TRF3 0002951-48.2008.4.03.6181 00029514820084036181
PROCESSO PENAL. ART. 1º, I, C. C. O ART. 12 DA LEI N. 8.137/90. SIGILO
BANCÁRIO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. QUEBRA. ADMISSIBILIDADE. MINISTÉRIO
PÚBLICO. SIGILO BANCÁRIO. REQUISIÇÃO DIRETAMENTE À RECEITA
FEDERAL. ADMISSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS.
1. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do
Recurso Especial Representativo de Controvérsia n. 1.134.665/SP, firmou
o entendimento de que é lícito ao Fisco receber informações sobre a
movimentação bancária dos contribuintes sem a necessidade de prévia
autorização judicial, desde que seja resguardado o sigilo das informações,
a teor do art. 1º, § 3º, VI, c. c. o art. 5º, caput, da Lei Complementar
n. 105/01, c. c. o art. 11, §§ 2º e 3º, da Lei n. 9.311/96.
2. A controvérsia cinge-se ao emprego dessa prova para fins de instrução de
processo-crime, pois há entendimento tanto no sentido de que para isso seria
imprescindível decisão judicial para a quebra do sigilo bancário (STJ,
HC n. 243.034, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 26.08.14, AGRESP n. 201300982789,
Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 19.08.14, RHC n. 201303405552,
Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 11.02.14), quanto no sentido de que,
tendo sido a prova produzida validamente no âmbito administrativo, não
há como invalidá-la posteriormente. Filio-me a esse entendimento, dado
não se conceber nulidade a posteriori: a autoridade fiscal tem o dever
jurídico (vinculado) de, ao concluir o lançamento de crédito constituído
em decorrência de crime fiscal, proceder à respectiva comunicação ao
Ministério Público para a propositura de ação penal. Não se compreende
como, ao assim fazer, acabe por inviabilizar a persecutio criminis.
3. Resta confirmada a validade da aplicação imediata da Lei Complementar
n. 105/01 em relação a fatos ocorridos anteriormente a sua vigência,
pois se trata de norma caráter procedimental.
4. Anoto que o Plenário do Supremo Tribunal Federal pronunciou-se sobre a
constitucionalidade do referido procedimento no RE n. 601.314, com acórdão
publicado em 16.09.16, bem como nas ADIs ns. 2390, 2859, 2397 e 2386,
publicados os respectivos acórdãos em 21.10.16.
5. O Supremo Tribunal Federal admitiu a transferência do sigilo bancário
ao Fisco, o que não atentaria contra a intimidade do contribuinte,
na medida em que as informações sigilosas remanesceriam cobertas pela
aludida proteção. Assim, os dados bancários permaneceriam insuscetíveis
de divulgação. Ressalvou, contudo, que o Fisco pode utilizar tais dados,
não apenas no âmbito administrativo (o processo administrativo fiscal tem
caráter sigiloso), como também para que sejam usados pela Advocacia-Geral
da União em Juízo.
6. No julgamento em referência, no que tange à impugnação aos arts. 5º
e 6º da Lei Complementar n. 105/01, ponto central das ações diretas
de inconstitucionalidade, o Relator Ministro Dias Toffoli destacou que a
transferência de dados para outro órgão da administração pública não
desnatura o caráter sigiloso da movimentação bancária do contribuinte.
7. No mesmo julgamento, relativamente à impugnação ao art. 3º, § 3º,
da Lei Complementar n. 105/01, que prevê que o Banco Central do Brasil e
a Comissão de Valores Mobiliários forneçam à Advocacia-Geral da União
"as informações e documentos necessários à defesa da União nas ações
que seja parte", registrou o Relator Ministro Dias Toffoli.
8. Não se concebe que, admitida a "judicialização" pelo Supremo Tribunal
Federal, seja ela válida somente para a cobrança do crédito tributário,
mas não para a punição do respectivo sonegador. Cumpre destacar, como o
fez o Relator Ministro Dias Toffoli, "(...) que o instrumento fiscalizatório
instituído nos arts. 5º e 6º da Lei Complementar nº 105/2001 se mostra
de extrema significância ao efetivo combate à sonegação fiscal no país"
(destaques originais). É certo que os dados bancários, de qualquer modo,
permaneceriam sob sigilo, igualmente imposto ao Ministério Público.
9. Se é possível a transferência do sigilo bancário da instituição
financeira ao Fisco para que este intente por seu órgão competente a ação
cabível, não há razão ponderável para se excluir a ação penal.
10. Por essa razão que não fica obstado ao Ministério Público Federal,
que tem garantida, para o exercício de suas atribuições, a requisição
de diligências investigatórias a que aludem os arts. 129, VIII, da
Constituição da República e 8º da Lei Complementar n. 75, de 20.05.93,
requisitar diretamente informações bancárias à Receita Federal.
11. Sendo certo que o sigilo é transferido, sem autorização judicial, da
instituição financeira ao Fisco e deste à Advocacia-Geral da União, para
cobrança do crédito tributário, bem como ao Ministério Público, sempre
que, no curso de ação fiscal de que resulte lavratura de auto de infração
de exigência de crédito de tributos e contribuições, constate-se fato
que configure, em tese, crime contra a ordem tributária (Decreto n. 2.730,
de 10.08.98, art. 1º e Lei n. 9.430/96, art. 83), a iniciativa deste não é
fato jurídico pelo qual se institui um requisito anteriormente inexistente.
12. A existência de valores creditados em conta corrente ou investimentos
instituição financeira, sem a adequada comprovação de origem configura
o delito de sonegação fiscal.
13. Não foram trazidos elementos que pudessem infirmar a representação
fiscal para fins penais, na qual constam os autos de infração (Procedimento
Administrativo Fiscal n. 19515.007004/2008-11, Apenso I) que é claro e preciso
no sentido de que o réu como responsável pela empresa praticara o crime
previsto no art. 1º, I, da Lei n. 8.137 /90 c. c. o art. 71 do Código Penal.
14. Em Sessão Plenária, o Supremo Tribunal Federal, em 17.02.16, firmou
o entendimento, segundo o qual "a execução provisória de acórdão penal
condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso
especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional
da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da
Constituição Federal" (STF, HC n. 126.292, Rel. Min. Teori Zavascki,
j. 17.02.16). Em regime de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal
reafirmou o entendimento de que não compromete o princípio constitucional
da presunção de inocência (CR, art. 5º, LVII) a execução provisória de
acórdão penal condenatório proferido em grau recursal, ainda que sujeito
a recurso especial ou extraordinário.
15. Apelação provida.
Ementa
PROCESSO PENAL. ART. 1º, I, C. C. O ART. 12 DA LEI N. 8.137/90. SIGILO
BANCÁRIO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. QUEBRA. ADMISSIBILIDADE. MINISTÉRIO
PÚBLICO. SIGILO BANCÁRIO. REQUISIÇÃO DIRETAMENTE À RECEITA
FEDERAL. ADMISSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS.
1. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do
Recurso Especial Representativo de Controvérsia n. 1.134.665/SP, firmou
o entendimento de que é lícito ao Fisco receber informações sobre a
movimentação bancária dos contribuintes sem a necessidade de prévia
autorização judicial, desde que seja resguardado o sigilo das informações,
a teor do art. 1º, § 3º, VI, c. c. o art. 5º, caput, da Lei Complementar
n. 105/01, c. c. o art. 11, §§ 2º e 3º, da Lei n. 9.311/96.
2. A controvérsia cinge-se ao emprego dessa prova para fins de instrução de
processo-crime, pois há entendimento tanto no sentido de que para isso seria
imprescindível decisão judicial para a quebra do sigilo bancário (STJ,
HC n. 243.034, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 26.08.14, AGRESP n. 201300982789,
Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 19.08.14, RHC n. 201303405552,
Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 11.02.14), quanto no sentido de que,
tendo sido a prova produzida validamente no âmbito administrativo, não
há como invalidá-la posteriormente. Filio-me a esse entendimento, dado
não se conceber nulidade a posteriori: a autoridade fiscal tem o dever
jurídico (vinculado) de, ao concluir o lançamento de crédito constituído
em decorrência de crime fiscal, proceder à respectiva comunicação ao
Ministério Público para a propositura de ação penal. Não se compreende
como, ao assim fazer, acabe por inviabilizar a persecutio criminis.
3. Resta confirmada a validade da aplicação imediata da Lei Complementar
n. 105/01 em relação a fatos ocorridos anteriormente a sua vigência,
pois se trata de norma caráter procedimental.
4. Anoto que o Plenário do Supremo Tribunal Federal pronunciou-se sobre a
constitucionalidade do referido procedimento no RE n. 601.314, com acórdão
publicado em 16.09.16, bem como nas ADIs ns. 2390, 2859, 2397 e 2386,
publicados os respectivos acórdãos em 21.10.16.
5. O Supremo Tribunal Federal admitiu a transferência do sigilo bancário
ao Fisco, o que não atentaria contra a intimidade do contribuinte,
na medida em que as informações sigilosas remanesceriam cobertas pela
aludida proteção. Assim, os dados bancários permaneceriam insuscetíveis
de divulgação. Ressalvou, contudo, que o Fisco pode utilizar tais dados,
não apenas no âmbito administrativo (o processo administrativo fiscal tem
caráter sigiloso), como também para que sejam usados pela Advocacia-Geral
da União em Juízo.
6. No julgamento em referência, no que tange à impugnação aos arts. 5º
e 6º da Lei Complementar n. 105/01, ponto central das ações diretas
de inconstitucionalidade, o Relator Ministro Dias Toffoli destacou que a
transferência de dados para outro órgão da administração pública não
desnatura o caráter sigiloso da movimentação bancária do contribuinte.
7. No mesmo julgamento, relativamente à impugnação ao art. 3º, § 3º,
da Lei Complementar n. 105/01, que prevê que o Banco Central do Brasil e
a Comissão de Valores Mobiliários forneçam à Advocacia-Geral da União
"as informações e documentos necessários à defesa da União nas ações
que seja parte", registrou o Relator Ministro Dias Toffoli.
8. Não se concebe que, admitida a "judicialização" pelo Supremo Tribunal
Federal, seja ela válida somente para a cobrança do crédito tributário,
mas não para a punição do respectivo sonegador. Cumpre destacar, como o
fez o Relator Ministro Dias Toffoli, "(...) que o instrumento fiscalizatório
instituído nos arts. 5º e 6º da Lei Complementar nº 105/2001 se mostra
de extrema significância ao efetivo combate à sonegação fiscal no país"
(destaques originais). É certo que os dados bancários, de qualquer modo,
permaneceriam sob sigilo, igualmente imposto ao Ministério Público.
9. Se é possível a transferência do sigilo bancário da instituição
financeira ao Fisco para que este intente por seu órgão competente a ação
cabível, não há razão ponderável para se excluir a ação penal.
10. Por essa razão que não fica obstado ao Ministério Público Federal,
que tem garantida, para o exercício de suas atribuições, a requisição
de diligências investigatórias a que aludem os arts. 129, VIII, da
Constituição da República e 8º da Lei Complementar n. 75, de 20.05.93,
requisitar diretamente informações bancárias à Receita Federal.
11. Sendo certo que o sigilo é transferido, sem autorização judicial, da
instituição financeira ao Fisco e deste à Advocacia-Geral da União, para
cobrança do crédito tributário, bem como ao Ministério Público, sempre
que, no curso de ação fiscal de que resulte lavratura de auto de infração
de exigência de crédito de tributos e contribuições, constate-se fato
que configure, em tese, crime contra a ordem tributária (Decreto n. 2.730,
de 10.08.98, art. 1º e Lei n. 9.430/96, art. 83), a iniciativa deste não é
fato jurídico pelo qual se institui um requisito anteriormente inexistente.
12. A existência de valores creditados em conta corrente ou investimentos
instituição financeira, sem a adequada comprovação de origem configura
o delito de sonegação fiscal.
13. Não foram trazidos elementos que pudessem infirmar a representação
fiscal para fins penais, na qual constam os autos de infração (Procedimento
Administrativo Fiscal n. 19515.007004/2008-11, Apenso I) que é claro e preciso
no sentido de que o réu como responsável pela empresa praticara o crime
previsto no art. 1º, I, da Lei n. 8.137 /90 c. c. o art. 71 do Código Penal.
14. Em Sessão Plenária, o Supremo Tribunal Federal, em 17.02.16, firmou
o entendimento, segundo o qual "a execução provisória de acórdão penal
condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso
especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional
da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da
Constituição Federal" (STF, HC n. 126.292, Rel. Min. Teori Zavascki,
j. 17.02.16). Em regime de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal
reafirmou o entendimento de que não compromete o princípio constitucional
da presunção de inocência (CR, art. 5º, LVII) a execução provisória de
acórdão penal condenatório proferido em grau recursal, ainda que sujeito
a recurso especial ou extraordinário.
15. Apelação provida.Decisão
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide
a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por
unanimidade, dar provimento à apelação do Ministério Público Federal
para condenar José Luiz de Souza Filho a 3 (três) anos, 1 (um) mês e 10
(dez) dias de reclusão, regime inicial de cumprimento de pena aberto, e 15
(quinze) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário
mínimo vigente à época dos fatos, pela prática do crime do art. 1º,
I, c. c. o art. 12, I, ambos da Lei n. 8.137/90, em continuidade delitiva e
substituir a pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos,
consistentes em prestação pecuniária de 10 (dez) salários mínimos em
favor de entidade beneficente (CP, art. 43, I, c. c. o art. 45, §§ 1º e
2º) e prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas (CP,
art. 43, IV, c. c. o art. 46) pelo mesmo tempo da pena privativa de liberdade,
cabendo ao Juízo das Execuções Penais definir a entidade beneficiária,
o local de prestação de serviços e observar as aptidões do réu e,
por maioria, determinar a execução provisória após o exaurimento das
instâncias ordinárias, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Data do Julgamento
:
04/02/2019
Data da Publicação
:
13/02/2019
Classe/Assunto
:
Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 77153
Órgão Julgador
:
QUINTA TURMA
Relator(a)
:
DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW
Comarca
:
TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Tipo
:
Acórdão
Referência
legislativa
:
LEG-FED LEI-8137 ANO-1990 ART-1 INC-1 ART-12
LEG-FED LCP-105 ANO-2001 ART-1 PAR-3 INC-6 ART-3 PAR-3 ART-5 ART-6
LEG-FED LEI-9311 ANO-1996 ART-11 PAR-2 PAR-3
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
LEG-FED ANO-1988 ART-129 INC-8 ART-5 INC-57
***** EMPU-93 ESTATUTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO
LEG-FED LCP-75 ANO-1993 ART-8
LEG-FED DEC-2730 ANO-1998 ART-1
LEG-FED LEI-9430 ANO-1996 ART-83
***** CP-40 CÓDIGO PENAL DE 1940
LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-71 ART-43 INC-1 INC-4 ART-45 PAR-1 PAR-2
ART-46
Indexação
:
VIDE EMENTA.
Fonte da publicação
:
e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/02/2019
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