado não pode ser punido
ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões
que proferir."
- Nos termos do artigo 5º, inciso X, da CF/1988, c.c. o artigo 186 do CC, a
violação dos direitos à intimidade, vida privada, honra e imagem assegura
indenização por danos materiais e morais, motivo pelo qual foi intentada a
presente demanda indenizatória com o escopo de ser a autarquia condenada ao
pagamento de valor equivalente a três vezes o vencimento de um magistrado
estadual, vigente na ocasião do pagamento.
- A Ordem dos Advogados do Brasil presta relevante serviço público e é
instituição que integra a administração da justiça, com personalidade
jurídica de caráter "ímpar". O reconhecimento de sua natureza jurídica
sui generis pelo STF, contudo, não significa que possa escapar aos ditames
legais e deixar de observar o ordenamento pátrio. Ao revés, deve-lhe maior
cumprimento ainda, porquanto desempenha atividade própria de Estado, atrelada
à defesa da Constituição, da ordem jurídica, do Estado Democrático de
Direito, dos direitos humanos, da justiça social e, também essência de sua
criação, à fiscalização do regular exercício da advocacia (RE 259976,
Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, j. 23/03/2010).
- A publicidade dos julgamentos proferidos nos processos de desagravo ou
moção de repúdio (artigo 7º, XII, da Lei nº 8.906/1994) pela OAB revela-se
medida de salvaguarda do livre exercício profissional. A divulgação ora
combatida, entretanto, não se amolda à mens legis - configura instrumento
que ofende a imagem pessoal e profissional das autoridades e particulares
ali listados por extrapolar os limites legalmente preceituados, uma vez
que vai além da proteção do exercício digno da advocacia prevista no
ordenamento nacional.
- Indiferente se foi ou não a autarquia que alcunhou as listas com os
mencionados títulos, pois a eles deu causa, na medida em que as criou,
atuação que extrapola os limites da razoabilidade na divulgação dos
julgamentos proferidos.
- Ponderado o todo consignado - elementos probatórios dos autos apontados,
legislação norteadora do tema e entendimento jurisprudencial -, verifica-se
comprovada a atuação ilegal da requerida, consistente na utilização de
forma indevida de divulgação do resultado do procedimento de desagravo
(moção de repúdio) relativo ao requerente, com inserção de seu nome em
"lista de inimigos da advocacia", possibilitada a instituição de penalidade
não contemplada na legislação, qual seja, evitar sua futura inscrição
nos quadros da autarquia. Presente, da mesma forma, o liame entre tal conduta
e o dano moral experimentado pelo autor, violação aos seus direitos de
personalidade (em especial imagem e honra) de sorte que se torna imperiosa a
responsabilização da OAB/SP pelo prejuízo sofrido, nos termos dos artigos
5º, V e 37, § 6º, da CF/1988, artigo 186 do CC e dos demais regramentos
norteadores da quaestio, nos exatos termos da sentença recorrida.
- Quanto ao pedido de pagamento do valor da publicação da sentença no
jornal "Folha de São Paulo", que o decisum recorrido acolheu, entendo que
merece reforma. O direito de resposta previsto no artigo 5º, inciso V,
da Constituição Federal não se confunde com o pleito da recorrida. Até
mesmo na malsinada Lei de Imprensa (Lei nº 5.250/67), não recepcionada pela
Constituição de 1988 (ADPF nº 130/DF-STF), o instituto não tinha feição
que se lhe quer dar. De qualquer forma, deve-se atentar para o princípio
da simetria e proporcionalidade. Não há notícia de que a lista com nome
da autora tenha sido publicada no referido periódico ou que os efeitos de
uma tal publicação equivalham à ofensa perpetrada.
- Há de se considerar, para a fixação do importe indenizatório, os
contornos fáticos da lide em sua integralidade. Significa dizer que o julgador
não fica adstrito ao fato originador dos danos, pois imperioso ponderar
a realidade e o perfil das partes envolvidas, como a situação financeira
de quem sofreu o malefício e de quem o causou, amoldada a condenação à
situação econômica das partes, de modo que seja fixado montante apto a
reparar o prejuízo moral e, de igual modo, desestimular o agente que o causou
de repetir o comportamento combatido, sem que se verifique enriquecimento
indevido à custa de imposição excessiva àquele que ocasionou a lesão.
- Na situação dos autos, o valor fixado pela instância a qua não
se demonstra suficiente, eis que é inferior ao valor de um salário
da magistrada. De outro lado R$ 300.000,00 é exacerbado, à vista das
características do caso. Entendo que o valor de R$ 50.000,00 atende aos
parâmetros mencionados e se revela proporcional e razoável. A OAB sem
dúvida tem capacidade econômica para arcar com o montante, o qual de forma
alguma gerará indevido enriquecimento do autor, ou seja, não transborda seu
caráter educativo, tampouco implica locupletamento sem causa do apelado. Ao
revés, revela valor que repara minimamente o abalo psíquico sofrido.
- Apelação da OAB conhecida em parte e, na parte conhecida, parcialmente
provida. Apelação da autora parcialmente provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,
por unanimidade, conhecer de parte do apelo da OAB e, na parte conhecida,
dar-lhe parcial provimento a fim de excluir da condenação a obrigação
de pagar publicação da sentença no jornal "Folha de São Paulo", bem
como dar parcial provimento ao apelo da autora a fim de majorar o valor da
indenização para R$ 50.000,00, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
04/07/2018
Data da Publicação
:
30/07/2018
Classe/Assunto
:
Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1556129
Órgão Julgador
:
QUARTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRE NABARRETE
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:30/07/2018
..FONTE_REPUBLICACAO:
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